quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Histórias de avoinha: As Casa do Comércio na Villa 14


Ensaio 39B – 2ª edição 1ª reimpressão

baitasar



É bem assim, mifioneto. Quando as pergunta parece qui terminô, não terminô. Tem as pergunta fácil de fazê: afável, cordial, polida, superficial, um feitio de vivê pra sobrevivê, são feita com cheiro e gosto pra agradá, assim os bel-prazer vão se clareando, atraindo mais facilidades pra história contada. A interrogação mais danada é a hostil, tanto de fazê como de respondê. É preciso sabê perguntá e retrucá, mais tem precisão sabê escutá, entendê o dito e o não dito. Tudo qui é gente do mundo tem lado. Nem todo mundo diz o lado qui tá, é mais desafogado o conforto de ficá em cima do muro. É bão oiá meió o jeito do desafogado dizê e fazê silêncio. As careta, os riso, o pavô. O truque é fazê ocê dormí um sono sem fim, os óio aberto e as vista fechada. Ficá parado. Mais cuidado, não se engane, avançá lentamente também é avançá, se precisá caminhá espaçado e vagaroso, vá, mais procure sê um caminhante firme e resistente. Não se assuste com o barulho amalucado. O ruído terrível faz parecê qui a febre é pió qui o adoecimento. Gritá pode sê bão, um ou otro grito, mais qui isso desarranja os ouvido do ouvidô, ocê pode não tá no lugá certo. Cuida pra não fazê coisa ruim pouca nem coisa ruim muita, as duas têm o mesmo gosto, o mesmo hálito, a mesma tristeza, o mesmo desencanto.

Avoinha me cansa com essa falação toda, essas histórias que nunca acabam. É preciso muita força pra carregar o meu tamanho pequeno e a minha cor de preto, ela escutou a minha reclamação sorrindo, isso não era justo, ela não pode caçoar do meu medo de ser pequeno e o desalento de preto.

Não parou os risos quando falou, é uma incumbência pra hôme, depois de dizer de maneira rude minha sentença de morte, com a naturalidade do bebê que procura o peito da mãe, ela virou e revirou a cabeça como um ventilador, um lado e outro

O que avoinha procura?

Meu neto! Um hôme grande qui finge sê anão, tá com medo de fazê as coisa certa, o ventilador continuava circulando, lá e cá, ventarolando

Eu não finjo, avoinha. O seu neto aqui... é um anão. Esse anão aprende mais no banco do cobrador das passagens que nos bancos da escola, o ventilador parou e cravou a ventania em mim, desgrudei da avoinha, não precisava ver avoinha pra sentir a ventoinha girando. Deslizei as vistas pelo corredor do Rocinante, os passageiros subindo, fecha a porta, um passinho mais acima, isso, vamos liberar a porta, fecha. Uma viagem pequena de socorro, mas que havia ficado arrastada como a história de avoinha: para, sobe e anda. Meu desinteresse calculado não desencostava avoinha do Rocinante

Na escola tem as lição pra ocê dizê qui é dotô, queria que ela pudesse ficar calada, como vai fazê as lição é com ocê, não ficará em silêncio, pelo menos, enquanto a tal história do Josino não acabar e eu não aceitar voltar aos estudos, pensa meió e volta colocá essa bunda preta nos banco da escola. Escuta sua avó, se ocê acha qui bem não faz, mal não há de fazê. Imagine só, ocê pode aprendê escrevê as historias de avoinha. No mundo dos branco, qui os preto vive dentro, tem as coisa qui tá escrita e as coisa qui não tá escrita. As coisa qui não tá escrita não tem valô de leitura. É bem assim, mifioneto, quando as lembrança não tá aparecida na caligrafia elas vira recordação, depois tem o tempo da desaparição das pessoa, o deslembramento e o sumiço. Tudo fica perdido no pó da terra. As memória tem força nos vivo, mais quando as memória tá escrita elas tem mais força qui a morte. Os branco sabe da mágica qui tá nos livro da escola, é causa disso, qui eles escreve as história do jeito e gosto deles, inventa e desinventa na causa própria, isso consegue mais qui as lei... faz ocê sentá aqui.

Avoinha, ninguém me obrigou ou veio aqui estorvar, reclamar o meu lugar.

