quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Honoré de Balzac - A Comédia Humana / Cenas da Vida Privada 1

 Honoré de Balzac - A Comédia Humana / Vol 1


1
Estudos de Costumes 
- Cenas da Vida Privada



Prefácio à Comédia Humana
por Honoré de Balzac





Ao dar a uma obra iniciada há quase treze anos o título de A comédia humana, é necessário assinalar a sua ideia diretriz, contar-lhe a origem, explicar sucintamente o plano seguido, procurando falar dessas coisas como se eu nelas não estivesse interessado. Isso não é tão difícil quanto o público poderia pensar. Pouca obra dá muito amor-próprio, muito trabalho dá muitíssima modéstia. Essa observação explica os exames[9] que Corneille, Molière e outros grandes autores faziam de seus trabalhos: se é impossível igualá-los nas suas belas concepções, é permitido querer assemelhar-se-lhes nesse sentimento. 


A ideia primeira de A comédia humana foi para mim, a princípio, como que um sonho, como um desses projetos impossíveis que se acariciam e se deixam voar; uma quimera que sorri, que exibe seu semblante feminino e logo em seguida distende as asas, subindo para um céu fantástico. Mas a quimera, como tantas quimeras, transforma-se em realidade; tem suas imposições e suas tiranias, às quais se é forçado a ceder. Essa ideia nasceu de uma comparação entre a humanidade e a animalidade. 

Erro seria crer que o grande dissídio que nestes últimos tempos se estabeleceu entre Cuvier e Geoffroy Saint-Hilaire[10] assentasse numa inovação científica. A unidade de composição já preocupou, sob outros termos, os maiores espíritos dos dois séculos precedentes. Ao reler as obras, tão extraordinárias, dos escritores místicos que trataram das ciências nas suas relações com o infinito, tais como Swedenborg, Saint-Martin etc.,[11] e os escritos dos mais belos gênios em história natural, tais como Leibniz, Buffon, Charles Bonnet etc., encontram-se nas mônadas de Leibniz, nas moléculas orgânicas de Buffon, na força vegetativa de Needham, no emboîtement das partes similares de Charles Bonnet, bastante ousado para escrever em 1760: “O animal vegeta como a planta”; encontram-se, repito, os rudimentos da bela lei do soi pour soi, sobre a qual repousa a unidade de composição.[12] Não há senão um animal. O Criador serviu-se de um só e único padrão para todos os seres organizados. O animal é um princípio que toma sua forma exterior, ou, para falar com mais rigor, as diferenças de sua forma nos meios onde se desenvolvem. As espécies zoológicas resultam dessas diferenças. 

A proclamação e defesa desse sistema, em harmonia, aliás, com as ideias que fazemos do poder divino, serão a glória eterna de Geoffroy Saint-Hilaire, o vencedor de Cuvier nesse ponto de alta ciência, e cujo triunfo foi saudado pelo último artigo que escreveu o grande Goethe.

