sábado, 30 de março de 2013

A morte tava viva na avó


Ensaio 32
baitasar

Os bolinho frito da avó era uma gostosura. O jeito de fazer os bolinho da avó foi junto com o desaparecimento da avó. As tias bem que tentaram, mas não ficava do mesmo jeito que nas lembrança, faltava a avó com a cantoria enquanto fritava os bolinho, Essa é do Cartola, essa outra é do Noel, esse moleque branco tinha a boquinha torta, desaparecido com 26, cuspindo sangue, um herói da Vila, viveu misturado com os preto... e as preta, acho que o moleque tinha uma caixinha de música.
A avó soltou um suspiro seguido do seu sorriso desdentado e recomeçô a cantoria, E eu pergunto: com que roupa? Com que roupa eu vou pro samba que você me convidou?
—     ...
Agora eu não ando mais fagueira
Pois o dinheiro não é fácil de ganhar
Mesmo eu sendo uma cabra trapaceira
Não consigo nem ter pra gastar
—     ...
O casarão da nêga Laetitia tinha sua Clementina, forte, inabalável, vigorosa, a nação dos preto, mais numerosa, mais amorosa, cantava suas harmonia, dançava suas memória, o batuque com o zunzunzum da avó, a regra dos orixás da Criação, Meu neinho, presta a devida atenção em tudo, mas não perde a vista da memória, o nosso povo não tem herói escrito nos livro da professora, e o que não tem escrito fica desaparecido se não tem quem conta a história.
Foi a avó que ensinou os neto com as história dos preto, mas enfiava aviso de cuidado, Pra não tê desfavô na escola dos branco, havia de aprendê também a contação do jeito da professora, o outro jeito fica no peito. Os neinho escolhe a justeza do lugar de uma e da outra, as história tem cor, é melhó guarda a contação da avó pra contá quando achá que pode
—     Se a avó quer assim, as história vai ficar criando raiz por dentro dos neinho.
Ocê vai tê que perdoá sua avó, tenho muito repetimento das história na cabeça, os miolo nem sempre ajuda, a avó aprendeu de ouvi contá, não tem nada escrito, muita coisa tá escondida no esquecimento, alguma coisa ficô guardada no espírito, melhor desse jeito, o peito da avó não congela nem endurece o modo de olhá os outro
—     ...
Os velho quando fica velho tem que tê uns remedinho pra tomá, as sementinha da saúde. Gente nova precisa fazê o plantio e o manejo da plantinha do amô, ela faz cura das tristeza quando fica florescida, mas há de defunta se não recebe cuidado de carinho, não pode ficá misturada com as erva daninha, essa nasce sozinha, não precisa semeação, cresce rápido feito maldade e segura a tristeza dentro do peito. O neinho precisa cultivá com capricho as sementinha do amô. Já pensô na paciência da galinha? Ela cisca, cata, come grão por grão, laboriosa, delicada, mas tem ginga, ela ensina com o exemplo. Não esquece que quem espera é porque tem esperança, só precisa escutá com a fundura do peito
—     A avó fica linda com essa cantoria toda...
Quê nada, neinho, a avó é aprisionada num corpo velho, se a minha Santinha escutá a reza do coração e intercedê com jeitinho, a avó faz a travessia pra África com a carne menos usada. Aqui, nesse casarão, to parecendo uma bailarina guardada na caixinha das música... esperando
—     A avó tá esperando o quê?
Ela soltou um suspiro que apareceu da maior lonjura, dum lugar que não existe, mas que a avó queria que tivesse existido, a cisma duma coisa que ela queria o feito que não foi feito, a largura do arrependimento
—     Cuida dos bolinho, a avó já volta...
Fiquei fritando os bolinho enquanto a avó não vinha. Fritei os bolinho, um a um. A avó não veio. Larguei os bolinho quentinho na mesa e fui chamar a avó. Entrei no quarto e fiz barulho de anúncio, O café e os bolinho já tão pronto. A luz amarelada na cabeceira da cama tava bem fraquinha. A avó ficava deitada com um caixinha ao seu lado. Ela tava diferente, os vinco do rosto cansado tava alisando, os crespo do cabelo acinzentava
—     Neinho, olha pra isso...
Mostrava a caixinha deitada do lado, nunca tinha visto nas mão da avó aquela caixinha toda brilhosa, parecia novinha em folha, acabada de ser recebida
—     ... isso é uma caixinha da música. Já viu alguma? Foi presente do avô...
Ela abriu a caixinha e uma bailarina girava pra lá e pra cá sobre um picadeiro de espelho, a música que nunca ouvi me fez ficar parado, como se a professora da geografia tivesse dito, Sim!, e não pudesse me mexer pra matar o desejo, imobilizado pela leveza do encanto, o inesperado. Não sabia que o avô tinha feito cerimônia de presente tão chique. A avó viu minha desconfiança, voltou a dizer que foi presente do avô, Mas não foi, insisti com os olhos dentro da avó, até que ela deu liberdade no suspiro que devia tá muito tempo guardado e queria sair aliviado, tinha vontade de ser contado
—     Foi presente do fogo que queima, um fogo que lava e perfuma a alma da avó, Muito delícia... o fogo repetia, vendo a avó de bailarina. A boca era pura paixão. Gostava dos mimos do avô, mas isso é como tê um colo de conforto. Queria o fogo que deixava a avó acordada, com medo de dormi, não havia jeito de esquecê a marca que ficava na avó, ferro em brasa que marcava por dentro. Não queria corrê o risco do esquecimento, então não deslembrava. Vinha no quarto e escutava o fogo
Fez pausa de silêncio, parecia se desculpando com o avô
—     Sei que atrapalho o descanso do teu avô com os espírito, fiquei metida nesse alvoroço da vontade perdida, por muitos anos, uns por descuido, outros por ausência da coragem.
A luz amarelada desviava do brilho da avó, é a avó que sempre ilumina o casarão, cuidô do avô, e não teve cuidado de atenção com ela mesma, por isso, não vai parar de existir... até aprendê. A avó vai voltá, não sei como, mas a avó vai voltá. A avó tem mais fantasma que pode carregá, é o acompanhamento de resultância da tristura
—     O moleque não sabe porque ainda é moleque, mas vai sabê que tem coisa que se faz ou se deixa de fazê, e o pagamento é a alegria ou a tristura. A bailarina da caixinha só tá alegre dançando.
A morte tava viva na avó
—     O neinho sabe pra onde o amô carrega a gente?
Não sabia responder pra avó, mas desconfiava que a avó passava o tempo escondida dentro dos pensamento até descobrir
—     Pra ausências, neinho. A vida não dá tempo, quando a morte chega, não quer tristeza, inté acho que a vida pode tá feliz realizando o desejo de sê a bailarina. Não luto mais com o fogo que queima, vivi uma vida de ausência e acabô, mas pra nêga Laetitia é apenas o começo.
A morte ficou viva dentro do neinho.

