quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

histórias davóinha: é mais fácil não tê alguma coisa qui tê 03cp

casarão canela preta


é mais fácil não tê alguma coisa qui tê
Ensaio 03cp – 2ª edição 1ª reimpressão



baitasar




os donos do dinheiro que tentavam o tiuzin nunca apareceram. parece que eles não têm cara, é gente secreta. quanto mais os sem nada procuram por eles menos acham essa gente secreta. ficam escondidos dentro de algum terno cinza, gravata preta, longo de baile, colar de diamantes. é gente brilhante, escuto dos menos atentos. nem tanto, nem tanto, penso comigo mesmo, no meu modo de vê eles são acinzentados. jamais se postam da janela com cortina e tudo. cérebros controlados que se acreditam desanuviados e possuem o desesperado desejo de nunca morrerem. orgulhosos. dementes que nunca andam de trem. um deserto de futilidades. compram muito capitão-do-mato e espalham pelo ar horas a fio de sermão. apesar de tudo, juram que o seu melhor amigo está sentado à sua frente

Esses o fiusobrinho não acha. Eles não se mostra. Usa máscara. Mandam o capitão-do-mato no seu lugá. Todo mundo qué conhecê o dono do capitão-do-mato, mas só pode desconfiá que tem cara. É fantasma que gosta de assustá.

Eu sei tia, esses são os políticos corruptos. A professora da geografia dizia que são uns safados, sempre vota em branco!

a tiazin arregalou os olhos para mim

Ocê é burro, Fumaça? Não é tudo assim, e essa máscara de político é apenas uma qui eles usa. Olhá melhó na
 volta. Esses político coloca a bunda na janela, pra isso eles é pago. Mais tem muito mais mascarado... amigo disfarçado de bão comprando o passado e o dia de hoje. Ela não acusa os estafeta da mentira, bandido mais perigoso qui bandido armado. Mata muito mais gente, mata até quem credita neles. Tira tudo, não deixa nada.

Quem é esse tal estafeta da mentira?

Ora, Fumaça. Os homê e as muié do jornalístico. Quem ocê acha qui paga eles? É gente safada qui tira toda sua vontade e coloca a deles no lugá dos seus pensamento, mais deixa os óio e o aparelhamento da escutação pra modo de ocê continuá sentado na frente deles.

Ninguém vai tirá o qui é meu!

o tiuzin parecia derreter a montanha da vontade da avó. a tiazin se voltou pra ele, ela ainda não estava alterada

João, chamou o tiuzin pelo nome sem fazer lembrança do mesmo sangue que corria dentro deles, ninguém da família qué lhe tirá o qui é seu, mais aqui nada é só seu. Não deixa a gula fazê esquecê a vontade da mãinha. Ela deixô a metade do Canela Preta pro moleque, ali. Alguma razão havia ditê.

o dedo da tia Vanda apontava pra mim. isso era uma novidade que eu não sabia se fazia gosto. dono da metade do casarão Canela Preta, pensei, Vou pedir para desistir dessa vontade da davó!

Eu?

O rabanete preto?

a família estava reunida para discutir o vende não vende do tiuzin João, mas a novidade era eu. dono da metade de tudo. todos ficamos espantados, uma pergunta ficou entre o silêncio e os olhares, Por que davó tinha feito isso?

eu não queria assim, nem pedi assim. dito de outro jeito, não pedi nada, foi quando a voz davó me chegou, Mifioneto, logo, logo, ocê vai descobrí quitê coisa, coisinha à toa, é mais difícil qui não tê. Depois qui ocê tem não qué perdê o qui tem. Se não tem não faz falta, mais se tem...

a tia sabia da confusão que me metia, mas tinha sido decisão davó. ninguém sabia da razão daquela vontade. ninguém sabia explicar, a tiazin não parecia saber os motivos davó nem se importava

Moleque, no mundo dos espírito não existe novidade, tudo que acontece já aconteceu antes.

em outras palavras, ela quis dizer que os espíritos não tinham que dar explicação. a família continuava reunida em silêncio. não tinha como não saber o que pensavam. nem precisava adivinhar. era simples e ao mesmo tempo nada fácil

Metade?

Isso mesmo, João... a metade.

os dois olhares agora se enfrentavam

Isso qué dizê o quê?

Isso qué dizê, João, aqui deu pra vê que ele parô pra respirar os próprios pensamentos e dar um tempo de desafogo para o tiuzin, qui o moleque fica com a metade do dinheiro qui ocês ganhá depois de vendê o casarão da mãinha.

qual a qualidade em mim tinha feito davó querer assim? não sei. qual defeito em mim tinha feito davó me colocar nesse mato sem cachorro? preferia que gritassem comigo. o silêncio dos tiuzin e dos primos me deixava mudo. aquilo não era uma brincadeira. não tinha como me sair do plano montado davó. foi quando o tiuzin Manoel chegou

E o qui ocê qué fazê, Manoel?

o tiuzin chegou atrasado para o encontro da família. ele sempre chega com atraso, mas bem vestido, barbeado, perfumado, um preto bem cuidado. esclarecido dos direitos de cada um, cumpridor dos próprios deveres. pediu que lhe explicassem as ideias para solucionar o problema

Por mim, vendia. Pela mãinha... fica tudo como tá. Então, não sô de vendê.

a tiazin olhou na minha direção, me pareceu que tinha um misterioso sorriso combinado com um olhar secreto de lápide. sentia um crescente círculo de pouca vontade

o tiuzin Manoel continuava seu discursivo

Quero aproveitá esse encontro da família e anunciá quitô de mudança marcada. Vou morá com Maria do Prato.

mais uma das mulheres do tiuzin que ninguém conhece, nem vamos conhecer, mas é bom guardar na memória o nome: Maria do Prato; pareceu que a voz do tiuzin desfaleceu, foi quase nada na hora de dizer o nome da estranha. vá que o inusitado aconteça e o tiuzin que não tem conserto encontra o que tem procurado, alguma capaz de lhe servir de salvação e sustento

Quem é essa?

a tiazin Ana levantou do seu torpor, tinha na voz espichada o cacoete do sono

Uma jovem senhora de posses que conheci no baile, esse tiuzin não prega prego sem estopa, nem malha ferro frio. fala a verdade vestida com uma ou outra mentira. aposto que essa moça do Prato é uma velha senhora com dinheiro que o tiuzin quer comer com seus encantamentos de riqueza até descobrir que não pode mastigar dinheiro. a tiazin Vanda tava com aquele olhar de repreensão

Minha irmã... essas velhinhas só querem fugir da solidão.

Nem sempre, Manoel. Cuidado com as bondade demasiada, ela não levantou a voz nem espichou o sermão, tem vez qui diversão de malandro vira prisão.

depois do dito a tia Vanda deu de ombros, voltou as costas para o tiuzin Manoel. aquele não era assunto que precisava de solução imediata. olhou à outra tia que parecia tinha acordada da função alimentícia do mais novo, E ocê, Ana?

essa outra tiazin chegou ao Canela Preta com o mais novinho dos filhos bebendo no peito. já tinha passado davó na quantidade de ter filhos. gostava de fazer os filhos, apreciar eles crescendo e lhe bebendo

Por eu... pode vendê. É um jeito pra arrumá melhor o barraco do Mitão.

a tiazin Vanda agachou na frente da outra tia. era o seu modo de ficar com as vistas nas vistas uma da outra

Ocê vendi pra arrumá o barraco do Mitão. Tá bão, e depois?

a tiazin Ana não entendia da política, dos homens e do depois da tia Vanda

Depois... o quê?

E se o Mitão arrumá outra, ocê vai morá aonde?

o nenê fez muxoxo de choro. ela tratou de aquietar dando outra teta. isso deve ser extenuante, cômico e patético, ficar com aquele carrapato grudado no peito, resmungando e reclamando

Voltamô pro Canela Preta, o Mitão levantou, aquela conversa parecia um grande perigo. passou a mão no penúltimo dos filhos, ou no antepenúltimo, isso não importa, e saiu daquele círculo de união familiar. ele pareceu tê sobrado ali

Ana, ocê disse que é pra vendê o casarão... não vai tê aonde voltá!

Arrumo outro...

a tiazin Vanda desaprisionou do peito outro suspiro. o seu corpo cansado enrijeceu. ela olhou a sua volta. as vantagens de ter alguma coisa envolve a todos, junto vêm as desvantagens e nos rodeiam, pouco ou nada se resolve, E você, Jorge?

Se o preço for muito bom... voto pra vendê.

votação empatada. um assunto controverso que não se acaba com todos me interrogando

E o Batata?

o tiuzin Jorge queria declaratório da situação do tiuzin Batata. O único dos filhos, além da mãinha, que não tinha feito comparecimento

Ele começô emprego de cobradô.

Ocê ta desinformativo, Manoel. Parece que o moleque ficô peixe do patrão e virô motora de caminhão, a tia Vanda juntou as mãos e agradeceu alguma graça

Já dou graças à Deus que o moleque saiu daquelas correria no caminhão do lixo, largou o sindicato, que outros tratem de organizar a associação. Alguém sabe a linha que ele tá puxando?

