a esperança mobiliza a realidade
Ensaio 014B – 3ª.ed
baitasar e paulus e marko e kamilá
Professor Paulo, aqui, nesta reunião – ou em qualquer outra –, correndo os riscos que toda generalização nos impõe, ninguém ficaria surpreso ou atônita com a inexistência de professores e professoras como coletivo pedagógico, pelo menos, naquelas em que trabalhei, nestes quarenta e tantos anos de reuniões administrativas-instrutivas. Vi algumas tentativas diferentes na educação de jovens e adultos, mas também muito espanto, crises, bolos de aniversário, almoço, piadas-reclamações, abandonos e tarefas de calendário, planejamentos de eventos: dia da criança, do índio do professor da árvore, dias das bruxas – como bons colonizados e colonizadas não podemos esquecer o Halloween, é tão divertido pedir balas ou travessuras, uma gracinha. Mas ainda tenho esperança de encontrar planejamento e sentido coletivo em nossas ações pedagógicas.
eu também, querido Marko, escutei muitos sonhos, presenciei muitas discussões, e algumas tentativas, que não passaram de desejo de uns poucos e poucas, lutas coletivas sabotadas por nós mesmas, Gente, o que nos impede de existirmos como um coletivo pedagógico, a pergunta pairava na reunião administrativa-instrutiva
O professor Marko precisa participar mais das nossas reuniões. Caso o professor não saiba, construímos em nossas reuniões a Árvore Pedagógica, desta escola!
Eu sei, Ofélia. Eu já estava aqui, mas confesso que minha participação foi pequena, deveria ter acreditado. Um erro entre tantos que cometi num tempo de esperança. Uma pena que nossa árvore virou um lindo quadro esquecido nos corredores. E não sei se os professores e professoras, novas e novos na escola, sabem que temos uma Árvore Pedagógica. Aposto que não sabem. Voltamos no tempo, onde cada um e uma ocupa o seu quadrado e o defende com unhas e dentes.
Então, gente, o que nos impede de sair deste isolamento? O que vocês precisam da direção da escola, a altíssima sendo objetiva e clara, no que podemos ajudar, o que nos impede de fazer e colocar em prática um planejamento coletivo?
Rachel, os eventos do calendário já estão planejados...
Cabayba, eu acho que não é esse planejamento que está em discussão... se entendi, a nossa altíssima diretora está garantindo nossas reuniões, ou não?
Sim, Anita... até no limite do respaldo que vocês e a comunidade quiserem me oferecer, sem esse apoio não tenho muito o que fazer.
o Marko levanta a mão, essa coisa de sentar um e uma atrás da outro e outra não ajudam as conversas
Eu tenho um sonho, haverá o tempo que nas escolas públicas pensaremos uma educação coletiva solidária com o todo e com as partes, incluindo pais e mães, alunos e alunas, todas e todos dialogando com a educação que querem para si ou para seus filhos e filhas.
Vai sonhando, Marko! Vamos falar sério, gente! Vocês não acham um desperdício do dinheiro público a nossa cidade investir nesse entulho da filosofia nas vilas? Não que eu ache a filosofia um entulho, nem a geografia, muito menos a história, não me entendam mal, mas nas escolas em que valem a pena esses estudos. Essa gente aqui precisa aprender português e matemática! Arrisco dizer que nem educação física é tão necessária assim, a menos que seja para preparar bons corredores da nossa boa polícia. Por favor, precisamos é de mais religião nas escolas. Sonho com uma administração corajosa para enfrentar essa merda de democracia na escola. Esse desperdício de escola inclusiva, libertária e sociedade justa. Educação com qualidade na escola pública é com muitas e boas aulas de português e matemática. Vileiro fingi que aprende, nós fingimos que ensinamos, caso vocês ainda não se deram conta. O sentido da escola pública é educar a disciplina e a obediência nesses pobres coitados. Fala sério, gente! Francês e espanhol nas vilas? É deboche, né?
a desesperança da Ofélia se antecipa à maldade, nos faz viver com medo, cheias de nós mesmas e ao mesmo tempo descrentes, seguindo regulamentos, esperando a recompensa que nunca vem, anônimas e anônimos zumbis despercebidos
Você acredita em tudo isso? Você não acredita na força do diálogo? Você não acredita na força transformadora da educação? O que você está fazendo aqui? Saia e vá ser feliz fazendo outras coisas.
