mulheres descalças
Bagaço hipócrita!
Ensaio 127Bs – 2ª edição 1ª reimpressão
baitasar
as palavra do pensamento continuava empedrada na boca da dona rosinha, elas num se solta pelos quatro canto da casa, num chora nem ri as palavra, no peito a falta da respiração era da angústia de num chorá e num falá e vê o tempo indo e otro chegando, os cabelo trocando o colorido do luto pela paz esmaecida, a pele encrespando, nesta tristeza profunda dos mau-trato da indiferença e dos punho fechado
e o tempo todo dia fazendo aniversário
o aniversário do tempo é uma invenção pra fazê as lembrança de longe tê mais sabedoria qui as lembrança de perto, será qui foi tão bão assim, é de se pruguntá, mais num tinha jeito das palavra saí pra respondê ou pruguntá, elas parecia mais qui se arrastava pelo silêncio do chão – como as cobra peçonhenta do mato qui se enfia pelas pedra ajustada nos escombro da escuridão – procurando e suspeitando e calculando com a língua
elas tem dois óio, mais enxerga mesmo é com a língua
dona rosinha num abre os caminho com a língua igual as peçonhenta, Nunca sentei com outras mulheres para conversar, o sinhô Augusto sempre estava junto. Nunca conversei sem medo. E sempre a mesma pose sentada, o mesmo desafio todos os dias: sentar e não cruzar as pernas. Como me imagino? Uma sombra sem corpo que decidiu ficar viva. Desisti de pensar no dia de ontem e no dia de amanhã. Esqueço o que passou e não me importa o que vem chegando. Como mãe tenho que cuidar da casa, dar um bom exemplo à nossa filha Chiquinha. Não tenho o recurso da beleza, e meu Deus, como eu queria ter essa beleza, e do mesmo jeito também não queria, os homens são animais famintos. Falam alto e nos dizem para ficarmos quietas, são tão previsíveis e iguais. O único talento que exigem das esposas é a aptidão do parto. Quando se cansam, espancam! Nunca me beijou, pelo menos, não lembro. Acho que eu lembraria. Eu deveria lembrar, não é? Quando engravidei do primeiro – o irmão da Chiquinha – a minha competência e habilidade reconhecida era de manter a organização da casa com a força dos meus braços e pernas, até que fiquei sonolenta, pesada e cansada. Foi quando o sinhô Augusto, preocupado com a hora do parto, trouxe para a casa: Antônia. Não disse nada. Foi a única vez que ele adivinhou o meu pensamento. Não pedi nada, sabia que estava feia. Quando vi Antônia, pensei: Agora tinha alguém em quem mandar. Queria me aliviar de todo sofrimento que já tinha passado e guardado dentro de uma lata. A última da fila! A lata do lixo dessa vida de merda! Será que eu sou como ele? Fiquei horrorizada. Eu sou má ou estou ficando má? Deitei e adormeci. Acordei gritando: Alguém me ajuda! Ninguém apareceu. Jamais aparece. Continuou difícil conversar sobre qualquer bisbilhotice que não fosse a casa e a minha barriga – que, a bem da verdade, já tinha virado a barriga dele e com tudo dentro –, para não amamentar problemas ficava em silêncio. Querer conversar era o mesmo vazio que ter uma doença contagiosa, podia sentir a repulsa. O meu corpo jamais foi o meu corpo. Sou só um pedaço de carne e seiva desta maldita Villa de escombros!
o siô augusto cezar emudeceu e a cara empalideceu, dona rosinha sentiu o medo se acomodando nela, ainda contava com a proteção da barriga, mais num sabia dizê se os pensamento saiu pru ventu, o esposo num tava acostumado tê resposta pras suas investida, muntu menos, revide atrevido das palavra, Será que vai me expulsar? Gosto de falar alto, ser engraçada. Quero me divertir, ser livre, e não presa a um homem, um capitão-do-mato. Se eu tenho medo? Tenho. Não tenho amigas. E vocês, siazinhas brancas? O que conseguiram?