Esse lugá eles não qué, neinho. Esse banco tá guardado pra ocê. E é bão lambê os beiço beiçudo, a ventoinha de avoinha girando, o Rocinante se arrastando, os passageiros subindo, é preciso fazê alarido e ameaçá com a brabeza dos espírito mais antigo pra acordá as história como essa do Josino. Tem vez qui uma cantiga ou um feitio de falá desata o nó dos lembramento, no caso desse tal Juca, foi preciso tê obediência e respeito pra anotá os conhecimento qui aprendeu da força curativa das planta pra amansá o adoecimento

Então, siô Juca Curador, o preto Camará sabia mais das urgência da moça qui o boticarista, esse só tinha o conhecimento de ouví falá da condição de embaraço da siá com as bosta, o siô faz toda essa ajuda pelo gosto de ajudar ou é só um truque para se dar importância, tem coisa qui não se pergunta, é meió ficá só no pensamento, e o perguntado faz meió em não respondê, inventá qui não escutô. O boticarista fez assim, desatendeu a vontade de se explicá, não tinha importância respondê. Dobrô as junta do joelho, agarrava numa das mão a lista qui prevenia esquecimento

Muito bem, deixemos de conversar fiado... vamos precisar do guaraná, este aqui. Pegue, rapaz.

O Camará fechô o ataúde e dobrô a queixada pra frente, agarrô o pote qui tava na mão do boticarista, o guaraná pode ser encontrado no naranazeiro, um arbusto de quase 12 metros de altura, tem propriedades adstringentes com bom uso em diarreias, a parte usada é a semente.

O boticarista puxô pra fora a cabeça qui vascuiava embaixo do balcão, parô os atendimento da freguesia, não conseguiu disfarçá o espanto, o Canjiquinha sabe ler?

O preto aprumô as costa, subiu e endureceu a queixada, parecia um guerrêro iluminado pela penumbra dos lampião. Aveludô a voz antes da resposta sê dada, ele também não disfarçô qui gostava de fazê surpresa com as leitura, siá Bella fez gosto de ensinar.

Não é difícil ler, improvável é encontrar alguém com gosto para ensinar um preto, o boticarista sorriu, esse é um bom truque... funcionou, voltô enfiá a cabeça no buraco do balcão

A vida é cheia de tramoias, siô Juca.

Até morrer, Canjiquinha. É preciso tá atento as redes de intrigas, destravô a mão do balcão, segura esse. E pra fazer tramoia ou morrer, basta tá vivo.

Louro-preto, também chamado de canela-preta. Árvore medindo cerca de 16 metros. A casca é diurética. Usada em pó, meia colher diluída em água, três vezes ao dia, nas ocorrências de catarro intestinal, diarreias, disenteria e...

Tá bom, tá bom... chega. Agarre esse, o Camará largô o pote com o louro-preto na tampa do balcão, juntô com o pote da guaraná, fez otra curvatura pra modo de agarrá otro pote de alento oferecido pelo Juca

Pronto, peguei. Deixe-me ver esse outro, sabugueiro, frutinha seca, tostada e moída, preparada como café. É boa para cortar a diarreia, 4 a 5 xícaras por dia.

Mais esse...

Anis ou erva-doce, dá bom resultado nas diarreias, principalmente das crianças. Infusão das sementes, 10 a 15 gramas para 1 litro de água, 4 a 5 xícaras por dia, mas siô Juca...

Silêncio, por favor. Mais esse...

Isso é tão aborrecido.

E quem lhe disse que seria divertido?

Ninguém. Bobagem minha, isso não é uma brincadeira, me desculpe o comentário desapropriado. Passe-me o pote, siô Juca, eles não tinha tempo de conhecimento um no otro, nem confiança, não tinha como sabê se a cara era amiga ou vazia, tamarindo, o chá da polpa do fruto é refrescante e calmante nas diarreias, 30 gramas para 1 litro de água, 4 a 5 xícaras por dia.

Só mais dois, esse daqui...

Camomila ou camomila-romana, utilizada contra os vermes intestinais, 10 a 15 gramas de folhas de molho em 1 litro de água, por alguns dias. Ou faça um chá das folhas e tome de 4 a 5 xícaras por dia.

E aqui, eis a campeã! Pegue... se nada mais funcionar essa irá nos salvar. Depressa! Depressa! A sua siá não se libertará sozinha dos seus horrores.

Romãnzeira ou romã, usar a casca do fruto para combater a diarreia. Ferver 30 gramas da casca de romã em 1 litro de água, durante 20 minutos. Filtre e adoce a gosto. Beba o chá várias vezes ao dia.

O boticarista ergueu o corpo sobre as pernas, colocô os pote na sua sacola de medicação e pendurô enviesada no ombro esquerdo. Caminhô pela botica enquanto assoprava, um a um, os lampião. Enfim, a escuridão venceu as resistências, pronto, Canjiquinha, vamos saindo. Depois qui os dois pisô na calçada, ele fechô a porta, mais colocô uma placa de aviso: atendimento de contratempo. Colocô as vista na escuridão, ela estava armada até os dentes

Siô Juca Curador...

