O PRÍNCIPE
Maquiavel
AO MAGNÍFICO LORENZO DE MEDICI NICOLÓ MACHIAVELLI
Costumam, o mais das vezes, aqueles que desejam conquistar as graças de um Príncipe, trazer-lhe aquelas coisas que consideram mais caras ou nas quais o vejam encontrar deleite, donde se vê amiúde serem a ele oferecidos cavalos, armas, tecidos de ouro, pedras preciosas e outros ornamentos semelhantes, dignos de sua grandeza. Desejando eu, portanto, oferecer-me a Vossa Magnificência com um testemunho qualquer de minha submissão, não encontrei entre os meus cabedais coisa a mim mais cara ou que tanto estime, quanto o conhecimento das ações dos grandes homens apreendido através de uma longa experiência das coisas modernas e uma contínua lição das antigas as quais tendo, com grande diligência, longamente perscrutado e examinado e, agora, reduzido a um pequeno volume, envio a Vossa Magnificência.
Não cogitarei aqui das repúblicas porque delas tratei longamente em outra oportunidade. Voltarei minha atenção somente para os principados, irei delineando os princípios descritos e discutirei como devem ser eles governados e mantidos. Digo, pois, que para a preservação dos Estados hereditários e afeiçoados à linhagem de seu príncipe, as dificuldades são assaz menores que nos novos, pois é bastante não preterir os costumes dos antepassados e, depois, contemporizar com os acontecimentos fortuitos, de forma que, se tal príncipe for dotado de ordinária capacidade sempre se manterá no poder, a menos que uma extraordinária e excessiva força dele venha a privá-lo; e, uma vez dele destituído, ainda que temível seja o usurpador, volta a conquistá-lo.
Nós temos na Itália, como exemplo, o Duque de Ferrara que não cedeu aos assaltos dos venezianos em 1484 nem aos do Papa Júlio em 1510, apenas por ser antigo naquele domínio. Na verdade, o príncipe natural tem menores razões e menos necessidade de ofender: donde se conclui dever ser mais amado e, se não se faz odiar por desbragados vícios, é lógico e natural seja benquisto de todos. E na antiguidade e continuação do exercício do poder, apagam-se as lembranças e as causas das inovações, porque uma mudança sempre deixa lançada a base para a ereção de outra.
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Biografia de Nicolau Maquiavel
Nicolau Maquiavel
Filósofo político e escritor italiano
Por Dilva Frazão
Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um filósofo político, historiador, diplomata e escritor italiano, autor da obra-prima "O Príncipe". Foi profundo conhecedor da política da época, estudou-a em suas diferentes obras. Viveu durante o governo de Lourenço de Médici. Realista e patriota definiu os meios para erguer a Itália.
Nicolau Maquiavel nasceu em Florença, Itália, no dia 3 de maio de 1469. Sua família de origem Toscana participou dos cargos públicos por mais de três séculos. Filho de Bernardo Maquiavel, jurista e tesoureiro da província de Marca de Ancona e de Bartolomea Nelli, que era ligada às mais ilustres família de Florença.
Interessado pelos problemas de seu tempo, Maquiavel participou ativamente da política de Florença. Com 29 anos, tornou-se secretário da Segunda Chancelaria durante o governo de Piero Soderim. Tinha a seu cargo questões militares de ordem interna como a redação de documentos oficiais. Ocasionalmente, realizou missões diplomáticas envolvendo a França, Alemanha, os Estados papais e diversas cidades italianas, como Milão, Pisa e Veneza.
Exílio
Em 1512, quando os Médici derrubaram a República e retomaram o governo de Florença, perdido em 1494, Maquiavel foi destituído de seu cargo e recolhe-se ao exílio voluntário na propriedade de San Casciano, perto de Florença, onde iniciou sua atividade de escritor político, historiador e literato. Em 1513 começa a trabalhar nos “Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio”, em que faz uma análise da República Romana, e procura nas experiências do passado uma solução para os problemas da Itália.
