Ensaio 58B – 2ª edição 1ª reimpressão
baitasar
O siô da Hora fungô as venta e aguçô os apetrecho da escutação: cautela, zelo e boa vontade. Sorriu. Eles continuava na vereda certa. Fungô otra veiz, só pra tê certeza do certo, sabia do caminho, mais gostava de praticá aquela fungação do aroma antes das vista alcançá o lugá, esse perfume das menina é danado de bom, elas não perdem nada esperando nossa visita. o conde tem confiança na vontade das moças? sou muito bom em tudo que eu faço, ele num tinha perdido o tino de farejadô, o conde é um cachorro bem treinado. o gato mia, o boi muge. o leão ruge, o menino assovia. vosmecê não é mais um menino. eu sei, bode. o menino cresceu e comprou a escritura de conde. veio junto a obrigação da minha juntura com um bode. vantagem para o conde, eu sou um bode sem marcas. não existem bodes desmarcados. eu sou livre. bobagem, o bode geme com alegria ou tristeza, tanto faz sabê o motivo. não tenho as marcas das correntes nem as canelas pretas, o cabelo é ruim, mas a pelagem é clara, sou um bode livre! calma, bode. não enche! o bode não consegue conversar com mais leveza? menos grotesco? isso, uma conversa menos dramática. vou tentar, mas não prometo nada. muito bom, afinal, quero apresentar ao bode algumas moças diferentes. já sei, moças que não são para o meu bico. nem para o pau. nossa, sinhô Conde, o pesadume das palavra sentou em cima da leveza. só quero ter certeza que o bode entende a gravidade da situação. a gravidade ou a leveza? estamos chegando. maravilha. cuidado com as palavras, não me desrespeite. não se preocupe. dentro da casa e das putas da Maria Cobra não esqueça que o bode também é o conde. não sei se quero ser um conde, um bode se cuida melhor das frescuras. cala a boca, bode. ordem dada, ordem obedecida. melhor assim, eu o trouxe para foder com elas, não com a minha paciência. já sei vou ter nas mãos as moças mais tenras e animadas da Villa. isso bode, muito macias, frescas, inocentes e meninas. meninas? isso não interessa, chegamos. chegamos? quase. oba! comporte-se. está bem. cuidado.
O siô da Hora tava chegando com o conde arrendadô das moça e o seu bode. Faltava cruzá o pelôrinho; a direita se mexeu de novo, foi inté o cabo do rêio. Tudo tava no lugá qui precisava tá. Levô os dedo no bigode, sorriu, ia sê bão aliviá os dedo durante algum castigo. Fungô os chêro de sangue e vinho nos dedo e cruzô aquele cruzêro. Sem oiá pra trás. Sem falá com os pensamento. Dobrô na rua Sete Pecados, largada atravessada entre a rua da Praia e a rua Formosa. Sentiu qui tava em casa. Foi ali, naquelas redondeza, qui o véio da Hora começô o seu comércio de seco e moiado. Quase fez o seu siná de respeito e favorecimento, em nome do pai fiô e santo, amém. Segurô os instinto e num disse as palavra. Deu mais dois passô e voltô, Em Nome do Pai Filho e Santo. Amém. Tanto viu, escutô e fez qui num esperava as bruxa aparecê com alguma desgraça, corria na frente com os pedido de proteção. Voltô os passo pra frente. Continuô o caminho de chegada. Os pensamento mais desaforado brotava, oiô pru lado e recomendô, fique atento, essas moças sempre têm algo novo para ensinar. no meu caso, tudo será novo. o bode nunca... nunca. nunca? nunca! isso é um espanto. o conde sabe fudê com a paciência do bode. desculpe. está bem, chega. fiquei pasmo. chega, conde. o bode só fez sacanagem com as mãos. aham. fique atento e deixe tudo nas mãos das moças. se o conde confia, o bode se entrega. confio, cresci aqui.
