segunda-feira, 14 de novembro de 2016

O Brasil nação - v1: § 8 – O caminho para o trono de Portugal - Manoel Bomfim

Manoel Bomfim



O Brasil nação volume 1





PRIMEIRA PARTE
SEQUÊNCIAS HISTÓRICAS



capítulo 1 
os frutos do 7 de setembro




§ 8 – O caminho para o trono de Portugal




Dominado, duas vezes mutilado para que perdesse importância, o Pernambuco tradicional e republicano foi profanado, enxovalhado, a ponto de que ali se abriram tendas de ostensivo absolutismo – as famosas colunas, apostolado ou clube, para maior firmeza do trono bragantino, e propagar, e pedir, o puro legitimismo. Antes de chegar a tão propícios resultados, tratou o imperador de ajustar as coisas com o seu Portugal. A Inglaterra, usufruturária do velho reino, albardante da casa de Bragança, ia servir de muito: ia resolver a questão a contento dos dois lusitanismos, e que, de fato, era para a satisfação dos próprios interesses ingleses. Mantendo o Brasil jungido a Portugal, mantendo-o na casa de Bragança, o Inglês trabalhava para si. José Bonifácio, brasileiro apesar de tudo, teve, desde logo, a justa impressão dos manejos britânicos, quando de Londres lhe ofereciam um empréstimo – de que se tiraria um milhão de libras esterlinas, para pagar a Portugal o reconhecimento. O velho Andrada repeliu a oferta, e guardou a penosa lembrança, que ressumbra nas linhas das suas cartas íntimas. Passam-se os tempos, e foi isto mesmo (pelo duplo do primeiro preço) o que finalmente se fez. O reconhecimento da Independência por Portugal, condição imposta pela Inglaterra para que o Brasil pudesse entrar para o rol das nações soberanas, foi arranjado ostensivamente entre o governo inglês e o português. Tal arranjo se arrastou por longo tempo, e deu trabalho aos respectivos empreiteiros;45  mas não é que a substância dele fosse difícil de achar, senão que, por tão pérfido e indigno, o ajuste, e tão vis os interesses em jogo, houve que, laboriosamente, procurar-se a forma menos asquerosa para apresentá-lo à luz do dia. Não chegando a bem alcançar toda a repercussão da miséria, o Sr. Pereira da Silva insere estas linhas de verdade:

Jorge Canning opinou contra a continuação da guerra entre o Brasil e Portugal, e insinuou ao governo de D. João VI que era preferível tratar amigavelmente com o do Rio de Janeiro, e reconhecer a independência do novo Império, com a condição de se conservarem as duas coroas na dinastia de Bragança, e de se reabrirem relações comerciais vantajosas entre os dois povos...46

O Sr. Oliveira Lima, com todo o seu pesado critério, chama Portugal, muito a sério – protetorado inglês... Todo o seu livro, escrito na intenção, evidente, de fazer do reconhecimento um belo esforço da diplomacia presidida pelo gênio de Canning, deixa evidente isso mesmo: que tudo foi ditado pelo inglês, consultados, apenas, os motivos portugueses, até nas simples veleidades. O Brasil estava independente; era irredutível na sua separação... Ninguém o compreendeu nem o demonstrou melhor do que o mesmo Canning. No entanto, entregue a nação brasileira aos interesses vis do Bragança, o inglês não teve necessidade de contar com ela, e fez o seu arranjo falando, a nós, como se estivéramos nas suas mãos; falava ao Brasil para impor as exigências de Portugal: “O Brasil tem que ser reconhecido por Portugal, em primeiro lugar; não posso ser indiferente a uma guerra com Portugal, que é meu aliado – Cesse a guerra!...” Portugal, com isto, ficou senhor da situação, pois que era quem nos abria a porta, como povo soberano. É verdade que os Estados Unidos não estiveram pelas veleidades do governo britânico, e reconheceram o Brasil independente antes de qualquer outra nação. Mas, no país conduzido pelo bragantismo, o caso passou como despercebido, e, ainda, hoje, as nossas histórias parecem ignorar a circunstância.

45 O grande ministro inglês, que mexeu nos destinos de todas as grandes nações da Europa, e influiu na reorganização do mundo após Napoleão, teve de notar – “que Portugal sozinho deu-me mais trabalho, nos dois últimos meses (julho e agosto de 1824) do que razoavelmente se deveria esperar, em meio ano, da parte de todas as cortes da Europa”. Esta queixa dá bem ideia das complicadas misérias a que ele tinha de atender (Correspondência oficial de Canning). No entanto, Canning não tinha necessidade de fingir reverências para com um Estado que havia vivido, durante anos, no domínio ostensivo dos ingleses. Dois anos depois, ele mesmo demonstrou o pouco caso, quando mandou os 5. 000 homens de Clinton ocuparem de novo o país português, sob o pretexto da revolta dos miguelistas. 

46 Hist. da Fundação, III, 322.



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"Morreu no Rio aos 64 anos, em 1932, deixando-nos como legado frases, que infelizmente, ainda ecoam como válidas: 'Somos uma nação ineducada, conduzida por um Estado pervertido. Ineducada, a nação se anula; representada por um Estado pervertido, a nação se degrada'. As lições que nos são ministradas em O Brasil nação ainda se fazem eternas. Torcemos para que um dia caduquem. E que o novo Brasil sonhado por Bomfim se torne realidade."

Cecília Costa Junqueira



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O Brasil nação: vol. I / Manoel Bomfim. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro, 2013. 332 p.; 21 cm. – (Coleção biblioteca básica brasileira; 35).


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Leia também:


O Brasil nação - v1: § 7 – A reação de Pernambuco - Manoel Bomfim

O Brasil nação - v1: § 9 – O verdadeiro pacto de família - Manoel Bomfim


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