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Leia também:

Ensaio 31 - E o quê a avó acendia com os pensamento? 
Ensaio 33 - A avó é um pedaço do seu acontecido

sexta-feira, 29 de março de 2013

Hoje é Sexta-feira 29

Tem Roda de Samba

Ataulfo Alves




Na Cadência Do Samba
Martinho da Vila


Sei que vou morrer
Não sei o dia
Levarei saudades da Maria
Sei que vou morrer
Não sei a hora
Levarei saudades da Aurora
Quero morrer numa batucada de bamba
Na cadência bonita do samba

Mas o meu nome ninguém vai jogar na lama
Diz o dito popular
Morre o homem e fica a fama
Eu quero morrer numa batucada de bamba
Na cadência bonita do samba
Quero morrer numa batucada de bamba
Na cadência bonita do samba


Composição: Ataulfo Alves / Paulo Gesta

domingo, 24 de março de 2013

E o quê a avó acendia com os pensamento?


Ensaio 31
baitasar
você não vem e vai me deixando aqui, criando as raízes da impaciência. a privação da alegria cotidiana me enche de desânimo, fazer junto as pequenas coisas não é romantismo, é biológico. a vida pra você pode ser sonolenta, mas sou muito agitada. não gosto de silêncios. quando você me aprender vai saber que eu escolho os gritos, pois eles reclamam a dor da outra pessoa como válida, mostram que vês o que a outra pessoa quer muito mostrar
—        Perdão, meu amor. Tenho muitos medos dentro de mim. O silêncio para mim é biológico. Não consigo curar minhas tristezas.
sei que incomodo e atrapalho, é que cada coisa que eu faço queria fazer junto... romantismos ultrapassados, mas isso me imobiliza, quando estou triste queria tanto teu colo, melhor não dizer nada
—        Adelaide. Adelaide... também tenho saudades...
então, larga tudo e o silêncio, estou cheirosa e de banho tomado vem fazer amor gostoso e dormir ao meu lado, casa comigo
O guri tava ali, deitado nas tábua assoalho, os cabelo longo embrulhados no chão, a cabeça colada nas tábua ouvindo sua Adelaide dos sonho, uma mulher diferente, ele acendia os pensamento resmungando com as tábua do assoalho. Eu... do meu jeito, historiando pro assoalho das tábua, tanta era a vontade de fazer continuação
—        Sèzar. Sèzar. O amigo escritista ta escutando?
—        Alto e bem claro, mas se o rabanete preto não se importa, vou ficar deitado. — um dos ouvido colado nas tábua do assoalho, precisava escuta a voz da sua Adelaide, não entendo por que ele não cuida melhor daquela mulher que lhe sonha e sussurra do amor, cheia dos desejo
—        Não senhor, chega! Vamos sentar, se o escritista não senta, eu não continuo a historiação com a avó... e chamo o serviço da vizinhança pra jogar na rua esse lixo sujo.
—        Não enche o meu saco, rabanete de merda!
—        Então, o que vai ser?
Ficamos sentados, frente a frente, olhando através daquela mancha com falta de luz, tudo na volta em silêncio, as tábuas falando da avó
—        Estava escutando os dois moleque caçando a avó... depois o silêncio abençoado, pensei comigo, enquanto olhava a fumaça que me subia da boca, esses dois acharam sentido de se espairecê sem necessidade da avó, inda bem, e não é que tava certa, os dois neinhos jogando e não se prestam de convida essa velha que sabe pra ensina, dois moleque desagradecido.
—        E a avó por onde se tinha enfiado? — o Tigão colocava esforço de sossego e compostura na voz — ... cansamo de procura a avó.
Revirô os olho como se estivesse ensaiando um desmaio, miramo o baseado nos dedo da avó, bem pequeno, quase no bagaço, a vermelhidão nos olhos denunciava o uso, pareceu que as perna deram uma pequena estremecida
—        Dois moleque preocupado com a avó que tava apenas dormindo num pedaço das lembrança, ocês parem com esse antecipatório de desgraça.
—        E o quê a avó acendia com os pensamento?
—        A saudade... gostava de cantar no encerramento da missa, era misseira. Cheguei a tocar cavaquinho, até que apanhei na rua da puliça. Era proibido nêga na rua com instrumento de música, ou qualquer instrumento de felicidade, não podia tirar meu sapato furado da pequena África... neinhos, muiê negâ precisa carregá o espírito da guerreira.
A avó depois de agitada destravava o pensamento e a língua ficava desgovernada, o que lhe vinha pra cabeça saia pela boca. Não cogitava papas na língua. Tinha vez, num relance de alguma brecha do tempo, percebia alguma linha de beleza da avó, como um risco de trovão no céu mostrava a fúria do seu embelezamento. O avô dizia que se passou com ele algum encantamento quando viu a avó, tinha acabado de acha um trevo de quatro folhas, foi o anúncio que a sorte tava com os seus serviço a favor do avô. Viu lampejos na claridade do dia. Teve a certeza de mantê a avó ardendo. Nunca precisô fazê simpatia pra não esquece a avó, sabia que ia lembra pra todo o seu sempre
—        Gostava de fazê feijoada na minha moda, pezinho de porco, tripa, toucinho, linguiça, cebola, duas folha de louro... o avô de ocêis era analfabeto de escrevê, mas gostava de lê, repetia que as mão tinha costume com a enxada, não se acertava com o lápis, mas os olho se encantava com as letra feita. Gostava de dizê verso pra folia de reis, cantava a história do Menino Deus, de porta em porta.
O estudo vem, o estudo vai, uns amigo vem, uns amigo vai, no jogo da vida dá pra cabê a ilusão, mas é preciso toma uns cuidado de vigilância. O Tigão não parecia sossegado com as história da avó
—        Avó... onde tu tava?
—        Quando?
—        Depois do almoço a avó sumiu.
—        Tava deitada na sombra, fumando meu cigarrinho.
Não quis vê o Tigão, mas senti o olho dele no meu encalço, não adiantava fecha o ouvido com um pouco de cera, ele tinha perdido confiança em mim, não fui prudente com as minha preferência
—        Neinhos, gostei da qualidade do fumo, a Laetitia também aprovô. E ocêis dois moleque... vem até a avó.
A avó tava de bem com a felicidade, mas misturava as história dentro da cabeça. Ela não mudou, mas tava atrapalhada. Pegou o rosário das rezas, na mão direita, levou até a testa, fechou os olho e iniciou reza. Na mão esquerda segurava um galinho de arruda que agitava calmamente no Tigão, depois em mim, repetia a mesma reza, Ó mangas, ó changas, ó tangas, ó mirabelas, ó caga verrumas, ó mijafivelas, ó caralhos, ó bugalhos, ó peidos meus e da Maria e do Matheus; por que bananas não comeste tu? Por que enfiaste o dedo no cu? Por que não me disseste que quebrantes tinhas, que eu te curava com três alhos, com três caralhos, com três bugalhos, com três fios, com três pavios, com três puta que os pariu
—        Por que a avó não vende a saúde?
—        Não recebo o que não me é devido, a cura é por amor ao próximo, não é por mimo nem por gratidão, se não é desse jeito as reza perde a resultância.
—        Pois eu acho que a avó ta rasgando gratidão.
—        Esquece... neinho, vamô toma café com bolinho frito.
O Tigão saiu pela porta resmungando que tava atrasado pro compromisso
        Então, come na volta..