o tempo qui os dois ficô oiando um pru otro com fingimento de cara vazia fez usóio dela descê prus pé e usóio dele desviá pra janela, num era oiá de aniversário
os dois tava com oiá de cemitério
o siô augusto pareceu num querê respondê como um bufão descontente, mais num tinha munta ousadia com as palavra qui num fosse aquelas pra machucá, ele vagueia pelo complô dos dono de tudo qui fica indiferente com os resultado pra dona rosinha, leviano com as vontade da sua mãezinha
os dois ficô sem o tempo, mais só dona rosinha continuava sem fazê vivê as palavra, engolia elas toda – aos pedaço e intêra –, nunca fez elas brotá, Bagaço hipócrita! Como me arrependo de ter cruzado o mesmo caminho! Jagunço hipócrita que espreita a claridade com a sua escuridão! O demônio mastigou e vomitou vosmecê nesse corpo viciado e sem remorsos, transbordando infâmia que amordaça e não consola. Um homem xoxo que grita. Isso mesmo, vosmecê é um abutre que não se arrisca e que pragueja entediado: Vadia!
não sou seu repasto, bagaço hipócrita! cruzo as pernas, não estou de joelhos nem piedosa, nem flácida ou acanhada, muito menos, enferma ou lasciva, mas com certeza fico entediada com essa vida que jamais termina, a mente é trágica e as tuas palavras vomitam calafrios por tudo em mim, até quando as suavizas, estou com as pernas cruzadas, sim, eu sou o aço e a fecundidade, e vosmecê
um bagaço hipócrita e negligente, sem perfume, sem canto e sem encanto, a preguiça desse pau murcho e sem viço é a cicatriz desse mistério de ódio e dor, eu sou o farol desta casa repleta de lamentos e crucifixos
quanto ódio aprendi com vosmecê, bagaço infame, em quantos labirintos precisei me esconder, me tornei imortal, não deboche, sou a musa da minha alma, o paladar do meu gosto, o pão da minha fome, as entranhas da minha agonia anônima, a mulher que você jamais vai conhecer
eu me salvei
e você, bagaço hipócrita?
não sou da sua costela nem das suas mãos, não sou do seu deus! sou da terra lamacenta que me espera até ser um ossário esquecido e sem memória, isso não é castigo nem tristeza, o esquecimento é o tambor da vida, um segredo sem perfume, um tédio que definha até o meu tudo desaparecer, o esquecimento também desaparece
entendeu, jagunço hipócrita?
desaparecemos no esquecimento, o nosso ossário é o adubo desta terra revolta de memórias, o meu coração não tem tamanho, mas o vosso é frio e calculista, um lugar subterrâneo, cruel e egoísta
o meu esquecimento da tua vida será sem lamentação ou penitência
subiu usóio dos pé assustada, ela num sabia se os pensamento saiu tudo pru ventu, num sabia se parô com os pensamento ou com a soltura das palavra, tava com as mão no colo das perna cruzada
A Mãezinha sabe que não gosto quando fica fazendo essa brincadeira de dizer e não dizer o que está pensando. Não gosto deste jogo do esconde-esconde.
E do que o Paizinho gosta?
pronto, ele viu qui ela tava no ponto de desafiá, o espasmo da raiva tinha passado, recuô pra esperá, como se tivesse percebido qui as palavra estúpida e a mão pesada é mais da miséria qui num dá desafogo, Bater é só uma maneira para distrair os pensamento das coisas que não se entende...
o siô augusto sabe que não deve bater na dona rosinha, mais ele bate pruqui o dono de tudo pode tudo
histórias de avoinha: Toque, minha filha.
Ensaio 127Bj – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: Onde está a gaiola do Venuto?