Compenetrado desse sistema, muito antes dos debates aos quais deu ensejo, compreendi que, sob esse ponto de vista, a sociedade se assemelhava à natureza. Não transforma a sociedade o homem, segundo os meios em que se desenvolve sua ação, em outros tantos indivíduos diferentes, à semelhança das variedades em zoologia? As diferenças entre um soldado, um operário, um administrador, um advogado, um desocupado, um sábio, um homem de Estado, um comerciante, um marujo, um poeta, um mendigo, um padre são, conquanto mais difíceis de apreender, tão consideráveis como as que há entre o lobo, o leão, o asno, o corvo, o tubarão, o lobo-marinho, a ovelha etc. Existiram pois, e existirão sempre, espécies sociais como há espécies zoológicas. Se Buffon fez um trabalho magnífico tentando apresentar num livro o conjunto da zoologia,[13] não seria desejável fazer-se uma obra desse gênero com relação à sociedade? Mas a natureza estabeleceu para as variedades animais limites dentro dos quais a sociedade não podia permanecer. Quando Buffon descrevia o leão, em poucas palavras nos apresentava a leoa, ao passo que na sociedade a mulher nem sempre se limita a ser a fêmea do macho. Pode haver, num casal, dois seres perfeitamente dessemelhantes. A mulher de um negociante é, muitas vezes, digna de ser a de um príncipe, e muitas vezes a de um príncipe não vale a de um artista. O estado social tem acasos que a natureza não se permite, porque ele é a natureza mais a sociedade. A descrição dessas espécies sociais era, pois, pelo menos o dobro da das espécies animais, não se considerando senão os dois sexos. Enfim, entre os animais há poucos dramas, entre eles não se gera a confusão, eles se atiram uns sobre os outros, e eis tudo. Os homens, é verdade, também se atiram uns sobre os outros, mas o grau de inteligência que os diferencia torna a luta muito mais complicada. Se alguns sábios ainda não admitem que a Animalidade se transvasa na Humanidade por uma imensa corrente de vida, pode entretanto o merceeiro tornar-se par de França e o nobre descer por vezes ao mais baixo nível social. Ademais, Buffon achou a vida entre os animais excessivamente simples. O animal tem pouca mobília, não tem arte nem ciência, ao passo que o homem, por uma lei que ainda não foi desvendada, tende a reproduzir seus costumes, seus pensamentos e sua vida em tudo que apropria às necessidades. Embora Leeuwenhoek, Swammerdam, Spallanzani, Réaumur, Charles Bonnet, Müller, Haller[14] e outros pacientes zoógrafos tenham demonstrado quanto os costumes dos animais eram interessantes, os hábitos de cada animal são, pelo menos a nossos olhos, constantemente semelhantes em todos os tempos, enquanto o modo de ser, o vestuário, as palavras, as residências de um príncipe, de um banqueiro, de um artista, de um burguês, de um padre ou de um indigente são inteiramente diversas e variam conforme as civilizações. 

Assim, pois, a obra a empreender devia ter uma tríplice forma: os homens, as mulheres e as coisas, isto é, as pessoas e a representação material que elas dão de seu pensamento, em resumo, o homem e a vida. 

Ao ler as secas e enfadonhas nomenclaturas dos fatos denominados históricos, quem não advertiu que os escritores se esqueceram, em todos os tempos, no Egito, na Pérsia, na Grécia, em Roma, de nos dar a história dos costumes? O trecho de Petrônio sobre a vida privada dos romanos mais irrita do que satisfaz a nossa curiosidade.[15] Depois de haver observado essa imensa lacuna no terreno da história, o padre Barthélemy consagrou sua vida a reconstituir os costumes gregos, em Anacársis.[16] 

Como, porém, tornar interessante o drama de três ou quatro mil personagens que a sociedade apresenta? Como agradar, ao mesmo tempo, ao poeta, ao filósofo e às massas que querem a poesia e a filosofia sob imagens empolgantes? Embora eu concebesse a importância e a poesia dessa história do coração humano, não via nenhum meio de execução; porque até nossa época os mais célebres narradores tinham despendido seu talento em criar uma ou duas personagens típicas, em pintar uma face da vida. Foi com esse pensamento que li as obras de Walter Scott. Walter Scott, esse trouveur[17] moderno, imprimia então proporções gigantescas a um gênero de composição injustamente considerado secundário. Não será verdadeiramente mais difícil fazer concorrência ao registro civil com Dáfnis e Cloé, Rolando, Amadis, Panurge, Dom Quixote, Manon Lescaut, Clarissa, Lovelace, Robinson Crusoé, Gil Blas, Ossian, Júlia d’Etanges, meu tio Toby, Werther, René, Corina, Adolfo, Paulo e Virgínia, Jeanie Dean, Claverhouse, Ivanhoé, Manfredo, Mignon,[18] do que pôr em ordem os fatos, pouco mais ou menos os mesmos em todas as nações, pesquisar o espírito das leis caídas em desuso, redigir teorias que desnorteiam os povos ou, como certos metafísicos, explicar “o que é”? Primeiro, quase todas essas personagens cuja existência se torna mais longa, mais autêntica do que a das gerações em meio às quais as fizeram nascer, não vivem, senão com a condição de serem uma grande imagem do presente. Concebidas nas entranhas de seu século, todo coração humano se agita sob o seu invólucro, e nelas se oculta, muitas vezes, toda uma filosofia. Walter Scott elevara, pois, ao valor filosófico da história o romance essa literatura que, de século a século, incrusta diamantes imortais na coroa poética dos países onde as letras são cultivadas. Colocava nele o espírito dos tempos antigos, juntando-lhe ao mesmo tempo o drama, o diálogo, o retrato, a paisagem, a descrição; introduzindo nessas obras o maravilhoso e o verdadeiro — esses elementos da epopeia —, fazendo ali ombrear a poesia com a familiaridade das mais humildes linguagens. Mas, tendo antes achado seu feitio ou no ardor do trabalho, ou pela lógica desse trabalho, do que propriamente imaginado um sistema, não pensou em ligar suas composições umas às outras com o fim de coordenar uma história completa, da qual cada capítulo formasse um romance e cada romance uma época. Ao perceber essa falha de ligação, que, aliás, não diminui a grandeza do escocês, vi ao mesmo tempo o sistema favorável à execução de minha obra e a possibilidade de executá-la. Conquanto deslumbrado, por assim dizer, com a surpreendente fecundidade de Walter Scott, sempre semelhante a si mesmo e sempre original, não me senti desanimado, pois encontrei a razão desse talento na infinita variedade da Natureza Humana. O acaso é o maior romancista do mundo; para ser fecundo, basta estudá-lo. A sociedade francesa ia ser o historiador, eu nada mais seria do que seu secretário. Ao fazer o inventário dos vícios e das virtudes, ao reunir os principais fatos das paixões, ao pintar os caracteres, ao escolher os acontecimentos mais relevantes da sociedade, ao compor os tipos pela reunião dos traços de múltiplos caracteres homogêneos, poderia, talvez, alcançar escrever a história esquecida por tantos historiadores, a dos costumes. Com muita paciência e coragem, eu realizaria para a França do século xix esse livro que todos lamentamos não nos terem deixado Roma, Atenas, Tiro, Mênfis, a Pérsia, a Índia sobre sua civilização e que, a exemplo do padre Barthélemy,[19] o corajoso e paciente Monteil tentara para a Idade Média, mas sob forma pouco atraente. 

