Juan Rulfo
11. Pedro Páramo: Fulgor Sedano, hombre de 54 años, soltero
El mexicano Juan Rulfo (1918-1986) figura, a pesar de la brevedad de su obra, entre los grandes renovadores de la narrativa hispanoamericana del siglo XX. De formación autodidacta, trabajó como guionista para el cine y la televisión. Con sólo dos obras de ficción publicadas -el libro de relatos El llano en llamas y la novela Pedro Páramo-, ha ejercido una decisiva influencia en la literatura en castellano del último medio siglo. En 1983 recibió el premio Príncipe de Asturias de las Letras.
11. Pedro Páramo: Fulgor Sedano, homem de 54 anos, solteiro
“Fulgor Sedano, homem de 54 anos, solteiro, de profissão administrador, apto para apresentar e acompanhar pleitos, por poder e por meu direito próprio, reclamo e alego o que segue...”
Tinha dito isso quando levantou a ata contra os atos de Toribio Aldrete. E terminou: “Que conste minha acusação por usufruto.”
— Não há quem lhe renegue a macheza, dom Fulgor. Sei do que o senhor é capaz. E não por causa do poder que tem atrás, mas por mérito próprio.
Lembrava-se. Foi a primeira coisa que Aldrete disse, depois que tinham andado se embebedando juntos, dizendo que era para celebrar a ata:
— Com este papel vamos nos limpar, o senhor e eu, dom Fulgor, porque não vai servir para outra coisa. E disso o senhor sabe muito bem. Enfim, pelo que lhe diz respeito, já cumpriu com o mandato, e me tirou de apuros; porque o senhor tinha me deixado preocupado, verdade seja dita. Agora já sei do que se trata, e dou risada. Quer dizer que “usufruto”. Vergonha, isso sim, é o que o seu patrão deveria sentir, por ser tão ignorante.
Lembrava-se. Estavam na pensão de Eduviges. E até ele tinha perguntado a ela:
— Escuta aqui, Viges, você pode me emprestar o quarto do canto?
— Todos que o senhor quiser, dom Fulgor; se quiser, pode ocupar todos. Seus homens vão ficar para dormir?
— Não, só um. Não se preocupe com a gente, vá dormir. É só deixar a chave.
— Pois é o que eu digo, dom Fulgor — disse Toribio Aldrete. — Ninguém aqui vai diminuir a hombridade do homem que o senhor é; mas fico fulo é com esse malparido do seu patrão.
Lembrava-se. Foi a última coisa que o ouviu dizer com os seus cinco sentidos. Depois tinha se comportado como um poltrão, dando gritos. “Dizer a força que eu tinha atrás de mim. Arre!”
Com o cabo do chicote bateu na porta da casa de Pedro Páramo. Pensou na primeira vez que tinha feito aquilo, duas semanas atrás. Esperou um bom tempo da mesma forma que precisou esperar daquela vez. Olhou também, como tinha feito da outra feita, o laço negro dependurado no dintel da porta. Mas não comentou consigo mesmo: “Que coisa! Puseram um em cima do outro. O primeiro já está descolorido, o último reluz como se fosse de seda; embora não passe de um trapo tingido.”
A primeira vez ficou esperando até ser tomado pela ideia de que a casa talvez estivesse desabitada. E já ia indo embora, quando apareceu a figura de Pedro Páramo.
— Entra, Fulgor. Era a segunda vez que se viam. A primeira só ele viu; porque Pedrinho era um recém-nascido. E esta. Quase se podia dizer que era a primeira vez. E acabaram falando de igual a igual. Que coisa! Seguiu-o a grandes trancos, chicoteando as próprias pernas: “Num instante ele vai saber que quem sabe das coisas aqui sou eu. Vai saber. E saber o que vim fazer.”
— Sente-se, Fulgor. Aqui podemos falar com mais calma.
Estavam no curral. Pedro Páramo se esparramou numa manjedoura e esperou:
— Por que não senta?
— Prefiro ficar de pé, Pedro.
— Como você quiser. Mas não se esqueça do dom. Dom Pedro.
Quem aquele moleque achava que era para falar desse jeito? Nem o pai dele, dom Lucas Páramo, tinha se atrevido a tanto. E de repente ele, que jamais tinha parado na Media Luna, e que não conhecia o trabalho nem de ouvir falar, se dirigia a ele como se ele fosse um peão qualquer. Ora essa!
— Como está aquilo lá?
