Ensaio 17B
baitasar
O
único vivo mais sem alma qui o siô Barros encontrô nos caminho qui pisava foi o
preto acendedô Betobento, ele ia nas rua acendendo as lanterna qui iluminava os
caminho. Baixava a lanterna do poste com seu varapau de gancho, depois era só
examiná os vidro, raspá a cera se tivesse necessidade, colocá vela nova, queimá
o pavio, e pronto, alevantava a iluminadura té o poste da iluminação pública,
na altura de um homem e meio com o tamanho do Josino, qui teve um corpo qui não
cabia medida. Tem homê e mulhé, assim, as vista enxerga mais do qui existe,
mais também, existe corpo qui se enxerga menô do qui é; os olho pode enganá a
razão, confundí o coração, mais é preciso aprendê olhá e vê o qui não vê, quem
vê só o qui vê... vê só o qui qué vê.
O
negro qui o chefe da pulícia mandava aprendê com o Betobento escutava a mesma
lição, As velas ocê pega com o Joca Lampião, a lição de aprender as lidas com
as lanternas é preciso escutar o véio Betobento
— Cada lanterna tem uma vela que é preciso
acendê e controlá, nas ida e volta, enquanto durá a escuridão da noite. As vela
queimada até o fim do pavio precisa sê raspada da lanterna, depois é só colocá
a nova e incendiá a mecha. A incumbência é vigiá os postes, à noite toda, e
deixá os poste vigiá as ruas. Escutô? — um bão aprendiz de acendedô sempre
escutava.
Aquele
era um serviço de patrulhamento. Reavivava as vela apagada pela teimosia do
vento, mais quando a chuva molhava com jeito de fazê brotá água, ele esperava,
resmungando dentro da boca do velho teimoso, Água e fogo não se junta, é melhó
esperá secá a chuva.
Gostava
da noite apinhada das estrela, tinha o qui fazê à noite inteira nas ruas qui
era sua incumbência. Passava à noite, assim, indo e vindo, fiscalizando os
poste das vela, descendo e subindo as lanterna, trocando, raspando, atiçando.
Iluminava os caminho, por isso, foi batizado com titulativo de gente: Betobento
Luz. Um caso raro de preto liberto qui ganhô alcunha, um nome próprio de
branco.
Saia
da casa dos lampião com a sacola carregada nas vela, o varapau com gancho numa
das mão e a tocha incendiando na outra. Atravessava o Largo dos Enforcado com a
tocha erguida, não queria nenhum espírito fechando o caminho, nem dá com a cara
do preto Joaquim, o primeiro enforcado: se fez pagô; se não fez, pagô pelo qui
não fez. Ele qui ficasse pras bandas de lá, qui o jeito não tinha mais jeito.
As carne depois de pendurada pelo pescoço, só faz desprendê o mijo té pará de
respirá. O Betobento Luz, nas dúvida, se ia ou não encontrá um qui outro dos
enforcado, pedia, Salve as banda de lá, salve as banda de cá! Com licença. E
rasgava a escuridão do Largo dos Enforcado.
Seguia
a rua da Praia, no cumprimento da praia, quase no início, já tinha qui cruzá
por outra tranqueira: o pelourinho de pedra. Erguido às pressas, no ano de
1810, tudo pra fazê a freguesia tê a cerimônia da instalação da vila da Nossa
Senhora. Ele entendia as necessidade de deixá de sê freguesia, passá a sê vila,
depois cidade, mais não entendia as necessidade daquela pedra, nem por que da
pedra ficá na frente da igreja santa. Os branco gosta de esfolá o couro dos
preto, isso se sabe, mais tanto lugá pra longe da missa, não tinha qui sê de
frente, no alcance do olhá do padre, da voz piedosa de oração, Será que os
ouvido que escuta oração não escuta os gemidos no pelourinho, e se escuta, faz
que não escuta
O
Betobento Luz conhecia o sinal da cruz, rezava sua oração pros espírito dos
couro rasgado qui rondava ali, os preto deixado esquecido na cruz da pedra. E
seguia seu caminho, poste por poste da iluminação té a Bragança. Depois fazia
um trecho da Bragança té a rua da Ponte, virava na Ponte e voltava perto da
esquina das água, na casa dos lampião. Nesses dois caminho, cruzava o Beco do
Fanha, o Beco do Leite, o Beco do Trem, mais na rua do Ouvidô, não podia só
cruzá sem desviá, tinha qui tê cuidado com as lanterna do Ouvidô. De volta na
Ponte, seguia sua vigilância cruzando a rua Clara, a rua do Arroio, muito
conhecida como a rua dos Pecado Mortal, tinha as cabana das putaria, as moça
tavam longe e perto, no alcance dos pé e do fogo das virilha. O trecho com as
cabana sempre tava com visita, mais ninguém reclamava a falta das lanterna e
dos poste da iluminação.
A
cada tempo, aparecia mais rua e o Betobento já não dava conta. Depois de fazê a
rua da Ponte reabastecia as vela da sacola na casa dos lampião, só precisava
fazê a sua marca no papel em branco qui o Joca Lampião deixava no balcão. O
homem se incomodava de saí do calô das coberta com o escravo Varão, não queria
se estorvado, então, deixava os pacote com as vela na disposição do negro
iluminadô. O Betobento, por sua vez, tava cada vez mais desgostoso de colocá
sua marca num quitamento em branco. Até qui criô coragem de dizê qui não achava
certo
— O quê o criolo não acha certo?
— Vosmecê me perdoe, mais não é bão colocá
a marca no papel sem nada escrito...