O Príncipe
A obra “O Príncipe”, escrita por Maquiavel em 1513, e publicada postumamente em 1532, se transformou em sua obra-prima. O livro, um manual sobre a arte de governar, foi inspirado no estilo político de César Bórgia um dos mais ambiciosos comandantes italianos, que ficou conhecido por seu poder e atrocidades que cometeu para conseguir o que queria. Maquiavel viu nele o modelo para os demais governantes da época.
A obra revela a preocupação de Maquiavel com o momento histórico da Itália, fragilizada pela falta de unidade nacional e alvo de invasões e intrigas diplomáticas. Indignado com a decadência política e moral da Itália, o autor dirige conselhos a um príncipe imaginário, com o único objetivo de unificar a Itália e criar uma nação moderna e poderosa.
A Volta à Florença
Em 1919, anistiado, volta à Florença, sob as graças dos Médici. Em 1920, conseguiu do Cardeal Gíulio de Médici a função remunerada de escrever a “História de Florença”, um tratado em estilo clássico, que ficou consagrado como a primeira obra da historiografia moderna.
Em 1526, é encarregado pelo papa Clemente VII de inspecionar as fortificações de Florença e organizar um exército permanente para sua cidade, sob o comando de Giovanni Delle Bande. Em 1527, o saque de Roma pelo imperador Carlos V, do Sacro Império Romano-Germânico, restabeleceu a república em Florença. Maquiavel, visto como favorito dos Médici foi excluído de toda atividade política.
Maquiavel, o importante analista político se transformou em dramaturgo para criticar a sociedade e os costumes de seu tempo em duas comédias: “A Mandrágora” (1518) e “Clizia” (1525), e também na novela “Belgaphor”, uma sátira sobre o casamento.
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Resenha crítica de “O Príncipe” – Nicolau Maquiavel
Wesley Sousa é graduando em Filosofia pela UFSJ.
Conforme Gramsci escreve no seu trabalho “Notas sobre Maquiavel”, “O príncipe moderno, o mito-príncipe, não pode ser uma pessoa real, um indivíduo concreto; só pode ser um organismo, um elemento de sociedade completo em que começa a concretar-se uma vontade coletiva conhecida e afirmada parcialmente na ação”. Vemos que o partido político moderno é o resumo das vontades coletivas modernas.
Maquiavel é intensamente interpretado tão mal como Platão interpretava a arte. Maquiavel era um realista político; um sujeito consciente da vida política dos homens. A meu ver, o Gramsci foi o melhor na sua integridade interpretativa: transpõe a categoria maquiaveliana do “moderno príncipe” para o intelectual orgânico, e depois, para o partido que executa a guerra de posições na disputa pela hegemonia. O Gramsci foi o maior e melhor intérprete de Maquiavel (e era marxista, não “maquiavélico”)...
O livro, em si, muitas vezes é comumente interpretado de forma equivocada. Por exemplo, aos ricos parecia um “manual” para que eles tirassem a liberdade dos mais pobres, ou ainda que eles se perpetuassem – de quaisquer maneiras – no poder (ou alcançá-lo). Foi-se criando um “mito” de maquiavelismo acerca do pensamento de Maquiavel. A originalidade, em seu tempo histórico, deu um certo tom exagerado à abordagem maquiaveliana.
Em sua breve apresentação à Lorenzo (provavelmente um nobre italiano), ele dirige a ele com esmero e louvor, uma profunda respeitabilidade. Aos Piagnoni, tal livro seria aos bons, desonesto; aos maus, pior que os próprios. Bem ao contrário do que se pensa Maquiavel não era um “totalitário”, mas defendia uma centralização para a unificação da Itália (o principado).
Para o apoio, não se deveria ser odiado; proteger seu reinado lhe daria confiabilidade para sua proteção. À conquista de outro Estado, cuidar de não ficar demasiadamente confiante com o novo reino, mas instigar os menos poderosos a ir contra os mais poderosos daquele Estado. Na disputa pela hegemonia.