Sentiu que chegava a sua oportunidade. “Agora é a minha vez”, pensou.
— Mal. Não sobrou nada. Vendemos a última cabeça de gado.
Começou a tirar os papéis para informar a quantas andava a sua dívida. E já ia dizer: “Estamos devendo tanto”, quando ouviu:
— Para quem estamos devendo? Não me interessa quanto, mas a quem.
Passou uma lista de nomes. E terminou:
— Não tem de onde tirar para pagar. Essa é que é a questão.
— E por quê?
— Porque a família do senhor absorveu tudo. Pediam e pediam, sem devolver nada. E isso se paga caro. Eu bem que dizia: “Com o tempo, vão acabar com tudo.” Pois bem, agora acabaram. Embora exista por lá quem se interesse por comprar os terrenos. E pagam bem. Dava para cobrar as promissórias pendentes e ainda sobrava alguma coisa; mas, isso sim, bem diminuído.
— E não será você o interessado?
— Como é que o senhor pode acreditar que eu faria isso?
— Eu creio até no espírito santo. Amanhã vamos começar a arrumar os nossos assuntos. Vamos começar pelas Preciados. Você diz que devemos mais a elas?
— Digo. E é para quem a gente menos pagou. O pai do senhor sempre as deixou para o último lugar. Soube que uma delas, Matilde, foi morar na cidade. Não sei se em Guadalajara ou em Colima. E Lola, quer dizer, dona Dolores, ficou sendo dona de tudo. O senhor sabe: o rancho de Enmedio. E é a ela que temos de pagar.
— Amanhã você vai pedir a mão de Lola.
— E o senhor acha que ela vai me aceitar, velho desse jeito?
— Vai pedir é para mim. Afinal das contas, ela tem lá sua graça. Você vai dizer que estou muito apaixonado por ela. E que ela leve isso muito em consideração. Aproveita e peça ao padre Rentería que arranje o nosso trato. Quanto dinheiro você tem aí?
— Nenhum, dom Pedro.
— Pois prometa dinheiro. Diga a ele que assim que a gente tiver, a gente paga. Tenho quase certeza que ele não vai pôr nenhuma dificuldade. Faça isso amanhã logo de manhã.
— E o Aldrete?
— Qual o problema de Aldrete? Você mencionou as Preciados e os Fregosos e os Guzmanes. E agora me aparece com Aldrete?
— Uma questão de divisa. Ele já mandou cercar e agora pede que a gente ponha o que falta para fazer a divisão.
— Deixa isso para depois. Não se preocupe com cercas. Não haverá cerca. A terra não tem divisões. Pense nisso, Fulgor, mas não deixe ele saber. Agora resolva rápido e de uma vez a questão da Lola. Você não quer sentar?
— Quero, dom Pedro. Palavra que estou gostando de negociar com o senhor.
— Você vai dizer a Lola isso e aquilo e que gosto dela. Isso é importante. Aliás, Sedano, gosto mesmo. Pelos olhos dela, sabe? Isso é o que você vai fazer amanhã de manhãzinha. Estou reduzindo suas tarefas de administrador. Esquema a Media Luna.
“De onde diabos aquele rapaz tinha tirado aquelas manhas?” pensou Fulgor Sedano, enquanto regressava à Media Luna. “Eu não esperava nada dele. ‘É um inútil’, dizia meu finado patrão dom Lucas. ‘Um frouxo de marca maior.’ Eu dava razão a ele. ‘Quando eu morrer, pode ir começando a procurar outro trabalho, Fulgor.’ ‘Está bem, dom Lucas.’ ‘Pois eu digo a você que tentei mandá-lo ao seminário para ver se pelo menos ele conseguia para comer e manter sua mãe quando eu faltar; mas nem isso ele se decidiu a fazer.’ ‘O senhor não merece isso, dom Lucas.’ ‘Não se pode contar com ele para nada, nem para servir de bengala quando eu estiver velho. Fracassei com ele, fazer o quê, Fulgor?’ ‘É uma verdadeira pena, dom Lucas.’
11. Pedro Páramo: Fulgor Sedano, hombre de 54 años, soltero
«Fulgor Sedano, hombre de 54 años, soltero, de oficio administrador, apto para entablar y seguir pleitos, por poder y por mi propio derecho, reclamo y alego lo siguiente...»
Eso había dicho cuando levantó el acta contra actos de Toribio Aldrete. Y terminó: «Que conste mi acusación por usufruto».