O ofertório. Um portal na escuridão. Lugá desimpedido pra poucos andá enquanto o dia durumia. A espessidão da cegueira acobertava as visita. O siô da Hora gostava dali, ele gostava sim. O conde oiô pru otro lado, bode. fale conde. se ninguém lhe disse, eu lhe digo, não tenha medo do entusiasmo da vida com as meninas, as confusões, as mentiras, tudo isso se vive com atrevimento desavergonhado. o conde não tem medo das denúncias? nem das anônimas, meu caro bode. sério? nada é para sempre, mas nem tudo se acaba. tudo acaba, conde. bobagem, bode, sempre haverá no mundo: condes, bodes, cordeiros e negros. no resumo do conde tem um abismo de gente que ficou de fora. eu sei, um contingente sem graça. um bode tem o mesmo valor que um cordeiro? não, jamais. o conde pode explicar melhor essa sua presunção de bodes e cordeiros? escute com atenção. estou escutando. um cordeiro não precisa rezar, mesmo assim, ele reza por si e pelos outros; o bode precisa rezar, mesmo assim, ele não reza. o bode é egoísta? ele precisa ser ensinado a ser um cordeiro, depois que aprende ele gosta de rezar, e ele reza: Peço que o Sinhô me conceda a graça de viver sem remorsos, sem pecados e amém. só isso? tem vez que ele é atendido no pedido do remorso, mas nunca fica sem pecado, ele não consegue evitar, os dedo do siô da Hora tava no bigode, sorria, sabia qui tinha proteção
Chegamos!
A lamparina avermeiada anunciava o lugá. Esfregô as mão, queria entrá sem batê. Nunca deixô sê anunciado, gostava de entrá desavisado. Os óio brilhava com aquela intimidade sem pudô, esse é o portal de passagem para um mundo de sem-vergonhice, entre. primeiro o conde. o bode está no limiar de um mundo com encantos e atrevimentos. me surpreenda, conde. estais, pronto? até para o fim do mundo, mais o bode num tava, atrás da porta tava a nudez e o atrevimento das moça qui a valentia da mocidade provoca pra se mostrá. O siô da Hora entrô
Meninas, chegou o vosso maior benfeitor!
Meu Deus, meninas! O Conde Humaitá! O Conde Humaitá!
O anúncio colocô a casa e a Maria Cobra em agitação de tumulto. Ele gostava de gastá munto e dá mais do qui recebia. Ela fazia questão de anunciá a titulação da nobreza do muriquinho piquinino, assim dava mais respeito pru negócio da casa e animava as menina. Depois recomendava sorrindo, meninas, o conde precisa ser cuidado com muita atenção, o nosso visitante é da nobreza rica.
O siô da Hora fingia qui o divertimento do gracejo incomodava. Ele se parecia com a vira-lata Poesia, a cadela da casa. Esquecida num canto. Sem uso. Atirada no chão com as patinha erguida, esperando algum agrado de meiguice. Mostrava desavergonhada sua barriga de pelos e tetinhas. Cansava de esperá os afago qui num vinha ela saia do canto. Rondava com o Raposa os otro canto da casa. Dois passo atrás. Ela, veiz e otra, recebia um agrado aqui otro ali, tudo com munta leveza. Mesmo assim, fazia fiasco. Churumingava, se mijava toda. Moiava o chão inté encharcá a terra. Depois durumia. Num parecia envergonhada ou cansada. Deitava na terra moiada
As moças e a dona da casa sempre com seus exageros.
Depois do fingimento do siô da Hora, Maria Cobra fazia gesto de seriedade, parecia incomodada. Sacudia a cabeça como se fosse fazê algum discurso desimportante na tribuna dos representante. Mais guardava silêncio. O corpo magro gingava dum lado e otro, as palavra num caia da boca. Era quando o tempo das coisa acontecida e num acontecida se misturava. Deu uma volta em si mesma, depois caminhô na direção do siô da Hora. O hôme num deu um passo de volta. Ficô onde tava. Num mexeu os pé, fincado na terra ficô, o sinhô Conde parado assim está parecendo um homem de milho, chegô mais um bocadinho perto, pareceu qui montava pra colhê o milho maduro. Num subiu. Num era hora ainda, parô no instante devido, aveludô a voz qui deixô saí devagá e piquinina, tudo para deixar o sinhô Conde com o contentamento adocicado, quer se servir?