Esse trabalho, ainda assim, nada era. Cingindo-se a essa reprodução rigorosa, um escritor podia tornar-se um pintor mais ou menos fiel, mais ou menos feliz, paciente ou corajoso dos tipos humanos, o narrador dos dramas da vida íntima, o arqueólogo do mobiliário social, o enumerador das profissões, o registrador do bem ou do mal; mas, para merecer os louvores que todo artista deve ambicionar, não deveria eu estudar as razões ou a razão desses efeitos sociais, surpreender o sentido oculto nessa imensa reunião de tipos, de paixões e de acontecimentos? Enfim, depois de ter procurado, não digo achado, essa razão, esse motor social, não seria preciso meditar sobre os princípios naturais e ver em que as sociedades se afastam ou se aproximam da regra eterna do verdadeiro, do belo? Apesar da extensão das premissas, que por si sós podiam formar uma obra, esta, para ser completa, exigia uma conclusão. Assim descrita, a sociedade devia carregar consigo a razão de seu movimento.



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Honoré de Balzac (Tours, 20 de maio de 1799 — Paris, 18 de agosto de 1850) foi um produtivo escritor francês, notável por suas agudas observações psicológicas. É considerado o fundador do Realismo na literatura moderna.[1][2] Sua magnum opus, A Comédia Humana, consiste de 95 romances, novelas e contos que procuram retratar todos os níveis da sociedade francesa da época, em particular a florescente burguesia após a queda de Napoleão Bonaparte em 1815.

Entre seus romances mais famosos destacam-se A Mulher de Trinta Anos (1831-32), Eugènie Grandet (1833), O Pai Goriot (1834), O Lírio do Vale (1835), As Ilusões Perdidas (1839), A Prima Bette (1846) e O Primo Pons (1847). Desde Le Dernier Chouan (1829), que depois se transformaria em Les Chouans (1829, na tradução brasileira A Bretanha), Balzac denunciou ou abordou os problemas do dinheiro, da usura, da hipocrisia familiar, da constituição dos verdadeiros poderes na França liberal burguesa e, ainda que o meio operário não apareça diretamente em suas obras, discorreu sobre fenômenos sociais a partir da pintura dos ambientes rurais, como em Os Camponeses, de 1844.[1] Além de romances, escreveu também "estudos filosóficos" (como A Procura do Absoluto, 1834) e estudos analíticos (como a Fisiologia do Casamento, que causou escândalo ao ser publicado em 1829).