Não sei a linha que ele ta puxando, mas o tiuzin começa às 4 e 15 da manhã e toca até às 11. Tem um intervalo até o meio da tarde, depois pega até às 10 da noite.

— E quem não é peixe do patrão?

a tiazin Ana levantou da cadeira, o bico da têta enfiado no gurizin. Deu uma volta na mesa da cozinha, parecida com uma ilha cercada de gente por todos os lados. balançava o piá pra lá e cá

Ana, isso não sei, mas aposto qui se não é peixe não sai de cobradô.

E faz o quê das 11 até voltá de tarde?

ela falava de jeito nervoso que não aquietava o gurizin da têta

Não sei, Ana, mas se fosse eu... dormia na garage, dentro do ônibus, ela voltou os olhos para o tiuzin Manoel. a tia empurrou a têta com mais força. parecia que custava muito mais esforço entender porque não se queria botar a mão no dinheiro vivo do comprador desconhecido

Então, a decisão é não vendê... quero sabê quem paga o quê pra arrumá o casarão, todo dia tem coisinha pra fazê...

Dividimô tudo entre nóis...

Quê? Eu nem moro mais aqui!

o tiuzin Jorge parecia começar a não controlar os nervos, Não aceito. O moleque é dono da metade, a metade das arrumação é dele, a metade que sobra dividimô.

Jorge, o moleque não tem donde tirá.

É só largá essa frescura dos livro e arrumá trabalho. O problema é o tamanho...

Jorge! A mãe deixô dito que o moleque estuda até terminá os estudo da escola. Não é assunto da discussão. E ocê, Ana, se não mora aqui é por querê seu, se quisé voltá... o lugar tá desocupado.

um frio me passou na barriga. a tia Ana e o Mitão mais a coleção dos muriquinhos da tia, tudo junto no caldeirão do casarão. isso não era bom para ninguém, nem para o casarão nem para o espírito davó, Mas a metade do Canela Preta é do moleque, ele não vai entrá na divisão?

— Manoel, ele vai tirá pagamento donde? A mãinha tem querê do guri nos estudo, até onde dé. O moleque não tem mais querê que a mãinha, ela queria e ele vai continuá na escola. Isso já foi resolvido, lá no tempo da mãinha viva. Tem alguma parte que eu não entendi?

a tiazin Vanda foi feita com o jeito davó, pronta para o amor e a guerra. com ela a conversa já começava pela metade, tinha o querê dela e o outro jeito que não lhe mudava o querê. os tiuzin Jorge e Manoel tinham aquietado com o rabo entre as pernas, as vistas entre as orelhas. a tiazin Ana achou melhor ficar com o Mitão do feitio que já tava. o tiuzin João saiu no meio das conversas, não disse mais nada do que já havia dito. já sabia que o tiuzin Batata não deixava vender o casarão

depois da reunião desfeita nenhum dos tiuzin voltou no assunto

eu ficava sozinho no casarão, na maior parte dos dias. descia na senzala sempre que precisava cumprir o compromisso de lembrança com a professora da matemática. bem mais nova que as lembranças da geografia. Minha desilusão passou logo que achei outro atrativo, conforme explicou o tiuzin Manoel

Amor é vento que vai um, vem cento.

a história dos preto massacrados já não me incomodava tanto. as coisas boas e ruins ficaram perdidas pela estrada das memórias. o esquecimento no tempo e a vontade das lembranças novas são mais fortes, mas fiz promessa de jamais usar calça longa, folgada nas pernas e apertada nas canelas, como as correntes apertando os cabritos preto. só uso calça de brim.





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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

histórias davóinha: Sô a favô de vendê, pegá no dinheiro e cuidá de vivê 02cp

casarão canela preta


Sô a favô de vendê, pegá no dinheiro e cuidá de vivê
Ensaio 02B – 2ª edição 1ª reimpressão



baitasar




depois dos serviços e as despedidas davó, a cantoria silenciou. foi o tempo de cada um escolher as lembranças que não queria desaprender. os tiuzin ficaram sem a última vez de ver davó antes do sumiço com o Capitão. não escutaram a última palavra. eu estava junto, dei meus ouvidos para os fios do seu suspiro. vi fechar os olhos para não abrirem mais. davó se foi me espiando. isso fez de mim um fiuneto especial. ela não escolheu a hora da partida, mais gosto de acreditar que escolheu quem lhe segurava a mão no desembarque. eu escolhi estar junto davó, ser o seu acompanhamento. um lugar que não queria tá, o único lugar em que eu tinha que estar. sei que nunca vou me arrepender da escolha que fiz. não experimentei medo, senti que o meu amor tava lhe ajudando na partida

por muitos anos, davó foi decisão que governava nos assuntos do casarão Canela Preta. aprendi que para essa posição de destaque não tem muito jeito de chegar, nem é para quem quer. ela tinha a autoridade e a sabedoria do tempo de conversar com desenvoltura com os mais antigos. falava que aprendeu de viver morrendo cada dia um pouquinho

Mifiuneto, escuta com atenção no coração.

Estou escutando, eu tava com os olhos esbugalhados, queria mostrar que o coração tava atento como as vista

Não credita qui vivê é juntá coisa inútil. Aproveita as coisa boa da escola. Escuta com atenção a professorinha.

vavó não foi na escola, mas, também, não aconselhava desfeita com os livros. tinha os livros na cabeça

Mas só tê os livro na cabeça não chega, mifiuneto. Não chega ficá com as história na cabeça, tem munta coisa quié preciso tá escrito, se não tá escrito não existiu. A memória da língua inventa as parte qui não lembra, e o qui existiu muda se fô mais bão pru inventadô. É como se a história dos preto não tivesse vivido, cada um conta do seu jeito e quem ouve tem seu jeito de escutá. A língua e os ouvido tumbém tem cô.

Mas davó sabe como contar as histórias... e têm aqueles que não sabem escrever as histórias como davó sabe contar.

Davó, sabe? Podê sê, mais davó qué dizê qui a vida qui não tá escrita as criança desaprende. As lembrança foge como as areia da praia na mão, sobra do punhado agarrado uns grãozinho. E a serpente enganosa diz uqui qué sobre uqui existiu ou não existiu. O ruim passa sê bão, o fingimento vira virtude. Os bandido são sempre uspretu. O branco ruim vira herói se as suas canalhice não incomodá os branco bão.

Eu sei do que davó tá falando, tem livro ruim que finge respeito e dá aconselhamento de desamor que parece amor... tem livro que mente... tem livro que esconde... tem livro...

Chega, Fumaça. Se tem livro quié ruindade, escreve ocê a história.

Falar é fácil...

davó não entende dos livro, mais sabe qui existe história na cabeça e nos livro, pra gente ruim e pros bão, cada um escolhe o qui serve meió. Ocê precisa escolhê se vai vivê aborrecido, fazendo desfavô, desamando o amô. Ou vivê a vida da vida. O mifiuneto não pode esquecê qui os fingido finge tanto qui credita nos fingimento da vida qui finge. Ocê aprenda escolhê os livro bão, tem vez qui precisa sorte, mais tem outra vez qui só precisa tê atenção na viseira qui vê.

davó chegou à posição de importância pelo jeito do amor que amou nos filhos. não tinha enganamento, se achava que precisavam um puxão nas orelhas dava o tranco e a explicação zangada, mas o colo da avó era o melhor lugar do mundo para ficar. os filhos e os fiunetos sabiam o que tinham tido e haviam perdido. foi quando se espalhou o boato que o casarão tava desgovernado e o tiuzin João tava disposto de ter conversa para vender o Canela Preta

a notícia caiu como um arrebentamento

depois do sumiço davó pensei que o casarão ficava no uso dos filhos e dos mais novos. davó dizia, Desde o Capitão, qui construiu a mansão só com as mão dos preto, o casarão nunca saiu do uso dos Canela Preta.

vender não parecia um bom plano, mas a vontade de ter dinheiro na quantia que não cabia na mão despertou o embaraço da cobiça. a vida davó que juntava os parentes tava fora das vistas e pareceu que cada um seguiria uma estrada, mas ainda tinham cuidado com  o puxão nas orelhas e o xingamento zangado

o tiuzin Jorge pediu reunião dos irmãos, queria esclarecer o zunzun que tinha virado mexerico, o tiuzin João foi logo dizendo

Tem gente com gosto de pagá um dinheirão pelo lugá dos Canela Preta! Acho que temô que vendê.

tudo ficou no silêncio. o madeirame do assoalho parou de gemer. as dobradiças pararam com o zumbido das portas e janelas. só os suspiros esvaziavam os respiros aprisionados. ninguém se olhava. ninguém se via. rezei para que alguém fosse avisar os mais velhos, trazer os espíritos para começar a resistência. a luta é desigual quando o olho da cobiça se atiça. todos falam horrores de tudo e de todos que se atrevem contra o egoísmo do dinheiro. ficamos desligados da nossa caridade. a vida é perdida. e esfria. fica esquecida. o ódio fica difuso, embutido no sopro da respiração. as pessoas ficam com descontrole sobre o rancor que manda no peito

Jorge... o João tá adormecido do juízo, perdido pelo interesse do dinheiro.

isso de conversar dizendo o nome, sem usar a lembrança do que cada um é na família: irmão ou irmã, não era um bom começo de assunto

Bobagem, Vanda. Cansei de puxá carroça feito cavalo e do aborrecimento das vista assustada das madame, nunca sei quando sô o cu ou as calça. Tem veiz qui sô o cu, tem outras veiz qui sô as calça. Quero tê a minha montaria. Não sento como ocê em cima duma mina de ouro...

