Franz Kafka
Capítulo 3
17 A Metamorfose - Gregório não tivera a menor intenção de assustar - Franz Kafka
Gregório não tivera a menor intenção de assustar fosse quem fosse, e muito menos a irmã. Tinha simplesmente começado a virar-se, para rastejar de regresso ao quarto, Compreendia que a operação devia causar medo, Pois estava tão diminuído que só lhe era possível efetuar a rotação erguendo a cabeça e apoiando-se com ela no chão a cada passo. Parou e olhou em volta. Pareciam ter compreendido a Pureza das suas intenções, e o alarme fora apenas passageiro; agora todos, em melancólico silêncio. A mãe continuava sentada, com as pernas rigidamente esticadas e comprimidas uma contra a outra, com os olhos a fecharem-se de exaustão. o pai e a irmã estavam sentados ao lado um do outro, a irmã com um braço passado em torno do pescoço do pai.
Talvez agora me deixem dar a volta, pensou Gregório, retomando os seus esforços. Não podia evitar resfolgar de esforço e, de vez em quando, era forçado a parar, para recobrar o fôlego. Ninguém o apressou, deixando-o completamente entregue a si próprio. Completada a volta, começou imediatamente a rastejar direito ao quarto. Ficou surpreendido com a distância que dele o separava e não conseguiu perceber como tinha sido capaz de cobri-la há pouco, quase sem o notar. Concentrado na tarefa de rastejar o mais depressa possível, mal reparou que nem um som, nem uma exclamação da família, lhe perturbavam o avanço. Só quando estava no limiar da porta é que virou a cabeça para trás, não completamente, porque os músculos do pescoço estavam a ficar perros, mas o suficiente para verificar que ninguém se tinha mexido atrás dele, exceto a irmã, que se pusera de pé. o seu último olhar foi para a mãe, que ainda não mergulhara completamente no sono.
Mal tinha entrado no quarto, sentiu fecharem apressadamente a porta e darem a volta à chave. O súbito ruído atrás de si assustou-o tanto que as pernas fraquejaram. Fora a irmã que revelara tal precipitação. Tinha-se mantido de pé, à espera, e dera um salto para fechar a porta. Gregório, que nem tinha ouvido a sua aproximação, escutou-lhe a voz:
— Até que enfim! — exclamou ela para os pais, ao girar a chave na fechadura.
Capítulo 3
17 A Metamorfose - Gregório não tivera a menor intenção de assustar - Franz Kafka
Gregório não tivera a menor intenção de assustar fosse quem fosse, e muito menos a irmã. Tinha simplesmente começado a virar-se, para rastejar de regresso ao quarto, Compreendia que a operação devia causar medo, Pois estava tão diminuído que só lhe era possível efetuar a rotação erguendo a cabeça e apoiando-se com ela no chão a cada passo. Parou e olhou em volta. Pareciam ter compreendido a Pureza das suas intenções, e o alarme fora apenas passageiro; agora todos, em melancólico silêncio. A mãe continuava sentada, com as pernas rigidamente esticadas e comprimidas uma contra a outra, com os olhos a fecharem-se de exaustão. o pai e a irmã estavam sentados ao lado um do outro, a irmã com um braço passado em torno do pescoço do pai.
Talvez agora me deixem dar a volta, pensou Gregório, retomando os seus esforços. Não podia evitar resfolgar de esforço e, de vez em quando, era forçado a parar, para recobrar o fôlego. Ninguém o apressou, deixando-o completamente entregue a si próprio. Completada a volta, começou imediatamente a rastejar direito ao quarto. Ficou surpreendido com a distância que dele o separava e não conseguiu perceber como tinha sido capaz de cobri-la há pouco, quase sem o notar. Concentrado na tarefa de rastejar o mais depressa possível, mal reparou que nem um som, nem uma exclamação da família, lhe perturbavam o avanço. Só quando estava no limiar da porta é que virou a cabeça para trás, não completamente, porque os músculos do pescoço estavam a ficar perros, mas o suficiente para verificar que ninguém se tinha mexido atrás dele, exceto a irmã, que se pusera de pé. o seu último olhar foi para a mãe, que ainda não mergulhara completamente no sono.
