quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

29. Pedro Páramo: - ¿Sabe, don Pedro, que derrotaron al Tilcuate? - Juan Rulfo

Juan Rulfo




29. Pedro Páramo: -¿Sabe, don Pedro, que derrotaron al Tilcuate?





-¿Sabe, don Pedro, que derrotaron al Tilcuate? 

-Sé que hubo alguna balacera anoche, porque se estuvo oyendo el alboroto; pero de ahí en más no sé nada. ¿Quién te contó eso, Gerardo? 

-Llegaron unos heridos a Comala. Mi mujer ayudó para eso de los vendajes. Dijeron que eran de la gente de Damasio y que habían tenido muchos muertos. Parece que se encontraron con unos que se dicen villistas. 

-¡Qué caray, Gerardo! Estoy viendo llegar tiempos malos. ¿Y tú qué piensas hacer? 

-Me voy, don Pedro. A Sayula. Allá volveré a establecerme. 

-Ustedes los abogados tienen esa ventaja; pueden llevarse su patrimonio a todas partes, mientras no les rompan el hocico. 

-Ni crea, don Pedro; siempre nos andamos creando problemas. Además duele dejar a personas como usted, y las deferencias que han tenido para con uno se extrañan. Vivimos rompiendo nuestro mundo a cada rato, si es válido decirlo. ¿Dónde quiere que le deje los papeles? 


-No los dejes. Llévatelos. ¿O qué no puedes seguir encargado de mis asuntos allá adonde vas? 

-Agradezco su confianza, don Pedro. La agradezco sinceramente. Aunque hago la salvedad de que me será imposible. Ciertas irregularidades... Digamos... Testimonios que nadie sino usted debe conocer. Pueden prestarse a malos manejos en caso de llegar a caer en otras manos. Lo más seguro es que estén con usted. 

-Dices bien, Gerardo. Déjalos aquí. Los quemaré. Con papeles o sin ellos, ¿quién me puede discutir la propiedad de lo que tengo? 

-Indudablemente nadie, don Pedro. Nadie. Con su permiso. 

-Ve con Dios, Gerardo. 

-¿Qué dijo usted? 

-Digo que Dios te acompañe. 

El licenciado Gerardo Trujillo salió despacio. Estaba ya viejo; pero no para dar esos pasos tan cortos, tan sin ganas. La verdad es que esperaba una recompensa. Había servido a don Lucas, que en paz descanse, padre de don Pedro; después a don Pedro, y todavía; luego a Miguel, hijo de don Pedro. La verdad es que esperaba una compensación. Una retribución grande y valiosa. Le había dicho a su mujer: 

-Voy a despedirme de don Pedro. Sé que me gratificará. Estoy por decir que con el dinero que él me dé nos estableceremos bien en Sayula y viviremos holgadamente el resto de nuestros días. 

Pero ¿por qué las mujeres siempre tienen una duda? ¿Reciben avisos del cielo, o qué? Ella no estuvo segura de que consiguiera algo: 

-Tendrás que trabajar muy duro allá para levantar cabeza. De aquí no sacarás nada. 

-¿Por qué lo dices? 

-Lo sé. 

Siguió andando hacia la puerta, atento a cualquier llamado: «¡Ey, Gerardo! Lo preocupado que estoy no me ha permitido pensar en ti. Pero yo debo favores que no se pagan con dinero. Recibe esto: es un regalo insignificante». 

Pero el llamado no vino. Cruzó la puerta y desanudó el bozal con que su caballo estaba amarrado al horcón. Subió a la silla y, al paso, tratando de no alejarse mucho para oír si lo llamaban, caminó hacia Comala sin desviarse del camino. Cuando vio que la Media Luna se perdía detrás de él, pensó: «Sería mucho rebajarme si le pidiera un préstamo».



-Don Pedro, he regresado, pues no estoy satisfecho conmigo mismo. Gustoso seguiré llevando sus asuntos. 

Lo dijo, sentado nuevamente en el despacho de Pedro Páramo, donde había estado no hacía ni media hora. 

-Está bien, Gerardo. Allí estáte los papeles, donde tú los dejaste. 

-Desearía también... Los gastos... El traslado... Un mínimo adelanto de honorarios... Algo extra, por si usted lo tiene a bien. 

-¿Quinientos? 

-¿No podría ser un poco, digamos, un poquito más? 