O quê?

Ocê senta em cima da sua mina de ouro... é só sabê usá!

a tia Vanda não se impressionou com o entusiasmo vendedor do João, nem com o jeito de lhe chamar de puta. e até onde davó contou, ou deixou de contar, ela podia ser a única que tinha correndo nas veias do corpo o sangue do Capitão e da nêga Laetitia. levantou e encarou de frente o tiuzin João. ninguém mexeu os olhos, a boca ou as mãos, a tia sabia defender o seu jeito de ser

E o pangaré de madame...

Qui tem eu?

O pangaré acredita que muda essa vida de arreio se vendê o casarão da mãinha?

E a nêga Vanda vai até quando esfregando o chão dos branco? Quieta com a vida de capacho?

queria tanto que davó tivesse aqui, acalmava os dois. primeiro, com as vistas; depois, com as mãos, fazendo sinal para que o bate a boca de um e o trinca os dentes da outra parassem aquela guerra, Fius, desfeita na família não é bão. Um campo sem dono não vai dá bom proveito.

davó era o respeito dos humanos na família e um espírito respeitado pelos mais antigos

Não gosto de acordá com o corpo amassado, dolorida e desanimada de sê diarista da madame, mas não vendo uma pedra do Canela Preta pra modo de saí dessa vida de vai ou não vai.

foi quando me animei

Davó virou encantamento dizendo que o casarão é da família. Todos podem escolher viver e morrer nele. E todos do sangue da família Canela Preta que vierem na descendência.

Quem pediu a opinativa do rabanete preto?

Cuidado com a língua João. Não mexe além da conta com o moleque.

resolvi aquietar a língua. não tinha estatura pra brigar com o tiuzin nem queria a tia como meu escudo de proteção

Ninguém vai tirá o qui é meu. Nêgo é o seguinte na fila qui não caminha. Nunca sai do lugá, um depois do outro esperando. Depois qui morré se terminô. Os vivo tem qui dá conta de vivê. Sô do lado de vendê, pegá o dinheiro e cuidá de vivê!

os outros da família não pareciam querer se meter. era melhor esperar, ver com que lado davó ficava. acho que foi assim, no tempo de acorrentar os canelas preta, lá na terra mãe. não acreditavam que aquilo ia continuar... e continuou, até a mãinha da terra dos preto minguar com falta de mão para enraizar. as coisas se repetem grandes ou miúdas, aprendemos com as histórias e desaprendemos com o silêncio. o preço da evaporação das lembranças é a repetição sem miolo e sem serventia para o bem de todos. o dono nunca está satisfeito com os escravos que tem

É assim mesmo, mifiuneto. O desaparecimento das lembrança é disfarce qui dono de gente usa pra continuá escravidão da miséria.

essa davó não descansa




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sábado, 22 de fevereiro de 2014

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Avó, João Torto e a professora