O siô da Hora sorriu, levô os dedo no bigode, deu um passo piquinino pra frente e deitô ao lado da Poesia, as costa no chão da terra, as patona erguida, a língua pra fora, os óio abrindo e fechando. A respiração pareceu tê parado, louco qui as mão das moça entreabrisse as calça, doido pra se mijá, Maria Cobra me acostuma muito mal com seus mimos, que não vou mais encontrar em qualquer lugar. eu não entendo o conde. o que o bode não entende? o conde está louco que as moças lhe coloquem as mãos, mas fica brincando de gato e rato. isso se chama fantasia, bode. fantasia. isso mesmo, imaginação mais assombração e vosmecê tem a ilusão do faz de conta. por que o conde não coloca a mão no bolso, paga o serviço da moça que mais lhe agrada, faz o que veio fazer e vai embora? quando quero serviço rápido, fico na Humaitá.
Maria Cobra tumbém sorriu, o siô da Hora tava todo na sua disposição. Ela piscô as vista e fez um riso animado de revelação, ela sabia usá as mão e a boca, o sinhô Conde Humaitá merece o gosto do doce na boca. O conde fechô as vista, mais o bode espiava os modo daquela muié maluca. A siá dona da casa, das moça e controladora dos lucro, ofereceu uma tábua de cortá carne com pedaço de rapadura do melado de cana, o sinhô Conde quer apreciar?
Adoro caldo de cana e os doces do melado, faço gosto de lambuzar o bigode.
Junto com a rapadura, ela mostrô as carne qui male-male o decote cobria. Era generosa com as assombração de cada um dos paroquiano. Sabia escutá e se oferecê, isso é apenas para começá a tiração do azedume da rua, vamos prepará o sinhô Conde para os quitutes da casa.
O siô da Hora pediu o vinho da casa, tragam o vinho! muito vinho, tudo sem desgrudá as vista do decote se derramando. Assustando o conde. Descabaçando o bode. O siô da Hora descabeçando num queria elogiá antes do bode tocá as mão, num queria parecê um conde afoito nem queria perdê das vista os bico piquinino rosado. Adorava aquilo tudo.
O Raposa, dono da cadela Poesia qui ele recoieu das rua do mesmo jeito qui recoieu uma ou otra minina, chegô com o vinho. Tocava sua gaita de boca pra Poesia qui pulava no arredó, depois fungava e lambia nos pé descalço do tocadô. Colocô o garrafão no chão. Nenhuma palavra. As coisa qui tinha pra dizê saia da gaita na boca. O siô da Hora colocô o vinho num caneco de lata, farejô com exagero e depois oiô o Raposa, está aprovado! o quê está aprovado? o gosto e o perfume do vinho. e o conde sabe escolher um bom vinho? claro que sei. sabe bem menos do que pensa que sabe. bobagem, se não cheira mal e o gosto não está azedo, está aprovado, entregô o vinho pru Raposa e ordenô uma rodada para todos na casa. Puxô com a mão esquerda a garrafa qui caregava no bolso da casaca, abra esse, também! e sirva a mais bela mulher da casa, Maria Cobra.
O vinho da degola deu sua pequena contribuição de requinte e assombração entre as puta daquela noite. A casa tava cheia, quando acabar o vinho vosmecê pode abrir outro, depois outro, e se precisar, não me peça permissão, abra outro. O Raposa servia os cliente da casa, tocava sua gaita de boca e avisava, cortesia do Conde Humaitá. Só num serviu vinho nos quarto. Tinha ordem de num entrá se num tivesse precisão. O estabelecimento da Maria Cobra tinha duas parte. Uma bem-vista pelos visitante, otra mais reservada pru causo do visitante querê fazê uso da consumação. A parte da frente Maria Cobra gostava de chamá loja das venda, na continuação vinha os quarto. O lugá de aproveitamento das mercadoria tinha uma pequena cela sem janela ao lado da otra, cada uma das cela tinha um catre com vela, botija d’água e uma caneca de lata. Ali, num era permitido forçá as menina fazê o qui num queria. A punição era a expulsão da casa e o destino sem proteção de procurá os serviço de rua furtivo, clandestino e perigoso. As menina tumbém corria o risco de sê retirada da lida. Era mais raro ainda, mais podia acontecê no caso de contrabando das regalia recebida.
