Luaanda... Vavó Xíxi e Seu Neto Zeca Santos
O sape-sape∗ ficava perto da rua, no terreno onde antigamente estava o Asilo República.
Assim, ali sozinho, de todos os lados as grandes casas de muitas janelas olhavam-lhe, rodeavam-lhe, parecia era feitiço. Sem mais água, só mesmo com a chuva é que vivia e sempre atacado no fumo preto das camionetas, indo e vindo no porto, que ali era o caminho delas, como é essa árvore ainda tinha coragem e força para pôr uma sombra boa, crescer suas folhas verde sujas, amadurecer os sape-sapes que falavam sempre frescura da sua carne de algodão e o gosto de cuspir longe as sementes pretas, arrancar a pele cheia de picos? Só mais lá em cima, nas barrocas das Florestas, tinha outros pau. Ali, era só aquele, corajoso, guardando na sua sombra massuícas pretas de fazer comida de monangambas dos armazéns de café, dos aprendizes de mecânico da oficina em frente, mesmo dos homens da Câmara quando vinham com as pás e picaretas e rasgavam a barriga das ruas.
Nessa hora de quase cinco horas as folhas xaxualhavam∗ baixinho e a sombra estendida estava boa, fresca, parecia era água de muringue∗. Sentado nas pedras negras do fumo, Zeca Santos esperava Delfina mirando, ansioso, a porta da fábrica. Tinha combinado com a pequena, nesse dia ela ia pedir para sair mais cedo, iam dar encontro, Zeca queria adiantar essas falas do baile de sábado. Delfina merengara∗ muito bem com ele e quando o conjunto, depois, rebentou com a música do “Kabulu”∗, ninguém mais lhes agarrou, quase o baile ia ficar só deles os dois, toda a gente parada a assistir-lhes, vaidosos e satisfeitos. Daí é que nasceu a peleja com João Rosa: o rapaz andava perseguir a garota, queria-lhe para ele, mas, nessa noite, Zeca Santos com a satisfação dos olhos de Delfina, pelejava mesmo que eram muitos. A sorte ficou do lado dele, azar no lado de João porque, lá fora, a luz era pouca. O rapaz usava óculos e falhou o soco na cara; aí, sem custar nada, Zeca caçou-lhe o braço e passou-lhe uma bassula nas costas, mergulhou-lhe em cima da areia.
Mas, mesmo que na peleja Zeca tinha ganhado, o mulato continuou vir buscar Delfina em seu carro pequeno, muitas vezes costumava-lhe trazer também e, nessa hora, era já escuro. Zeca ficava raivado, pensava o silêncio e o escondido do carro, se calhar o sacrista∗ adiantava apalpar as pernas da namorada, muitas vezes, quem sabe? outras coisas mesmo, o carro estava-lhe ajudar...
Por causa disso, nesse dia tinha decidido. Ou era dos copos do vinho no almoço e mais outro com Maneco depois que falaram no Sebastião, ou era ainda, cadavez, essa promessa de trabalho que arranjara, a verdade agora estava ver tudo com mais confiança, satisfeito quase. Sem querer mesmo, o pensamento do dinheiro para mandar consertar sapatos, muitas vezes umas calças novas, juntava-se com a figura de Delfina, com seu riso e seu falar, seu encostar pequeno e bom, na hora dos tangos, na farra...
Sebastião tinha-lhes recebido bem, Maneco era amigo. Grande, careca quase, o homem falou com voz grossa em Zeca Santos, apalpou-lhe ainda os braços, depois cuspiu. Mas Maneco estava a ajudar-lhe:
— Deixa, Mbaxi∗! O rapaz precisa...
Sebastião Cara-de-Macaco — Polo ia Hima∗, como gritavam todos os homens do cariengue∗, por ali deitados nas sombras das árvores, esperando as camionetas — foi avisando o trabalho era pesado, pega sete horas, despega seis horas e todo o dia é aguentar os sacos de cimento nas costas, carregar as camionetas, descansar só mesmo para uma sandes∗ de peixe frito. E depois o pior é esse pó toda a hora, ainda que põe lenço na boca, ele entra na mesma.
— E você, rapaz, és fraco! Não quero t’aldrabar∗!...