Ensaio 32B
baitasar
—        Ocê sabe com quem está falando?
Mifioneto, essa deve sê a pergunta qui a fidalguia mais ensinô os fio fazê, pra modo de calá os miserável. Tá mintendendo? Eles pergunta e não responde, deixa qui a resposta fique dentro de ocê, roendo a coragem e a vontade de lutá. Eles mostra pros fio como é qui se faz fazendo, num tem meió exemplo pros fio qui o pai cumpridô do qui promete. Faz os desafortunado creditá qui tem na frente um inimigo maió qui sua força de lutá, pelo menos, é o qui eles qué fazê ocê pensá
—        Cuidado! Ocê não sabe com quem está se metendo...
Com o tempo de uso, a mesma pergunta mudô um pouquinho aqui, outro ali, e se alastrô nas teia da fidalguia parasita qui adora dizê qui ela é qui trabaia e faz a riqueza de tudo isso. E foi se enfiando, criando o costume de creditá ela mesma qui foi assim, é assim, vai sê sempre assim, aumentando o gosto de sê obedecida sem pergunta. Inté qui esse seu jeito dominadô chegô nas pulícia, nas justiça, nos doutô,  nos jornalista de imprensa, qui parecia qui ia escapá dos parasita, mais não escapô. O mifioneto já deve de tê escutado da professora
—        A professora aqui sou eu, cala a boca!
Eu sempre desconfiei qui isso não é jeito de educá diferente, mais o véio modo de ensiná das fidalguia, Ocê sabe com quem tá se metendo?, mais vai chegá o dia qui os minguado de pobre vai amotiná de sê tratado arrogante pelos patrício, vai aprendê gritá
—        E ocê sabe com quem está gritando?
No tempo do preto Josino, esse jeito parasita já tinha chegado nos funcionário do imperadô.
O imperadô representava o interesse público, se o mifioneto querê oiá esse tal interesse, como sendo a fidalguia parasita, o guri acertô. Era esses qui o imperadô representava. Assim, quem o imperadô convocava pra sê o representante alegórico dele, na verdade, falava e escutava e mandava por ele junto da fidalguia aproveitadora, qui nunca instruiu pra educá, mais pra obedecê. E se as lei do império governa o comportamento do cidadão, e os preto não era cidadão, mais uma mercadoria do ferramental do trabalho nas plantação ou um utensílio de uso nos casarão, então, ele era alguma coisa qui não podia tê comportamento, só obrigação.
Tá mintendendo? Tá entendendo por que ocê tá sentado nesse banco de cobradô e não tá no banco da escola?
O imperadô é soberano!
Faz, autoriza, determina o cumprimento das lei, pra dá conta de tudo isso, nomeia as indicação das fidalguia pros serviço público. O imperadô é assim, no mesmo tempo, a paz e a força. O podê tudo pode com dureza ou brandura, crueldade ou fleuma, coação ou docilidade, ele constrange ou libera; tem vez qui é veemente, mais tem otras qui é desanimado. E quando ele é uma coisa ou otra? Ele decide nas suas comodidade e interesse.
As fidalguia qui o imperadô escolhe e promove faz a incumbência suja com as suas concordância. Quando qué é rápido, decidido e cruel. Mais quando não qué sê duro, fica um docinho de coco. Daí, desse tempo, o dito do povo, O rigô das lei é pros inimigo, as bondade das lei é pros amigo. Ele fez as lei assim, com generosidade e ruindade, e escolhe em quem aplicá uma ou otra.
Foi fácil, assim. É fácil, assim.
As vista grossa e os favorecimento das lei é a generosidade com a fidalguia parasita. As ruindade das lei é pros miserável, os pobre e as puta; a justiça da ruindade ou generosidade não é pros preto. Os preto tá mais embaixo.
Tá mintendendo? Já consegue vê como ocê foi jogado nesse banco de trocadô de passagem? Alguém tinha qui sê, ocê foi escolhido antes de saí da barriga da sua mãe. Já tá vendo por que os fio da fidalguia fica com as meió indicação do imperadô?
—        Mas Avó, já não temos mais Imperador. Isso acabou fazem mais de cem anos... a escravidão foi abolida. Os negros são livres!
—        Já vi qui o mifioneto só enxerga o qui a fidalguia parasita diz pra oiá. O imperadô saiu, diga-se de passagem, calmamente, sem maió susto pra ele e os qui ficô. E quem foi qui ficô? A fidalguia tomô o seu lugá, por isso, não saiu junto. Nunca saiu depois qui chegô.
—        Isso eu sei, viramos uma República!
—        De golpes e tramoia! E sabe por quê? Continuamô a sê dominado pelos parasita qui faz ocê ficá aqui, nesse banco, enquanto eles prende e julga quem eles qué, faz as lei qui qué, diz o qui qué e só escuta o qui qué das suas conveniência. É pouco?
Os parasita faz as lei, executa e aplica, ocê tá mintendendo? Ocê e eu, os preto, os pobre e as puta vivemô na ditadura da fidalguia parasita. E se ocê quisé sabê quem é essa gente, tem qui aprendê oiá e escutá. Eles são egoísta e tem gosto de dizê bem grande com a voz branca, às vezes, dura, otras macia, é a tal da conveniência
—        A nossa Vila é o lugar da liberdade, da ordem e do progresso. — mais não diz quisso tudo é pra eles, as fidalguia parasita.
Tirei os olhos do corredor do ônibus, um instante, minha desatenção deve ter durado menos que um piscar, quando procurei a Avó ela não tava. Largou o tambor, ensaiava os passos da dança para sua Rainha.
Girava, girava e girava num branco e azul. Os olhos fechados. O mar, as algas, a estrela-do-mar, os peixes. O arco-íris de Oxumarê. A mãe dos orixás. Os passageiros batiam palmas e cantavam, celebravam a Senhora de todas as cabeças. Cantavam os orixás. Festejavam. A Avó abria os caminhos
—        Ela tá girando
            É a Rainha do mar
O João Torto parou o carro e desceu. Caminhava na areia, para um lado e outro, com um charuto entre os dedos, indicador e o maior de todos da mão direita; na outra mão, carregava uma garrafa de cachaça. Fumava e bebia enquanto falava a língua dos orixás. Não sei onde ele guardava os utensílios
—        Ô João! João Torto! — não parecia ser mais ele.
Os passageiros iam descendo e formando um círculo na volta da Avó e do Preto Véio. Lá dentro tava a África. A terra perdida. O homem comprido que estava enfiado na janela do teto desceu com o tambor na mão. Foi ele que começou a batucada, é bem assim, não sabemos o que nos cabe até que desistimos da busca inútil de ter tudo
—        Ela tá chegando
            É a Rainha do mar
A Avó girava, o Preto Véio ia e vinha, os dois no meio da cantoria e da roda de gente. O terreiro no ônibus dos passageiros. A nostalgia, a areia molhada, o manto azul voante, flutuante. Uma garoa fininha que parecia subir nas espumas das águas molhava as cabeças. A Mãe das águas do mar estava abençoando o batuque que não parava
—        Iansã cadê Ogum
            Foi pro mar
A mãe e os filhos correndo, dançando, cantando. Iemanjá e os seus dez filhos. A professora e a sua bolsa aberta olhavam de longe, ela carregava nas mãos flores coloridas: marrom, vermelha e branca. Foi se aproximando da roda até que fechou os olhos e começou a girar. A bolsa sorria para a professora girando, cantando, dançando. Batiam palmas, cantavam alto
—        Mas Iansã cadê Ogum
            Foi pro mar
A velhinha carregava um tabuleiro com cocadas coloridas: branca, verde e azul-real. Ela girava alegre, me olhava e chamava, até que fechou os olhos
—        Olha aqui fora! Vem olhar!
Os tambores, os agogôs, os xequerês e adjás. Os homens e mulheres da roda davam vivas, batiam palmas, Iemanjá, Iansã, Ogum, os orixás dançavam com o corpo da Avó, João Torto e a professora. Estavam de novo acostumando com os humanos. O Céu ajuntado à Terra. Os humanos e os orixás felizes
—        Eu vi, Avó!
Um preto do tamanho mais alto tava escorado num poste. Parecia uma montanha. Tinha a envergadura do varapau qui escorava. Um no otro. Olhava direto nos óio do guri. Usava um riso zombateiro qui fazia qualqué um hesitá. Parecia cara de nojo, mais não era nojo, talvez desdém, um oiá de negligência com as descoberta do guri. O preto não tinha cortejo, só a confiança própria de quem carrega a verdade, mesmo qui o carregamento da retidão e honestidade não lhe dê nem a liberdade, nem a bondade, apenas a dô da injustiça desalmada, sem um pouquinho qui seja da compaixão do Jesus branco.
Um oiá mais atento nos detalhe e se via qui o preto escorado no poste da luz ficava mais maió qui o poste. Olhando mais alerta e cuidadoso dava pra vê qui ele carregava no corpo as marca dos lanho. E não parava de crescê. As mão gigante de carregá a escravatura segurava um lápis e um apontadô. Enfiava o lápis no apontadô e girava o lápis té descascá e afiná a ponta. Agachava té o chão e riscava a terra. Depois alevantava, girava o lápis no apontadô té descascá e afiná a ponta. Agachava té o chão e riscava a terra. Na volta dos pé, um amontoado de casca da serraria do lápis cobria té as canela preta
—        Ocê viu o quê, mifioneto?
O preto de tamanho muito grande continuava apontando o lápis e escrevendo na terra, té qui ele cortô e levantô o chão, fez siná com os óio, o guri precisava oiá os escrito qui o sopro dos orixá tinha deixado na terra, tava na língua da criação, Iorubá, pra não sê misturado com as poeira dos branco misericordioso, os dono da escravatura. Os dono do céu branco qui eles comia e bebia nos domingo.
O preto agigantado carregô o chão nas mão té o guri, repetiu o oiá e esperô. A cantoria aumentô, as palma e o batuque ajuntô mais o Céu dos orixá com a Terra dos humano, té qui se ajuntô tudo no guri
—        Ocê precisa estudá pra ocê mesmo, mais também, por tudo qui tá em ocê dos mais antigo; por todo preto e toda preta que é ocê, e os qui vão chegá de ocê. Os dono da escravatura dos preto ainda não se libertô dos gosto do sangue nos lanho e na chibata. Sente prazê em acorrentá. Esses branco qui não se libertô creditá qui é dono dos preto. Ocê precisa ensiná qui ninguém é dono dos preto. Ninguém devia sê dono de ninguém. Pega o lápis e o apontadô
—        Eu vi o pobre cadeiado, o cuspe nas puta e a borracha nos preto!
Oiei o guri com as água dos óio subindo té em cima, no ponto de derramá. Não queria fazê choro. Fiz força pra segurá as água do carinho e da tristeza. Virei os óio na direção do poste da luz, mais o preto não tava, caminhava seu caminho sem oiá atrás, solitário e deslembrado, té qui chorei de raiva e a danação me deixô mais atrevida e forte pra dizê
—        É assim faz muito tempo, mifioneto!
É assim desde qui o primeiro preto pisô na Vila escravizado, era o tempo da carregação dos preto pra trabaiá e colocá comida na boca das fidalguia preguiçosa e hipócrita. Os branco da fidalguia mentirosa, desmemoriada das crueldade que fez, e continua tentando fazê, jura qui não é verdade. Tudo invencionice dos preto, dos pobre e das puta qui não gosta de trabaiá. Eles faz pouco caso, e repete té alguém creditá
—        Aqui na Vila, ninguém é preso ou morre porque é negro. O problema deles não é a cor, é a burrice que vem do berço. — a hipocrisia é uma das parte do parasita, o corpo e o sangue das domingueira alivia as fraqueza e intolerância dos otros dia. Pra gente assim, não descendo a borracha no lombo dos fio da fidalguia, tá tudo certo, a verdade das coisa tá dita e tá feita, se apanhô tava merecendo, se foi cadeiado alguma coisa há de tê feito; otra das parte da fidalguia, além de vivê acostumada com as bondade das lei, é a parte qui gosta de fazê caridade com o cu dos otro
—        E essas putas vagando pelas margens do rio? O que Vossa Excelência tem a dizer?
—        Poderiam trabalhar no serviço doméstico. O lugar da mulher não é na rua se oferecendo, mas não querem largar essa vida fácil.
—        Não querem.
—        Eu sei, preferem continuar onde estão. Na rua. Não tem muita coisa que eu discorde de Jesus e as suas misericórdias, mas defender as prostitutas foi demais. Deviam ser condenadas ao ostracismo. Francamente, sinhô Ouvidor, foi um desserviço essa historinha da primeira pedra. Muita misericórdia para quem não merece.
Isso já dura tanto tempo qui té o tempo desanima e gosta de creditá qui os branco é um doce e o inferno dos branco é meió qui o céu dos preto
—        Mas há quem devemos a convocação dessa reunião no Sanctuário? Por certo, não foi para ouvirmos um do outro o que já conhecemos dos negros e das prostitutas.
O oiá dos dois homem se cruzô de lado a lado, no recinto escurecido. Parecia dois risco de relâmpago preparando à tempestade, a chegada dos ventos e a descida das água. As janela fechada ajudava trazê mais abafamento antes da tormenta, como se ela não pudesse desabafá o prazê da traição
—        Vim à pedido do nosso Governador que se sente honrado por Sua Excelência receber esse humilde servidor. E mais humilde ainda,  como Ouvidor-Geral da Vila, um lugar de homens fortes e destemidos, prontos à luta e lealdade ao nosso Governador.
E o pió é qui eles achava graça nesses galanteio e boniteza de falá enquanto decidia o qui é certo, o qui é errado, quem valia a pena prendê, quem não valia, quem devia tomá um susto e quem nem merecia sê lembrado. Era quando se convenciam de julgá e não julgá. Eles tinha tempo de resolvê o qui precisava sê dito e o qui carecia de fazê silêncio, sabe como é, cara de paisagem, fazê de conta qui não viu, não escutô, não ficô sabendo. A sua excelência costumava repetí aos próximo da sua amizade, como um siná de atrevimento

—        A abundância de poderio e podridão da Irmandade obriga o cuidado de não entrar em reunião, nem fazê o julgamento dos associados sem que tudo tenha sido tratado.
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Leia também:

Ensaio 31B - O barbeiro-sangradô e os fidalgo parasita


Ensaio 33B - Um lugá qui nunca existiu

Índio, caboclo, cafuso, criolo! Sou brasileiro!

Criolo






Com direção de Paula Lavigne e Fernando Young, o espetáculo traz as músicas de seu disco "Nó na Orelha"

02:40 - Mariô
06:25 - Sucrilhos
11:50 - Subirusdoistiozin
15:45 - Samba Sambei
20:21 - Freguês da Meia Noite
24:32 - Não Existe Amor em SP
29:57 - Lion Man
34:02 - Grajauex
37:10 - Linha de Frente
42:28 - Bogotá
50:05 - Vasilhame


Sucrilhos
Criolo


Calçada pra favela, avenida pra carro,
céu pra avião, e pro morro descaso.
Cientista social, Casas Bahia e tragédia,
Gostam de favelado mais que Nutella
Quanto mais ópio você vai querer?
Uns preferem morrer ao ver o preto vencer
É papel alumínio todo amassado,
Esquenta não mãe é só uma cabeça de alho...
Cartola virá que eu vi,
Tão lindo e forte e belo como Muhammad Ali
Cantar rap nunca foi pra homem fraco
Saber a hora de parar é pra homem sábio
Rico quer levar uma com nóis, 'cê que sabe...
Quero ver pagar de loco lá em Abu Dhabi.
Eu sou nota 5 e sem provoca alarde,
Nota 10 é Dina Di DJ Primo e Sabotage.