-A usted ni quien le quite lo hombre, don Fulgor. Sé que usted las puede. Y no por el poder que tiene atrás, sino por usted mismo.
Se acordaba. Fue lo primero que le dijo el Aldrete, después que se habían estado emborrachando juntos, dizque para celebrar el acta:
-Con ese papel nos vamos a limpiar usted y yo, don Fulgor, porque no va a servir para otra cosa. Y eso usted lo sabe. En fin, por lo que a usted respecta, ya cumplió con lo que le mandaron, y a mí me quitó de apuraciones; porque me tenía usted preocupado, lo que sea de cada quien. Ahora ya sé de qué se trata y me da risa. Dizque «usufruto». Vergüenza debía darle a su patrón ser tan ignorante.
Se acordaba. Estaban en la fonda de Eduviges. Y hasta él le había preguntado:
-Oye, Viges, ¿me puedes prestar el cuarto del rincón?
-Los que usted quiera, don Fulgor; si quiere, ocúpenlos todos. ¿Se van a quedar a dormir aquí sus hombres?
-No, nada más uno. Despreocúpate de nosotros y vete a dormir. Nomás déjanos la llave.
-Pues ya le digo, don Fulgor -le dijo Toribio Aldrete-. A usted ni quien le menoscabe lo hombre que es; pero me lleva la rejodida con ese hijo de la rechintola de su patrón.
Se acordaba. Fue lo último que le oyó decir en sus cinco sentidos. Después se había comportado como un collón, dando de gritos. «Dizque la fuerza que yo tenía atrás. ¡Vaya!»
Tocó con el mango del chicote la puerta de la casa de Pedro Páramo. Pensó en la primera vez que lo había hecho, dos semanas atrás. Esperó un buen rato del mismo modo que tuvo que esperar aquella vez. Miró también, como lo hizo la otra vez, el moño negro que colgaba del dintel de la puerta. Pero no comentó consigo mismo: «¡Vaya! Los han encimado. El primero está ya descolorido, el último relumbra como si fuera de seda; aunque no es más que un trapo teñido».
La primera vez se estuvo esperando hasta llenarse con la idea de que quizá la casa estuviera deshabitada. Y ya se iba cuando apareció la figura de Pedro Páramo.
-Pasa, Fulgor.
Era la segunda ocasión que se veían. La primera nada más él lo vio; porque el Pedrito estaba recién nacido. Y ésta. Casi se podía decir que era la primera vez. Y le resultó que le hablaba como a un igual. ¡Vaya! Lo siguió a grandes trancos, chicoteándose las piernas: «Sabrá pronto que yo soy el que sabe. Lo sabrá. Y a lo que vengo».
-Siéntate, Fulgor. Aquí hablaremos con más calma.
Estaban en el corral. Pedro Páramo se arrellanó en un pesebre y esperó:
-¿Por qué no te sientas?
-Prefiero estar de pie, Pedro.
-Como tú quieras. Pero no se te olvide el «don».
¿Quién era aquel muchacho para hablarle así? Ni su padre don Lucas Páramo se había atrevido a hacerlo. Y de pronto éste, que jamás se había parado en la Media Luna, ni conocía de oídas el trabajo, le hablaba como a un gañán. ¡Vaya, pues!
-¿Cómo anda aquello?
Sintió que llegaba su oportunidad. «Ahora me toca a mí», pensó.
-Mal. No queda nada. Hemos vendido el último ganado.
Comenzó a sacar los papeles para informarle a cuánto ascendía todavía el adeudo. Y ya iba a decir: «Debemos tanto», cuando oyó:
-¿A quién le debemos? No me importa cuánto, sino a quién.
Le repasó una lista de nombres. Y terminó:
-No hay de dónde sacar para pagar. Ése es el asunto.
-¿Y por qué?
-Porque la familia de usted lo absorbió todo. Pedían y pedían, sin devolver nada. Eso se paga caro. Ya lo decía yo: «A la larga acabarán con todo». Bueno, pues acabaron. Aunque hay por allí quien se interese en comprar los terrenos. Y pagan bien. Se podrían cubrir las libranzas pendientes y todavía quedaría algo; aunque, eso sí, algo mermado.
-¿No serás tú?
-¡Cómo se pone a creer que yo!
-Yo creo hasta el bendito. Mañana comenzaremos a arreglar nuestros asuntos. Empezaremos por las Preciados. ¿Dices que a ellas les debemos más?