Enfatiza que reconhecer antecipadamente os males do Estado lhe permite ousar-lhe a “cura” eficaz. Um detalhe importante nas análises preliminares, é que o livro pode dar margem para diversas transposições temporais. Tanto progressistas quanto conservadoras, podendo fazer dele realmente um manual de instruções (com certas deturpações) para a práxis social.
O conhecimento histórico, crítico – bem como a cautela – ajuda na compreensão do mesmo, e faz-se necessário um olhar mais sereno à pequena obra para uma análise mais sólida.
Um governo bem estabilizado é, sem dúvidas, dificultoso destituí-lo, isto é, suprimi-lo; primeiro que seu povo estará na sua retaguarda; segundo que se há um governo fragilizado, as chances de fracasso é imanente; terceiro que sempre o conspirador terá chances da mesquinharia, calúnias contra o governo vigente, portanto, a desunião de suas bases é culminante para sua derrocada final. Não é surpresa que pensamos o que houve com o governo petista: não soube lidar com adversidades, pois que os próprios acolheram-nas de “bom grado”.
Todavia, “conservar” um bom principado, segundo ele, afirma que manter leis vigentes é um das formas. Porém, habitá-la por completo ou transformá-la é caminho mais correto a seguir, porque o povo se lembra de seus velhos modos de vida e faz a usura de costumes antigos.
Gramsci comenta “a luta política se converte assim em uma série de eixos de personagens entre aqueles que não sabem tudo, e tem concordado ao diabo, e que são objetos de burla, [...] nesse campo, a luta pode e deve ser conduzida desenvolvendo o conceito de hegemonia, assim como foi conduzida praticamente no desenvolvimento da teoria do partido político [...]”.
Maquiavel considera que “o objetivo do povo é mais honesto que o dos poderosos; estes querem oprimir e aquele [– os nãos poderosos –] não ser oprimido. Contra a hostilidade do povo, o príncipe não se pode assegurar nunca, porque são muitos; com relação aos grandes, é possível porque são poucos. O pior que um príncipe pode esperar do povo hostil é ser abandonado por ele.”.
O próprio Gramsci diz que “os elementos da observação empírica, que, em geral, são expostos desordenadamente nos tratados de ciência política, deveriam, se não são questões abstratas ou sustentadas no ar, ter seu lugar no vários graus de relação de força”.
Maquiavel faz considerações sobre a “crueldade” e o fato de César Bórgia ter tal fama e mesmo assim reerguer a Romanha “para levar à paz e fé’’. O “temor”, segundo Maquiavel é esteio pelo qual se resguarda a República, “os homens geralmente são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ambiciosos de dinheiro, e, enquanto lhes fizerem bem, todos estão contigo, oferecem-te sangue, bens, etc.”. Evita o ódio do povo consiste num governo estável. A lealdade também é ponto importante que o autor destaca.
Esses são problemas na estrutura e superestrutura que deve ser entendidos exatamente no ponto para resolver para chegar a uma boa análise perante as operações históricas de um período determinado. Nesse sentido, compreender os fenômenos que nos aparecem e alcançar sua essência.
Dentro da disputa política os seres têm a ânsia pelo alcance do poder, da mudança, para qualquer fim. A luta política é complexa. Não se pode deixar levar pela consciência do poderoso e emboscadas fáceis. Na luta de interesses comuns de sua classe, o serviço de cooptação, organizar saídas emergenciais, torna-se importante.
Finalmente, importante parafrasear Rousseau, cujo afirmou que Maquiavel ao fingir dar lições aos Príncipes, deu grandes ensinamentos ao povo.