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Leia também: 
Ensaio 30 - Tigão, vamô joga awalé?
Ensaio 32 - A morte tava viva na avó

sábado, 23 de março de 2013

Hoje é Sábado 23

Tem Reunião Dançante


A vida não é uma festa...



Tina Charles - Dance Little Lady Dance





não se engane... nem é amante da alegria


Tina Charles - I Love To Love




As pessoas choram por muitas razões e, por vezes,

uma canção traz de volta uma lembrança de você mesmo



Jesse Green - Nice And Slow




mágica...


Dee D. Jackson - Automatic Lover





com muita roupa ou quase nada... 

a vida deveria ser uma festa


Ritchie Family - American generation





uma reunião dançante...



Elton John - Skyline Pigeon




maliciosa...

Van McCoy - the Hustle



sensual...

Lou Rawls - You'll Never Find Another Love Like Mine




dançante...


Johnny Rivers - Do you wanne dance





me diga, então...


Lobo - I'd love you to want me




às vezes, basta traduzir o olhar para entender...


When I saw you standing there
I about fell off my chair
When you moved your mouth to speak
I felt the blood go to my feet

Now it took time for me to know
What you tried so not to show
Something in my soul just cries
I see the want in your blue eyes

Chorus :
Baby, I'd love you
to want me
The way that I want you
The way that it should be
Baby, you'd love me to want you
The way that I want to
If you'd only let it be

You told yourself years ago
You'd never let your feelings show
The obligation that you made
For the title that they gave

Repeat chorus
Repeat verse 2
Repeat chorus



Pesquisa: Romacir
Texto: baitasar

sexta-feira, 22 de março de 2013

A Terra dada não se abra a boca

A Poesia que não cabe no latifúndio


João Cabral de Melo Neto




Morte e Vida Severina

O Retirante assiste ao enterro de um trabalhador de eito e ouve o que dizem do morto os amigos que o levaram ao cemitério


—— Essa cova em que estás,
com palmos medida,
é a cota menor
que tiraste em vida.

—— é de bom tamanho,
nem largo nem fundo,
é a parte que te cabe

neste latifúndio.

—— Não é cova grande.
é cova medida,
é a terra que querias
ver dividida.

—— é uma cova grande
para teu pouco defunto,
mas estarás mais ancho
que estavas no mundo.

—— é uma cova grande
para teu defunto parco,
porém mais que no mundo
te sentirás largo.

—— é uma cova grande
para tua carne pouca,
mas a terra dada
não se abre a boca.



—— Viverás, e para sempre
na terra que aqui aforas:
e terás enfim tua roça.

—— Aí ficarás para sempre,
livre do sol e da chuva,
criando tuas saúvas.

—— Agora trabalharás
só para ti, não a meias,
como antes em terra alheia.

—— Trabalharás uma terra
da qual, além de senhor,
serás homem de eito e trator.

—— Trabalhando nessa terra,
tu sozinho tudo empreitas:
serás semente, adubo, colheita.

—— Trabalharás numa terra
que também te abriga e te veste:
embora com o brim do Nordeste.

—— Será de terra
tua derradeira camisa:
te veste, como nunca em vida.

—— Será de terra
e tua melhor camisa:
te veste e ninguém cobiça.

—— Terás de terra
completo agora o teu fato:
e pela primeira vez, sapato.

—— Como és homem,
a terra te dará chapéu:
fosses mulher, xale ou véu.

—— Tua roupa melhor

será de terra e não de fazenda:
não se rasga nem se remenda.

—— Tua roupa melhor
e te ficará bem cingida:
como roupa feita à medida.



—— Esse chão te é bem conhecido
(bebeu teu suor vendido).

—— Esse chão te é bem conhecido
(bebeu o moço antigo)

—— Esse chão te é bem conhecido
(bebeu tua força de marido).