Poesia seguia o Raposa aos pulo, sempre dois passo atrás, latindo e abanando o rabo piquinino. Num tinha cô a pelagem da vira-lata, parecia uma camaleoa se adaptando a própria sobrevivência, tanto podia sê uma coisa boa como um mal-está no instante depois, ou um mistério sem segredo, ou um motivo pra desistí, ou um negócio parado, ou um pensamento sem cabeça, um cacareco no porão. Uns achava qui ela escolhia, otros afirmava qui era os óio dos qui via. Tinha veiz qui ela latia, mais num parecia qui latia
Esse bicho tem mais devoção que os meus negros, tem mais faro para reconhecer quem cuida da sua comida que esses escravos mal-agradecidos. Ela nunca abandona seu dono nem tenta fugir. Sabe o seu lugar na casa que a abriga e não a deixa dormir ao relento. É grata pela caridade do prato de comida, a caridade de uma cama, a caridade do seu cocho com água. Adoraria ver os rabos dos meus negros balançando de um lado e outro.
E por falar em rabos balançando vamos fazê um brinde à Poesia!
O siô da Hora se adiantô em segurá seu caneco de lata, um brinde ao rabo da Poesia! chega dessa conversa dura, conde. é o vinho, bode. parece que ele endureceu as palavra e amoleceu a língua. essa é a virtude do vinho
Viva à Poesia!
Maria Cobra tava em pé sem o vestido qui ficô nos pé. O caneco de vinho numa das mão. Nua. Descascada. A pelagem escovada. Pronta pra escaramuça. Num tinha música nem assovio, só tinha ela balançando. Nua. Sem dó nem piedade. Abria e fechava ela mesma. Gostava de sê vista. O Raposa recomeçô tocá. A Poesia recomeçô pulá. Só os três tava vivo.
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Leia também:
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baitasar
O siô da Hora fungô as venta e aguçô os apetrecho da escutação: cautela, zelo e boa vontade. Sorriu. Eles continuava na vereda certa. Fungô otra veiz, só pra tê certeza do certo, sabia do caminho, mais gostava de praticá aquela fungação do aroma antes das vista alcançá o lugá, esse perfume das menina é danado de bom, elas não perdem nada esperando nossa visita. o conde tem confiança na vontade das moças? sou muito bom em tudo que eu faço, ele num tinha perdido o tino de farejadô, o conde é um cachorro bem treinado. o gato mia, o boi muge. o leão ruge, o menino assovia. vosmecê não é mais um menino. eu sei, bode. o menino cresceu e comprou a escritura de conde. veio junto a obrigação da minha juntura com um bode. vantagem para o conde, eu sou um bode sem marcas. não existem bodes desmarcados. eu sou livre. bobagem, o bode geme com alegria ou tristeza, tanto faz sabê o motivo. não tenho as marcas das correntes nem as canelas pretas, o cabelo é ruim, mas a pelagem é clara, sou um bode livre! calma, bode. não enche! o bode não consegue conversar com mais leveza? menos grotesco? isso, uma conversa menos dramática. vou tentar, mas não prometo nada. muito bom, afinal, quero apresentar ao bode algumas moças diferentes. já sei, moças que não são para o meu bico. nem para o pau. nossa, sinhô Conde, o pesadume das palavra sentou em cima da leveza. só quero ter certeza que o bode entende a gravidade da situação. a gravidade ou a leveza? estamos chegando. maravilha. cuidado com as palavras, não me desrespeite. não se preocupe. dentro da casa e das putas da Maria Cobra não esqueça que o bode também é o conde. não sei se quero ser um conde, um bode se cuida melhor das frescuras. cala a boca, bode. ordem dada, ordem obedecida. melhor assim, eu o trouxe para foder com elas, não com a minha paciência. já sei vou ter nas mãos as moças mais tenras e animadas da Villa. isso bode, muito macias, frescas, inocentes e meninas. meninas? isso não interessa, chegamos. chegamos? quase. oba! comporte-se. está bem. cuidado.