Aqui vale lembrar-se das palavras do camarada Felipe Lustosa, ao afirmar: “Maquiavel nos deixou uma lição que povos historicamente insurgentes fazem revoluções de tempos em tempos a fim de recuperar a liberdade perdida em algum momento de sua constituição; já povos historicamente cativos e escravizados, que não romperam suas correntes com as próprias mãos, ou que em nenhum momento de sua história vislumbrou sua liberdade, povos que obtiveram sua cidadania como ‘dádiva piedosa’ de seus exploradores, concedida por cima e sem ponto de contato; se condicionam à dominação de classe de tal forma, que dificilmente se amotinam e insurgem contra seus exploradores; dificilmente estes chegam ao ponto de sacudir o pescoço com violência, lançando para o alto o jugo que o massacra e acomete.”.
Referências bibliográficas
MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Tradução, prefácio e notas Lívio Xavier. Editora Nova Fronteira; Rio de Janeiro, 2014 [Edição especial].
SADER, Emir. Gramsci – poder, política e partido. Tradução Eliana Aguiar. Editora Expressão Popular; São Paulo – 2° edição, 2012.
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Leia também:
Maquiavel - O Príncipe: Capítulos II Dos Principados Mistos
Maquiavel
O PRÍNCIPE
E se bem julgue esta obra indigna da presença de Vossa Magnificência, não menos confio que deva ela ser aceita, considerado que de minha parte não lhe possa ser feito maior oferecimento senão o dar-lhe a faculdade de poder, em tempo assaz breve, compreender tudo aquilo que eu, em tantos anos e com tantos incômodos e perigos, vim a conhecer. Não ornei este trabalho, nem o enchi de períodos sonoros ou de palavras pomposas e magníficas, ou de qualquer outra figura de retórica ou ornamento extrínseco, com os quais muitos costumam desenvolver e enfeitar suas obras; e isto porque não quero que outra coisa o valorize, a não ser a variedade da matéria e a gravidade do assunto a tornarem-no agradável. Nem desejo se considere presunção se um homem de baixa e ínfima condição ousa discorrer e estabelecer regras a respeito do governo dos príncipes: assim como aqueles que desenham a paisagem se colocam nas baixadas para considerar a natureza dos montes e das altitudes e, para observar aquelas, se situam em posição elevada sobre os montes, também, para bem conhecer o caráter do povo, é preciso ser príncipe e, para bem entender o do príncipe, é preciso ser do povo. Receba, pois, Vossa Magnificência este pequeno presente com aquele intuito com que o mando; nele, se diligentemente considerado e lido, encontrará o meu extremo desejo de que lhe advenha aquela grandeza que a fortuna e as outras suas qualidades lhe prometem. E se Vossa Magnificência, das culminâncias em que se encontra, alguma vez volver os olhos para baixo, notará quão imerecidamente suporto um grande e contínuo infortúnio.
CAPÍTULO I
DE QUANTAS ESPÉCIES SÃO OS PRINCIPADOS E DE QUE MODOS SE ADQUIREM
(QUOT SINT GENERA PRINCIPATUUM ET QUIBUS MODIS ACQUIRANTUR)
Todos os Estados, todos os governos que tiveram e têm autoridade sobre os homens, foram e são ou repúblicas ou principados. Os principados são: ou hereditários, quando seu sangue senhorial é nobre há já longo tempo, ou novos. Os novos podem ser totalmente novos, como foi Milão com Francisco Sforza, ou o são como membros acrescidos ao Estado hereditário do príncipe que os adquire, como é o reino de Nápoles em relação ao rei da Espanha. Estes domínios assim obtidos estão acostumados, ou a viver submetidos a um príncipe, ou a ser livres, sendo adquiridos com tropas de outrem ou com as próprias, bem como pela fortuna ou por virtude.
DOS PRINCIPADOS
(De Principatibus)
CAPÍTULO II
DOS PRINCIPADOS HEREDITÁRIOS
(DE PRINCIPATIBUS HEREDITARIIS)
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Biografia de Nicolau Maquiavel
Nicolau Maquiavel
Filósofo político e escritor italiano
Por Dilva Frazão
Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um filósofo político, historiador, diplomata e escritor italiano, autor da obra-prima "O Príncipe". Foi profundo conhecedor da política da época, estudou-a em suas diferentes obras. Viveu durante o governo de Lourenço de Médici. Realista e patriota definiu os meios para erguer a Itália.
