sexta-feira, 11 de setembro de 2020

histórias davóinha: becos sem saída (I) 04bs - cacete pra todo lado!

becos sem saída


(I) o descolocado
04bs – cacete pra todo lado!


baitasar



a miúda não tem a mania da paciência nem a vontade para esperar, não esconde a impaciência que lhe acode a cabeça de um lado para o outro, sempre foi assim, desde que lembra dela mesma, coloca os dedos na boca e fica roendo o cantinho das unhas do dedo mais gordo até chegar no menor da outra mão, Antes do sumiço nosso, teve um caso de polícia que se tornou conhecido porque o corpo apareceu boiando nas águas com as mãos amarradas. Lembro do papai comentar alguma coisa em casa. Foi sobre um tal Raimundo, tido como comunista perigoso, uma mania pra amedrontar as pessoas, colocar o apelido de comunista, mas depois do golpe...

Calma aí, velho... espera... que golpe é esse? Roubaram o quê?

Tudo... a verdade... a alegria... a poesia... um bando de gente cinza vestida de general e mais um bando de paisanos, fantasiados de gente amável, educada e cortês. Queriam mudar tudo sem consultar ninguém além deles mesmos. Um monstro grande que pisou forte e indiferente sobre a gente. Tinham do seu lado o chefe dos tanques, navios e aviões.

Nossa, velho! Isso é muita gente...

Não teve pra ninguém, cacete pra todo lado! Foi um passeio, o progresso e a ordem da porrada, mas como eu ia dizendo, o tal Raimundo passou a ser considerado perturbador da ordem e foi enviado à ilha presídio Madalena, destino dos desajustados políticos. Não dava pra responder nem levantar os olhos do chão. E tudo era melhor. Melhor não discordar. Melhor obedecer. Melhor não pensar. Ninguém vive na ignorância impunemente.



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