quarta-feira, 16 de setembro de 2015

um certo homem, de uma certa região e de uma certa etnia... um Negro Gaúcho

Lanceiros Negros



Peleia, negro, peleia pela tua independência
Semeia, negro, semeia teus direitos na querência
que a razão vença a lança








"Porém, o imaginário do ser gaúcho está associado com o rural, com o pampa, com uma indumentária e com hábitos específicos. A identidade do povo rio-grandense remete-se a um passado ideal que silencia a presença do índio e do negro como elementos formadores da “raça gaúcha”. Pauta-se pelo contraste a outras identidades e forma-se pela negação e silenciamento do outro, relacionando-se somente a um certo homem, de uma certa região e de uma certa etnia." A Revolução Farroupilha através da música: A construção do Negro Gaúcho



Lanceiros Negros
João Quintana Vieira



Sem anos de escola
Nem leitos e estradas
Na causa farrapa um pelotão de escravos
Partiu da senzala buscando horizontes
Repontando anseios por campos de brabo (???)
Mãos com cicatrizes e pés calejados
Empunhando as lanças rumo ao fim sinistro
Sustentando a guerra que eles não fizeram
Brigas de governos ou de alguns ministros
Sustentando a guerra que eles não fizeram
Brigas de governos ou de algum ministro
E no Ponche Verde as flores que nascem
Parecem bandeiras da luta tenaz
Onde os combatentes e Lanceiros Negros
Plantaram com sangue a semente da paz
E no Ponche Verde as flores que nascem
Parecem bandeiras da luta tenaz
Onde os combatentes e Lanceiros Negros
Plantaram com sangue a semente da paz
Com ventos e chuva
Tomaram o relento
Propiaram saudades
Deixada nos biongos*
Carregaram sonhos
De nação mais justa
Para tombar peleando
Lá pelos Porongos
A diplomacia calou forças brutas
Pelotões de escravos foram libertados
E os campos da paz resistindo aos tempos
Guardaram conquistas daqueles tratados
E os campos da paz resistindo aos tempos
Guardaram conquistas daqueles tratados
E no Ponche Verde as flores que nascem
Parecem bandeiras da luta tenaz
Onde os combatentes e Lanceiros Negros
Plantaram com sangue a semente da paz
E no Ponche Verde as flores que nascem
Parecem bandeiras da luta tenaz
Onde os combatentes e Lanceiros Negros
Plantaram com sangue a semente da paz
Onde os combatentes e Lanceiros Negros
Plantaram com sangue a semente da paz
A semente da paz, a semente da paz



*casebre, biboca, choça.










O Negro de 35
César Passarinho



A negritude trazia a marca da escravidão
Quem tinha a pele polianga vivia na escuridão
Desgarrado e acorrentado, sem ter direito à razão
Castrado de seus direitos não tinha casta nem grei*
Nos idos de trinta e cinco, quando o caudilho era o rei
E o branco determinava, fazia e ditava a lei
Apesar de racional, vivia o negro na encerra
E adagas furavam palas, ensangüentando esta terra
Da solidão das senzalas tiraram o negro pra guerra
(Peleia, negro, peleia pela tua independência
Semeia, negro, semeia teus direitos na querência)
Deixar o trabalho escravo, seguir destino campeiro
As promessas de igualdade aos filhos no cativeiro
E buscando liberdade o negro se fez guerreiro
O tempo nas suas andanças viajou nas asas do vento
Fez-se a paz, voltou a confiança, renovaram pensamentos
A razão venceu a lança e apagou ressentimentos
Veio a lei Afonso Arinos cultivando outras verdades
Trouxe a semente do amor para uma safra de igualdade
Porque o amor não tem cor, sem cor é a fraternidade
(Peleia, negro, peleia com as armas da inteligência
Semeia, negro, semeia teus direitos na querência)


*Nação, povo













Negro da Gaita
Cesar Passarinho


Mata o silêncio dos mates, a cordeona voz trocada
E a mão campeira do negro, passeando aveludada
Nos botões chora segredos, que ele juntou pela estrada

(Quando o negro abre essa gaita
Abre o livro da sua vida
Marcado de poeira e pampa
Em cada nota sentida)

Quando o pai que foi gaiteiro, desta vida se ausentou
O negro piá solitário, tal como pedra rolou
E se fez homem proseando, com a gaita que o pai deixou

E a gaita se fez baú para causos e canções
Do negro que passa a vida, mastigando solidões
E vai semeando recuerdos, por estradas e galpões






Lanceiros Negros
Oliveira Silveira


Carga de lança - diante do inimigo
a noite
              uma noite pontuda
de ir rasgando entranhas
como rasgava roupas
                       pele
                       carne
                       tudo
a sanha
                      de não velhos açoites.

Carga de lança - no campo da luta
a noite
                      negra e pontiaguda
Sombras noturnas rolam no horizonte,
há nuvens de sangue no chão.
E cada lanceiro estendido
é uma noite pisoteada
- roupas e entranhas rasgadas -
noite que ficou
para sempre libertada.

Carga de lança - noite alforriada.






Os Lanceiros Negros demonstraram grande capacidade de luta e combatividade durante a guerra farrapa. Descrevendo sua participação nas batalhas, Garibaldi - o "herói dos dois mundos" - diz:
Já os terríveis lanceiros (...), todos livres e todos domadores de cavalos, tinham feito um movimento de avanço envolvendo o flanco direito do inimigo, que se viu obrigado fazer-lhes frente também pela direita, em desordem. Os valentes libertos, imponentes pela ferocidade, se faziam mais firmes do que nunca e aquele incomparável pelotão, composto de escravos alforriados pela República, selecionados entre os mais hábeis domadores da Província, todos negros, exceto os oficiais superiores, parecia uma floresta de lanças. O inimigo jamais tinha visto pelas costas estes verdadeiros filhos da liberdade, que tão bem combatiam por ela. Suas lanças mais longas do que o normal, suas caras negríssimas, suas robustas extremidades, endurecidas pelo constante e fatigante exercício, e sua perfeita disciplina, infundiam terror ao inimigo.  Garibaldi, Giuseppe. Memórias. Buenos Aires: Biblioteca de La Nación, 1910, p. 132.

Trecho do encarte Revolução Farroupilha, 5 edição. Publicação do Gabinete do Deputado Raul Carrion. Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul.


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