—— Desse chão és bem conhecido
(através de parentes e amigos).

—— Desse chão és bem conhecido
(vive com tua mulher, teus filhos)

—— Desse chão és bem conhecido
(te espera de recém-nascido).


—— Não tens mais força contigo:
deixa-te semear ao comprido.

—— Já não levas semente viva:
teu corpo é a própria maniva.

—— Não levas rebolo de cana:
és o rebolo, e não de caiana.

—— Não levas semente na mão:
és agora o próprio grão.

—— Já não tens força na perna:
deixa-te semear na coveta.

—— Já não tens força na mão:
deixa-te semear no leirão.



—— Dentro da rede não vinha nada,
só tua espiga debulhada.

—— Dentro da rede vinha tudo,
só tua espiga no sabugo.

—— Dentro da rede coisa vasqueira,
só a maçaroca banguela.

—— Dentro da rede coisa pouca,
tua vida que deu sem soca.



—— Na mão direita um rosário,
milho negro e ressecado.

—— Na mão direita somente
o rosário, seca semente.

—— Na mão direita, de cinza,
o rosário, semente maninha,

—— Na mão direita o rosário,
semente inerte e sem salto.


—— Despido vieste no caixão,
despido também se enterra o grão.

—— De tanto te despiu a privação
que escapou de teu peito à viração.

—— Tanta coisa despiste em vida
que fugiu de teu peito a brisa.

—— E agora, se abre o chão e te abriga,
lençol que não tiveste em vida.

—— Se abre o chão e te fecha,
dando-te agora cama e coberta.

—— Se abre o chão e te envolve,
como mulher com que se dorme.


 
Fernando Pessoa

















A Poesia para cada um é um jeito
um feito
um defeito
malfeito
um esquecimento da vida
um lembramento
a carícia partida
uma árvore com desejos
suspiros na despedida
uma carícia que não acaba
uma espera que não termina
o milho
o pão
a cruz
o perfume
a enxada
a semente
não é nada

quinta-feira, 21 de março de 2013

A Poesia

Maldigo la poesía concebida como un lujo
Gabriel Celaya


Alfredo Zitarrosa



Al Comandante Ernesto Che Guevara
Alfredo Zitarrosa

(Poema por balada)

Las palabras no entienden lo que pasa:
Las vocingleras, las oscuras, las dóciles,
las que llaman las cosas por su nombre,
las que inventan el nombre de las cosas;
las palabras que dije o me dijeron,
las que aprendí en los libros,
las que escribo,
las que pensé mirando una ventana,
las que acercándose al silencio, gritan;
las que al tocar el fuego, se desfogan,
las que truecan los trinos y los truenos,
las que sirven la mesa de mi casa,
las de la nítida caligrafía que cae por las paredes de la escuela,
las que dicen a dúo el pez y el pájaro;
las palabras que tuve o que no tuve
para llamar al mundo y que viniera,
las que tienden un hilo minucioso
que va de los balcones a las bocas,
y de las bocas a la historia, y pasan,
las que pasan la noche entre papeles,
o suben la escalera del insomne,
y se introducen en su sueño a ciegas;
las que ordenan el ruido en los rincones,
las que barren el vómito de rabia,
las que saltan del fémur a la luna,
las que cortan la sombra calcinante,
las que labran un nombre en una piedra
para mejor perpetuar el olvido,
las que bajan al árbol por el aire
y se trepan al cielo por el tronco,
las que mastican un cangrejo lento,
las que anuncian el fin de la Cuaresma,
las que le quitan sueño al asesino
y lo dejan dormir y le montan guardia,
las que no sangran, aunque se las hiera,
las que no mueren, aunque se las mate;
las que roban futuro en un embudo,
las que administran mitos y virtudes,
las que mantienen trato con el viento,
las que advierten el agua incinerada,
las que abren los labios de la tierra
buscando el astrolabio de tu grito,
las que te dicen, sin creer que oyes:
-Vuelve a pelear Ramón, aunque te mueras...
Las palabras no entienden lo que pasa.


Maiakovski



A propósito disto - O amor
Vladímir Maiakovski


Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
numa alameda do zôo,
sorridente,
tal como agora está
no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o exame
de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então,
de todo amor não terminado
seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me,
nem que seja só porque te esperava
como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me,
nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo
de casamentos,
concupiscência,
salários.
Para que, maldizendo os leitos,
saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia,
que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
- Camaradas!
Atenta se volte a terra inteira.
Para viver
livre dos nichos das casas.
Para que doravante
a família seja
o pai,
pelo menos o Universo,
a mãe,
pelo menos a Terra.



Garcia Lorca



Es Verdad
Garcia Lorca

¡Ay qué trabajo me cuesta
quererte como te quiero!

Por tu amor me duele el aire,
el corazón
y el sombrero.

¿Quién me compraría a mí
este cintillo que tengo
y esta tristeza de hilo
blanco, para hacer pañuelos?

¡Ay qué trabajo me cuesta
quererte como te quiero!



Pablo Neruda





Cecilia Meireles




Cora Coralina




Carlos Drummond de Andrade




Vinicius de Moraes













quarta-feira, 20 de março de 2013

Si dios fuera mujer

Mario Benedetti








¿Y si Dios fuera mujer?

pregunta Juan sin inmutarse,
vaya, vaya si Dios fuera mujer
es posible que agnósticos y ateos
no dijéramos no con la cabeza
y dijéramos sí con las entrañas.

Tal vez nos acercáramos a su divina desnudez
para besar sus pies no de bronce,
su pubis no de piedra,
sus pechos no de mármol,
sus labios no de yeso.

Si Dios fuera mujer la abrazaríamos
para arrancarla de su lontananza
y no habría que jurar
hasta que la muerte nos separe
ya que sería inmortal por antonomasia
y en vez de transmitirnos SIDA o pánico
nos contagiaría su inmortalidad.

Si Dios fuera mujer no se instalaría
lejana en el reino de los cielos,
sino que nos aguardaría en el zaguán del infierno,
con sus brazos no cerrados,
su rosa no de plástico
y su amor no de ángeles.