-Sí. Y a las que les hemos pagado menos. El padre de usted siempre las pospuso para lo último. Tengo entendido que una de ellas, Matilde, se fue a vivir a la ciudad. No sé si a Guadalajara o a Colima. Y la Lola, quiero decir, doña Dolores, ha quedado como dueña de todo. Usted sabe: el rancho de Enmedio. Y es a ella a la que tenemos que pagar.
-Mañana vas a pedir la mano de la Lola.
-Pero cómo quiere usted que me quiera, si ya estoy viejo.
-La pedirás para mí. Después de todo tiene alguna gracia. Le dirás que estoy muy enamorado de ella. Y que si lo tiene a bien. De pasada, dile al padre Rentería que nos arregle el trato. ¿Con cuánto dinero cuentas?
-Con ninguno, don Pedro.
-Pues prométeselo. Dile que en teniendo se le pagará. Casi estoy seguro de que no pondrá dificultades. Haz eso mañana mismo.
-¿Y lo del Aldrete?
-¿Qué se trae el Aldrete? Tú me mencionaste a las Preciados y a los Fregosos y a los Guzmanes. ¿Con que' sale ahora el Aldrete?
-Cuestión de límites. Él ya mandó cercar y ahora pide que echemos el lienzo que falta para hacer la división.
-Eso déjalo para después. Note preocupen los lienzos. No habrá lienzos. La tierra no tiene divisiones. Piénsalo, Fulgor, aunque no se lo des a entender. Arregla por de pronto lo de la Lola. ¿No quieres sentarte?
-Me sentaré, don Pedro. Palabra que me está gustando tratar con usted.
-Le dirás a la Lola esto y lo otro y que la quiero. Eso es importante. De cierto, Sedano, la quiero. Por sus ojos, ¿sabes? Eso harás mañana tempranito. Te reduzco tu tarea de administrador. Olvídate de la Media Luna.
«¿De dónde diablos habrá sacado esas mañas el muchacho? -pensó Fulgor Sedano mientras regresaba a la Media Luna-. Yo no esperaba de él nada. "Es un inútil", decía de él mi difunto patrón don Lucas. "Un flojo de marca." Yo le daba la razón. "Cuando me muera váyase buscando otro trabajo, Fulgor." "Sí, don Lucas." "Con decirle, Fulgor, que he intentado mandarlo al seminario para ver si al menos eso le da para comer y mantener a su madre cuando yo les falte; pero ni a eso se decide." "Usted no se merece eso, don Lucas." "No se cuenta con él para nada, ni para que me sirva de bordón servirá cuando yo esté viejo. Se me malogró, qué quiere usted, Fulgor." "Es una verdadera lástima, don Lucas."»
Y ahora esto. De no haber sido porque estaba tan encariñado con la Media Luna, ni lo hubiera venido a ver. Se habría largado sin avisarle. Pero le tenía aprecio a aquella tierra; a esas lomas pelonas tan trabajadas y que todavía seguían aguantando el surco, dando cada vez más de sí... La querida Media Luna... Y sus agregados: «Vente para acá, tierrita de Enmedio». La veía venir. Como que aquí estaba ya. Lo que significa una mujer después de todo. «¡Vaya que sí!», dijo. Y chicoteó sus piernas al trasponer la puerta grande de la hacienda.
____________________________Eso había dicho cuando levantó el acta contra actos de Toribio Aldrete. Y terminó: «Que conste mi acusación por usufruto».
-A usted ni quien le quite lo hombre, don Fulgor. Sé que usted las puede. Y no por el poder que tiene atrás, sino por usted mismo.
Se acordaba. Fue lo primero que le dijo el Aldrete, después que se habían estado emborrachando juntos, dizque para celebrar el acta:
-Con ese papel nos vamos a limpiar usted y yo, don Fulgor, porque no va a servir para otra cosa. Y eso usted lo sabe. En fin, por lo que a usted respecta, ya cumplió con lo que le mandaron, y a mí me quitó de apuraciones; porque me tenía usted preocupado, lo que sea de cada quien. Ahora ya sé de qué se trata y me da risa. Dizque «usufruto». Vergüenza debía darle a su patrón ser tan ignorante.
Se acordaba. Estaban en la fonda de Eduviges. Y hasta él le había preguntado:
-Oye, Viges, ¿me puedes prestar el cuarto del rincón?
-Los que usted quiera, don Fulgor; si quiere, ocúpenlos todos. ¿Se van a quedar a dormir aquí sus hombres?