Marko, esses vileiros me deprimem. Essa gente não tem o que me ensinar. Ainda não chegou o dia em que o poste vai fazer xixi no cachorro, essas palavras da Ofélia me torturam, tão cheias de amargura, desencanto frustração, escondida em queixas, reclamações, críticas, xingamentos e acusações, mas com certeza não foi ela que inventou essa educação de alfas e betas utilitárias, instrumento de dominação, sem utilidade alguma além de desumanizar a educação
Ofélia, estou falando sério... Salve-se e nos permita prosseguir.
Eu acho que precisamos escutar todos e todas sobre o que esperam de nós, professores, mesmo que seja, Queremos que façam o seu trabalho e ensinem os nossos filhos e filhas.
Isso, Carlos. As pessoas precisam escutar a própria voz, nós precisamos escutá-las. Mas é fundamental que o nosso discurso consagrado pelo púlpito catedrático – exaltado e aclamado apenas por nós, é verdade – não seja uma oração pedagógica para lhes afirmar de maneira contundente, definitiva e incompreensível que somente nós entendemos educação, e vocês, pais e mães, nada de relevante têm a nos dizer. Será?
Também tenho poucas certezas e muitas dúvidas, Marko. Conseguiremos desvelar com amorosidade à necessidade da argumentação crítica e a construção das palavras como alimento amoroso do pensamento?
Eu entendo, Paulo. Parece que na maioria das vezes conduzimos as palavras em voos só por voar, voos sem sonhos.
Isso nos basta?
Espero que não. Espero que não nos baste lutar por nossa dignidade como profissionais da educação – a nossa eterna luta salarial -, esquecendo a defesa dos direitos de todos e todas, crianças e adolescentes, jovens e adultos, a todo conhecimento que a humanidade acumulou, seja na filosofia, na história, geografia, o conhecimento do próprio corpo, reconhecendo limites e estratégias para superar esses limites com uma educação física que faça sentido para suas vidas, divertida, lúdica e construtora da determinação individual e coletiva.
Leia também:
parábolas: ensaio 001A / Camarada, Ofélia!
parábolas: ensaio 002A / o coração livre para voar
parábolas: ensaio 003A / macho, branco e dono de tudo
parábolas: ensaio 004A / uma carreta de bois
parábolas: ensaio 005A / amar para se deliciar junto
parábolas: ensaio 006A / civismo cínico
parábolas: ensaio 007A / o compromisso
parábolas: ensaio 008A / minicontos de natal
parábolas: ensaio 009A / a fome que nunca passa
parábolas: ensaio 010A / o medo no cardápio pedagógico
parábolas: ensaio 011A / o futuro não é eterno
parábolas: ensaio 012A / o bufê das comidas invisíveis
parábolas: ensaio 013B / o sorriso cínico da desesperança maliciosa
parábolas: ensaio 014B / a esperança mobiliza a realidade
parábolas: ensaio 015B / silenciar o outro não é educar
Eu acho que precisamos escutar todos e todas sobre o que esperam de nós, professores, mesmo que seja, Queremos que façam o seu trabalho e ensinem os nossos filhos e filhas.
Isso, Carlos. As pessoas precisam escutar a própria voz, nós precisamos escutá-las. Mas é fundamental que o nosso discurso consagrado pelo púlpito catedrático – exaltado e aclamado apenas por nós, é verdade – não seja uma oração pedagógica para lhes afirmar de maneira contundente, definitiva e incompreensível que somente nós entendemos educação, e vocês, pais e mães, nada de relevante têm a nos dizer. Será?
Também tenho poucas certezas e muitas dúvidas, Marko. Conseguiremos desvelar com amorosidade à necessidade da argumentação crítica e a construção das palavras como alimento amoroso do pensamento?
Eu entendo, Paulo. Parece que na maioria das vezes conduzimos as palavras em voos só por voar, voos sem sonhos.
Isso nos basta?
Espero que não. Espero que não nos baste lutar por nossa dignidade como profissionais da educação – a nossa eterna luta salarial -, esquecendo a defesa dos direitos de todos e todas, crianças e adolescentes, jovens e adultos, a todo conhecimento que a humanidade acumulou, seja na filosofia, na história, geografia, o conhecimento do próprio corpo, reconhecendo limites e estratégias para superar esses limites com uma educação física que faça sentido para suas vidas, divertida, lúdica e construtora da determinação individual e coletiva.
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