Cruz e Sousa
Obra Completa
Volume 1
POESIA
O Livro Derradeiro
Primeiros Escritos
Cambiantes
Outros Sonetos Campesinas
Dispersas
Julieta dos Santos
OUTROS SONETOS
VOZINHA
Velha, velhinha, da doçura boa
De uma pomba nevada, etérea, mansa.
Alma que se ilumina e se balança
Dentre as redes da Fé que nos perdoa.
Cabeça branca de serena leoa,
Cabeça branca de serena leoa,
Carinho, amor, meiguice que não cansa,
Coração nobre sempre como a lança
Que não vergue, não fira e que não doa.
Olhos e voz de castidades vivas,
Olhos e voz de castidades vivas,
Pão ázimo das Páscoas afetivas,
Simples, tranquila, dadivosa, franca.
Morreu tal qual vivera, mansamente,
Morreu tal qual vivera, mansamente,
Na alvura doce de uma luz algente,
Como que morta de uma morte branca.
NO EGITO
Sob os ardentes sóis do fulvo Egito
NO EGITO
Sob os ardentes sóis do fulvo Egito
De areia estuosa, de candente argila,
Dos sonhos da alma o turbilhão desfila,
Abre as asas no páramo infinito.
O Egito é sempre o antigo, o velho rito
O Egito é sempre o antigo, o velho rito
Onde um mistério singular se asila
E onde, talvez mais calma, mais tranquila,
A alma descansa do sofrer prescrito.
Sobre as ruínas d’ouro do passado,
Sobre as ruínas d’ouro do passado,
No céu cavo, remoto, ermo e sagrado,
Torva morte espectral pairou ufana...
E no aspecto de tudo em torno, em tudo,
E no aspecto de tudo em torno, em tudo,
Árido, pétreo, silencioso, mudo,
Parece morta a própria dor humana!
OCASOS
Morrem no Azul saudades infinitas,
OCASOS
Morrem no Azul saudades infinitas,
Mistérios e segredos inefáveis...
Ah! Vagas ilusões imponderáveis,
Esperanças acerbas e benditas.
Ânsias das horas místicas e aflitas,
Ânsias das horas místicas e aflitas,
De horas amargas das intermináveis
Cogitações e agruras insondáveis
De febres tredas, trágicas, malditas.
Cogitações de horas de assombro e espanto
Cogitações de horas de assombro e espanto
Quando das almas num relevo santo
Fulgem de outrora os sonhos apagados.
E os braços brancos e tentaculosos
E os braços brancos e tentaculosos
Da Morte, frios, álgidos, nervosos,
Abrem-se para mim torporizados.
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Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXI - Ave! Maria
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXII - Símiles
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXIII - Decadentes
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXIV - Lirial
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXV - Visão Medieva
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXVI - Vanda
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXVII - Êxtase
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXVIII - A Partida
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXIX - Manhã
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXX - Aspiração
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXXI - Pássaro Marinho
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXXII - Magnólia dos trópicos
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXXIII - Os Mortos
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXXIV - Horas de sombra
Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XXXVI - Repouso
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De fato, a inteligência, criatividade e ousadia de Cruz e Sousa eram tão vigorosos que, mesmo vítima do preconceito racial e da sempiterna dificuldade em aceitar o novo, ainda assim o desterrense, filho de escravos alforriados, João da Cruz e Sousa, “Cisne Negro” para uns, “Dante Negro” para outros, soube superar todos os obstáculos que o destino lhe reservou, tornando-se o maior poeta simbolista brasileiro, um dos três grandes do mundo, no mesmo pódio onde figuram Stephan Mallarmé e Stefan George. A sociedade recém-liberta da escravidão não conseguia assimilar um negro erudito, multilíngue e, se não bastasse, com manias de dândi. Nem mesmo a chamada intelligentzia estava preparada para sua modernidade e desapego aos cânones da época. Sua postura independente e corajosa era vista como orgulhosa e arrogante. Por ser negro e por ser poeta foi um maldito entre malditos, um Baudelaire ao quadrado. Depois de morrer como indigente, num lugarejo chamado Estação do Sítio, em Barbacena (para onde fora, às pressas, tentar curar-se de tuberculose), seu
corpo foi levado para o Rio de Janeiro graças à intervenção do abolicionista José do Patrocínio, que cuidou para que tivesse um enterro cristão, no cemitério São João Batista.
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