Fale, Canjiquinha, os dois punha os óio branco de um no otro

Siá Bella vai precisar tomar tudo isso?

O acalmado riu alto, depois respondeu, não, claro que não, mas vou levando todas as armas. Depois de examinar a situação da adoecida, ver com meus próprios olhos, e não com os seus, escolho o chá de mais precisão. E ocê, já deu o alarme pro sinhô Padre?

O siô Juca acha que tem necessidade?

Acho que não, mas é sempre prudente contar com forças aliadas. De qualquer maneira, isso é decisão pra depois. Vamos?

Os dois tava parado. A botica fechada. A escuridão por tudo, vou lhe mostrar o caminho até a casa da siá Bella. Deixemos de conversa, vamos...

O Camará Canjiquinha na frente, as rua desabitava de gente viva tão rápido quanto o escurecimento tomô conta das rua e dos telhado. A vida da noite precisa tê otra gente, menos fraca, menos inocente. As madrugada com esquina arrepiada, os gato pardo nas sombra, o ventre da terra, a estrada das água, gente marcada de qualqué modo, em todo caso, pra sempre.

A escuridão da noite habita com feitiço, segredo, encruzilhada, faisões depenados e estripados, graveto seco, as vista do acalmado não sabia dizê o qui é gato, o qui é pardo. Os passo esmagava as pedra pequena da estrada, os dente arrepiava, ele tinha o medo qui dizia não tê, mais não ia gritá o seu medo da escuridão. Os aviso do siô da Hora tava ali, junto. Eles ia um passo na frente e dois atrás. Prontos pra alarmá ou corrê. Na hora tomava a decisão de fugí ou enfrentá o perigo qui sabia do presente, do passado e do futuro. O medo da escuridão e dos preto era mais forte, arranquem o couro, batam, batam, mais e mais, não esqueçam o sal e a pimenta, negro-filho-da-puta, não tem outro lugar nem outro fazer que me servir, guiar-me em segurança através da escuridão da noite, impedir que o mal me encontre no cruzeiro das ruas e das almas, tereis esquecido que o meu Deus, o único Deus, meu Pai, criou ocê para servir-me, ó infame, ó marcado, negro, escravo, vagabundo, sou o teu refúgio, agradeças, vou criar teus filhos para servirem meus filhos, o porão da minha casa é tua última toca, pede, deixa-me ficar, vamos, pede, súplica, negro ignorante.

Não é perto nem longe, siô Juca.

O importante é chegar, Canjiquinha, continuava dois passo atrás do Camará, lutava com o sabê ou não sabê das coisa do seu mundo, criancice esse meu medo, não quero alegrar o canalha do Afonso com meus gritos, esses pretos precisam voltar para sua terra, ainda nos arrependemos dessas compras de carne, se não são gente como os brancos, também não são animais, a conta um dia há de chegar e será preciso pagar, continuava dois passo atrás do Camará, em silêncio, pensativo

Prudência, Juca, os dois assustô junto, o preto e o branco, as palavra vinha mais adiante do caminho, e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, os dois firmô as vista no rumo qui achava sê o rumo do conselho acautelado, nada foi visto, depois será tarde, a mesma voz agora chegava pelos lado, os dois lado, para arrependimentos, o Juca se descuidô do Camará, quando quis tê arrependimento o preto saltô com os dois ôio arregaiado e os dente assanhado, parecia tê o demônio. O siô Juca procurava a voz rouca da prudência pra lhe ajudá enquanto agarrava a mão do Camará com arma pronta pra lhe cortá e sangrá como os cabrito, como as galinha, agora não adianta lutar, sou a prudência, preferia qui fosse arma de atirá, a ronqueira anunciando seu estertor... aceite o reinado preto de Olorum, ocê é minha oferenda, o presente para Exu, corta logo, Canjiquinha!

Não! Não corta!

O que foi isso, siô Juca?

O boticarista passô as mão na goela, não sentiu nada cortado, girô as vistas, mais ninguém, só ele e o Camará com as mão sem arma de cortá ou de atirá...

_________________________

Leia também:


As Casa do Comércio na Villa 13
Ensaio 38B – 2ª edição 1ª reimpressão


As Casa do Comércio na Villa 15
Ensaio 40B – 2ª edição 1ª reimpressão

Nenhum comentário:

Postar um comentário