parábolas de uma professora
acertou, ele mesmo...
Ensaio 017B – 3ª.ed
baitasar e paulus e marko e kamilá
não há isenção em nada do que fazemos; não acredito em destino, mas na escolha de menosprezar ou não as pessoas, o monólogo da dominação é tentador, ele se repete não como se a história estivesse se repetindo, ele se replica como erros que não conseguimos evitar; assim, temos nazistas e fascistas revigorados em nosso convívio, parecemos sempre perdendo as vidas humanas dos sonhos para vaidades e intolerância
O momento merece uma pequena reflexão se o senhor me permite, o Paulo continua disposto a ir ao passado para voltar ao presente, não existe o agora sem o que aconteceu antes, a Educação Moral e Cívica e a OSPB surgiram em contextos de pura “ideologia neutra”, portanto, jamais foram, ou como requer o querido professor, nunca foram disciplinas neutras. Inclusive, no período da ditadura cívico-militar, foram utilizadas para diminuírem o ensino da História e da Geografia, que tinham uma posição de criar um pensamento crítico nos alunos e alunas. Alguma similaridade com os dias atuais? Uma cópia autenticada do passado da educação e a desconstrução do pensamento crítico.
E vocês acreditam nessa baboseira de direitos políticos e a identidade que o trabalho dá ao trabalhador ralé? O pobre se serve do trabalho para sobreviver! Não está interessado em direitos políticos, essa gente só quer comer, mesmo que sejam ossos, farelo ou pés de galinha! Sobreviver, essa é a urgência!
Mas então, Cabayba, não entendo essa sua contradição, esse seu discurso contra a alimentação na escola...
Eu não sou contra, apenas afirmo que a prioridade dessa gente não é estudar, é comer! É quando concordo com o Rodolfo, a identidade com o trabalho é a identidade da sobrevivência, “Não gosto do que faço, mas preciso levar o pão pra mesa”, a Cabayba parecia ter um esquematismo de nuances de explicações ou ausências de desculpas e muitas acusações, e me respondam, qual a memória que os filhos da fome herdam e reconstroem em suas vidas?
talvez, uma memória que os filhos e filhas da abastança desprezem, ao mesmo tempo que pregam a farsa do amor ao trabalho, o lugar em que alguns exploram muitos e muitas enquanto se fortalecem sobre os sobreviventes
É disso que eu falo, o Rodolfo parecia um morto que se sucede em camadas de vivos, não existe uma conspiração. É isso, e pronto. O circo, o pão e bundas cantando bastam para ficarem bestificados, é uma apatia coletiva de violência incorporada ao nosso dia após dia. Qual a saída? A escola? A teimosia? Eu desisto, vou ficar no meu feijão e arroz, quer estudar? Estuda. Não quer? Tudo bem...
Um minuto, por favor. Gostaria de continuar, aqui não vou mencionar as caras e caretas que vi sendo jogadas para o Paulo
Por favor, professor Paulo, continue. Se possível seja mais objetivo, o fio da navalha de administrar uma escola democrática, um desafio que nos salva? talvez
Obrigado, professora Rachel. Vou tentar ser mais direto. Não quero parecer enfadonho nem melodramático, muito menos repetitivo, já sendo, mas não acho que possa ser tão sintético. De qualquer maneira, quero fazer uma pergunta a todos e todas, nesta sala de aula. É à toa que retiram, novamente!, a Filosofia das escolas públicas? É ao acaso que o tamanho das horas da História e Geografia diminuíram para alguns minutos enquanto aumentam as horas da matemática e português?
É claro que não, Paulo!, respondi intempestiva e, imediatamente, senti um rubor aquecer meu rosto, ainda não rompi a barreira com o poder, mais ou menos como deixar de escrever por ter medo das vírgulas, tenho pavor das vírgulas
Obrigada, Anita. Devido ao tempo, vou tentar esclarecer esse desejo abastado de ver e querer a escola pública como parte desse circo, já citado pelo professor Rodolfo. Lá atrás, nos anos 60, não queriam pensamento crítico, e agora, também... não.
o Marko não se contém e solta o grito que trás engasgado, tenho vontade de gritar junto
Acordem! Esse patriotismo de arrepios interessa a quem? A liberdade só é liberdade quando é para libertar os explorados da exploração e da fome. Esse patriotismo que luta por essa causa de menos História e Geografia – e mais português e matemática –, menos pensamento e mais trabalho, trabalho, trabalho, pensa que pensa, mas quem pensa é o dono do dinheiro, do trabalho e da informação. Eu concordo com a professora Cabayba, a fome é ideológica, trazer, novamente, o Brasil para o mapa da fome é ideológico, mas a professora precisa se decidir se luta contra a fome, ou não. O patriotismo e o nacionalismo sempre são discursos ideológicos, mesmo que quem os use não diga, “Ame o Brasil do nosso jeito, ou deixe-o!”
Isso, Marko. Se você me permite, esse é o ponto em que eu quero chegar. Lembram? Esse foi um dos principais discursos da ditadura civil-militar. Pois é, podemos perguntar aos exilados ou as famílias dos desaparecidos e mortos pelos militares sobre o seu patriotismo, talvez, essas pessoas tenham outra visão de amor pelo país, mas infelizmente não tiveram chance de ver esse amor reconhecido. Aliás, aulinha grátis de História: o nacionalismo também foi um dos principais discursos utilizados por Hitler! Também por Vargas durante a ditadura do Estado Novo. Ah, também foi usado durante o Brasil Império, num contexto de escravização e tentativa de branquear a população, por acharem que negros e indígenas estavam “atrasando o País”, sabe o que fizeram? Trouxeram imigrantes europeus para criarem uma “Nação de Verdade”! Uma nação branca e elitista! Só alguns exemplos históricos, queridos professores e professoras, sobre a importância de desvelar esse discurso nacionalista e patriótico anticorrupção. A história não se repete, apenas cometemos os mesmos erros, é simples. A gravidade desse momento exige denunciar que os arrepios e bandeiras deste patriotismo nacionalista nunca foi neutro ou bonzinho, mas acredito que os colegas e as colegas já sabiam disso tudo, não é?
o grande susto do professor Rodolfo foi encontrar alguém que já sabia o que ele escondia debaixo do seu colchão, uma visão distorcida dos fatos reais, uma ficção onde não haveria vida além da vida dele e seus iguais, um mundo de fingimento ético, cultural e social, um faz de conta da sua bravura desperdiçada nos almoços da mesa grande, e na tardinha, à volta para casa, entre acomodado e revoltado por ter que retornar amanhã, um mormaço de resmungões reprimidos, até o dia que pudessem levantar à sua moda o colchão grotesco das maldades genocidas do bem
Não podemos mais amar o nosso País e querer o melhor para Ele?
Claro, Rodolfo. Podemos e devemos, respondeu o Marko, afinal, o país somos todos e todas nós, não é mesmo?
E desde quando reproduzir Hinos e Símbolos da Pátria virou tempestade?
Não virou, professor. O que discutimos é a apropriação de um discurso histórico de ficção para uma plateia passiva e alheia aos dramas do passado, reproduzindo hinos e símbolos na intenção de apagar a diversidade, querendo um único tipo de nação, isso é extremamente perigoso. Aliás, sabe quem deve adorar essas disciplinas de OSPB e Moral e Cívica? Isso mesmo... acertou, ele mesmo... lord voldemort
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