Ensaio 127Bk – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: Deus te abençoe, minha filha
Ensaio 127Bl – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: um corpo febrento e para sempre culpada
Ensaio 127Bm – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: a dança dos dedo
Ensaio 127Bn – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: os pé e as bota de garrão
Ensaio 128A – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: Oh!... prugunta pra todas criança
Ensaio 128B – 2ª edição 1ª reimpressão
Ensaio 127Bp – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: um império invisível
Ensaio 127Bq – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: uma sombra sem corpo não cruza as pernas
Ensaio 127Br – 2ª edição 1ª reimpressão
histórias de avoinha: a vaga de marido
Ensaio 127Bt – 2ª edição 1ª reimpressão
Bagaço hipócrita!
Ensaio 127Bs – 2ª edição 1ª reimpressão
baitasar
as palavra do pensamento continuava empedrada na boca da dona rosinha, elas num se solta pelos quatro canto da casa, num chora nem ri as palavra, no peito a falta da respiração era da angústia de num chorá e num falá e vê o tempo indo e otro chegando, os cabelo trocando o colorido do luto pela paz esmaecida, a pele encrespando, nesta tristeza profunda dos mau-trato da indiferença e dos punho fechado
e o tempo todo dia fazendo aniversário
o aniversário do tempo é uma invenção pra fazê as lembrança de longe tê mais sabedoria qui as lembrança de perto, será qui foi tão bão assim, é de se pruguntá, mais num tinha jeito das palavra saí pra respondê ou pruguntá, elas parecia mais qui se arrastava pelo silêncio do chão – como as cobra peçonhenta do mato qui se enfia pelas pedra ajustada nos escombro da escuridão – procurando e suspeitando e calculando com a língua
elas tem dois óio, mais enxerga mesmo é com a língua
dona rosinha num abre os caminho com a língua igual as peçonhenta, Nunca sentei com outras mulheres para conversar, o sinhô Augusto sempre estava junto. Nunca conversei sem medo. E sempre a mesma pose sentada, o mesmo desafio todos os dias: sentar e não cruzar as pernas. Como me imagino? Uma sombra sem corpo que decidiu ficar viva. Desisti de pensar no dia de ontem e no dia de amanhã. Esqueço o que passou e não me importa o que vem chegando. Como mãe tenho que cuidar da casa, dar um bom exemplo à nossa filha Chiquinha. Não tenho o recurso da beleza, e meu Deus, como eu queria ter essa beleza, e do mesmo jeito também não queria, os homens são animais famintos. Falam alto e nos dizem para ficarmos quietas, são tão previsíveis e iguais. O único talento que exigem das esposas é a aptidão do parto. Quando se cansam, espancam! Nunca me beijou, pelo menos, não lembro. Acho que eu lembraria. Eu deveria lembrar, não é? Quando engravidei do primeiro – o irmão da Chiquinha – a minha competência e habilidade reconhecida era de manter a organização da casa com a força dos meus braços e pernas, até que fiquei sonolenta, pesada e cansada. Foi quando o sinhô Augusto, preocupado com a hora do parto, trouxe para a casa: Antônia. Não disse nada. Foi a única vez que ele adivinhou o meu pensamento. Não pedi nada, sabia que estava feia. Quando vi Antônia, pensei: Agora tinha alguém em quem mandar. Queria me aliviar de todo sofrimento que já tinha passado e guardado dentro de uma lata. A última da fila! A lata do lixo dessa vida de merda! Será que eu sou como ele? Fiquei horrorizada. Eu sou má ou estou ficando má? Deitei e adormeci. Acordei gritando: Alguém me ajuda! Ninguém apareceu. Jamais aparece. Continuou difícil conversar sobre qualquer bisbilhotice que não fosse a casa e a minha barriga – que, a bem da verdade, já tinha virado a barriga dele e com tudo dentro –, para não amamentar problemas ficava em silêncio. Querer conversar era o mesmo vazio que ter uma doença contagiosa, podia sentir a repulsa. O meu corpo jamais foi o meu corpo. Sou só um pedaço de carne e seiva desta maldita Villa de escombros!