Ay Dios mío, Dios mío
si hasta siempre y desde siempre
fueras una mujer
qué lindo escándalo sería,
qué venturosa, espléndida, imposible,
prodigiosa blasfemia.


Patativa do Assaré

Eu sou brasileiro fio do nordeste cabra da peste

"sou o amor com gentileza"










terça-feira, 19 de março de 2013

A Poesia é uma arma carregada de Futuro

Paco Ibañez
La Poesia es un arma cargada de Futuro







La Poesia es un arma cargada de Futuro
Gabriel Celaya ("Poesía urgente")

Cuando ya nada se espera personalmente exaltante
mas se palpita y se sigue más acá de la conciencia,
fieramente existiendo, ciegamente afirmando,
como un pulso que golpea las tinieblas,

cuando se miran de frente
los vertiginosos ojos claros de la muerte,
se dicen las verdades:
las bárbaras, terribles, amorosas crueldades:

Se dicen los poemas
que ensanchan los pulmones de cuantos, asfixiados,
piden ser, piden ritmo,
piden ley para aquello que sienten excesivo.

Con la velocidad del instinto,
con el rayo del prodigio,
como mágica evidencia, lo real se nos convierte
en lo idéntico a sí mismo.

Poesía para el pobre, poesía necesaria
como el pan de cada día,
como el aire que exigimos trece veces por minuto,
para ser y en tanto somos dar un sí que glorifica.

Porque vivimos a golpes, porque apenas si nos dejan
decir que somos quienes somos,
nuestros cantares no pueden ser sin pecado un adorno.
Estamos tocando el fondo.

Maldigo la poesía concebida como un lujo
cultural por los neutrales
que, lavándose las manos, se desentienden y evaden.
Maldigo la poesía de quien no toma partido hasta mancharse.

Hago mías las faltas. Siento en mí a cuantos sufren
y canto respirando.
Canto, y canto, y cantando más allá de mis penas
personales, me ensancho.

Quisiera daros vida, provocar nuevos actos,
y calculo por eso con técnica, qué puedo.
Me siento un ingeniero del verso y un obrero
que trabaja con otros a España en sus aceros.

Tal es mi poesía: Poesía-herramienta
a la vez que latido de lo unánime y ciego.
Tal es, arma cargada de futuro expansivo
con que te apunto al pecho.

No es una poesía gota a gota pensada.
No es un bello producto. No es un fruto perfecto.
Es algo como el aire que todos respiramos
y es el canto que espacia cuanto dentro llevamos.

Son palabras que todos repetimos sintiendo
como nuestras, y vuelan. Son más que lo mentado.
Son lo más necesario: Lo que no tiene nombre.
Son gritos en el cielo, y en la tierra, son actos.


"A Utopia serve para Caminhar"

Eduardo Galeano



domingo, 17 de março de 2013

Tigão, vamô joga awalé?