Mal tinha entrado no quarto, sentiu fecharem apressadamente a porta e darem a volta à chave. O súbito ruído atrás de si assustou-o tanto que as pernas fraquejaram. Fora a irmã que revelara tal precipitação. Tinha-se mantido de pé, à espera, e dera um salto para fechar a porta. Gregório, que nem tinha ouvido a sua aproximação, escutou-lhe a voz:
— Até que enfim! — exclamou ela para os pais, ao girar a chave na fechadura.
— E agora?, perguntou Gregório a si mesmo, relanceando os olhos pela escuridão. Não tardou em descobrir que não podia mexer as pernas. Isto não o surpreendeu, pois o que achava pouco natural era que alguma vez tivesse sido capaz de aguentar-se em cima daquelas frágeis perninhas. Tirando isso, sentia-se relativamente bem. É certo que lhe doía o corpo todo, mas parecia-lhe que a dor estava a diminuir e que em breve desapareceria. A maçã podre e a zona inflamada do dorso em torno dela quase não o incomodavam. Pensou na família com ternura e amor. A sua decisão de partir era, se possível, ainda mais firme do que a da irmã. Deixou-se ficar naquele estado de vaga e calma meditação até o relógio da torre bater as três da manhã. Uma vez mais, os primeiros alvores do mundo que havia para além da janela penetraram-lhe a consciência. Depois, a cabeça pendeu-lhe inevitavelmente para o chão e soltou-se-lhe pelas narinas um último e débil suspiro.
De manhã, ao chegar, a empregada, com toda a força e impaciência, batia sempre violentamente com as portas, por mais que lhe recomendassem que o não fizesse, pois ninguém podia gozar um momento de sossego desde que ela chegava, não viu nada de especial ao espreitar, como de costume, para dentro do quarto de Gregório. Pensou que ele se mantinha imóvel de propósito, fingindo-se amuado, pois julgava-o capaz das maiores espertezas. Tinha à mão a vassoura de cabo comprido, procurou obrigá-lo a pôr-se de pé com ela; empunhando-a à entrada da porta. Ao ver que nem isso surtia efeito, irritou-se e bateu-lhe com um pouco mais de força, e só começou a sentir curiosidade depois de não encontrar qualquer resistência. Compreendendo-se repentinamente do que sucedera, arregalou os olhos e, deixando escapar um assobio, não ficou mais tempo a pensar no assunto; escancarou a porta do quarto dos Samsa e gritou a plenos pulmões para a escuridão:
— Venham só ver isto: ele morreu! Está para ali estendido, morto!
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A Metamorfose
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Leia também:
16. A Metamorfose - Era evidente que ninguém se apercebera da sua presença - Franz Kafka
18. A Metamorfose - Fim - Franz Kafka
De manhã, ao chegar, a empregada, com toda a força e impaciência, batia sempre violentamente com as portas, por mais que lhe recomendassem que o não fizesse, pois ninguém podia gozar um momento de sossego desde que ela chegava, não viu nada de especial ao espreitar, como de costume, para dentro do quarto de Gregório. Pensou que ele se mantinha imóvel de propósito, fingindo-se amuado, pois julgava-o capaz das maiores espertezas. Tinha à mão a vassoura de cabo comprido, procurou obrigá-lo a pôr-se de pé com ela; empunhando-a à entrada da porta. Ao ver que nem isso surtia efeito, irritou-se e bateu-lhe com um pouco mais de força, e só começou a sentir curiosidade depois de não encontrar qualquer resistência. Compreendendo-se repentinamente do que sucedera, arregalou os olhos e, deixando escapar um assobio, não ficou mais tempo a pensar no assunto; escancarou a porta do quarto dos Samsa e gritou a plenos pulmões para a escuridão:
— Venham só ver isto: ele morreu! Está para ali estendido, morto!
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