O siô da Hora tava chegando com o conde arrendadô das moça e o seu bode. Faltava cruzá o pelôrinho; a direita se mexeu de novo, foi inté o cabo do rêio. Tudo tava no lugá qui precisava tá. Levô os dedo no bigode, sorriu, ia sê bão aliviá os dedo durante algum castigo. Fungô os chêro de sangue e vinho nos dedo e cruzô aquele cruzêro. Sem oiá pra trás. Sem falá com os pensamento. Dobrô na rua Sete Pecados, largada atravessada entre a rua da Praia e a rua Formosa. Sentiu qui tava em casa. Foi ali, naquelas redondeza, qui o véio da Hora começô o seu comércio de seco e moiado. Quase fez o seu siná de respeito e favorecimento, em nome do pai fiô e santo, amém. Segurô os instinto e num disse as palavra. Deu mais dois passô e voltô, Em Nome do Pai Filho e Santo. Amém. Tanto viu, escutô e fez qui num esperava as bruxa aparecê com alguma desgraça, corria na frente com os pedido de proteção. Voltô os passo pra frente. Continuô o caminho de chegada. Os pensamento mais desaforado brotava, oiô pru lado e recomendô, fique atento, essas moças sempre têm algo novo para ensinar. no meu caso, tudo será novo. o bode nunca... nunca. nunca? nunca! isso é um espanto. o conde sabe fudê com a paciência do bode. desculpe. está bem, chega. fiquei pasmo. chega, conde. o bode só fez sacanagem com as mãos. aham. fique atento e deixe tudo nas mãos das moças. se o conde confia, o bode se entrega. confio, cresci aqui.
O ofertório. Um portal na escuridão. Lugá desimpedido pra poucos andá enquanto o dia durumia. A espessidão da cegueira acobertava as visita. O siô da Hora gostava dali, ele gostava sim. O conde oiô pru otro lado, bode. fale conde. se ninguém lhe disse, eu lhe digo, não tenha medo do entusiasmo da vida com as meninas, as confusões, as mentiras, tudo isso se vive com atrevimento desavergonhado. o conde não tem medo das denúncias? nem das anônimas, meu caro bode. sério? nada é para sempre, mas nem tudo se acaba. tudo acaba, conde. bobagem, bode, sempre haverá no mundo: condes, bodes, cordeiros e negros. no resumo do conde tem um abismo de gente que ficou de fora. eu sei, um contingente sem graça. um bode tem o mesmo valor que um cordeiro? não, jamais. o conde pode explicar melhor essa sua presunção de bodes e cordeiros? escute com atenção. estou escutando. um cordeiro não precisa rezar, mesmo assim, ele reza por si e pelos outros; o bode precisa rezar, mesmo assim, ele não reza. o bode é egoísta? ele precisa ser ensinado a ser um cordeiro, depois que aprende ele gosta de rezar, e ele reza: Peço que o Sinhô me conceda a graça de viver sem remorsos, sem pecados e amém. só isso? tem vez que ele é atendido no pedido do remorso, mas nunca fica sem pecado, ele não consegue evitar, os dedo do siô da Hora tava no bigode, sorria, sabia qui tinha proteção
Chegamos!
A lamparina avermeiada anunciava o lugá. Esfregô as mão, queria entrá sem batê. Nunca deixô sê anunciado, gostava de entrá desavisado. Os óio brilhava com aquela intimidade sem pudô, esse é o portal de passagem para um mundo de sem-vergonhice, entre. primeiro o conde. o bode está no limiar de um mundo com encantos e atrevimentos. me surpreenda, conde. estais, pronto? até para o fim do mundo, mais o bode num tava, atrás da porta tava a nudez e o atrevimento das moça qui a valentia da mocidade provoca pra se mostrá. O siô da Hora entrô
Meninas, chegou o vosso maior benfeitor!
Meu Deus, meninas! O Conde Humaitá! O Conde Humaitá!