-No, nada más uno. Despreocúpate de nosotros y vete a dormir. Nomás déjanos la llave.
-Pues ya le digo, don Fulgor -le dijo Toribio Aldrete-. A usted ni quien le menoscabe lo hombre que es; pero me lleva la rejodida con ese hijo de la rechintola de su patrón.
Se acordaba. Fue lo último que le oyó decir en sus cinco sentidos. Después se había comportado como un collón, dando de gritos. «Dizque la fuerza que yo tenía atrás. ¡Vaya!»
Tocó con el mango del chicote la puerta de la casa de Pedro Páramo. Pensó en la primera vez que lo había hecho, dos semanas atrás. Esperó un buen rato del mismo modo que tuvo que esperar aquella vez. Miró también, como lo hizo la otra vez, el moño negro que colgaba del dintel de la puerta. Pero no comentó consigo mismo: «¡Vaya! Los han encimado. El primero está ya descolorido, el último relumbra como si fuera de seda; aunque no es más que un trapo teñido».
La primera vez se estuvo esperando hasta llenarse con la idea de que quizá la casa estuviera deshabitada. Y ya se iba cuando apareció la figura de Pedro Páramo.
-Pasa, Fulgor.
Era la segunda ocasión que se veían. La primera nada más él lo vio; porque el Pedrito estaba recién nacido. Y ésta. Casi se podía decir que era la primera vez. Y le resultó que le hablaba como a un igual. ¡Vaya! Lo siguió a grandes trancos, chicoteándose las piernas: «Sabrá pronto que yo soy el que sabe. Lo sabrá. Y a lo que vengo».
-Siéntate, Fulgor. Aquí hablaremos con más calma.
Estaban en el corral. Pedro Páramo se arrellanó en un pesebre y esperó:
-¿Por qué no te sientas?
-Prefiero estar de pie, Pedro.
-Como tú quieras. Pero no se te olvide el «don».
¿Quién era aquel muchacho para hablarle así? Ni su padre don Lucas Páramo se había atrevido a hacerlo. Y de pronto éste, que jamás se había parado en la Media Luna, ni conocía de oídas el trabajo, le hablaba como a un gañán. ¡Vaya, pues!
-¿Cómo anda aquello?
Sintió que llegaba su oportunidad. «Ahora me toca a mí», pensó.
-Mal. No queda nada. Hemos vendido el último ganado.
Comenzó a sacar los papeles para informarle a cuánto ascendía todavía el adeudo. Y ya iba a decir: «Debemos tanto», cuando oyó:
-¿A quién le debemos? No me importa cuánto, sino a quién.
Le repasó una lista de nombres. Y terminó:
-No hay de dónde sacar para pagar. Ése es el asunto.
-¿Y por qué?
-Porque la familia de usted lo absorbió todo. Pedían y pedían, sin devolver nada. Eso se paga caro. Ya lo decía yo: «A la larga acabarán con todo». Bueno, pues acabaron. Aunque hay por allí quien se interese en comprar los terrenos. Y pagan bien. Se podrían cubrir las libranzas pendientes y todavía quedaría algo; aunque, eso sí, algo mermado.
-¿No serás tú?
-¡Cómo se pone a creer que yo!
-Yo creo hasta el bendito. Mañana comenzaremos a arreglar nuestros asuntos. Empezaremos por las Preciados. ¿Dices que a ellas les debemos más?
-Sí. Y a las que les hemos pagado menos. El padre de usted siempre las pospuso para lo último. Tengo entendido que una de ellas, Matilde, se fue a vivir a la ciudad. No sé si a Guadalajara o a Colima. Y la Lola, quiero decir, doña Dolores, ha quedado como dueña de todo. Usted sabe: el rancho de Enmedio. Y es a ella a la que tenemos que pagar.
-Mañana vas a pedir la mano de la Lola.
-Pero cómo quiere usted que me quiera, si ya estoy viejo.
-La pedirás para mí. Después de todo tiene alguna gracia. Le dirás que estoy muy enamorado de ella. Y que si lo tiene a bien. De pasada, dile al padre Rentería que nos arregle el trato. ¿Con cuánto dinero cuentas?
-Con ninguno, don Pedro.
-Pues prométeselo. Dile que en teniendo se le pagará. Casi estoy seguro de que no pondrá dificultades. Haz eso mañana mismo.
-¿Y lo del Aldrete?