Pode colar, mas sem arrastar,
Se arrastar, a favela vai cobrar...
Acostumado com sucrilhos no prato,
Morango só é bom com a preta de lado.

O planeta jaz e a trombeta do Satanás,
Usain Bolt se não correr fica pra trás
Querer tapar o sol com a peneira é feio demais
E cocaína desgraça a vida de um bom rapaz...
Trilha Sonora do Gueto, Rappin Hood e Facção,
Fazem o povo cantar com emoção
Zona Sul... Haja coração!
Dez mil pessoas numa favela, na quermesse do Campão,
Então Di Cavalcanti, Oiticica e Frida Kahlo
Têm o mesmo valor que a benzedeira do bairro
Disse que não ali o recém formado entende,
Não vou espera você ficar doente...
Cantar rap nunca foi pra homem fraco
Saber a hora de parar é pra homem sábio...
Vacilou no jab, fio, é lona!
Criolo Doido não é garapa,
A ideia é rapida mais soma.

Pode colar, mas sem arrastar,
Se arrastar, a favela vai cobrar...
Acostumado com sucrilhos no prato,
Morango só é bom com a preta de lado.

Eu tenho orgulho da minha cor,
Do meu cabelo e do meu nariz.
Sou assim e sou feliz.
Índio, caboclo, cafuso, criolo! Sou brasileiro!



Subirusdoistiozin



Subirusdoistiozin
Criolo


(Tem uns menino bom novo hoje aí na rua, pra lá e pra cá, que corre pelo certo..
Mas já tem uns também que eu vou te falar, viu.. só por Deus, viu! Ave Maria!)

Mandei falá, pra não arrastá, não botaram fé, subirusdoistiozin
O baguio é loco, o sol tá de rachá, vários de campana aqui na do campin
Má quem quer pretá, má quem qué branca, todo azulê requer seu rejuntin
Pleno domingão, flango ou macalão, se o negócio é bão, cê fica é chineizin
Cença aqui patrão, aqui é a lei do cão, quem sorri por aqui, quer ver tu cair
É, é... justo é Deus, o homem não, ouse me julgá, tente a sorte fi.

Para pa pa, para pa pa, para pa pa, para para papa (4x)

Só função no doze, na garagem um Golf, bonitão na praia de Hornet, fi
Tudo isso tem, e o apetite vai, pra bater de front, e Babylon cair
As criança daqui, tão de HK, leva no sarau, salva essa alma aí
Os perreco vem, os perreco vão, as vadia quer, mas nunca vão subir
Cença aqui patrão, eu cresci no mundão, onde o filho chora e a mãe não vê
E covarde são, quem tem tudo de bom, e fornece o mal, pra favela morrer

Uns acham que são, mas nunca vão ser
Feio é arrastar e nem perceber

Para pa pa, para pa pa, para pa pa, para para papa (4x)

Só função no doze, na garagem um Golf, bonitão na praia de Hornet, fi
É, tudo isso tem e o apetite vai, pra bater de from e Babylon cair
As criança daqui, tão de HK, leva no sarau, salva essa alma aí
Os perreco vem, os perreco vão, as vadia quer, mas nunca vão subir
Licença aqui patrão, eu cresci no mundão, onde o filho chora e a mãe não vê
E covarde são, quem tem tudo de bom, e fornece o mal, pra favela morrer

(Acostumado com sucrilhos no prato, né, moleque?)

(Enquanto o colarinho branco dá o golpe no Estado)



quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Ensinação é ineficaz

Teatro Pedagógico 08
baitasar
A pedagogia antibiótica e meritória dos tecnocratas da ensinação é ineficaz para acabar com o analfabetismo porque acaba com o analfabeto. Sob o ponto de vista da pena de morte da libertação, ela é convincente e útil, mas não considera o analfabeto porque não enxerga que antes dos conteúdos e das linhas preenchidas está a amorosidade capaz de nos aliviar um pouco do egoísmo de saber e ter mais; não considera porque não repara que o tempo voador engole a permanência, qualquer que seja o precioso momento de estar junto. A permanência é a morte. O tempo engole a morte. Tudo vira poeira nas doses letais de renúncia ao condenado analfabeto, com 6 ou 60 anos, perdido da conscientização consigo mesmo e com o outro.
A pedagogia antibiótica não sabe o que fazer com os abraços e sorrisos da suavidade derretida que farão da memória um lugar gostoso para reaparecer
—        Paulo! Você é um obstinado com esse crédito de esperança no ser humano educador.
O Paulo está de costas para o general, olha diretamente para o Acácio. Parece dizer que o amor não é paz, nem é o silêncio, é o amor que se contradiz no outro e em si mesmo. A diversidade deveria ajudar o mundo a mudar
—        Querido Acácio. Fico pensando naqueles e naquelas desesperançadas por pura teimosia. Negam a própria existência e a construção do seu teatro histórico, têm medo de narrar e não querem registrar sua biografia. Não acreditam que podem formatar a sua própria fábula, se fogem. Não se acreditam e não permitem que os desesperançados se acreditem. Jogam suas cabeças no abismo da fatalidade e do destino, se proíbem de acreditar em si, nos outros, nas outras.
O que acontece hoje seria a reunião pedagógica que sempre sonhei e nunca tive? Estou sonhando? É só para mim essa realidade
—        E o que fazer com pessoas que se julgam maiores ou menores, conforme o tamanho que imaginam do outro à sua frente?
—        Lia, estamos jogados nas águas oceânicas da vida, alguns se deixam embalar até o naufrágio na primeira tempestade, que cedo ou tarde virá. Navegam na desesperança e na aposta imoral que os ventos não mudam, não circulam, não aumentam. Juram que os vagalhões não existem. Eles não existem, não se acreditam existindo, são frutos da imaginação. Por isso, também se impedem de sonhar.
—        Professor Paulo...
—        Apenas Paulo, meu querido Arthur. Caso seja necessário usar algum título, que seja professor, até porque tio ou tia, velho ou velha, são títulos que pressupõe outros relacionamentos que também existem. Não é o nosso caso. Mas se você sentir necessidade do título, não tem problema, muito ao contrário, sinto orgulho do título: professor, substantivo próprio de quem sente orgulho pelo que faz.
O Arthur é mais um jovem que começa sua estrada de ensinar e educar aos outros e a si mesmo, nesta escola
—        Professor se o desesperançado tem medo de encontrar a verdade nos pesadelos, ele tem medo das suas fantasias; então, suas ilusões se tornam opressoras ou oprimidas?
Vejo um sorriso maroto e disfarçado que o Paulo não se apressa em desmanchar para responder
—        Eis um coração e uma mente que me parece a Academia não destruiu. Arthur, os desesperançados teimam que a esperança não existe como um ato de mudança, como um fato do cotidiano, como uma xícara com chá de hortelã. A vida para os desesperançados está fora deles, está nas pessoas e nas coisas que podem comprar.
Acredito que o destino pode ser torcido e retorcido até a dor intensa da consciência ou ficar moralmente dominado pelos desatinos do medo. Esses pensamentos me trazem as conversas no banco de madeira, à sombra da mangueira, Não acreditamos no que fazemos porque o que fazemos não vai mudar nada, Jura, Não vai mudar nada do que sempre foi, Você não acredita que existe beleza no trabalho de educar com esperança na palavra do outro que nos educa, E você jura que existe o outro miserável que nos educa
Essa é a desesperança maliciosa e ordeira. Respondi angustiada, Você é muito triste, mesmo quando ri com suas gargalhadas; existimos nos educando juntos, nas histórias vividas ora com um, ora com outra, nada é igual o tempo todo
—        Tenho certeza que o Paulo, o mais esperançado, entre nós, e aquele ou aquela mais desesperançada nesta sala não ficaria surpresa ou atônito se lhes afirmasse que o coletivo dos professores não existe no sentido pedagógico. Pelo menos, nas escolas nas quais estive nestes trinta e tantos anos de reuniões, espasmos, espantos, crises, bolos de aniversário, almoços, piadas, reclamações, licenças, abandonos, risos e lágrimas. Raramente vi ou ouvi planejamento e sentido coletivo nas ações pedagógicas. Escutei muitos sonhos, presenciei muitas discussões e tentativas, que não passaram dos desejos de uns poucos e poucas. O que nos impede de existirmos como um coletivo de professores por certo não é a falta de espaço para discussões pedagógicas.
—        Isso não é verdade! Na minha outra escola não tem espaço para discussões pedagógicas.
—        Tá bem, Acemira. E qual é a tua contribuição para as discussões aqui? Mas o que dizer daquelas escolas que têm horários sistemáticos semanais, quinzenais ou mensais, para reuniões pedagógicas e não conseguem um sentido pedagógico coletivo? Aqui, não estou me referindo ao senso corporativista, sentido de classe, mas ao fazer e pensar educação coletivamente, incluindo, especialmente, funcionários, pais, mães, alunos e alunas. Eles têm o direito de nos dizer qual a educação que desejam, para si, para seus filhos e filhas, ou não têm?
Bem assim, oramos o discurso pedagógico do alto do púlpito catedrático para mostrar que somente os professores e as professoras entendem sobre educação escolar. E o mínimo que esperamos é que eles eduquem seus filhos e filhas para que possamos ensinar-lhes com nossos velhos métodos os conteúdos programáticos
—        Os pais não têm nada para nos dizer!
—        Será, Cabayba?
—        Quem está com o discurso da desesperança é você, Marko!
—        Cabayba, não é somente a esperança. Mas, por certo, ela é um sentido muito forte que me moveu e move, em mais de trinta anos de reuniões, na maioria, catarses de autoajuda ou autodestruição, negação do aluno que não se molda à nossa imagem e semelhança.
O melhor da aposentadoria será não participar das reuniões. Talvez tenha sentido esperar por outras, como esta, com o Paulo e o Marko juntos num poema pedagógico. Queria correr atrás de uns goles de chimarrão. Não saio. O Paulo vira-se todo, nos olha de frente
—        Querido Marko, invejo quem na sua esperança mobiliza a realidade à sua volta na busca da transformação. Não sou queixoso. Minha inveja não é invejosa, não é melancólica, á amorosa. Precisamos pensar e fazer com esperança. Não nos deixar invadir pela desesperança do mundo, do outro, e a nossa própria. O mundo a todo instante nos impõe desapontamentos, desencantos, frustrações, as desilusões do cotidiano. E apesar disto, homens e mulheres, jovens e velhos, criam com as mãos e coração o mundo da esperança, da igualdade social, do pensamento livre, da voz que não se cala, tagarela.
Eu sei, aprendi com você que não existe nada pior que a alma submetida ao silêncio pelo medo. A escola brilha de humanidade amorosa quando se mantém atenta à diversidade, às diferenças, para não criar guetos ou estufas, próxima do verdadeiro combate corpo a corpo. A escola ética e verdadeira é aquela que luta contra um mundo excludente e falso; não valoriza o ter mais, nem esconde as mentiras do consumo desnecessário e destrutivo que amaldiçoa a nossa necessidade ontológica de ser mais. Quero parte da escola que antes de pensar o que vai ensinar para suas avaliações cartesianas – aprovado/reprovada – discute o que existe, se transforma na fecundidade frágil entre o certo e o errado
—        E o destino?
—        Por certo, não é o destino, meu jovem. Qual é o seu nome?
—        Aécio.
—        Aécio, os atos e omissões de homens e mulheres que acreditam em si, em vós, e também em nós, renovam o fazer do cotidiano, pretendem incinerar a neutralidade estúpida, curta de inteligência, orelhuda, mal-intencionada.
Silêncio
—        Blá, blá, blá... somos o exército da salvação.
—      Com licença. Eu sou o Aécio, estagiário. Acho que poucos me conhecem. O professor Arthur, talvez um mais ou outros. Não sei se tenho direito de participar, afinal, sou o estagiário, mas gostaria de fazer uma ou duas observações sobre o comentário da professora: o exército da salvação...
—        Cabayba. O nome da professora é Cabayba, menino.
—   Ok, professora Cabayba. Peço desculpas, mas assim como poucos me conhecem, também não conheço a todos. Mas enfim, eu acho que é indispensável à esperança o coletivo. Não sei se as pessoas veem nos professores um exército de salvação que marcha, marcha e marcha, perde seus soldados, forma novos exércitos para marchar e marchar, também não sei, se nos vemos soldados dessa massa de seguidores tarefeiros, tampouco posso afirmar se individualmente conseguimos salvar nossa existência nesse contingente salvacionista. Nem tenho certeza da existência de um outro exército: a legião do extermínio. Mas acho que se os professores não se constituírem no coletivo, serão facilmente cooptados e aliciados pelo exército da desesperança, do desamor, do desânimo, das lamúrias, dos mal-intencionados. De modo caricatural pode-se dizer que se criam as condições para uma grande escola de gritos e silêncios.
Silêncio.
A ousadia da juventude é sempre bem-vinda. O garoto não parece assustado com aqueles olhos arregalados. Não o reconheci com os cabelos crespos presos num cocó, o bigodinho raladinho, os alunos de alguns anos atrás cresceram, esse voltou. Será que a esperança consegue afastar o cansaço? Como organizar um coletivo com visões de mundo tão diferentes
—        Aguinaldo, chega dessa conversa. Eu quero ver isso tudo na prática.
—        Na prática, Renata, só produzimos um imenso vazio. Eu perco minutos preciosos das minhas aulas falando sobre as maneiras, ou melhor, as nenhumas maneiras que têm. Falo, falo, falo, e nada. Entra por um lado e sai pelo outro.
Abro a boca para perguntar à Cabayba ou à Renata se elas já leram alguma coisa sobre educação bancária, mas me contenho, não quero contribuir para provocar o silêncio.
A Acemira não se conteve, aproveitou o meu silêncio
—        Chego a atingir os limites do aconselhamento: Quem não quer estudar, fique em casa! Não precisa vir!
Eis quando a ingenuidade deixa de ser inocente e passa a ser mal-intencionada.
Esperar que o vazio mal-intencionado venha a ser preenchido pela ingênua esperança que vem carregada pelos braços, suor e sangue dos outros é também querer ser virtuoso pela virtude do outro. Quando nos imaginamos em movimento, na verdade, estamos de braços cruzados. Uns goles de chá de maconha, por certo, nos deixariam os sentidos mais relaxados para acreditar, não apenas no que vemos, mas também naquilo que desconhecemos, que não se está enxergando. Uns goles de jazz, samba, ou bossa-nova, talvez nos devolvam sentidos adormecidos. Eu já preferi doses cavalares de rock.

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Leia também:

TP 07 - A esperança das manhãs, tardes e noites perfeitas


TP 09 - Já desencarrilhei e louqueei

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

histórias davóinha: casarão canela preta 01cp

casarão canela preta



sempre chega a vez de sentá pra conversá
Ensaio 01cp – 2ª edição 1ª reimpressão




baitasar





davó descansou os olhos e abriu um vazio no coração de cada um dos seus amores

desocupou-se

foi mais um aviso aos inquilinos da vida: não tem nada para sempre. mais dia menos dia chega à vez de sentar para conversar sobre a denúncia vazia, a quebra do contrato sem justificativa alguma. não tem outro jeito de ser... há de chegar o tempo de virar lembrança. davó ensinou que as pessoas podem escolher as lembranças do desprezo ou da bajulação para deixarem espalhadas pelo mundaréu: ela escolheu as lembranças da amorosidade, mas sabe que não pode mudar os comentários da memória, nem os olhares das lembrança na vida que passou, Mifioneto, é preciso esperá té qui tudo se perca nas miudeza do pó da terra. O vento vai fazê varredura, a chuva fica encarregá da lavação e o sol queimá tudo té fazê o roçado novo brotá. É assim mesmo, enquanto uns vai... otros vem. O roçado novo toma o lugá do plantado mais antigo, té qui tudo vira pó ou barro pru dono de tudo. O que não precisa é tê descuido com a vida pruqui depois qui ela se vai, ela se foi, não adianta choro nem vela.

uma doce loucura de davó

é simples assim, tudo que é sangue bom da davó carrega os seus conselhos de aviso, a boniteza de ser na vida o que se precisa viver. uma vida com os mistérios da poesia, o encantamento das memórias, os segredos do silêncio, o formigueiro dos cochichos, os xingamentos dos gritos, olhares e abraços, despedidas e chegadas, nascimentos e mortes

ela estava deitada. quieta na cama dos seus amores. parecia que iria abrir os olhos para comentar os lamentos e falar mal das cerimônias preparadas, As vista não carece de se enchê com tanta lamentação do desgosto, é preciso dizê da vida vivida e do contentamento, mais com tanto soluço de choro davó de ocêis vai parecê mais triste qui alegre. Isso não é bão pra modo de fazê a separação da vida dessa carcaça velha. Quero avisá qui faço gosto de encontrá os mais velho.

as tiazinhas já tinham providenciado a lavação da davó com panos e óleos. os cabelos brancos tomaram a forma de muitas tranças, embelezadas por contas coloridas. a cabeça da davó estava livre e os cabelos trançados. cuidaram de não desmanchar o sorriso de amor e paciência na moldura da pele sem rugas. era davó fazendo a passagem do seu feitio. filhas e netas arrumavam um corpo desabitado. o jeito doce e entoado que rezava conversas de alegria com os netos e as netas tinha partido. eu acho que só tinha nele as nossas lembranças davó. não tinha como saber, não tinha como duvidar onde tava davó

quando vestiram davó com um pano grosso e sem graça, sem a cor da alegria, fiz reclamação. disse que davó tinha que ter vestidura fúnebre com mais boniteza

Ela é muito vaidosa.

a tia Vanda respondeu com voz de alicerce que davó foi muito vaidosa. e eu lhe disse que enquanto ela não voasse das asas da minha memória continuava a ser o que foi

É ordem da nêga Laetitia, davó davó da mãinha. Esse jeito simples de vestí é pra modo do Capitão não se perdê de encontrá davó. Ela qué sê vestida pra sê achada.

depois, sentou na cadeira de balanço e pegou-me no colo. sorriu com a latência dos lábios carnudos e chorou a lamentação com as vistas. subi meu olhar até a tia e balancei no seu pescoço. até pertinho da sua lamentação. então, consegui beijar as águas dos olhos. não desisti de reclamar do modo de vestir davó

Tia, os espíritos não podem ver o modo de vestir da avó, ela desocupou da vida e desse corpo, São os olhos de quem fica que veem davó vestida com tristeza, Queria mais contentamentos na apresentação de despedida davó.