Ensaio 30
baitasar
Na noite de lua cheia, escrever três vezes num papel totalmente branco o nome da pessoa que se quer conquistar e desenhar do lado dos três nomes um único coração. Dobrar o papel e dizer a seguinte frase, três vezes olhando pra lua e pensando na pessoa: ‘Lua, lua, lua, me traga...’, como se chama essa sua paixão perdida?
—        Não precisa nada disso, Fumaça.
—        Diz logo o nome da moça.
—        Adelaide.
Tudo bem, vamos continuar: ‘Lua, lua, lua, traga pra mim a Adelaide’. Colocar o papel dobrado dentro da fronha do travesseiro e dormir. No dia seguinte, joga o papel dobrado em algum mato até o meio dia. Funciona, mas o escritista precisa botar vontade de acredita, senão o encanto se quebra
—        Fumaça, acho tudo isso bobagem. Amor conquistado com simpatia é fantasia da cabeça.
—        O escritista ta certo, amor é pura fantasia da vontade da cabeça e fogaréu da virilha.
—        Então, se acaba o feitiço... acaba o amor.
—        Rapaz, mostra pro Fumaça um amor que não acaba. — o escritista fez silêncio demasiado, não parecia com entusiasmo de continuação no assunto, foi quando o Tigão entrou correndo pelos pensamentos e se intrometeu na conversa de amor com o escritista
—        Mano, onde a avó se meteu?
A voz preocupada do Tigão me devolveu à memória aquela tarde de desaparecimento da avó. O escritista que fosse achar um jeito de resolver os seus feitiços de simpatia com a moça, essa tal Adelaide. Eu tinha os meus jeitos de resolver, ele que fizesse esforço de achar solução. A vida não é só cafuné na cabeça, tem vez, que é preciso mostra o caminho do lado certo, custe o que precisa custa
—        E se a avó ta escondida junto com a nêga Laetitia?
O Tigão me olhô com o branco dos olho enfezado, quase saindo do olho
—        E o guri sabe onde fica esse lugar?
Engraçado como tudo que se diz e se faz não tem só um jeito. O poço que foi esconderijo e depois prisão pra nêga Laetitia, hoje, pode que é a caverna da avó
—        Não... a avó nunca apontou o lado com precisão.
—        Vamo começa em algum luga...
Na verdade, se disse que o tal poço ficava na cozinha, também se disse que o poço podia ta escondido na senzala. Como se a nêga Laetitia nunca tivesse saído do alojamento escravista. O esconderijo da nêga Laetitia incomoda a memória que não é indiferente e precisa escolhe o que vai lembra, Neinho, o branco foi violento e cruel com o trabalhadô escravo. O açoite, a corrente, e o uso que fazia das mulhê, se juntô com as lei que protege a força, a tortura e o castigo, pra doma e abafa os preto. Meu neto, a puliça ta no serviço de todos, mas corre mais ligeiro atrás do preto, Mas avó, os tempo são outro, não tem mais trabalho de escravo, os preto e os branco se misturaram, O neinho tem a certeza pelo que diz ou só repete a bobage dos branco?
Fiquei em silêncio, ela tava com vontade de dizer do seu costume de enxerga a vida, e nada havia de impedi a avó de fala da sua vontade, Ajeita o ouvido de escuta pra mais perto, cheguei bem pertinho, os olho da avó ficaram do tamanho da lua cheia, a boca da avó tinha o cheiro do fumo de corda, toda vez que a lembrança da avó embranquece, pego um pedaço do fumo de corda e lixo feito escova nos pelo do bigode, Isso, assim, bem pertinho, presta atenção, pro puliça os preto não é dono de si mesmo, não é livre, por isso, é mais fácil de corre atrás. Muitos se deixa morre de tristeza, outros se acostuma com a carapinha branca
—        Avó! Avó!
—        Não grita, Tigão.
—        E como vamo encontra a avó?
—        Procurando...
Descemos até o porão do casarão
—        Tigão, a avó não há de se esconde aqui... eu tava aqui, tinha visto.
—        Dormindo com a mão toda melada e os dente se mostrando da satisfação com a alucinação. Do meu modo de vê, ocê não via nada que acontecia na sua volta. — senti um arrepio de espírito pra espírito, Será que a avó viu a professora da geografia fazendo seus serviços de carinho, ensinando que a mão que segura o lápis é mais forte que devia pras carícia, é preciso faze uso da outra, mais boba, menos valente, menos de uso com a força, merda, merda, merda... se viu, não vai faze de conta que não viu, mas isso é outro causo pra se resolvido na hora correta
—        Tigão!
—        O que foi? — a revista na senzala deu em nada, a avó tava em esconderijo que ficava em outro lugar
—        Lembra do jogo que a avó ensino?
—        Que jogo que ocê ta falando?
—        Daquele de fazê colheita e semea as simenti...
—        Lembro um pouco, outro pouco to no esquecimento.
—        Vamo jogá?
—        E a avó?
—        Se ela ta escondida teve vontade de fica ocultada, quieta da intromissão de alguém.
—        Não sei, não...
—        Confia no jogo, é preciso o tempo da semeadura — antes, fizemo reza pra velha senta na volta do jogo, convidando os espírito antigo, velho e moço jogando awalé pra alivia das dificuldade, festejando a semeadura da vida, enquanto o assunto do corpo queima na fogueira, aumentando a latência da poeira dos espírito. A avó diz que o awalé e a poesia flutuam no espaço do não enxergado, tão entre as coisas, pra junta os pedaços da vida que precisa sê contado e colhido. Fiz um risco no chão e dividi os dois território, o meu e o do Tigão, com seis buraco cada um. O sul fico comigo, o norte fico com o Tigão. Cada uma das trinta e seis cova recebeu quatro simenti, assim, cada jogador plantou vinte e quatro simenti
—        Que jogo é esse, Fumaça?
—        Pelo visto, o escritista não consegue ficar mudo e ouvir a história por completo, sem fazer perguntas.
—        Só quero saber o nome do jogo.
—        Awalé.
—        Nunca ouvi falar.
—        Não sei por que, mas... não é nenhuma surpresa. Posso continuar?
—        Você pode explicar melhor?
—        Rapaz... acende outro e eu vou explicando o jogo.
—        O fósforo...
—        Ta sentado em cima.
Ficô combinado que o Tigão inicia o jogo. Ele escolhe uma das cova do seu território e retira tudo que foi simenti e redistribui. A direção do jogo é sempre pela direita
—        Não entendi.

Depois que o Tigão esvaziou a cova escolhida por ele, teve que coloca cada uma das quatro simenti em cada uma das cova seguinte. Os quatro buraco na direita do vazio receberam cada uma sua simenti.
O próximo na vez do jogo sou eu. Da mesma forma escolho uma cova do meu território, retiro dela todas as simenti e redistribuo respeitando os sentido – sempre pra direita – não posso pula nenhuma cova. Assim, as simenti se desconjuntam entre as cavidade do meu território, mas também do teu, Tigão. E cada cova vai acumulando as nova, que se soma nas simenti do começo. Asveis, as cova fica com pouca simenti
—        E o que acontece? — o Tigão se tinha posto em vigília de interesse.
As cova com 1, 2 ou 3 simenti corre risco. Se o simenteiro calcular bem, de forma que a última simenti espalhada caia na cova do outro sementeiro que tenha 1, 2 ou 3 simenti, ele tem o direito de esvazia a cova, recolhendo as simenti pra si e tirando do jogo. Mas isso, vale apenas pras cova com 3 simenti ou menos
—        ...
Assim, as cova do outro simenteiro com pouca simenti se torna alvo. Quando um dos simenteiro consegue colhe todas as simenti de alguma cova, do jeito que eu disse, todas as cova de antes com 1, 2 ou 3 simenti poderão sê esvaziada. É um jeito de consegui, numa só jogada, uma grande quantidade de simenti em seqenciamento
—        Já entendi, vamos jogar.
Calma escritista. Agora, o mais importante, neste jogo, não se tem o direito de deixar o outro sementeiro faminto. Se ele não tem mais nenhuma semente no seu campo, o outro sementeiro deve entregar pra ele uma semente, retirada de uma das suas covas, para o jogo continuar. De uma semente pode se volta com muita
—        Não entendi... como se ganha esse jogo das sementes?
O jogo termina quando o número de sementes é tão pequeno que nenhum sementeiro consegue colher a semente do outro. Ganha quem colheu mais sementes
—        Ah, então, o sementeiro planta e colhe. Precisa calcular pela quantidade de sementes nas covas, de onde parte, onde vai cair e o quanto poderá colher do outro sementeiro. E também, precisa calcular para as covas do seu território não ficarem com poucas sementes
—        Venci, venci... ganhei do Tigão!
—        Joguinho de fresco...
—        Os menino fazendo tanto deboche... por causo do quê?
—        Avó!

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Leia também: 

Ensaio 31 - E o quê a avó acendia com os pensamento?

sábado, 16 de março de 2013

Hoje é Sábado 16

Tem Reunião Dançante

Lá se foram os tempos da Catacumba... da Catapimba


Cat Stevens - Father and Son




mesmo você que não mora mais por aqui, mas viveu em Canoas


Light Reflections - Tell me once again




passou pelos dormitórios da nossa Cidade, curtiu os brasileiros compondo e cantando em inglês, nomes que pareciam gringos...