-¿Qué se trae el Aldrete? Tú me mencionaste a las Preciados y a los Fregosos y a los Guzmanes. ¿Con que' sale ahora el Aldrete?
-Cuestión de límites. Él ya mandó cercar y ahora pide que echemos el lienzo que falta para hacer la división.
-Eso déjalo para después. Note preocupen los lienzos. No habrá lienzos. La tierra no tiene divisiones. Piénsalo, Fulgor, aunque no se lo des a entender. Arregla por de pronto lo de la Lola. ¿No quieres sentarte?
-Me sentaré, don Pedro. Palabra que me está gustando tratar con usted.
-Le dirás a la Lola esto y lo otro y que la quiero. Eso es importante. De cierto, Sedano, la quiero. Por sus ojos, ¿sabes? Eso harás mañana tempranito. Te reduzco tu tarea de administrador. Olvídate de la Media Luna.
«¿De dónde diablos habrá sacado esas mañas el muchacho? -pensó Fulgor Sedano mientras regresaba a la Media Luna-. Yo no esperaba de él nada. "Es un inútil", decía de él mi difunto patrón don Lucas. "Un flojo de marca." Yo le daba la razón. "Cuando me muera váyase buscando otro trabajo, Fulgor." "Sí, don Lucas." "Con decirle, Fulgor, que he intentado mandarlo al seminario para ver si al menos eso le da para comer y mantener a su madre cuando yo les falte; pero ni a eso se decide." "Usted no se merece eso, don Lucas." "No se cuenta con él para nada, ni para que me sirva de bordón servirá cuando yo esté viejo. Se me malogró, qué quiere usted, Fulgor." "Es una verdadera lástima, don Lucas."»
Y ahora esto. De no haber sido porque estaba tan encariñado con la Media Luna, ni lo hubiera venido a ver. Se habría largado sin avisarle. Pero le tenía aprecio a aquella tierra; a esas lomas pelonas tan trabajadas y que todavía seguían aguantando el surco, dando cada vez más de sí... La querida Media Luna... Y sus agregados: «Vente para acá, tierrita de Enmedio». La veía venir. Como que aquí estaba ya. Lo que significa una mujer después de todo. «¡Vaya que sí!», dijo. Y chicoteó sus piernas al trasponer la puerta grande de la hacienda.
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11. Pedro Páramo: Fulgor Sedano, homem de 54 anos, solteiro
“Fulgor Sedano, homem de 54 anos, solteiro, de profissão administrador, apto para apresentar e acompanhar pleitos, por poder e por meu direito próprio, reclamo e alego o que segue...”
Tinha dito isso quando levantou a ata contra os atos de Toribio Aldrete. E terminou: “Que conste minha acusação por usufruto.”
— Não há quem lhe renegue a macheza, dom Fulgor. Sei do que o senhor é capaz. E não por causa do poder que tem atrás, mas por mérito próprio.
Lembrava-se. Foi a primeira coisa que Aldrete disse, depois que tinham andado se embebedando juntos, dizendo que era para celebrar a ata:
— Com este papel vamos nos limpar, o senhor e eu, dom Fulgor, porque não vai servir para outra coisa. E disso o senhor sabe muito bem. Enfim, pelo que lhe diz respeito, já cumpriu com o mandato, e me tirou de apuros; porque o senhor tinha me deixado preocupado, verdade seja dita. Agora já sei do que se trata, e dou risada. Quer dizer que “usufruto”. Vergonha, isso sim, é o que o seu patrão deveria sentir, por ser tão ignorante.
Lembrava-se. Estavam na pensão de Eduviges. E até ele tinha perguntado a ela:
— Escuta aqui, Viges, você pode me emprestar o quarto do canto?
— Todos que o senhor quiser, dom Fulgor; se quiser, pode ocupar todos. Seus homens vão ficar para dormir?
— Não, só um. Não se preocupe com a gente, vá dormir. É só deixar a chave.
— Pois é o que eu digo, dom Fulgor — disse Toribio Aldrete. — Ninguém aqui vai diminuir a hombridade do homem que o senhor é; mas fico fulo é com esse malparido do seu patrão.
Lembrava-se. Foi a última coisa que o ouviu dizer com os seus cinco sentidos. Depois tinha se comportado como um poltrão, dando gritos. “Dizer a força que eu tinha atrás de mim. Arre!”