Nicolau Maquiavel nasceu em Florença, Itália, no dia 3 de maio de 1469. Sua família de origem Toscana participou dos cargos públicos por mais de três séculos. Filho de Bernardo Maquiavel, jurista e tesoureiro da província de Marca de Ancona e de Bartolomea Nelli, que era ligada às mais ilustres família de Florença.
Interessado pelos problemas de seu tempo, Maquiavel participou ativamente da política de Florença. Com 29 anos, tornou-se secretário da Segunda Chancelaria durante o governo de Piero Soderim. Tinha a seu cargo questões militares de ordem interna como a redação de documentos oficiais. Ocasionalmente, realizou missões diplomáticas envolvendo a França, Alemanha, os Estados papais e diversas cidades italianas, como Milão, Pisa e Veneza.
Entre 1502 e 1503, Maquiavel exerceu o cargo de embaixador junto a César Bórgia, estadista inescrupuloso e capitão das forças papais. Dominava o governo papal e usava todos os meios para conquistar novas terras e estender o domínio da família Bórgia na Itália. Os cinco meses como embaixador junto a César Bórgia o encheu de admiração.
Em 1512, quando os Médici derrubaram a República e retomaram o governo de Florença, perdido em 1494, Maquiavel foi destituído de seu cargo e recolhe-se ao exílio voluntário na propriedade de San Casciano, perto de Florença, onde iniciou sua atividade de escritor político, historiador e literato. Em 1513 começa a trabalhar nos “Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio”, em que faz uma análise da República Romana, e procura nas experiências do passado uma solução para os problemas da Itália.
Durante o exílio escreveu também “O Príncipe” (1513), “O Diário em Torno de Nossa Língua” (1916) procurando demonstrar a superioridade do dialeto florentino sobre os demais dialetos da Itália e “A Arte da Guerra”, publicada em 1521, em forma de diálogo, onde expõe as vantagens das milícias nacionais sobre as tropas mercenárias e realiza um exaustivo estudo de estratégia e tática militar.
A obra “O Príncipe”, escrita por Maquiavel em 1513, e publicada postumamente em 1532, se transformou em sua obra-prima. O livro, um manual sobre a arte de governar, foi inspirado no estilo político de César Bórgia um dos mais ambiciosos comandantes italianos, que ficou conhecido por seu poder e atrocidades que cometeu para conseguir o que queria. Maquiavel viu nele o modelo para os demais governantes da época.
A obra revela a preocupação de Maquiavel com o momento histórico da Itália, fragilizada pela falta de unidade nacional e alvo de invasões e intrigas diplomáticas. Indignado com a decadência política e moral da Itália, o autor dirige conselhos a um príncipe imaginário, com o único objetivo de unificar a Itália e criar uma nação moderna e poderosa.
Para Maquiavel, o importante era realizar o desejo projetado, mesmo sob qualquer forma de governo – monarquia ou república, e por qualquer meio, inclusive a violência. Considerava os fatores morais, religiosos e econômicos, que operavam na sociedade como forças que um governante hábil poderia e deveria utilizar para construir um estado nacional forte. Assim, o príncipe com seu exército nacional que substituísse as precárias forças mercenárias, deveria ser capaz de estender seu domínio sobre todas as cidades italianas, acabando com a discórdia.
Em 1919, anistiado, volta à Florença, sob as graças dos Médici. Em 1920, conseguiu do Cardeal Gíulio de Médici a função remunerada de escrever a “História de Florença”, um tratado em estilo clássico, que ficou consagrado como a primeira obra da historiografia moderna.