Ah, fiudileto, a minha vista só enxerga tempo muito atrás. As minha lembrança da mãinha tem cantoria, aroma da feijoada, cheiro da boca, gosto do beijo, as vista doce, as mão carinhosa, os cabelo arrumado, perfumado. O tempo só volta nas minha vista. A mãinha agora não é mais nossa. Ela já fez despedida antes de perdê o último suspiro.

queria contentar a tia, mas não conseguia manter a secura da vista desarmada. cobiçava a quentura daquele abraço que só as mãinha sabem exagerar. coloquei minha cabeça em seu peito. fechei os olhos, precisava descansar as vistas de vê davó morta. sentia os dedos da tia enfiados no meu lugar de orgulho: o cabelo duro. escutava sua voz sossegada, Fumaça, ocê lembra da vez que tu mais o Tigão, que o Espírito dos Mais Velhos tenham o moleque junto e protegido, deram fumo de corda que não era o fumo de fumá da mãinha?

sorri com as vistas, mas a lembrança do Tigão me fez mais quedo. as duas tristezas se juntaram. era muita saudade junta, muita pergunta sem resposta. davô João não sabia nem nunca confirmou que sabia, mas tinha desconfiança, Fumaça, quando terminô é porque terminô. 


a tia tinha cogitativo de mais confiança, tentava explicar no que acreditava, Os espírito se junta depois da separação das carcaça e senta no chão, na volta da fogueira. Uns esfrega as mão, otros toma um licô da cachaça. Tem os qui caminha e faz reboo com os pé, otros só arrasta daqui pra lá, e de volta, sem zunideira. Os em pé tá esperando a vez de sentá pra conversá. Num tem pressa nem lamentação, eles sabe qui acabô o tempo das providência, chegô o tempo das conversa e do batuque com os antigo de bem antes.

eu não sei de saber bem confirmado, mas gosto de pensar que o Tigão está no colo davó levando xingamento, um pouco por causa do descaso que deu aos aconselhamentos da preta velha, outro pouco porque perdeu a oportunidade de viver um tempo grande de vida. olho os pés davó, ela deve tá guardando o meu lugar de ouvir

Eu lembro, tia...

Lembro de ouví a mãinha chamá os dois moleque. Pasmada com a malcriação!

concordei com a cabeça, eu e o Tigão parecíamos dois guris cagados de medo, A tia sabe como davó sabia tudo e muito mais.

as lembranças da voz davó estava tão viva, mas as nuvens que povoam as lembranças já se ajuntavam

Mifiuneto, senta aqui nos pé davó e escuta com atenção. Sabê escutá é tê muita sabedoria, dá mais mão de autoridade qui sabê falá, queria conseguir lembrar tudo que davó disse, mas as memórias vão ficando embaraçadas com a tristeza, até parece que uma atrapalha a outra. davó gostava de tá sentada fazendo balanço. eu namorava de saber que davó ficava sentada se balançando

Quando ela contô essa história do fumo de corda, ria de tê tosse e engasgá. Só de lembrá chorava de tanto rí, ela me chamou num canto do quarto e disse: Minha Vandinha, tudo qui é gente tinha qui fumá o baseado desse fumo, uma vez, uma outra vez, rí da alucinação de oiá a própria imbecilidade. Mifia, pode creditá que esse mundo ia sê outro.

Tia...

O que ocê qué, guri?

Eu e o Tigão passamos um tempo danado caminhando levinho, escondidos nas frestas. A gente não sabia da aprovação davó, não sabia que ela tinha gostado. Até arrumava mais daquela corda.

Isso prova que ocêis não fazia conhecimento davó de ocêis. Tê medo não é conhecê.

passei a noite no aconchego do colo da tia. a luz amarelada sobre a cabeceira da cama foi testemunha da vida davó. ela lhe reconhecia a utilidade, sempre foi agradecida, Essa luz do tipo fusquifusqui, só mostra o qui é preciso mostrá, tá favô do amô.

até que chegô noite de não deixar o sono davó na escuridão

nos primeiros lamentos do dia, abri os olhos devagarinho. fiquei esticado num incontrolável bocejo. uma das mãos na boca, a outra esfregava os olhos. deslembrei que davó tinha desocupado a vida até que o cheiro da morte me entrou e revelou o homem que eu era. o meu pertencimento. o calor do colo me enrolou na preguiça

Bom dia.

Bom dia, mifiu.

a penumbra no quarto davó parecia mais assombreada que iluminação disfarçada em velório. descobri que aquilo já era um velório. a luz amarelada se mostrava cansada com a missão de vigiar defunto. eu estava exausto. cheguei querer que aquelas despedidas acabassem logo. no instante seguinte, precisei pedir perdão pra davó, ela havia de entender

E davó? — perguntei como se estivesse recém chegado para visita de cortesia

Já se foi...

Pra onde? Desculpe, eu sei que a pergunta é chata e boba, como a tia havia de saber...

Se foi pro lugá de morá com sua gente, com o seu Capitão.

fiquei desapontado com as respostas da tia, queria saber mais, queria se tratado com adulto

A tia não se explica de uma vez só, parece que espera a pergunta pra responder quase nada. Não é justo deixar a solução escondida. Logo a tia que nunca foi de obedecer davó.

Não diz bobagem, moleque. Sua tia esquecia de obedecê, mas nem sempre. Só vez que outra. Isso é bem diferente de sê rebelão. O meu atrevimento nunca foi com davó, sempre foi com minha mãinha.

Então, por que não diz o que aconteceu? Onde tá davó? A cama esvaziou.

Ganhô encantamento quando noiteceu e foi alimentá a vida na outra vida. Ou não quis esbarrá no amanhecê e foi embora com o Capitão. Ocê escolhe... Eu prefiro acreditá que o amô daqueles dois conseguiu se combiná e ressuscitô pra vivê outra vida longe dessa.

Onde já se viu levantar depois de morta? Davó não devia tá no seu ajuizamento das ideias.

O neinho devia tê ficado vigiando a noite, se queria vê pra tê certeza.

O colo da tia foi mais quente que o colo da morte.

Ocê não creditô no acreditá davó, nem lembra o que sonhô. Vive mais triste que a própria dô. Ocê precisa sonhá que o amô chegô de vez pra davó.

Como a gente faz um enterro sem davó presente? Os tiuzin tão esperando pra vê davó de corpo pra visitação. Não sei dizê do acontecido.

Não precisa enterrá o que não morreu. Não carece de se preocupá com os irmão, eles sabia que a mãinha não ia ficá. O que ela queria deixá ela deixô... as lembrança das palavra. Pediu pra ocê não esquecê que a vida vai vivê e não vai fazê ocê sonhá. O sonho é d’ocê, não é da vida.

estava muito cansado, pareceu que levei uma surra, queria voltar para dormir e sonhar da vida até acordar depois que a vida tivesse passado




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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Fatos que mudaram a história do Rock (08)

Phil Spector



Ele produz uma das melhores músicas de todos os tempos e é forçado a se aposentar


Data: 14 de março de 1966, estúdios Gold Star, Los Angeles




Trechos do livro 50 fatos que mudaram a história do rock...


"A magia terminara. Todo mundo sabia disso, até mesmo o homem responsável por torná-la possível. Sim, já no início de 1965, Phil Spector sabia que seus dias estavam contados. 'Eu lembro que estávamos no estúdio produzindo Born to be Together, das Ronettes', disse o amigo de longa data de Spector, Jack Nitzsche. 'Durante a reprodução, Phil se aproximou e disse: - Está tudo acabado. Acabado. O lance não existe mais. O entusiasmo se foi. Tínhamos feito aquilo tantas e tantas vezes..."

" Spector revelou ao mundo que sua intenção era criar 'sinfonias adolescentes'. Durante um período glorioso, foi exatamente isso que ele fez, mas agora seu sucesso completara seu curso."

" Quem queria dançar ao som de Phil Spector quando Bob Dylan detinha o segredo do mistério da vida?"

"... decidiu ir para o tudo ou nada... Ele criaria o compacto definitivo de Phil Spector, uma gravação que ficaria como a apoteose de tudo por que lutara."

"... numa canção intitulada 'River Deep - Mountain High'."

"Quando Tina chegou para gravar, Spector contava com vinte cantores para o coral. Desacostumada a tanta pompa musical, a jovem cantora ficou completamente confusa e não conseguiu cantar."