Balzac tinha uma enorme capacidade de trabalho, usada sobretudo para cobrir as dívidas que acumulava.[1] De certo modo, suas despesas foram a razão pela qual, desde 1832 até sua morte, se dedicou incansavelmente à literatura. Sua extensa obra influenciou nomes como Proust, Zola, Dickens, Dostoyevsky, Flaubert, Henry James, Machado de Assis, Castelo Branco e Ítalo Calvino, e é constantemente adaptada para o cinema. Participante da vida mundana parisiense, teve vários relacionamentos, entre eles um célebre caso amoroso, desde 1832, com a polonesa Ewelina Hańska, com quem veio a se casar pouco antes de morrer.


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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)
(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil)

Balzac, Honoré de, 1799-1850. 
          A comédia humana: estudos de costumes: cenas da vida privada / Honoré de Balzac;                            orientação, introduções e notas de Paulo Rónai; tradução de Vidal de Oliveira; 3. ed. – São                  Paulo: Globo, 2012. 

          (A comédia humana; v. 1) Título original: La comédie humaine ISBN 978-85-250-5333-1                    0.000 kb; ePUB 

1. Romance francês i. Rónai, Paulo. ii. Título. iii. Série. 

12-13086                                                                               cdd-843 

Índices para catálogo sistemático: 
1. Romances: Literatura francesa 843

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[9]Exames: alusão às análises explicativas com que os grandes autores do século xvii costumavam preceder a edição de suas obras, principalmente peças. 

[10]Georges Cuvier (1769 -1832), fundador da anatomia comparada e da paleontologia, combateu as teorias de outro grande naturalista, Étienne Geoffroy Saint-Hilaire (1772 -1844). Os trabalhos deste ligam-se todos a uma mesma ideia, a da “unidade de composição orgânica”, que lhe permitiu descobrir um sistema dentário nas aves, analogias entre os esqueletos dos vertebrados mais diversos etc. A polêmica despertou considerável interesse e levou muitos sábios a se pronunciar, entre os quais o próprio Goethe, que tomou partido por Geoffroy SaintHilaire; no entanto, a discussão acabou, contrariamente ao que mais adiante afirma Balzac, pela vitória de Cuvier. Certas ideias do adversário vencido, sobretudo as que concerniam à variabilidade das espécies e à filiação das espécies atuais às já extintas, exerceriam mais tarde profunda influência sobre as teorias de Darwin. 

[11]Emmanuel Swedenborg (1688-1772), naturalista e mineralogista sueco de grande valor que, depois de publicar obras relativas às ciências naturais, enveredou pelos caminhos da teosofia e do misticismo. Seus livros de metafísica (Arcanos celestiais, Apocalipse explicado etc.), em que descreve estranhas visões místicas e dá representações do céu e do inferno, alcançaram enorme êxito em toda a Europa, lidos e comentados apaixonadamente por muitos leitores (entre os quais a própria mãe de Balzac), além dos membros da seita que Swedenborg chegara a fundar. — Saint-Martin (1743-1803), autor, entre outras obras curiosas, do poema O Crocodilo ou a Guerra do Bem e do Mal, foi um dos adeptos mais fervorosos de Swedenborg. Percorreu vários países para propagar-lhe a doutrina, fazendo campanhas contra o sensualismo e o materialismo; considerado apóstolo por uns, impostor por outros. 

[12] Os problemas a que Balzac alude aqui foram os que mais agitaram a opinião científica da época. Assim, a teoria das mônadas de Leibniz (1646-1716), exposta na Monadologia, refere-se à ação de átomos imateriais, forças simples e irredutíveis que contêm em si mesmas o princípio e a fonte de toda a sua atividade; a das moléculas orgânicas de Buffon (1707-1788) supõe a existência de uma matéria viva sempre ativa que serviria à nutrição, ao desenvolvimento e à reprodução das plantas e dos animais. Papel semelhante cabe à força vegetativa no sistema do jesuíta polígrafo John Turberville Needham (1713 -1781), que em suas pesquisas, feitas com a ajuda do microscópio, encontrou argumentos a favor da “geração espontânea” e afirmou que podem formar-se espontaneamente “animálculos” no suco de limão. Charles Bonnet (1720 -1793), autor de um famoso Tratado de Insetologia, abandonou aos poucos as pesquisas concretas, como Swedenborg, para entregar-se a considerações de filosofia especulativa (Ensaio analítico acerca das faculdades da alma, contemplação da natureza etc.), que culminaram na teoria do emboîtement, isto é, o encaixe de todos os seres vivos que formariam uma cadeia única. 