Zeca Santos resmungou qualquer coisa, nem ele mesmo que percebeu o quê, o homem fazia respeito com seu largo peito e braços pareciam eram troncos de pau, a voz grossa, as pernas grandes saindo duma calça rasgada em feitio de calção. Apontando em todos os outros por ali sentados ou deitados, Sebastião riu um grande riso de dono e falou-lhes, mais baixo agora:
— Você vai roubar serviço num desses homens!... Mas deixa só! Eu é que escolho quando vêm os camiões... e você vai comigo!
Maneco apertou-lhe a mão para despedir, mas o homem não aceitou. Continuou rir, ria, e falou outra vez. Zeca Santos não percebia por que o homem ria assim, mas as palavras espantaram:
— Os gajos costumam pagar quarenta, nesse serviço. Já foi sessenta cada dia, mas tem sempre cada vez mais gente aqui para trabalhar e os sacanas fazem abatimento...
Olhou para todos os lados, calado e desconfiado agora, e os olhos brilharam na cara achatada de grande queixo.
— Dez paus cada dia, são para mim. Aceitas?
Zeca Santos abriu a boca, mas Maneco já refilava:
— Ená, Mbaxi! Vê ainda o rapaz, pópilas!∗ Tem pessoa de família para comer...
— E eu? Não tenho meus sete filhos? Como vou dar de comer? Enh? E vestir? Se não aceita tem aí quem me dá mesmo metade, se lhe deixo ir no cimento!
Maneco quis ainda protestar, arranjar abatimento, cinco estava muito bem, o rapaz tinha de fazer força, lutar, não estava habituado, merecia o vencimento...
— Por isso mesmo! — riu. — Por isso mesmo! O miúdo vai fazer mangonha∗, eu é que vou lhe carregar o resto dele...
No meio desse riso assim, que lhe sacudia os músculos dentro da camisola, virou-lhes as costas e adiantou deitar outra vez debaixo da velha árvore onde estava, gritando depois:
— Seis horas, sem falta! Senão, entra outro! E dez paus...
Maneco pôs-lhe um manguito∗ e Zeca Santos foi ainda muito tempo com um peso no coração, nem lhe apetecia falar, antes de despedir o amigo e chegar na porta da fábrica de tabacos, adiantar combinar encontro com Delfina.
Mas agora, com a rapariga ali ao lado, não tinha mais lembrança de Sebastião Polo ia Hima. O calor começava já fugir com medo da noite que vinha e um vento, guardando o fresco da chuva da manhã, batia o vestido de Delfina de encontro às pernas fortes, ao corpo rijo dela, O capim verde convidava de todos os lados e, molhado como estava, punha cócegas nos pés de Zeca Santos, metendo-se nos sapatos rotos. Ia muito calado, não sabia mais o que dizer a Delfina, tudo quanto estava inventar debaixo do sape-sape, essas palavras doces que nasciam à toa no calor das farras, agora ali não aceitavam sair. Pelo carreiro acima, devagar, sentia as cigarras a cantar nos troncos das acácias, o vento a dançar os ramos cheios de flores, as folhas murmurando uma conversa parecia de namorados, todo o barulho das picas∗, dos pardais, dos plim-plaus aproveitando os bichos das chuvas. Delfina vinha com um pequeno sorriso escondido, de fazer-pouco, e foi ela quem adiantou interromper esse silêncio:
— Ená! Então você me dá encontro e não dizes nada?
— Oh!... O que eu quero falar você já sabe, Fina!
— Ih!? Já sei? Quando é que falaste? E trabalho, já arranjaste?
continua página 024...
_____________________
∗ sape-sape— árvore da família da fruta-pinha.
∗ xaxualhar — balançar fazendo ruído; farfalhar; rumorejar.
∗ muringue — moringa; cântaro; pote de barro para água.
∗ merengar — dançar o merengue (ritmo musical).
∗ “Kabulu” — Coelho (das fábulas); música original do conjunto Ngota Ritmo.
∗ sacrista — sacana.
∗ Mbaxi — Sebastião.
∗ Polo ia Hima — cara de macaco.
∗ cariengue — sistema de trabalho que emprega mão-de-obra avulsa: trabalho temporário.
∗ sande — sanduíche.
∗ aldrabar — enganar; mentir; passar conto do vigário.
∗ pópilas! — exclamação de surpresa, que equivale aproximadamente a “ora bolas!”.
∗ mangonha — preguiça.
∗ manguito — gesto obsceno feito com os dois braços.
∗ pica — o mesmo que pica-flor; beija-flor.