O anúncio colocô a casa e a Maria Cobra em agitação de tumulto. Ele gostava de gastá munto e dá mais do qui recebia. Ela fazia questão de anunciá a titulação da nobreza do muriquinho piquinino, assim dava mais respeito pru negócio da casa e animava as menina. Depois recomendava sorrindo, meninas, o conde precisa ser cuidado com muita atenção, o nosso visitante é da nobreza rica.
O siô da Hora fingia qui o divertimento do gracejo incomodava. Ele se parecia com a vira-lata Poesia, a cadela da casa. Esquecida num canto. Sem uso. Atirada no chão com as patinha erguida, esperando algum agrado de meiguice. Mostrava desavergonhada sua barriga de pelos e tetinhas. Cansava de esperá os afago qui num vinha ela saia do canto. Rondava com o Raposa os otro canto da casa. Dois passo atrás. Ela, veiz e otra, recebia um agrado aqui otro ali, tudo com munta leveza. Mesmo assim, fazia fiasco. Churumingava, se mijava toda. Moiava o chão inté encharcá a terra. Depois durumia. Num parecia envergonhada ou cansada. Deitava na terra moiada
As moças e a dona da casa sempre com seus exageros.
Depois do fingimento do siô da Hora, Maria Cobra fazia gesto de seriedade, parecia incomodada. Sacudia a cabeça como se fosse fazê algum discurso desimportante na tribuna dos representante. Mais guardava silêncio. O corpo magro gingava dum lado e otro, as palavra num caia da boca. Era quando o tempo das coisa acontecida e num acontecida se misturava. Deu uma volta em si mesma, depois caminhô na direção do siô da Hora. O hôme num deu um passo de volta. Ficô onde tava. Num mexeu os pé, fincado na terra ficô, o sinhô Conde parado assim está parecendo um homem de milho, chegô mais um bocadinho perto, pareceu qui montava pra colhê o milho maduro. Num subiu. Num era hora ainda, parô no instante devido, aveludô a voz qui deixô saí devagá e piquinina, tudo para deixar o sinhô Conde com o contentamento adocicado, quer se servir?
O siô da Hora sorriu, levô os dedo no bigode, deu um passo piquinino pra frente e deitô ao lado da Poesia, as costa no chão da terra, as patona erguida, a língua pra fora, os óio abrindo e fechando. A respiração pareceu tê parado, louco qui as mão das moça entreabrisse as calça, doido pra se mijá, Maria Cobra me acostuma muito mal com seus mimos, que não vou mais encontrar em qualquer lugar. eu não entendo o conde. o que o bode não entende? o conde está louco que as moças lhe coloquem as mãos, mas fica brincando de gato e rato. isso se chama fantasia, bode. fantasia. isso mesmo, imaginação mais assombração e vosmecê tem a ilusão do faz de conta. por que o conde não coloca a mão no bolso, paga o serviço da moça que mais lhe agrada, faz o que veio fazer e vai embora? quando quero serviço rápido, fico na Humaitá.
Maria Cobra tumbém sorriu, o siô da Hora tava todo na sua disposição. Ela piscô as vista e fez um riso animado de revelação, ela sabia usá as mão e a boca, o sinhô Conde Humaitá merece o gosto do doce na boca. O conde fechô as vista, mais o bode espiava os modo daquela muié maluca. A siá dona da casa, das moça e controladora dos lucro, ofereceu uma tábua de cortá carne com pedaço de rapadura do melado de cana, o sinhô Conde quer apreciar?
Adoro caldo de cana e os doces do melado, faço gosto de lambuzar o bigode.
Junto com a rapadura, ela mostrô as carne qui male-male o decote cobria. Era generosa com as assombração de cada um dos paroquiano. Sabia escutá e se oferecê, isso é apenas para começá a tiração do azedume da rua, vamos prepará o sinhô Conde para os quitutes da casa.
O siô da Hora pediu o vinho da casa, tragam o vinho! muito vinho, tudo sem desgrudá as vista do decote se derramando. Assustando o conde. Descabaçando o bode. O siô da Hora descabeçando num queria elogiá antes do bode tocá as mão, num queria parecê um conde afoito nem queria perdê das vista os bico piquinino rosado. Adorava aquilo tudo.