o siô augusto cezar emudeceu e a cara empalideceu, dona rosinha sentiu o medo se acomodando nela, ainda contava com a proteção da barriga, mais num sabia dizê se os pensamento saiu pru ventu, o esposo num tava acostumado tê resposta pras suas investida, muntu menos, revide atrevido das palavra, Será que vai me expulsar? Gosto de falar alto, ser engraçada. Quero me divertir, ser livre, e não presa a um homem, um capitão-do-mato. Se eu tenho medo? Tenho. Não tenho amigas. E vocês, siazinhas brancas? O que conseguiram?
o tempo qui os dois ficô oiando um pru otro com fingimento de cara vazia fez usóio dela descê prus pé e usóio dele desviá pra janela, num era oiá de aniversário
os dois tava com oiá de cemitério
o siô augusto pareceu num querê respondê como um bufão descontente, mais num tinha munta ousadia com as palavra qui num fosse aquelas pra machucá, ele vagueia pelo complô dos dono de tudo qui fica indiferente com os resultado pra dona rosinha, leviano com as vontade da sua mãezinha
os dois ficô sem o tempo, mais só dona rosinha continuava sem fazê vivê as palavra, engolia elas toda – aos pedaço e intêra –, nunca fez elas brotá, Bagaço hipócrita! Como me arrependo de ter cruzado o mesmo caminho! Jagunço hipócrita que espreita a claridade com a sua escuridão! O demônio mastigou e vomitou vosmecê nesse corpo viciado e sem remorsos, transbordando infâmia que amordaça e não consola. Um homem xoxo que grita. Isso mesmo, vosmecê é um abutre que não se arrisca e que pragueja entediado: Vadia!
não sou seu repasto, bagaço hipócrita! cruzo as pernas, não estou de joelhos nem piedosa, nem flácida ou acanhada, muito menos, enferma ou lasciva, mas com certeza fico entediada com essa vida que jamais termina, a mente é trágica e as tuas palavras vomitam calafrios por tudo em mim, até quando as suavizas, estou com as pernas cruzadas, sim, eu sou o aço e a fecundidade, e vosmecê
um bagaço hipócrita e negligente, sem perfume, sem canto e sem encanto, a preguiça desse pau murcho e sem viço é a cicatriz desse mistério de ódio e dor, eu sou o farol desta casa repleta de lamentos e crucifixos
quanto ódio aprendi com vosmecê, bagaço infame, em quantos labirintos precisei me esconder, me tornei imortal, não deboche, sou a musa da minha alma, o paladar do meu gosto, o pão da minha fome, as entranhas da minha agonia anônima, a mulher que você jamais vai conhecer
eu me salvei
e você, bagaço hipócrita?
não sou da sua costela nem das suas mãos, não sou do seu deus! sou da terra lamacenta que me espera até ser um ossário esquecido e sem memória, isso não é castigo nem tristeza, o esquecimento é o tambor da vida, um segredo sem perfume, um tédio que definha até o meu tudo desaparecer, o esquecimento também desaparece
entendeu, jagunço hipócrita?
desaparecemos no esquecimento, o nosso ossário é o adubo desta terra revolta de memórias, o meu coração não tem tamanho, mas o vosso é frio e calculista, um lugar subterrâneo, cruel e egoísta
o meu esquecimento da tua vida será sem lamentação ou penitência
subiu usóio dos pé assustada, ela num sabia se os pensamento saiu tudo pru ventu, num sabia se parô com os pensamento ou com a soltura das palavra, tava com as mão no colo das perna cruzada
A Mãezinha sabe que não gosto quando fica fazendo essa brincadeira de dizer e não dizer o que está pensando. Não gosto deste jogo do esconde-esconde.
E do que o Paizinho gosta?
pronto, ele viu qui ela tava no ponto de desafiá, o espasmo da raiva tinha passado, recuô pra esperá, como se tivesse percebido qui as palavra estúpida e a mão pesada é mais da miséria qui num dá desafogo, Bater é só uma maneira para distrair os pensamento das coisas que não se entende...
o siô augusto sabe que não deve bater na dona rosinha, mais ele bate pruqui o dono de tudo pode tudo
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