A
resposta do Joca Lampião foi na hora do acontecido
— O criolo está achando que no papel do
recibo não têm as velas que o criolo leva na sacola?
— Não to dizendo nada.
— Pois se não tem, é porque o criolo tá
escondendo as vela.
— Não to dizendo nada.
— Então, não me incomoda com preocupação
de criolo.
Betobento
baixô os olho, colocô a marca no recido branco e saiu. Nunca mais fez assunto
do causo. Mal tinha tempo de fazê a vigilância na Quitanda e recomeçá a trilha.
O chefe da iluminação pública qui se entendesse com ele.
O
Largo da Quitanda não parecia dormí, as pessoa continuava o comércio qui se juntava
como as formiga. O trapiche rio adentro cortava as água, como a cicatriz marca
o couro, e avisava: é o lugá de embarcá e desembracá os iate e as sumarca,
antes da saída das água doce nas água salgada.
O
siô Barros passô pelo acendedô sem fazê menção de reconhecimento. O negro qui
tinha obrigação de cumprimento. O iluminadô não parô de ajeitá o qui tinha qui
fazê: iluminá com capricho era sua ocupação, e aquela noite recém tinha começo,
Mais um negro metido a gente, esse parece que não conhece o seu lugar, o siô
Barros não queria assunto de falação com o acendedô, muito menos autorizava
intimidade, mais aquele negro sujo lhe devia cortesia e reconhecimento. Parô a
rua nos pé, chegô abrí a boca pra chamá atenção do negro, mais viu qui a rua
era um deserto de gente, Isso é um desperdício. Voltô pro seu caminho. Avançô
um passo, dois passo, e não se dominô, foi libertado das corrente da
compreensão, isso é um desaforo, quem esse criolo pensa que é
— Você, negro!
Nenhuma
resposta, nenhum sinal da atenção, Assim, já é demais, voltô mais um passo qui
não devia voltá, não devia tê voltado
— Você, criolo atrevido!
O
Betobento Luz, qui tinha um nome e uma alma, se ocê acredita qui as alma só existe
depois de batizado, continuava a raspá a cera da laterna. O siô Barros levantô
do chão uma pedra, jogô sem precisão na mira. Não acertô nem por pouco,
resmungô, Não queria acertá, mesmo. O negro não se mexeu, não parecia qui tudo
aquilo era com ele. A paciência do siô Barros tinha limite, a desatenção
daquele negro ia custá caro, e fez o serviço do jovem Capitão: sacô o chicote
curto, desenrolô o cipó qui levava preso na cintura pra impressioná os branco,
assustá os negro, sujô as mão quando acertô o véio Betobento Luz.
O
homem solto um grito qui o siô nunca teve qui ouví, saltô como um felino e ficô
na frente do branco, o olhá de odiá.
O
preto Betobento Luz era um liberto dos branco besta. Exercia serviço de
segurança pra pulícia, nunca ia tê licença pra prendê branco, mais queria entrá
no qui fazê da pulícia: corrê atrás dos badernista, brigadô, valentão, deixá de
sê corrido, corrê atrás. Pará de cuidá da iluminação pública.
Mais
continuava negro.
A
escuridão mostrava o branco dos olho arregalado, não parecia susto nem medo,
parecia a morte.
No
peito carregava uma tabuleta de aviso: Surdo Mudo!
Aquela
conversa com o Varão já faz um bom tempo, mais foi logo depois dela qui o
Betobento Luz apareceu com a língua cortada e os dois ouvido furado. O rumô era
qui o escravo Varão não tinha gostado dos modo do Betobento com o patrão Joca,
uns dizia o qui escutava de outro, coisas do iluminadô tá desviando as vela qui
o chefe da pulícia autorizava comprá com o fundo da iluminação. Nada ficô
provado nem contra nem a favô, mais o Betobento ficô mudo e surdo. Quase
ninguém escapa da justiça dos branco, só os branco.
O
siô Barros olhô a pequena chibata na sua mão, ela se pareceu com uma pistola
qui se usa na cintura sem nunca tê uso, mais qui depois de empunhá precisava
fazê o uso sem fraqueza.
Queria
saí dali.
É
diferente mandá fazê e sê a mão qui faz. Dá pra senti o gosto do sangue na
boca, o cheiro do suô do preto, os grito se enfia na cabeça e custa pra saí. É
uma marca por toda vida.
Voltô
nos passo qui deu pra trás, virô as costa e saiu caminhando, Merda, merda, como
podia saber que o negro é surdo, mas surdo ou não, ele tem as vista, se me viu,
devia o cumprimento de respeito.
Retomô
o seu caminho, desconfiado dele mesmo, Como fui me deixar usar da chibata, não
sou homem dessas canalhices, isso é coisa do Capitão, merda, talvez fosse,
talvez não fosse, bão com a chibata, mais pra parecê um branco forte, qui sabia
colocá as coisa no devido lugá, não podia tê dó nem piedade, Por certo, o
Senhor colocou esse negro no meu caminho para me lembrar alguma coisa que devo
ter esquecido, deve ser alguma benção.
Soltô
um suspiro silencioso dos intestino, junto com o vento mais uma pequena
umidade. O descuido lhe brotô no fundilho das calça, mais um pequeno aviso do
Siô, o vulcão tava limpando a garganta.
Lembrô
do Josino, o negro certo pra tarefa acertada, Esse só me deve uns negrinhos da
sua criação com a negra Milagres. A lembrança lhe deu vontade de dobrá na
direção da praia, e olhá se o carregamento foi descarregado no barco, mais a
cautela era sua maió virtude, não achô por bem se aproximá dos trabalho
secreto, Quem não é visto, não é reconhecido.
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