Em 1526, é encarregado pelo papa Clemente VII de inspecionar as fortificações de Florença e organizar um exército permanente para sua cidade, sob o comando de Giovanni Delle Bande. Em 1527, o saque de Roma pelo imperador Carlos V, do Sacro Império Romano-Germânico, restabeleceu a república em Florença. Maquiavel, visto como favorito dos Médici foi excluído de toda atividade política.
Nicolau Maquiavel faleceu em Florença, Itália, no dia 22 de julho de 1527. Seu corpo foi sepultado na Igreja da Santa Cruz, em Florença. Morreu sem ver seu sonho realizado, pois a unificação da Itália só se completaria no século XIX.
Curiosidades:
Na linguagem figurada, a expressão “maquiavelismo” significa astúcia e perfídia, e maquiavélico é o indivíduo que não se importa com os meios que escolhe para atingir seus propósitos.
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Resenha crítica de “O Príncipe” – Nicolau Maquiavel
Wesley Sousa é graduando em Filosofia pela UFSJ.
Wesley Sousa é graduando em Filosofia pela UFSJ.
Conforme Gramsci escreve no seu trabalho “Notas sobre Maquiavel”, “O príncipe moderno, o mito-príncipe, não pode ser uma pessoa real, um indivíduo concreto; só pode ser um organismo, um elemento de sociedade completo em que começa a concretar-se uma vontade coletiva conhecida e afirmada parcialmente na ação”. Vemos que o partido político moderno é o resumo das vontades coletivas modernas.
Maquiavel é intensamente interpretado tão mal como Platão interpretava a arte. Maquiavel era um realista político; um sujeito consciente da vida política dos homens. A meu ver, o Gramsci foi o melhor na sua integridade interpretativa: transpõe a categoria maquiaveliana do “moderno príncipe” para o intelectual orgânico, e depois, para o partido que executa a guerra de posições na disputa pela hegemonia. O Gramsci foi o maior e melhor intérprete de Maquiavel (e era marxista, não “maquiavélico”)...
O livro, em si, muitas vezes é comumente interpretado de forma equivocada. Por exemplo, aos ricos parecia um “manual” para que eles tirassem a liberdade dos mais pobres, ou ainda que eles se perpetuassem – de quaisquer maneiras – no poder (ou alcançá-lo). Foi-se criando um “mito” de maquiavelismo acerca do pensamento de Maquiavel. A originalidade, em seu tempo histórico, deu um certo tom exagerado à abordagem maquiaveliana.
Em sua breve apresentação à Lorenzo (provavelmente um nobre italiano), ele dirige a ele com esmero e louvor, uma profunda respeitabilidade. Aos Piagnoni, tal livro seria aos bons, desonesto; aos maus, pior que os próprios. Bem ao contrário do que se pensa Maquiavel não era um “totalitário”, mas defendia uma centralização para a unificação da Itália (o principado).
Para o apoio, não se deveria ser odiado; proteger seu reinado lhe daria confiabilidade para sua proteção. À conquista de outro Estado, cuidar de não ficar demasiadamente confiante com o novo reino, mas instigar os menos poderosos a ir contra os mais poderosos daquele Estado. Na disputa pela hegemonia.
Enfatiza que reconhecer antecipadamente os males do Estado lhe permite ousar-lhe a “cura” eficaz. Um detalhe importante nas análises preliminares, é que o livro pode dar margem para diversas transposições temporais. Tanto progressistas quanto conservadoras, podendo fazer dele realmente um manual de instruções (com certas deturpações) para a práxis social.
O conhecimento histórico, crítico – bem como a cautela – ajuda na compreensão do mesmo, e faz-se necessário um olhar mais sereno à pequena obra para uma análise mais sólida.
Um governo bem estabilizado é, sem dúvidas, dificultoso destituí-lo, isto é, suprimi-lo; primeiro que seu povo estará na sua retaguarda; segundo que se há um governo fragilizado, as chances de fracasso é imanente; terceiro que sempre o conspirador terá chances da mesquinharia, calúnias contra o governo vigente, portanto, a desunião de suas bases é culminante para sua derrocada final. Não é surpresa que pensamos o que houve com o governo petista: não soube lidar com adversidades, pois que os próprios acolheram-nas de “bom grado”.