Com o cabo do chicote bateu na porta da casa de Pedro Páramo. Pensou na primeira vez que tinha feito aquilo, duas semanas atrás. Esperou um bom tempo da mesma forma que precisou esperar daquela vez. Olhou também, como tinha feito da outra feita, o laço negro dependurado no dintel da porta. Mas não comentou consigo mesmo: “Que coisa! Puseram um em cima do outro. O primeiro já está descolorido, o último reluz como se fosse de seda; embora não passe de um trapo tingido.”
A primeira vez ficou esperando até ser tomado pela ideia de que a casa talvez estivesse desabitada. E já ia indo embora, quando apareceu a figura de Pedro Páramo.
— Entra, Fulgor. Era a segunda vez que se viam. A primeira só ele viu; porque Pedrinho era um recém-nascido. E esta. Quase se podia dizer que era a primeira vez. E acabaram falando de igual a igual. Que coisa! Seguiu-o a grandes trancos, chicoteando as próprias pernas: “Num instante ele vai saber que quem sabe das coisas aqui sou eu. Vai saber. E saber o que vim fazer.”
— Sente-se, Fulgor. Aqui podemos falar com mais calma.
Estavam no curral. Pedro Páramo se esparramou numa manjedoura e esperou:
— Por que não senta?
— Prefiro ficar de pé, Pedro.
— Como você quiser. Mas não se esqueça do dom. Dom Pedro.
Quem aquele moleque achava que era para falar desse jeito? Nem o pai dele, dom Lucas Páramo, tinha se atrevido a tanto. E de repente ele, que jamais tinha parado na Media Luna, e que não conhecia o trabalho nem de ouvir falar, se dirigia a ele como se ele fosse um peão qualquer. Ora essa!
— Como está aquilo lá?
Sentiu que chegava a sua oportunidade. “Agora é a minha vez”, pensou.
— Mal. Não sobrou nada. Vendemos a última cabeça de gado.
Começou a tirar os papéis para informar a quantas andava a sua dívida. E já ia dizer: “Estamos devendo tanto”, quando ouviu:
— Para quem estamos devendo? Não me interessa quanto, mas a quem.
Passou uma lista de nomes. E terminou:
— Não tem de onde tirar para pagar. Essa é que é a questão.
— E por quê?
— Porque a família do senhor absorveu tudo. Pediam e pediam, sem devolver nada. E isso se paga caro. Eu bem que dizia: “Com o tempo, vão acabar com tudo.” Pois bem, agora acabaram. Embora exista por lá quem se interesse por comprar os terrenos. E pagam bem. Dava para cobrar as promissórias pendentes e ainda sobrava alguma coisa; mas, isso sim, bem diminuído.
— E não será você o interessado?
— Como é que o senhor pode acreditar que eu faria isso?
— Eu creio até no espírito santo. Amanhã vamos começar a arrumar os nossos assuntos. Vamos começar pelas Preciados. Você diz que devemos mais a elas?
— Digo. E é para quem a gente menos pagou. O pai do senhor sempre as deixou para o último lugar. Soube que uma delas, Matilde, foi morar na cidade. Não sei se em Guadalajara ou em Colima. E Lola, quer dizer, dona Dolores, ficou sendo dona de tudo. O senhor sabe: o rancho de Enmedio. E é a ela que temos de pagar.
— Amanhã você vai pedir a mão de Lola.
— E o senhor acha que ela vai me aceitar, velho desse jeito?
— Vai pedir é para mim. Afinal das contas, ela tem lá sua graça. Você vai dizer que estou muito apaixonado por ela. E que ela leve isso muito em consideração. Aproveita e peça ao padre Rentería que arranje o nosso trato. Quanto dinheiro você tem aí?
— Nenhum, dom Pedro.
— Pois prometa dinheiro. Diga a ele que assim que a gente tiver, a gente paga. Tenho quase certeza que ele não vai pôr nenhuma dificuldade. Faça isso amanhã logo de manhã.
— E o Aldrete?
— Qual o problema de Aldrete? Você mencionou as Preciados e os Fregosos e os Guzmanes. E agora me aparece com Aldrete?
— Uma questão de divisa. Ele já mandou cercar e agora pede que a gente ponha o que falta para fazer a divisão.
— Deixa isso para depois. Não se preocupe com cercas. Não haverá cerca. A terra não tem divisões. Pense nisso, Fulgor, mas não deixe ele saber. Agora resolva rápido e de uma vez a questão da Lola. Você não quer sentar?
— Quero, dom Pedro. Palavra que estou gostando de negociar com o senhor.
