Ensaio 14B
baitasar
Josino
chegô cansado, já ia tarde o fim do dia. Foi direto ao porão da casa dos
lampião, precisava dá jeito no descanso da juntura dos ossos. Não achô na sua
vontade, e, por certo, nem no capricho do padre, nenhuma necessidade de dizê da
sua chegada. Dava os cumprimento do siô, se o vigário das alma querê, no dia
depois. Baixô as vista até os pé, tinha os dois cansado de levá e guiá de volta
sua corpulência, sentô pra arrancá os ferrão do mato, o embaraço tava cravado
no solado. Alguns tirô, um qui outro deixô, coisa sem importância, a carne
havia de comê os estorvo qui ficô.
Sentiu
vontade de retrucá o couro. Saiu do porão como entrô: mudo. Ninguém lhe viu
entrá ou saí. Preto caminha camuflado na escuridão, invisível, até pode existí,
mais é como dormí e não sonhá, não vivê no sono. Josino não sonhava, mais na
noite qui teve a Milagre na pedra do amô, sonhô, pela primeira vez, em muito
tempo, qui a sua preta tinha se feito com cera, disfarçada numa vela queria
iluminá o caminho dele. A cada vez, o Josino punha fogo na vela, ele via com
claridade a viagem, mais a Milagre se desfazia a cada pouco da vela derretida.
Não podia tê as duas. Passô a viagem pra cidade chateado com o sonho.
Chegô
no rio e mergulhô, gostava de entrá nas água mais afastada da Arsenal, não
tinha simpatia pelo Largo da Forca. Ficava enfiado, longe dali, na escuridão
molhada, entranhado com a sola dos pé no lodo, a linha d’água na cintura. Podia
não sê, não era, mais parecia livre. Gostava da noite, era quando se juntava
com a Milagre.
A
saudade incomodava, lhe agitava o dormí, assanhava o sono, mais era o lugá de
passá as noite sem o uso das corrente. O siô sabia qui não fugia sem a Milagre.
As canela agradecia aquela liberdade. Mergulhô e subiu, passô as mão na cara
marcada, olhô a barriga da lua pendurada, como a rede de Oia boiando nas
estrela, tava cismado com o feitiço da saudade, Essa nêga me tira o amansá,
fingi qui não sabe qui me tirá o sossego, fingindo inocente. Ah, se esse homem
pudesse, dava a terra, também o céu, esse rio, levava a Milagre pras terra dos
preto livre, qui deve existí em algum lugá, Minha Milagre, ocê tá no meu
coração dum jeito qui não quero mais ninguém, só tu muié. Não sabia se as água
nos olho era do rio ou se as água do rio nascia das vista, uma abarrotava com a
outra
— Sai do rio, negro safado!
Não
houve tempo de obedecê nem desobedecê, o chicote do jovem Capitão andô sobre as
águas e alcançô o Josino, não escolheu lugá pra acertá. O inesperado da dô lhe
fez grita dum jeito qui assustô o siô
— Cuidado, Capitão! Não quero a mercadoria
desarranjada para o uso!
O
Capitão, fio do siô com a negra Rita, tinha o distintivo do pai num olho e a
marca da mãe no outro olho, recolheu a contragosto o cipó de boi, no seu jeito
de vê, o negro Josino precisava de mais corretivo
— Sinhô, assim a negrada fica manhosa...
Perto
dali, depois do pelourinho, entre a Arsenal e o Largo da Forca, no tempo do
Josino menino, outro negro recebia nas carne o açoite qui lhe fazia cortá em
tiras as costa, mais ninguém lhe arrancava um grito. O capitão-do-mato Maria da
Cruz parô cansado de batê, queria ouví o gemido do negro. Mandô cortá uma tira
de cada lado do saúva. Enquanto o ajudante das suas ordens lhe obedecia,
recomendava cuidado, É preciso prudência de desinfetá com salmora e pimenta,
depois é preciso cuidá da sangria com pólvora e brasa.
O
alívio da desinfetação veio quando o negro desmaiado
— Acorda, negro fujão!
O
corpo do negro não lhe obedeceu.
Deu
nova ordem
— Aguadeiro!
O
negro qui cuidava de levá água e matá a sede dos escravo se apresentô rápido.
Parado, em pé, mudo. Esperando com a tina da água em uma das mãos
— Joga fora essa água da tina!
Lançô
a água da tina no chão da terra
— Hoje, ocê e os fujão vão dormir com
sede.
O
aguadeiro ali, imóvel, desanimado, sem expressão
— Recolhe no lugar da água o mijo dos
macaco... é prá já! Quero a tina cheia!
O
aguadeiro correu na direção dos negro acorrentado no pescoço, as mão atada nas
costa, perfilado, um ao lado do outro, tratados com mais crueldade qui a
selvageria dada aos castelhanos aprisionados, os negro precisava desaguá na
tina
— O macaco que se negar vai apanhar!
O
aguadeiro ajoelhado pegava o varapau das virilha de cada negro e enfiava na
tina, ordenhava até escutá o desmame e anunciava
— Esse tá mijando!
Depois
do último foi a sua vez
— Aguadeiro!
Ele
voltô com a tina cheia
— Deixa ver... hum, se mijo valer alguma
coisa, esses negro tão feito comigo! Espere! Vou misturar o mijo do branco com
os negro! Joga!
O
aguadeiro não entendeu, na dúvida, sempre ficava parado, aguardando o reforço
da ordem
— Joga no fujão, quero esse macaco
acordado!
Jogô.
Precisava jogá.
O
capitão Maria da Cruz aproximô do negro acordado, não ouvia nenhum gemido,
então, lhe deu um pontapé violento
— Isso é pra ocê gemer com mais vontade,
macaco fedido!