[13]Num livro o conjunto da zoologia...: este livro é a História natural, em 36 volumes, cujas proporções imponentes podem ter contribuído ao nascimento, no espírito de Balzac, da ideia de uma obra única que reunisse rodos os seus romances. 

[14]Anton van Leeuwenhoek (1632-1723): conhecido por suas investigações microscópicas. — Jan Swammerdam (1637-1680), autor da Bíblia da natureza, estudioso da anatomia dos insetos. — Lazzaro Spallanzani (1729-1799), publicou Experiências para servir à história da geração dos animais e das plantas. — René-Antoine Ferchault de Réaumur (1683-1757), físico e naturalista, o “Plínio do século xviii”, inventor do termômetro e do vidro branco opaco, autor de pesquisas sobre a digestão. — Charles Bonnet, já citado acima. — Hans Peter Müller (1801-1858), médico e fisiologista, autor de um Manual da fisiologia do homem. — Albrecht von Haller (1708-1777), fisiologista e poeta alemão, autor não só de Elementos da fisiologia do corpo humano mas também de um conhecido poema didático sobre Os alpes. 

[15]Petrônio: escritor romano do século i da nossa era, autor de Satíricon, espécie de “romance de costumes”, de que só ficaram alguns fragmentos. 

[16]O abade Jean-Jacques Barthélemy (1716-1795) escreveu as Viagens do jovem Anacársis na Grécia, livro popularíssimo na época e em que, sob forma de romance, está condensado o que no tempo se sabia a respeito da vida pública e particular dos gregos no século iv a.C. O Anacársis do romance seria o descendente de um filósofo cita que visitou Atenas no século vi a.C., foi amigo de Sólon e se tornou famoso por seus julgamentos independentes. 

[17]Trouveur: pessoa que acha, que inventa. À guisa de explicação, no original este termo vem seguido, entre parênteses, do equivalente trouvère, nome dado a certo grupo de poetas da Idade Média. 

[18] Todos esses nomes indicam personagens famosas de romances e obras de ficção. Dáfnis e Cloé são os protagonistas de um romance pastoral grego, do século iv d.C., de Longus; Rolando, o herói da Canção de Rolando, epopeia francesa do século xii, como também do Orlando Furioso, poema heroico-cômico do italiano Ariosto (1474-1533); Amadis de Gaula, o do primeiro romance cavalheiresco espanhol, do começo do século xvi. Panurge é um dos principais personagens do Gargântua, de Rabelais, do mesmo século. Dom Quixote, o cavaleiro da triste figura, de Cervantes, e Manon Lescaut, a bela cortesã cuja história foi contada pelo Abade Prévost, não precisam de apresentação. Já as criaturas do inglês Richardson (1689-1761), Clarissa Harlowe e seu sedutor Lovelace, andam mais esquecidas hoje. Robinson Crusoé, de Defoe, e o simpático aventureiro Gil Blas, de Lesage, são figuras vivas para os leitores de nossos tempos também. Ossian, embora não seja protagonista de romance, é igualmente personagem fictícia: foi a um antigo poeta celta desse nome que o escocês Macpherson (século xviii) atribuiu, por uma das burlas mais famosas da história literária, suas próprias poesias. Júlia d’Étanges é a heroína da Nouvelle Héloise, de Rousseau; meu tio Toby, um tipo curioso do escritor irlandês Sterne (1713-1768), um dos autores preferidos de Balzac, em Tristram Shandy; Jeanie Dean, personagem central da Prisão de Edimburgo, de Walter Scott. Werther, de Goethe, Corina, de mme. de Staël, Adolfo, de Benjamin Constant, Paulo e Virgínia, de Bernardin de Saint-Pierre, são ainda hoje universalmente conhecidos. Claverhouse é personagem de Os puritanos da Escócia, de Walter Scott; Ivanhoé é outro herói do mesmo autor; Manfredo, protagonista de um drama de Byron; Mignon, uma das criações mais atraentes de Goethe em Wilhelm Meister. 

[19] A respeito do abade Barthélemy, ver a nota 8. — Amans-Alexis Monteil (1769-1850) publicou uma História dos franceses das diversas condições, em que, por oposição à “história heroica”, procurou historiar os costumes dentro das diversas classes da sociedade.


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