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Leia também:
Contos Africanos : Luandino Vieira - Vavó Xíxi... a chuva não caía (01)
Contos Africanos : Luandino Vieira - Vavó Xíxi... a raiva era muita e quente (02)
Contos Africanos : Luandino Vieira - Vavó Xíxi... ...Dona Cecília de Bastos Ferreira (03)
Contos Africanos : Luandino Vieira - Vavó Xíxi...Vinham andando os dois... (04)
Luandino Vieira
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Assim, ali sozinho, de todos os lados as grandes casas de muitas janelas olhavam-lhe, rodeavam-lhe, parecia era feitiço. Sem mais água, só mesmo com a chuva é que vivia e sempre atacado no fumo preto das camionetas, indo e vindo no porto, que ali era o caminho delas, como é essa árvore ainda tinha coragem e força para pôr uma sombra boa, crescer suas folhas verde sujas, amadurecer os sape-sapes que falavam sempre frescura da sua carne de algodão e o gosto de cuspir longe as sementes pretas, arrancar a pele cheia de picos? Só mais lá em cima, nas barrocas das Florestas, tinha outros pau. Ali, era só aquele, corajoso, guardando na sua sombra massuícas pretas de fazer comida de monangambas dos armazéns de café, dos aprendizes de mecânico da oficina em frente, mesmo dos homens da Câmara quando vinham com as pás e picaretas e rasgavam a barriga das ruas.
Nessa hora de quase cinco horas as folhas xaxualhavam∗ baixinho e a sombra estendida estava boa, fresca, parecia era água de muringue∗. Sentado nas pedras negras do fumo, Zeca Santos esperava Delfina mirando, ansioso, a porta da fábrica. Tinha combinado com a pequena, nesse dia ela ia pedir para sair mais cedo, iam dar encontro, Zeca queria adiantar essas falas do baile de sábado. Delfina merengara∗ muito bem com ele e quando o conjunto, depois, rebentou com a música do “Kabulu”∗, ninguém mais lhes agarrou, quase o baile ia ficar só deles os dois, toda a gente parada a assistir-lhes, vaidosos e satisfeitos. Daí é que nasceu a peleja com João Rosa: o rapaz andava perseguir a garota, queria-lhe para ele, mas, nessa noite, Zeca Santos com a satisfação dos olhos de Delfina, pelejava mesmo que eram muitos. A sorte ficou do lado dele, azar no lado de João porque, lá fora, a luz era pouca. O rapaz usava óculos e falhou o soco na cara; aí, sem custar nada, Zeca caçou-lhe o braço e passou-lhe uma bassula nas costas, mergulhou-lhe em cima da areia.
Mas, mesmo que na peleja Zeca tinha ganhado, o mulato continuou vir buscar Delfina em seu carro pequeno, muitas vezes costumava-lhe trazer também e, nessa hora, era já escuro. Zeca ficava raivado, pensava o silêncio e o escondido do carro, se calhar o sacrista∗ adiantava apalpar as pernas da namorada, muitas vezes, quem sabe? outras coisas mesmo, o carro estava-lhe ajudar...
Por causa disso, nesse dia tinha decidido. Ou era dos copos do vinho no almoço e mais outro com Maneco depois que falaram no Sebastião, ou era ainda, cadavez, essa promessa de trabalho que arranjara, a verdade agora estava ver tudo com mais confiança, satisfeito quase. Sem querer mesmo, o pensamento do dinheiro para mandar consertar sapatos, muitas vezes umas calças novas, juntava-se com a figura de Delfina, com seu riso e seu falar, seu encostar pequeno e bom, na hora dos tangos, na farra...
Sebastião tinha-lhes recebido bem, Maneco era amigo. Grande, careca quase, o homem falou com voz grossa em Zeca Santos, apalpou-lhe ainda os braços, depois cuspiu. Mas Maneco estava a ajudar-lhe:
— Deixa, Mbaxi∗! O rapaz precisa...
Sebastião Cara-de-Macaco — Polo ia Hima∗, como gritavam todos os homens do cariengue∗, por ali deitados nas sombras das árvores, esperando as camionetas — foi avisando o trabalho era pesado, pega sete horas, despega seis horas e todo o dia é aguentar os sacos de cimento nas costas, carregar as camionetas, descansar só mesmo para uma sandes∗ de peixe frito. E depois o pior é esse pó toda a hora, ainda que põe lenço na boca, ele entra na mesma.
— E você, rapaz, és fraco! Não quero t’aldrabar∗!...