— Você vai dizer a Lola isso e aquilo e que gosto dela. Isso é importante. Aliás, Sedano, gosto mesmo. Pelos olhos dela, sabe? Isso é o que você vai fazer amanhã de manhãzinha. Estou reduzindo suas tarefas de administrador. Esquema a Media Luna.
“De onde diabos aquele rapaz tinha tirado aquelas manhas?” pensou Fulgor Sedano, enquanto regressava à Media Luna. “Eu não esperava nada dele. ‘É um inútil’, dizia meu finado patrão dom Lucas. ‘Um frouxo de marca maior.’ Eu dava razão a ele. ‘Quando eu morrer, pode ir começando a procurar outro trabalho, Fulgor.’ ‘Está bem, dom Lucas.’ ‘Pois eu digo a você que tentei mandá-lo ao seminário para ver se pelo menos ele conseguia para comer e manter sua mãe quando eu faltar; mas nem isso ele se decidiu a fazer.’ ‘O senhor não merece isso, dom Lucas.’ ‘Não se pode contar com ele para nada, nem para servir de bengala quando eu estiver velho. Fracassei com ele, fazer o quê, Fulgor?’ ‘É uma verdadeira pena, dom Lucas.’
E agora, essa. Se eu não fosse tão encarinhado pela Media Luna, nem teria vindo ao encontro dele. Teria me largado sem avisar. Mas sentia apreço por aquelas terras; por aquelas colinas calvas tão trabalhadas e que continuavam aguentando o sulco do arado, dando cada vez mais de si... Querida Media Luna... E os agregados: “Venha para cá, terrinha do Enmedio.” E via como ela vinha. Como já estava aqui. O tanto que uma mulher, afinal de contas, significa. “Claro que sim!”, disse. E chicoteou suas pernas ao traspassar a porta grande da fazenda.
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Rulfo, Juan Pedro Páramo / tradução e prefácio de Eric Nepomuceno. — Rio de Janeiro: BestBolso, 2008. Tradução de: Pedro Páramo ISBN 978-85-7799-116-7 1. Romance mexicano. I. Nepomuceno, Eric. II. Título
Pedro Páramo – Romance mais aclamado da literatura mexicana, Pedro Páramo é o primeiro de dois livros lançados em toda a vida de Juan Rulfo. O enredo, simples, trata da promessa feita por um filho à mãe moribunda, que lhe pede que saia em busca do pai, Pedro Páramo, um malvado lendário e assassino. Juan Preciado, o filho, não encontra pessoas, mas defuntos repletos de memórias, que lhe falam da crueldade implacável do pai. Vergonha é o que Juan sente. Alegoricamente, é o México ferido que grita suas chagas e suas revoluções, por meio de uma aldeia seca e vazia onde apenas os mortos sobrevivem para narrar os horrores da história. O realismo fantástico como hoje se conhece não teria existido sem Pedro Páramo; é dessa fonte que beberam o colombiano Gabriel Garcia Márquez e o peruano Mario Vargas Llosa, que também narram odisseias latino-americanas.
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Leia também:
10. Pedro Páramo: Había estrellas fugaces - Juan Rulfo
12. Pedro Páramo: Fue muy fácil encampanarse a la Dolores - Juan Rulfo
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Rulfo, Juan Pedro Páramo / tradução e prefácio de Eric Nepomuceno. — Rio de Janeiro: BestBolso, 2008. Tradução de: Pedro Páramo ISBN 978-85-7799-116-7 1. Romance mexicano. I. Nepomuceno, Eric. II. Título
Pedro Páramo – Romance mais aclamado da literatura mexicana, Pedro Páramo é o primeiro de dois livros lançados em toda a vida de Juan Rulfo. O enredo, simples, trata da promessa feita por um filho à mãe moribunda, que lhe pede que saia em busca do pai, Pedro Páramo, um malvado lendário e assassino. Juan Preciado, o filho, não encontra pessoas, mas defuntos repletos de memórias, que lhe falam da crueldade implacável do pai. Vergonha é o que Juan sente. Alegoricamente, é o México ferido que grita suas chagas e suas revoluções, por meio de uma aldeia seca e vazia onde apenas os mortos sobrevivem para narrar os horrores da história. O realismo fantástico como hoje se conhece não teria existido sem Pedro Páramo; é dessa fonte que beberam o colombiano Gabriel Garcia Márquez e o peruano Mario Vargas Llosa, que também narram odisseias latino-americanas.
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