Todavia, “conservar” um bom principado, segundo ele, afirma que manter leis vigentes é um das formas. Porém, habitá-la por completo ou transformá-la é caminho mais correto a seguir, porque o povo se lembra de seus velhos modos de vida e faz a usura de costumes antigos.
Gramsci comenta “a luta política se converte assim em uma série de eixos de personagens entre aqueles que não sabem tudo, e tem concordado ao diabo, e que são objetos de burla, [...] nesse campo, a luta pode e deve ser conduzida desenvolvendo o conceito de hegemonia, assim como foi conduzida praticamente no desenvolvimento da teoria do partido político [...]”.
Maquiavel considera que “o objetivo do povo é mais honesto que o dos poderosos; estes querem oprimir e aquele [– os nãos poderosos –] não ser oprimido. Contra a hostilidade do povo, o príncipe não se pode assegurar nunca, porque são muitos; com relação aos grandes, é possível porque são poucos. O pior que um príncipe pode esperar do povo hostil é ser abandonado por ele.”.
O próprio Gramsci diz que “os elementos da observação empírica, que, em geral, são expostos desordenadamente nos tratados de ciência política, deveriam, se não são questões abstratas ou sustentadas no ar, ter seu lugar no vários graus de relação de força”.
Maquiavel faz considerações sobre a “crueldade” e o fato de César Bórgia ter tal fama e mesmo assim reerguer a Romanha “para levar à paz e fé’’. O “temor”, segundo Maquiavel é esteio pelo qual se resguarda a República, “os homens geralmente são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ambiciosos de dinheiro, e, enquanto lhes fizerem bem, todos estão contigo, oferecem-te sangue, bens, etc.”. Evita o ódio do povo consiste num governo estável. A lealdade também é ponto importante que o autor destaca.
Esses são problemas na estrutura e superestrutura que deve ser entendidos exatamente no ponto para resolver para chegar a uma boa análise perante as operações históricas de um período determinado. Nesse sentido, compreender os fenômenos que nos aparecem e alcançar sua essência.
Dentro da disputa política os seres têm a ânsia pelo alcance do poder, da mudança, para qualquer fim. A luta política é complexa. Não se pode deixar levar pela consciência do poderoso e emboscadas fáceis. Na luta de interesses comuns de sua classe, o serviço de cooptação, organizar saídas emergenciais, torna-se importante.
Finalmente, importante parafrasear Rousseau, cujo afirmou que Maquiavel ao fingir dar lições aos Príncipes, deu grandes ensinamentos ao povo.
Aqui vale lembrar-se das palavras do camarada Felipe Lustosa, ao afirmar: “Maquiavel nos deixou uma lição que povos historicamente insurgentes fazem revoluções de tempos em tempos a fim de recuperar a liberdade perdida em algum momento de sua constituição; já povos historicamente cativos e escravizados, que não romperam suas correntes com as próprias mãos, ou que em nenhum momento de sua história vislumbrou sua liberdade, povos que obtiveram sua cidadania como ‘dádiva piedosa’ de seus exploradores, concedida por cima e sem ponto de contato; se condicionam à dominação de classe de tal forma, que dificilmente se amotinam e insurgem contra seus exploradores; dificilmente estes chegam ao ponto de sacudir o pescoço com violência, lançando para o alto o jugo que o massacra e acomete.”.
Referências bibliográficas
MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Tradução, prefácio e notas Lívio Xavier. Editora Nova Fronteira; Rio de Janeiro, 2014 [Edição especial].
SADER, Emir. Gramsci – poder, política e partido. Tradução Eliana Aguiar. Editora Expressão Popular; São Paulo – 2° edição, 2012.
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Leia também:
Maquiavel - O Príncipe: Capítulos II Dos Principados Mistos
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