Morris Albert - She's my girl




sentiu as vibrações dançantes dos sábados, domingos


Pepeu Gomes - Mil e Uma Noites de Amor




na Catacumba, na Catapimba...


George McCrae - Rock Your Baby




Andrea True Connection - More, More More




Viola Wills - Gonna get along without you now




Tavares -- Heaven Must Be Missing An Angel





o cheiro do cloro das piscinas, o estacionamento, os carros, as quadras de tênis...
a música a dança


Blondie - Heart of Glass




até que chega a hora de ir embora


The stylistics - You are everything



Pesquisa: Romacir
Texto: baitasar

sexta-feira, 15 de março de 2013

Cenas...

O cinema e as suas cenas...

que permanecem na memória, por algum perfume


Perfume de Mulher - Scent Of A Woman 




Vem Dançar -




até que os nomes não tenham mais importância...





apenas o bailado do tango





e você tem certeza que só acontece uma vez na vida





a música, a dança, os passos... a mágica





têm vezes que a música toma conta da cena e






como se fosse a primeira vez... você se deixa ficar







mas se preferir dublado... não precisa aprender a dançar





esse vagabundo...









quarta-feira, 13 de março de 2013

terça-feira, 12 de março de 2013

As Estrelas, os Acasos, as Cartas de Tarô

Tetê Espíndola

Escrito nas Estrelas






Amelinha - Foi Deus que fez você






Elba Ramalho - Mulher






Nana Caymmi e Erasmo Carlos - Não Se Esqueça De Mim



domingo, 10 de março de 2013

Neinho, o seu puliça é gente decente


Ensaio 29
baitasar
Desculpe ter metido o senhor, seu puliça, nesta história sem pé nem cabeça. O seu puliça é gente decente, bom coração, cumpridor do seu dever de vigilante da imbecilidade, mas todo mundo que não é preto finge que não sabe, o seu puliça desembesta pro lado dos preto mais fácil que pro lado dos branco. E isso vem do berço dos branco. Uma chave de cadeia que fica na cinta do seu puliça. E os preto tinha que lambe o beiço, dar graças à deus, que a cinta não saia da cintura do seu puliça. Mente quem diz que os branco tem tanta chance com os arreios da vida como os preto. Desculpa esse meu atrevimento, outra vez, mas isso é conversa de gente que não quer tirar os arreio dos preto.
Os preto passa a vida se distraindo da própria vida pra servir o conforto dos branco que parece sempre em falta e com vontade de ter mais. Não quero embranquece a carapinha, quero acinzenta. Houve tempo que o caminho mais rápido pra riqueza era ter um preto pro seu conforto nos serviços da limpeza do chão, faze uso das mãos do preto na plantação, serviço de servidão feito pelo arroz, milho, feijão, mocotó e a rede na senzala que o branco atirava no chão. Essa gente de bem é apaixonada por coisa material, um desejo incontrolado de ter um preto de servidão, acorrentado no tornozelo. Quanto mais acumulação dos preto e uso de cama das preta... mais abundância de prosperidade, progresso, riqueza, poderio, mando, e a abafante dominação do seu puliça que fica no serviço de quem lhe paga. O seu puliça também é preto, devia sabe disso.
A avó contava que nunca foi fácil de fazer sobra, mas de falta não precisava nenhum descuido. Costurou muitos anos pros Almeida, Se eu fosse outra tonta, tinha passado muito trabalho, mas tinha tudo controladinho, bem certinho. O avô não se envolvia com nada em casa, todo dinheirinho dele era pra família. O teu avô tinha umas besteira que eu e o tempo acabamo, gastava com a bebida e o fumo de corda, às veiz, com o carteado no 44.

