sexta-feira, 7 de julho de 2023

Cruz e Sousa - Poesias Completas: Dispersas LXX - Saudação

Cruz e Sousa


Obra Completa
Volume 1
POESIA


O Livro Derradeiro
Primeiros Escritos

Cambiantes
Outros Sonetos Campesinas
Dispersas
Julieta dos Santos


DISPERSAS 



SAUDAÇÃO
Ao Liceu de Artes e Ofícios


Como esta luz é serena,
Como esta luz é sincera;
Como eu vejo a primavera
Num lápis e numa pena.

Que prismas de luz ardente,
Que prismas de luz suave;
Como eu sinto um canto de ave
Em cada boca inocente.

Sim! Que o estudo é como a aurora
Que nos entra pela casa,
Num vivo fulgor de brasa,
Vibrante, alegre, sonora.

Ele rasga a treva espessa,
Num só momento – cantando;
Vai estrelas semeando
Em cada tenra cabeça.

Tira os crânios do letargo
Da ignorância – pois entra
Como um sol e se concentra
Num esplendor muito largo.

Quem, ó Arte imaculada,
Medisse o ser da criança,
Pela alma de uma esperança,
Pela alma de uma alvorada.

Quem aos paramos subindo,
Eternamente pudesse,
Dos astros a loura messe
Arrancar – depois abrindo

Os peitos das criancinhas
Jogá-los dentro e beijá-las
Cheias de pompa e das galas
Que a luz concede às rainhas!...

Pois que a treva entre fulgores
É como, dentre ataúdes,
Rebentar como virtudes,
As mais simpáticas flores.

Ah! Ninguém sabe, por certo,
Quanto é bom, quanto é saudável,
Sentir a crença adorável
Como um clarão sempre aberto.

Ver os germens do futuro
No campo eterno da escola
Brilhando como a corola
De um lírio cândido e puro.

Ver morrer – como uns invernos
Da vida, os velhos colossos
E ver erguerem-se os moços
Como verões sempiternos.

Mães, ó mães tão estremosas,
Dos vossos ventres fecundos
Saem todos esses mundos
Das ideias fulgurosas.

Tudo isso quanto há escrito
De pensamento e crenças
Saiu das fontes imensas
De um grande amor infinito.

E desde a escrita à leitura
E desde um livro a uma carta,
A bondade sempre farta
Das mães – esplende e fulgura.

Bom dia ao mestre que é guia
Das belas crianças louras!
Bom dia às mães porvindouras,
À mocidade – Bom dia!

continua pág. 233...

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De fato, a inteligência, criatividade e ousadia de Cruz e Sousa eram tão vigorosos que, mesmo vítima do preconceito racial e da sempiterna dificuldade em aceitar o novo, ainda assim o desterrense, filho de escravos alforriados, João da Cruz e Sousa, “Cisne Negro” para uns, “Dante Negro” para outros, soube superar todos os obstáculos que o destino lhe reservou, tornando-se o maior poeta simbolista brasileiro, um dos três grandes do mundo, no mesmo pódio onde figuram Stephan Mallarmé e Stefan George. A sociedade recém-liberta da escravidão não conseguia assimilar um negro erudito, multilíngue e, se não bastasse, com manias de dândi. Nem mesmo a chamada intelligentzia estava preparada para sua modernidade e desapego aos cânones da época. Sua postura independente e corajosa era vista como orgulhosa e arrogante. Por ser negro e por ser poeta foi um maldito entre malditos, um Baudelaire ao quadrado. Depois de morrer como indigente, num lugarejo chamado Estação do Sítio, em Barbacena (para onde fora, às pressas, tentar curar-se de tuberculose), seu corpo foi levado para o Rio de Janeiro graças à intervenção do abolicionista José do Patrocínio, que cuidou para que tivesse um enterro cristão, no cemitério São João Batista.
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Organização e Estudo
Lauro Junkes
Presidente da Academia Catarinense de Letras
© Copyright 2008
Avenida Gráfica e Editora Ltda.

Projeto Gráfico, Editoração e Capa
ESPAÇO CRIAÇÃO ARQUITETURA DESIGN E COMPUTAÇÃO GRÁFICA LTDA.
www.espacoecriacao.com.br
Fone/Fax: (48) 3028.7799

Revisão Linguístico-Ortográfica
PROFª Drª TEREZINHA KUHN JUNKES
PROF. Dr. LAURO JUNKES

Impressão e Acabamento
Avenida Gráfica e Editora Ltda.
Formato
14 x 21cm

FICHA CATALOGRÁFICA

Catalogação na fonte por M. Margarete Elbert - CRB14/167
S725o      Sousa, Cruz e, 1861-1898
                        Obra completa : poesia / João da Cruz e Sousa ; organização
                  e estudo por Lauro Junkes. – Jaraguá do Sul : Avenida ; 2008.
                         v. 1 (612 p.)
                         Edição comemorativa dos 110 anos de falecimento e do
                  traslado dos restos mortais de Cruz e Sousa para Santa Catarina.
                            1. Sousa, Cruz e, 1861-1898. 2. Poesia catarinense. I.
                  Junkes, Lauro. II. Titulo.
                                                                                      CDU: 869.0(816.4)-1

"A gente só tem saída na poesia."

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