Zeca Santos resmungou qualquer coisa, nem ele mesmo que percebeu o quê, o homem fazia respeito com seu largo peito e braços pareciam eram troncos de pau, a voz grossa, as pernas grandes saindo duma calça rasgada em feitio de calção. Apontando em todos os outros por ali sentados ou deitados, Sebastião riu um grande riso de dono e falou-lhes, mais baixo agora:
— Você vai roubar serviço num desses homens!... Mas deixa só! Eu é que escolho quando vêm os camiões... e você vai comigo!
Maneco apertou-lhe a mão para despedir, mas o homem não aceitou. Continuou rir, ria, e falou outra vez. Zeca Santos não percebia por que o homem ria assim, mas as palavras espantaram:
— Os gajos costumam pagar quarenta, nesse serviço. Já foi sessenta cada dia, mas tem sempre cada vez mais gente aqui para trabalhar e os sacanas fazem abatimento...
Olhou para todos os lados, calado e desconfiado agora, e os olhos brilharam na cara achatada de grande queixo.
— Dez paus cada dia, são para mim. Aceitas?
Zeca Santos abriu a boca, mas Maneco já refilava:
— Ená, Mbaxi! Vê ainda o rapaz, pópilas!∗ Tem pessoa de família para comer...
— E eu? Não tenho meus sete filhos? Como vou dar de comer? Enh? E vestir? Se não aceita tem aí quem me dá mesmo metade, se lhe deixo ir no cimento!
Maneco quis ainda protestar, arranjar abatimento, cinco estava muito bem, o rapaz tinha de fazer força, lutar, não estava habituado, merecia o vencimento...
— Por isso mesmo! — riu. — Por isso mesmo! O miúdo vai fazer mangonha∗, eu é que vou lhe carregar o resto dele...
No meio desse riso assim, que lhe sacudia os músculos dentro da camisola, virou-lhes as costas e adiantou deitar outra vez debaixo da velha árvore onde estava, gritando depois:
— Seis horas, sem falta! Senão, entra outro! E dez paus...
Maneco pôs-lhe um manguito∗ e Zeca Santos foi ainda muito tempo com um peso no coração, nem lhe apetecia falar, antes de despedir o amigo e chegar na porta da fábrica de tabacos, adiantar combinar encontro com Delfina.
Mas agora, com a rapariga ali ao lado, não tinha mais lembrança de Sebastião Polo ia Hima. O calor começava já fugir com medo da noite que vinha e um vento, guardando o fresco da chuva da manhã, batia o vestido de Delfina de encontro às pernas fortes, ao corpo rijo dela, O capim verde convidava de todos os lados e, molhado como estava, punha cócegas nos pés de Zeca Santos, metendo-se nos sapatos rotos. Ia muito calado, não sabia mais o que dizer a Delfina, tudo quanto estava inventar debaixo do sape-sape, essas palavras doces que nasciam à toa no calor das farras, agora ali não aceitavam sair. Pelo carreiro acima, devagar, sentia as cigarras a cantar nos troncos das acácias, o vento a dançar os ramos cheios de flores, as folhas murmurando uma conversa parecia de namorados, todo o barulho das picas∗, dos pardais, dos plim-plaus aproveitando os bichos das chuvas. Delfina vinha com um pequeno sorriso escondido, de fazer-pouco, e foi ela quem adiantou interromper esse silêncio:
— Ená! Então você me dá encontro e não dizes nada?
— Oh!... O que eu quero falar você já sabe, Fina!
— Ih!? Já sei? Quando é que falaste? E trabalho, já arranjaste?
continua página 024...
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∗ sape-sape— árvore da família da fruta-pinha.
∗ xaxualhar — balançar fazendo ruído; farfalhar; rumorejar.
∗ muringue — moringa; cântaro; pote de barro para água.
∗ merengar — dançar o merengue (ritmo musical).
∗ “Kabulu” — Coelho (das fábulas); música original do conjunto Ngota Ritmo.
∗ sacrista — sacana.
∗ Mbaxi — Sebastião.
∗ Polo ia Hima — cara de macaco.
∗ cariengue — sistema de trabalho que emprega mão-de-obra avulsa: trabalho temporário.
∗ sande — sanduíche.
∗ aldrabar — enganar; mentir; passar conto do vigário.
∗ pópilas! — exclamação de surpresa, que equivale aproximadamente a “ora bolas!”.
∗ mangonha — preguiça.