Tudo que a avó fez era bem feito. Quando saia de passeio longo, não foram muitas vezes, deixava um vasinho com rosas e pedia que a santinha cuidasse da casa e avisava, Neinho, o seu puliça é gente decente, se precisa pede socorro
—        Não tenho pena, esses pretos – não são todos, mas são muitos – não querem trabalhar, só querem roubar!
Mas seu puliça não faz injustiça de julgamento. O estudo é tudo, já viu onde os preto estuda? Os moço e moça branca vão pra longe estuda, os que não querem ir pra longe, não se contentam com os jesuíta ou as freira, que tem uns lugar de ensina quem manda, precisam de outra escola, o cursinho do gringo, o preparatório do exame pra doutor, vão em escola que ensina tudo de novo, junto com os jesuíta e as freira. E não é que são burro, mas a competição entre os branco é quase como virar santo de devoção. O seu puliça já contou quantos preto tem no colégio dos jesuíta e das freira? Tem mais preto na puliça, né?
—        E o caminhão do lixo?
Seu puliça, até no caminhão do lixo o motorista é dos branco, os preto corre atrás. Aqui, nesta terra de lanceiros, desde sempre foi assim. Por isso, quando um pequeno rabanete preto chega, bate na porta, e entra pelas portas da escola de doutor pra se doutor, é como chegar nas Américas, junto com o seu Colombo, depois de 500 anos. Já penso seu puliça... doutô jornalista.
O movimento do Tigão me tirou os pensamentos do seu puliça
—        Avó, to entrando...
O Tigão que não se metia de medroso com ninguém, tava com o branco do olho enfezado, continuava com a mão no ferrolho da porta, no maior cuidado. Foi empurrando a porta com o ombro, até fazer serviço de procura com o seu olho de vigiamento
—        E a avó? — perguntei impaciente
—        Ta muito escuro, e preto no escuro fica difícil de procura...
—        Deixa de dize bobagem...
—        Eu também quero espiar, quero ajudar o descobrimento da avó.
Fiz um muxoxo de impaciência com o doutor jornalista chapado, o escritista não se contentava em escuta a história, queria se intrometer, dar opinião de conhecimento. Já disse pra não se meter que essa história é dos preto. O escritista já tá encrencado com essa tal de Adelaide, não desata nem reata, se quiser ensino simpatia que a avó instruía pra domação da afeição pelo cupido
—        Fumaça, eu não acredito nessas bobagens.
Bem coisa de branco, fingir que não acredita. O amigo fique sabendo que a tia Vanda foi a que mais se aproveitou das simpatias da avó. Depois que botava o olho no pretendente, rezava baixinho, quase não mexia com a boca, nunca fazia reza de queixume, era murmúrio de pedidos e oferecimentos. Esperava que o pedido subisse até onde precisava subi, então, a tanajura subia nos tamanco e dançava, pra lá e pra cá, até o animal fica selvagem, depois era encilha e monta
—        Bobagem... toma, estica esse bracinho...
Branco é tudo igual, gasta a vida acumulando opulência, abastança, desafogo da pobreza, correndo nas estradas com o carrão, até que tem a iluminação que não estava aprendendo a morrer, já tinha morrido. Adiou a vida com amorosidade pra depois da morte. Tá cheio do dinheiro e fodido de saudade da vida que não teve.
Puxei fundo a frouxeza do bixo da seda, até me pareceu que o seu puliça tava junto nessa, cheguei estende o braço – costume de boa educação – mas foi só uma aparição de mau gosto, receio de assombração. Nem o danado desse bixo ajuda com os medos que são enfiados na cabeça dos pretos. É como ficar caminhando de um lado pro outro, vamos e voltamos, não saímos do mesmo lugar, espalhados na poeira
—        To com fome.
Isso é uma boa lembrança
—        To com vontade de torcer, levar a Adelaide no jogo.
Seja bem-vindo, meu amigo. Essa moça que não lhe sai do especulativo merece mais da sua atenção. Chega de lamúria, o seu jeito com a moça parece elegância de charlatão. Não promete, mas também não cumpre.
Fechei os olhos pra deixar as lembranças em movimento se aquietarem, procurava razões pra lembrar, queria terminar com aquela história
—        A avó não tá!
—        E agora, Tigão?
—        Continua a perseguição... em algum lugar, ela tá.
A avó tinha todo o casarão na sua disposição.
A tia Ana vivia de ambulante, conforme o capricho do novo ajuntado, esse outro tio agregado deixo ela enfiada mais pra dentro da vila, levou junto tudo que se mexe: os filho, as filha, os bicho. A avó rezava com simpatia e benzedura pra que a latência do agregado tivesse tempo de acostuma com a tia Ana, Meu neinho, escuta a avó, se ele acostuma, ele fica.
A tia Vanda tava no serviço de limpeza na casa da professora do Chico, irmão do Samuel. Ainda não contei dele? O Samuca é meu primo, filho da tia Ana. Não ta interessado? Preciso para com os enleios? O rapaz fica quieto e escuta. O passado sempre nos alcança mais uma vez. Acho que encontrar o escritista faz parte do jeito de me encontra, me acha comigo mesmo. Essas lembranças são ocorrências de muitos anos, naqueles instantes não tive dúvidas que nunca ia esquece. Até que esqueci. O Samuca, um dos primeiros filhos da tia Ana, que foi pra escola, foi atrás do professor porque uns piá tavam brigando, Encontrei o sôr no cafezinho batendo língua com a sôrinha do andar de baixo, ficô zangado comigo e mandô que eu desse volta já pro meu lugá, voltei, mas ele demorô mais um tempão pra voltá pro dele. Mas voltô, e precisô dá muito grito, tava tudo muito enfezado, na maió bagunça, lápis, papel, caderno no chão, giz esmagado, quadro todo riscado, uma das cortina ficô rasgada. E o sôr exigia com berro que todo mundo ia pagá, ‘Uma ova’, eu disse que não tinha culpa e que não tinha estoque de riqueza pra apagá o errado dos outro, o sôr gritô que queria meu pai na escola, no dia seguinte, ‘Meu pai já morreu’, ‘Então, quero a mãe, amanhã’, ‘Minha mãe morreu’, ‘Você não entra mais na minha aula sem os pais’, gritô dessa maneira.  Fiquei pensando comigo mesmo, ‘Como vô fazê o pai e a mãe não chegá na escola’, depois, me chamô na sala duma sôra com conversa mole, repetiu as mesmas coisa do sôr, no final de tudo isso, disse que eu havia faltado o respeito ao sôr e que ia ficar uns dia em casa, pra pensá em melhorá a atitude. O primo Samuca resolveu não volta mais, achava que era o sôr que tinha atitude pra melhorá, ‘As minha não tavam errada’, e assim aconteceu o primeiro tropeço escolar dos filho da tia Ana, ‘Fumaça’, ‘O que foi Samuca’, ‘Pra mim, escola passô a sê um casarão mal-assombrado miúdo’.
O tio Manoel tinha hora de larga do quartel, mas não tinha hora de solta as calcinha. Repetia que só tinha ambição na vida de arranca calcinha com os dente. O tio Jorge dormia até a hora de treina com as carta. Tinha mãos macias e dedo ágil, se tivesse insistido com os estudo, seria um bom professor de matemática. Contava as carta do baralho e sabia de cabeça as contas da jogatina, na mão e na mesa. O tio Batata pra não pará em casa arrumou mais uma rota. Nem bem terminava uma e já saia com outro caminhão... depois, ficava na reunião do sindicato. A avó derramava a garganta com ele, anotava do pensamento que desse jeito o filho não arrancava compromisso de nenhuma moça séria, ‘Meu filho, que moça vai querer um homem que não para em casa’, ‘Uma muié lutadora’, era a resposta do tio.
E o escritista vai querer ou não a simpatia pra atrair a sua Adelaide
—        Que benefício isso pode trazer?
Isso só o amigo pode responder, mas se deixar cair suas escamas dos olhos, vai poder ver que a moça lhe faz mais falta que o amigo tem coragem pra concordar.

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Leia também:
Ensaio 28 - A mão daquele desvergonhado embaixo do vestido 
Ensaio 30 - Tigão, vamô joga awalé?