Oquê
Reginaldo Prandi
Oquê surge do fundo do mar
No
princípio, Olocum reinava só no mundo.
Olofim
fez o mundo de água e Olocum o governava.
No
princípio, tudo era o mar, tudo era Olocum. E Olofim andava entediado com a
vastidão sem fim das águas. Foi então que Oraniã, com a força que lhe dera
Olofim, fez surgir do fundo do oceano o primeiro monte de terra, a primeira
colina sobre as águas, a montanha Oquê.
Oquê,
que quer dizer montanha na língua dos antigos, surgiu das profundezas dos mares
para o prazer de Olofim e desde então, além das águas, passou a existir a terra
de Oquê.
Assim
nasceu Oquê, o orixá do monte, e sobre o monte a vida do homem foi possível,
porque antes estava tudo submerso e todo o poder era do mar, de Olocum.
Logo
depois, tendo o homem já se espalhado na Terra, Olofim-Olodumare reuniu os
demais orixás em cima de Oquê e indicou a cada um onde seria seu domínio nesse
mundo novo. Os orixás tornaram-se então muito poderosos, mas muitos daqueles
que vieram depois dos orixás se esqueceram de Oquê.
Sem
Oquê nenhum dos orixás teria podido fazer nada e é por isso que sempre se deve
fazer oferendas a ele. O que aconteceria se Oquê voltasse para o fundo das
águas e deixasse Olocum dominando o mundo sozinha? [91]
Oquê salva seus súditos dos
invasores
Logo
no começo do mundo, quando toda terra era plana, Oquê era o rei de um pacato
povo que habitava uma feliz aldeia. Um dia um feroz exército estrangeiro veio
em direção à cidade de Oquê.
Por
onde passavam, os invasores matavam todos os que encontravam, não poupando
homens, mulheres ou crianças. Destruindo, saqueando e incendiando tudo, os
inimigos já estavam prestes a alcançar as portas da cidade.
Nem
Oquê nem seu povo tinha armas.
O
rei Oquê foi à casa do babalaô em busca de conselho. Fui recomendado a ele que
fizesse um ebó, que deveria colocar
nos quatro cantos da cidade. Assim fez Oquê e ficou esperando, sentado em seu
trono bem no centro da praça, com todo seu povo reunido silenciosamente em
torno dele.
Quando
os invasores chegaram bem perto da entrada da aldeia, ouviu-se um estrondo
surpreendente. A terra tremeu e se agitou. Oquê foi crescendo e crescendo, até
numa montanha transformar-se, levando consigo, no seu cimo, todo o seu povo. Os
inimigos ficaram lá embaixo e o povo de Oquê no alto da montanha em segurança.
Agora
a Terra já não era mais uma vastíssima planície. Morros, colinas e serras
faziam parte deste mundo. [92]
_____________________
Leia também:
XI – Mitologia dos Orixás : Orô [89] [90]XIII – Mitologia dos Orixás: Nanã
Reginaldo Prandi, paulista de Potirendaba e professor
titular de sociologia da Universidade de São Paulo, é autor de três dezenas de
livros. Pela editora Hucitec publicou Os candomblés de São Paulo, pela Edusp, Um sopro do
Espírito, e pela Cosac Naify, Os príncipes do destino. Dele, a
Companhia das Letras publicou também Segredos guardados: orixás na alma
brasileira; Morte nos búzios; Ifá, o Adivinho; Xangô, o
Trovão; Oxumarê, o
Arco-Íris; Contos e lendas afro-brasileiros: a criação do mundo; Minha querida
assombração; Jogo de escolhas e Feliz Aniversário.
Prandi, Reginaldo.
Mitologia dos Orixás / Reginaldo Prandi; ilustrações de Pedro Rafael. - São
Paulo: Companhia das Letras, 2001.
Nenhum comentário:
Postar um comentário