quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Florbela Espanca - A Mensageira das Violetas 03

Florbela Espanca



03 - A Mensageira das Violetas





CRAVOS VERMELHOS


Bocas rubras de chama a palpitar,
Onde fostes buscar a cor, o tom,
Esse perfume doido a esvoaçar,
Esse perfume capitoso e bom?!


Sois volúpias em flor! Ó gargalhadas
Doidas de luz, ó almas feitas risos!
Donde vem essa cor, ó desvairadas,
Lindas flores d´esculturais sorrisos?!


...Bem sei vosso segredo...Um rouxinol
Que vos viu nascer, ó flores do mal
Disse-me agora: "Uma manhã, o sol,


O sol vermelho e quente como estriga
De fogo, o sol do céu de Portugal
Beijou a boca a uma rapariga..."





ANSEIOS
À minha Júlia

Meu doido coração aonde vais,
No teu imenso anseio de liberdade?
Toma cautela com a realidade;
Meu pobre coração olha cais!

Deixa-te estar quietinho! Não amais
A doce quietação da soledade?
Tuas lindas quimeras irreais
Não valem o prazer duma saudade!

Tu chamas ao meu seio, negra prisão!...
Ai, vê lá bem, ó doido coração,
Não te deslumbre o brilho do luar!

Não ´stendas tuas asas para o longe...
Deixa-te estar quietinho, triste monge,
Na paz da tua cela, a soluçar!...





A ANTO!


Poeta da saudade, ó meu poeta qu´rido 
Que a morte arrebatou em seu sorrir fatal, 
Ao escrever o Só pensaste enternecido 
Que era o mais triste livro deste Portugal,

Pensaste nos que liam esse teu missal, 
Tua bíblia de dor, teu chorar sentido 
Temeste que esse altar pudesse fazer mal 
Aos que comungam nele a soluçar contigo!

Ó Anto! Eu adoro os teus estranhos versos, 
Soluços que eu uni e que senti dispersos 
Por todo o livro triste! Achei teu coração...

Amo-te como não te quis nunca ninguém, 
Como se eu fosse, ó Anto, a tua própria mãe 
Beijando-te já frio no fundo do caixão!




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A Mensageira das Violetas, de Florbela Espanca

Fonte: ESPANCA, Florbela. A mensageira das violetas: antologia. Seleção e edição de Sergio Faraco. Porto Alegre: L&PM, 1999. (Pocket). 

Texto proveniente de: 
A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo Permitido o uso apenas para fins educacionais. 

Texto-base digitalizado por: 
Luciana Peixoto Silva – Divinópolis/MG
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