∗ manguito — gesto obsceno feito com os dois braços.
∗ pica — o mesmo que pica-flor; beija-flor.
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José Luandino Vieira -
Com José Luandino Vieira a literatura angolana adquire dimensão internacional. Nascido a 4 de maio de 1935 e criado à vontade nos velhos musseques da Luanda antiga, o escritor recria linguagens de origens diversas e, através de sua prosa extraordinária, fixa o fato cultural local, universalizando-o. Suas atividades literárias e políticas no quadro da luta pela libertação nacional levam-no diversas vezes à prisão, num total de onze anos.
As três narrativas aqui reunidas retratam a dura realidade dos musseques angolanos - os bairros pobres de Luanda, onde o próprio autor viveu. "Minha preocupação era ser o mais fiel possível àquela realidade. [...] Se a fome, a exploração, o desemprego, surgem com muita evidência [...] é porque isso era - digamos assim - o aquário onde meus personagens e eu circulávamos", afirma Luandino.
E, dura realidade à parte, Luandino cria personagens memoráveis. Como "Vavó" Xíxi e seu neto, que, sem trabalho e sem dinheiro, não dispensa a camisa florida ou o amor de Delfina, para desespero da avó (Vavó Xíxi e seu neto Zeca Santos). Ou o Garrido Kam'tuta, atormentado pelo papagaio que ganhava as carícias que Inácia lhe recusava (Estória do ladrão e do papagaio). Ou nga Zefa e sua vizinha, que disputam a posse de um ovo de galinha (Estória da galinha e do ovo).
Essas histórias curtas, narradas com grande maestria e um colorido muito especial, buscam na oralidade inspiração para recriar a linguagem e nos fazem lembrar da nossa própria trajetória literária.
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José Luandino Vieira -
Com José Luandino Vieira a literatura angolana adquire dimensão internacional. Nascido a 4 de maio de 1935 e criado à vontade nos velhos musseques da Luanda antiga, o escritor recria linguagens de origens diversas e, através de sua prosa extraordinária, fixa o fato cultural local, universalizando-o. Suas atividades literárias e políticas no quadro da luta pela libertação nacional levam-no diversas vezes à prisão, num total de onze anos.
As três narrativas aqui reunidas retratam a dura realidade dos musseques angolanos - os bairros pobres de Luanda, onde o próprio autor viveu. "Minha preocupação era ser o mais fiel possível àquela realidade. [...] Se a fome, a exploração, o desemprego, surgem com muita evidência [...] é porque isso era - digamos assim - o aquário onde meus personagens e eu circulávamos", afirma Luandino.
E, dura realidade à parte, Luandino cria personagens memoráveis. Como "Vavó" Xíxi e seu neto, que, sem trabalho e sem dinheiro, não dispensa a camisa florida ou o amor de Delfina, para desespero da avó (Vavó Xíxi e seu neto Zeca Santos). Ou o Garrido Kam'tuta, atormentado pelo papagaio que ganhava as carícias que Inácia lhe recusava (Estória do ladrão e do papagaio). Ou nga Zefa e sua vizinha, que disputam a posse de um ovo de galinha (Estória da galinha e do ovo).
Essas histórias curtas, narradas com grande maestria e um colorido muito especial, buscam na oralidade inspiração para recriar a linguagem e nos fazem lembrar da nossa própria trajetória literária.
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Luuanda
Estórias
Escritas no Pavilhão Prisional da PIDE e nas masmorras da l.a Esquadra da P.S.P.A., em Luanda, durante o ano de 1963.
1.a ed. — Luanda, “ABC”, 1964.
2.a ed. (revista) — Lisboa, Edições 70, 1972 (com uma tiragem especial de 500 + XXV exemplares).
3.a ed. — Lisboa, Edições 70, 1974.
4.a ed. — Lisboa, Edições 70, 1974.
5.a ed. — Lisboa, Edições 70, 1976.
6.a ed. — Lisboa/Luanda, Edições 70 — U.E.A., 1977.
7.a ed. (livro de bolso) — Luanda, U.E.A., 1978.
— Circulou em Lisboa, em 1965, uma edição clandestina, com a indicação (falsa) de ter sido feita em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil,
— Prêmio literário angolano Mota Veiga em 1964.
— Grande Prêmio de Novelística da Sociedade Portuguesa de Escritores, 1965.
— Tradução russa por Helena Riáusova: Luanda, na revista Innostranaya Literatura, Moscou, 1968.
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