O Raposa, dono da cadela Poesia qui ele recoieu das rua do mesmo jeito qui recoieu uma ou otra minina, chegô com o vinho. Tocava sua gaita de boca pra Poesia qui pulava no arredó, depois fungava e lambia nos pé descalço do tocadô. Colocô o garrafão no chão. Nenhuma palavra. As coisa qui tinha pra dizê saia da gaita na boca. O siô da Hora colocô o vinho num caneco de lata, farejô com exagero e depois oiô o Raposa, está aprovado! o quê está aprovado? o gosto e o perfume do vinho. e o conde sabe escolher um bom vinho? claro que sei. sabe bem menos do que pensa que sabe. bobagem, se não cheira mal e o gosto não está azedo, está aprovado, entregô o vinho pru Raposa e ordenô uma rodada para todos na casa. Puxô com a mão esquerda a garrafa qui caregava no bolso da casaca, abra esse, também! e sirva a mais bela mulher da casa, Maria Cobra.
O vinho da degola deu sua pequena contribuição de requinte e assombração entre as puta daquela noite. A casa tava cheia, quando acabar o vinho vosmecê pode abrir outro, depois outro, e se precisar, não me peça permissão, abra outro. O Raposa servia os cliente da casa, tocava sua gaita de boca e avisava, cortesia do Conde Humaitá. Só num serviu vinho nos quarto. Tinha ordem de num entrá se num tivesse precisão. O estabelecimento da Maria Cobra tinha duas parte. Uma bem-vista pelos visitante, otra mais reservada pru causo do visitante querê fazê uso da consumação. A parte da frente Maria Cobra gostava de chamá loja das venda, na continuação vinha os quarto. O lugá de aproveitamento das mercadoria tinha uma pequena cela sem janela ao lado da otra, cada uma das cela tinha um catre com vela, botija d’água e uma caneca de lata. Ali, num era permitido forçá as menina fazê o qui num queria. A punição era a expulsão da casa e o destino sem proteção de procurá os serviço de rua furtivo, clandestino e perigoso. As menina tumbém corria o risco de sê retirada da lida. Era mais raro ainda, mais podia acontecê no caso de contrabando das regalia recebida.
Poesia seguia o Raposa aos pulo, sempre dois passo atrás, latindo e abanando o rabo piquinino. Num tinha cô a pelagem da vira-lata, parecia uma camaleoa se adaptando a própria sobrevivência, tanto podia sê uma coisa boa como um mal-está no instante depois, ou um mistério sem segredo, ou um motivo pra desistí, ou um negócio parado, ou um pensamento sem cabeça, um cacareco no porão. Uns achava qui ela escolhia, otros afirmava qui era os óio dos qui via. Tinha veiz qui ela latia, mais num parecia qui latia
Esse bicho tem mais devoção que os meus negros, tem mais faro para reconhecer quem cuida da sua comida que esses escravos mal-agradecidos. Ela nunca abandona seu dono nem tenta fugir. Sabe o seu lugar na casa que a abriga e não a deixa dormir ao relento. É grata pela caridade do prato de comida, a caridade de uma cama, a caridade do seu cocho com água. Adoraria ver os rabos dos meus negros balançando de um lado e outro.
E por falar em rabos balançando vamos fazê um brinde à Poesia!
O siô da Hora se adiantô em segurá seu caneco de lata, um brinde ao rabo da Poesia! chega dessa conversa dura, conde. é o vinho, bode. parece que ele endureceu as palavra e amoleceu a língua. essa é a virtude do vinho
Viva à Poesia!
Maria Cobra tava em pé sem o vestido qui ficô nos pé. O caneco de vinho numa das mão. Nua. Descascada. A pelagem escovada. Pronta pra escaramuça. Num tinha música nem assovio, só tinha ela balançando. Nua. Sem dó nem piedade. Abria e fechava ela mesma. Gostava de sê vista. O Raposa recomeçô tocá. A Poesia recomeçô pulá. Só os três tava vivo.
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