O
negro não lamento da dô, ficô estendido no chão das terra perto da Arsenal, as
mão amarrada nas costa. Dois bicho da tropa do capitão Maria da Cruz levaram os
negro acorrentado até mais chegado da Arsenal, quando ainda não era Arsenal
— Capitão Maria!
— O que foi Exposto?
— To achando que essa noite nenhum negro
vai dormí depois do corretivo...
O
sargento das suas ordens era o Exposto, mais um dos mestiço abandonado quando
em criança, não sentia pena nem dó. Deu uns passo e olhô no redô. Os homem qui
não cuidava os negro carregava uma tocha na mão.
O
menino Josino escondia as vista e a pele no meio do mato na beirada do rio.
Queria saí, mais não conseguia. Não ia abandoná de vê aquela maldade, havia de
contá e contá de novo, té alguém escutá, havia de existí um branco sem maldade.
Olhô pra trás e viu o padre apegado na cruz, parado, rezando. Assistia, como o
menino Josino, a peversão da crueldade e da fúria, voltô as vista nas luz das
tocha.
O
Exposto voltô té o capitão Maria da Cruz
— Capitão!
— Tudo pronto?
— Tudo pronto, capitão! Os negros tão lhe
esperando...
Como
um comandante imperial passô revista na tropa, num qui outro bateu com o cabo
da enxada no varapau das virilha
— Quando voltá pra dormir, cada negro vai
tê o que lembrar.
Ninguém
mexia as vista, cada preto respirava bem pouquinho
— Me trás o fujão!
O
menino olhô para o padre, parecia qui o homem de preto rezava, um Pai Nosso, um
Ave Maria, não importô prô outro maritirizado, tem vez qui rezá é mais
disperdício qui dizê uma blasfêmia. Viu o homem torturado, pensô no padre, na
virgi, no céu, achô qui iam colocá o preto na cruz pra salvá os outro preto bão
dos branco ruim. O vulto do preto fez o sinal da benção, rezava pelo espírito
dos preto, o menino amaldiçoava a alma dos branco, vai custá pra se perdoá, o
padre entrô na casa, homem bão, credospadre
— Levanta o negro!
Dois
soldado da tropa civil do capitão-do-mato Maria da Cruz ergueram o homem negro
açoitado
— Coloca de joelho!
Ficô
ajoelhado, mudo das dô do açoite e das tira qui faltava nas nádegas. Ganhô um
só golpe nos dente branco. A pancada saiu da mão qui empunhava o seu soco mais
duro e violento. A força da batida pareceu tê quebrado um dente do coitado, fez
brotá sangue, mais não fartô a vontade de batê qui atormentava o capitão da
Cruz
— Não lhe adiantô os aviso, de nada lhe
serviu a queimadura do F na testa, nem a orelha cortada...
O
menino Josino vomitô pela segunda vez, não entendia porque o sofrimento de
alguém não aplacava a fúria daquele homem. Não tinha o fervô do padre na
oração, nem a força da blasfêmia, nem a coragem daquele homem preto. Nenhum
exército de preto ia vim pra salvá o homem preto daquele martírio. Pareceu ao
menino qui escutava o padre escondido na casa gritando, Morrê não importa!
O
menino Josino olhô o homem preto, firmô as vista até se aproximá, viu qui ele
não tinha medo, nem esperança
— Agarrá o macaco!
Um
soldado agarrô um braço, outro soldado firmô o outro braço, o ajudante das
ordens Exposto agarrô com muita firmeza a cabeça do homem preto . O polegá de
cada mão apertava a testa e puxava a cabeça pra trás, até abrí a boca. O
capitão Maria Cruz colocô na boca do preto um galho do mato. Depois com uma
estaca de madeira quebrava os dente do homem preto, usava o martelo da outra
mão
— Vamos ver ocê fugir, agora! Corre negro!
Corre negro! Corre!
O
menino Josino suplicô
— Solta as mão dele... — murmurava com as
água das vista
— Corre desgraçado!
O
homem preto não tendo mais o qui fazê tentô fugí. Correu um pouco e caiu. Os negros gritava pra
levantá e fugí
— Solta os cachorro!
Dois
dos três cachorro logo lhe alcançaram. Tentô batê com os pé, gritô, assustô,
mais as mordida carregava muita dô, levantô e caiu, perdia os pedaço. Fez
corrida na água da Arsenal, as mordida rasgava a água barrenta. O capitão Maria
da Cruz latia, latia, latia, esganiçava ordens à cachorrada.
O
fugitivo daquela infâmia, desprotegido em nome da alma e da dô, entrô nas água
mais e mais, a cachorrada não lhe deixava, perseguia os garrão, as perna, as
costa, onde pudesse alcançá. Tentô afundá, mais os dente continuava arrancando
pedaço. Quis agarrá um cachorro com os dente qui não tinha mais, tentô uma,
duas vez, té qui afundô, se livrô das dentadura.
A
cachorrada voltô pra mão do capitão Maria da Cruz, não paravam de mastigá. O
capitão ajoelhô pra abraçá os seus
verdadeiros campeão, os homens por quem arriscaria a própria vida. Lambiam suas
bota, a cara cabeluda e a boca amarelada com os dentes podres. Enfiô a mão num
saco e retiro as duas tira das nádega do homem preto e jogo pra cima
— Agora, vão dormir... já têm com o que
sonhar.
O
Exposto se aproximô
— O capitão tem três cachorros danado de
bão.
— Mas já teve tempo que perdia um ou
outro. Esses negro morde igual a cachorro, por isso, quebro os dente do macaco antes de soltar os cachorro.
— Vivendo e aprendendo, capitão.
— É isso, enquanto se vive estamos
aprendendo.
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