-¿Te conformas con mil? 

-¿Y si fueran cinco?

-¿Cinco qué? ¿Cinco mil pesos? No los tengo. Tú bien sabes que todo está invertido. Tierras, animales. Tú lo sabes. Llévate mil. No creo que necesites más. 

Se quedó meditando. La cabeza caída. Oía el tintineo de los pesos sobre el escritorio donde Pedro Páramo contaba el dinero. Se acordaba de don Lucas, que siempre le quedó a deber sus honorarios. De don Pedro, que hizo cuenta nueva. De Miguel su hijo: ¡cuántos bochornos le había dado ese muchacho! 

Lo libró de la cárcel cuando menos unas quince veces, cuando no hayan sido más. Y el asesinato que cometió con aquel hombre, ¿cómo se apellidaba? Rentería, eso es. El muerto llamado Rentería, al que le pusieron una pistola en la mano. Lo asustado que estaba el Miguelito, aunque después le diera risa. Eso nomás ¿cuánto le hubiera costado a don Pedro si las cosas hubieran ido hasta allá, hasta lo legal? Y lo de las violaciones ¿qué? Cuántas veces él tuvo que sacar de su misma bolsa el dinero para que ellas le echaran tierra al asunto: «¡Date de buenas que vas a tener un hijo güerito!», les decía. 

-Aquí tienes, Gerardo. Cuídalos muy bien, porque no retoñan. 

Y él, que todavía estaba en sus cavilaciones, respondió: 

-Sí, tampoco los muertos retoñan -y agregó-: Desgraciadamente.




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— ESTÁ SABENDO, dom Pedro, que derrotaram o Sucuri? 

— Sei que teve algum tiroteio ontem à noite, porque deu para ficar ouvindo o tumulto; mas daí em diante não sei mais nada. Quem foi que contou isso, Gerardo? 

— Chegaram uns feridos a Comala. Minha mulher ajudou nessa coisa dos curativos. Disseram que eram do pessoal de Damasio e que tinham tido muitos mortos. Parece que se encontraram com uns sujeitos que se dizem de Pancho Villa. 

— Que caralho, Gerardo! Estou vendo tempos ruins chegando. E o que você está pensando em fazer? 

— Eu vou-me embora, dom Pedro. Para Sayula. E lá, vou me estabelecer de novo. 

— Vocês advogados têm essa vantagem; podem levar seu patrimônio a tudo que é lugar, pelo menos enquanto alguém não arrebentar suas fuças. 

— Nem pense nisso, dom Pedro; tem os nossos problemas. Além do mais dói deixar pessoas como o senhor, e as deferências que o senhor teve comigo a gente sempre sente falta. Nosso mundo muda o tempo todo, se é válido dizer assim. Onde o senhor quer que eu deixe os seus papéis? 

— Não deixe os papéis. Leve tudo. Ou será que você não vai poder continuar cuidando de meus assuntos lá onde vai estar? 

— Agradeço a sua confiança, dom Pedro. Agradeço sinceramente. Embora deva fazer a aclaração de que para mim vai ser impossível. Certas irregularidades... Digamos... Depoimentos que ninguém além do senhor deve conhecer. Podem prestar-se a manipulações ruins no caso de cair em outras mãos. O mais seguro é que fiquem aqui com o senhor. 

— Você disse bem, Gerardo. Deixa tudo aqui. Vou queimar os papéis. Com papéis ou sem eles, quem pode discutir comigo a propriedade do que tenho? 

— Sem sombra de dúvida, ninguém, dom Pedro. Ninguém. Com licença. 

— Vá com Deus, Gerardo. 

— O que foi que o senhor disse? 

— Eu disse que Deus o acompanhe. 

O doutor Gerardo Trujillo saiu devagar. Já estava velho; mas não para dar passos tão curtos, tão desanimados. A verdade é que ele esperava uma recompensa. Havia servido a dom Lucas, que em paz descanse, o pai de dom Pedro; depois, e ainda, a dom Pedro; e depois a Miguel, o filho de dom Pedro. A verdade é que ele esperava uma compensação. Uma retribuição grande e valiosa. Dissera à mulher: 

— Vou me despedir de dom Pedro. Sei que ele vai me gratificar. Estou quase dizendo que com o dinheiro que ele vai me dar nos estabeleceremos bem em Sayula e vamos viver com folga o resto dos nossos dias. 