The Ronettes - Be My Baby




Baby I Love You




The Crystals - Da Doo Ron Ron




Then He Kissed Me




Ike & Tina Turner - River Deep Mountain High (original 1966)



River Deep Mountain High 1971 (including intro)



Rio Profundo, Montanha Alta

Quando eu era uma garotinha
Eu tinha uma boneca de pano
A unica boneca que eu tinha

Agora eu te amo do mesmo jeito
Que eu amei aquela boneca de pano
Mas só agora meu amor cresceu

E isso fica mais forte, de todas as formas
E fica mais profundo, deixe-me dizer
E isso fica maior, a cada dia

E eu te amo, oh meu Deus
Rio profundo, montanha alta
Se eu perder você, eu choraria
Oh eu te amo baby
Baby, baby, baby

Quando você era um garotinho
Você tinha um cãozinho
Sempre te seguindo de perto

Vou ser tão fiel quanto aquele cãozinho
Eu nunca vou te deixar pra baixo

E isso fica mais forte, como um rio flui
E isso fica maior, só Deus sabe
E isso fica mais doce baby, enquanto cresce

E eu te amo, oh meu Deus
Rio profundo, montanha alta
Se eu perder você, eu choraria
Oh eu te amo baby
Baby, baby, baby

Eu te amo baby como uma flor ama a primavera
Eu te amo baby como um pássaro ama cantar
Eu te amo baby como um estudante ama seu animal
Eu te amo baby rio abaixo, montanha acima

(Baby, baby, baby)

Eu te amo, oh meu Deus
Rio profundo, montanha alta
Se eu te perdesse, eu choraria
Eu te amo baby
Baby baby baby

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Outras histórias:

THE MONKEES: a primeira boy band

Keith Richards e Mick Jagger são presos

domingo, 16 de fevereiro de 2014

2112

Rush







Live at Capitol Theatre, DEC 10, 1976 (Passaic, NJ)


2112
I. Abertura 00:00

E os humildes devem herdar a terra

II. Templos de Syrinx 04:33

Nós temos tomado conta de tudo
As palavras que vocês ouvem as canções que cantam
As imagens que dão satisfação aos seus olhos

É um por todos e todos por um
Nós trabalhamos juntos, filhos da mesma terra
Nunca precisamos perguntar como ou por quê

Nós somos os Sacerdotes dos Templos de Syrinx
Nossos grandes computadores
Preenchem os salões sagrados
Nós somos os Sacerdotes dos Templos de Syrinx
Todas as dádivas da vida
São mantidas dentro de nossas muralhas

Olhe em volta para este mundo que fizemos
Igualdade é o nosso lema
Venha e junte-se a Fraternidade de Homens
Oh, que mundo lindo e feliz
Deixe as bandeiras se estenderem
Segure a Estrela Vermelha orgulhosamente ao alto

Nós somos os Sacerdotes dos Templos de Syrinx
Nossos grandes computadores
Preenchem os salões sagrados
Nós somos os Sacerdotes dos Templos de Syrinx
Todas as dádivas da vida
São mantidas dentro de nossas muralhas

III. Descoberta 06:45

O que pode ser este estranho aparelho?
Quando eu o toco, ele emite um som
Ele tem cordas que vibram e geram música
O que pode ser esta coisa que encontrei?

Veja como ele canta como um coração triste
E alegremente grita seu sofrimento
Sons que se formam altos como uma montanha
Ou notas que caem suaves como chuva

Mal posso esperar para compartilhar esta nova maravilha
Todas as pessoas verão a sua luz
Deixá-las todas fazerem suas próprias músicas
Os Sacerdotes louvarão meu nome nesta noite

IV. Apresentação 10:14

Eu sei que isto é muito incomun
Vir perante vocês assim
Mas eu encontrei uma maravilha antiga
Eu pensei que vocês deveriam conhecer

Ouçam a minha música
E escutem o que ela pode fazer
Há algo aqui tão forte como a vida
Eu sei que ela tocará vocês

Sim, nós conhecemos, não é nada de novo
É só perda de tempo
Nós não precisamos de coisas antigas
O mundo está indo bem

Outra ninharia ajudará a destruir
A raça antiga do homem
Esqueça sua fantasia boba
Ela não se encaixa no plano

Eu não posso acreditar no que vocês estão dizendo
Essas coisas simplesmente não podem ser verdade
Nosso mundo poderia usar esta beleza
Pensem no que poderemos fazer

Ouçam a minha música
E escutem o que ela pode fazer
Há algo aqui tão forte como a vida
Eu sei que ela tocará vocês

Não nos incomode mais
Temos nosso trabalho à fazer
Pense nos prejuízos
Que utilidade eles têm para você?

Outra ninharia ajudará a destruir
A raça antiga do homem
Esqueça sua fantasia boba
Ela não se encaixa no plano

V. Oráculo: O Sonho 13:56

Eu vaguei para casa por ruas silenciosas
E caí em um sono profundo
A saída para reinos além da noite
Sonho, você não pode me mostrar a luz?

Eu paro no alto de uma escada espiral
Um oráculo confronta-me lá
Ele me guia por anos-luz distantes
Através de noites astrais, dias galáticos

Vejo os trabalhos de mãos talentosas
Que encantam esta estranha e maravilhosa terra
Eu vejo a mão do homem levantar
Com a mente faminta e olhos abertos

Eles deixaram o planeta há muito tempo
A raça antiga ainda aprende e cresce
Sua força cresce com um forte propósito
De reivindicar o lar ao qual pertencem
Voltar para romper com os Templos...
Voltar para mudar

VI. Solilóquio 15:56

O sono ainda está em meus olhos
O sonho ainda está na minha cabeça
Eu suspiro e sorrio triste
E deito um instante na cama
Quisera que isto pudesse acontecer
Não sumir como todos os meus sonhos

Penso como minha vida poderia ser
Em um mundo como eu vi
Eu não acho que posso suportar
Suportar esta vida fria e vazia
Oh...não

Minhas vitalidades estão baixas nas profundezas do desânimo
Meu sangue derrama.

VII. O Grande Final 18:17

Atenção todos os Planetas da Federação Solar
Atenção todos os Planetas da Federação Solar
Atenção todos os Planetas da Federação Solar
Nós assumimos o controle
Nós assumimos o controle
Nós assumimos o controle.



The Spirit Of Radio (From "Snakes and Arrows")



O Espírito Do Rádio

O dia começa com uma voz amigável,
Uma companheira invisível.
Toca uma canção bem sutil
E a música mágica faz seu humor matinal

Fora de seu caminho, ao alcance da estrada aberta,
Há mágica nos seus dedos
Para o Espírito sempre persistente,
Sem muito contato em sua feliz solidão.

Ondas invisíveis no ar soam com vida
Antenas luminosas cheias de energia
Resposta emocional em comprimento de onda estacionária
Trazendo um presente sem preço, quase de graça

Toda esse maquinário fazendo música moderna
ainda pode ser sentimental.
As paradas de sucesso não são tão frias, é apenas uma questão
De sua honestidade, sim, de sua honestidade.

Eu prefiro acreditar na liberdade da música.
Mas prêmios pomposos e compromissos
Intermináveis acabam com a ilusão da integridade.

Ondas invisíveis no ar soam com vida
Antenas luminosas cheias de energia
Resposta emocional em comprimento de onda estacionária
Trazendo um presente sem preço, quase de graça

Para as palavras dos lucros que estão escritas na parede do estúdio,
Sala de concerto
Ecoam com os sons do vendedor.

(2x)
Do vendedor



Far Cry (From "Snakes and Arrows")




Grande Diferença

Cães Selvagens e loucos perambulantes
Latindo para estranhos e falando línguas
O fluxo e refluxo da sorte como a maré
Mudanças elétricas estão carregando o jovem

É uma grande diferença do mundo que pensávamos que herdaríamos
É uma grande diferença do jeito que pensávamos que iríamos compartilhá-lo
Você quase pode sentir a corrente fluindo
Você quase pode ver os circuitos estourando

Um dia me sinto como se estivesse no topo do mundo
E no seguinte ele está desabando sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar
Um dia me sinto à frente da roda
E no seguinte ela está rolando sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar

O redemoinho da vida de fé e traição
A raiva que surge, some, e se repete
Passos lentos no horizonte negro
A lua cheia nascente estende-se prateada aos seus pés

É uma grande diferença do mundo que pensávamos que herdaríamos
É uma grande diferença do jeito que pensávamos que iríamos compartilhá-lo
Você quase pode sentir a corrente fluindo
Você quase pode ver os circuitos estourando

Um dia me sinto como se estivesse no topo do mundo
E no seguinte ele está desabando sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar
Um dia me sinto à frente da roda
E no seguinte ela está rolando sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar

É uma grande diferença do mundo que pensávamos que herdaríamos
Você quase pode ver o círculo crescendo
Você quase pode sentir os planetas incandescentes

Um dia me sinto como se estivesse no topo do mundo
E no seguinte ele está desabando sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar
Um dia me sinto à frente da roda
E no seguinte ela está rolando sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar

Um dia um vôo através de uma fenda no céu
E no seguinte ele desaba sobre mim
Eu posso voltar
Eu posso voltar...