Mas por que as mulheres sempre têm alguma dúvida? Recebem avisos do céu, ou o quê? Ela não pareceu estar segura nem mesmo de que ele receberia alguma coisa: 

— Lá, você vai ter de trabalhar duro e muito para levantar a cabeça. Daqui você não arranca nada.

— Por que está dizendo isso? 

— Eu sei. 

Continuou andando até a porta, atento a qualquer chamado: “Ei, Gerardo! Estou tão preocupado que não me permiti pensar em você. Mas eu lhe devo favores que o dinheiro não paga. Receba isto: um presente insignificante.” 

Mas o chamado não veio. Cruzou a porta e desamarrou o cabresto com que seu cavalo estava amarrado à forquilha. Subiu na sela e, em marcha curta, tratando de não se afastar muito para ouvir se o chamasse, caminhou até Comala sem se desviar do caminho. Quando viu que a Media Luna se perdia atrás, pensou: “Seria me rebaixar demais pedir a ele um empréstimo.”



— DOM PEDRO, voltei, porque não estou satisfeito comigo mesmo. Com prazer vou continuar cuidando de seus assuntos. 

Disse isso sentado novamente no escritório de dom Pedro Páramo, onde havia estado não fazia nem meia hora. 

— Está bem, Gerardo. Aí estão os papéis, onde você deixou. 

— Eu também queria... Os gastos... A viagem... Um adiantamento mínimo de honorários... Algum extra, se o senhor houver por bem. 

— Quinhentos? 

— Não poderia ser um pouco, digamos, um pouquinho mais? 

— Você ficaria conformado com mil? 

— E se fossem cinco? 

— Cinco o quê? Cinco mil pesos? Não tenho. Você sabe muito bem que está tudo investido. Terras, animais. Você sabe disso. Leva os mil. Não acho que você precise de mais. 

Ficou meditando. A cabeça caída. Ouvia o tilintar dos pesos sobre a escrivaninha onde Pedro Páramo contava o dinheiro. Lembrava-se de dom Lucas, que sempre ficou devendo seus honorários. De dom Pedro, que abriu conta nova. De seu filho Miguel: quanta dor de cabeça aquele rapaz tinha dado! 

Livrou-o da cadeia pelo menos umas 15 vezes, se é que não foram mais. E o assassinato que cometeu com aquele homem, como era mesmo o nome?, Rentería, isso. O morto chamado Rentería, em cuja mão puseram uma pistola. O jeito que Miguelzinho estava assustado, embora depois caísse no riso. Só isso, quanto teria custado a dom Pedro se as coisas tivessem ido até lá, até a lei? E a questão das violações, nada? Quantas vezes ele teve que tirar do próprio bolso dinheiro para que elas enterrassem o assunto: “Fique bem e em paz que você vai ter um filhote branquelo!”, dizia a elas. 

— Aqui está, Gerardo. Cuida muito bem deles, porque não geram cria. 

E ele, que ainda estava em suas cismas, respondeu: 

— Pois é, os mortos também não — e acrescentou: — Desgraçadamente.




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Rulfo, Juan Pedro Páramo / tradução e prefácio de Eric Nepomuceno. — Rio de Janeiro: BestBolso, 2008. Tradução de: Pedro Páramo ISBN 978-85-7799-116-7 1. Romance mexicano. I. Nepomuceno, Eric. II. Título

Pedro Páramo – Romance mais aclamado da literatura mexicana, Pedro Páramo é o primeiro de dois livros lançados em toda a vida de Juan Rulfo. O enredo, simples, trata da promessa feita por um filho à mãe moribunda, que lhe pede que saia em busca do pai, Pedro Páramo, um malvado lendário e assassino. Juan Preciado, o filho, não encontra pessoas, mas defuntos repletos de memórias, que lhe falam da crueldade implacável do pai. Vergonha é o que Juan sente. Alegoricamente, é o México ferido que grita suas chagas e suas revoluções, por meio de uma aldeia seca e vazia onde apenas os mortos sobrevivem para narrar os horrores da história. O realismo fantástico como hoje se conhece não teria existido sem Pedro Páramo; é dessa fonte que beberam o colombiano Gabriel Garcia Márquez e o peruano Mario Vargas Llosa, que também narram odisseias latino-americanas.


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