quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Tim Maia - Um dia de domingo

Como Uma Onda Confesso É Primavera





Descobridores dos sete mares








Como uma onda





Gostava tanto de você





Ela Partiu
- (Trecho Extraído do Filme)





É primavera





Réu confesso





Venho lhe dizer se algo andou errado
Eu fui o culpado, rogo o seu perdão
Venho lhe seguir, lhe pedir desculpas
Foi por minha culpa a separação

Devo admitir que sou réu confesso
E por isso eu peço, peço pra voltar
Longe de você já não sou mais nada
Veja, é uma parada viver sem te ver

Longe de você já não sou mais nada
Veja, é uma parada viver sem te ver
Perto de você eu consigo tudo
Eu já vejo tudo, peço pra voltar

Devo admitir que sou réu confesso
E por isso eu peço, peço pra voltar
Longe de você já não sou mais nada
Veja é uma parada viver sem te ver

Perto de você eu consigo tudo
Eu já vejo tudo, peço pra voltar



Compositores: Sebastiao Rodrigues Maia




Do leme ao pontal








Um dia de domingo

Eu preciso te falar
Te encontrar de qualquer jeito
Pra sentar e conversar
Depois andar de encontro ao vento

Eu preciso respirar
O mesmo ar que te rodeia
E na pele quero ter
O mesmo sol que te bronzeia
Eu preciso te tocar
E outra vez te ver sorrindo
Te encontrar num sonho lindo

Já não dá mais pra viver
Um sentimento sem sentido
Eu preciso descobrir
A emoção de estar contigo
Ver o sol amanhecer
E ver a vida acontecer
Como um dia de domingo

Faz de conta que ainda é cedo
Tudo vai ficar por conta da emoção
Faz de conta que ainda é cedo
E deixar falar a voz do coração



Composição: Michael Sullivan / Paulo Massadas







O Segundo Sexo - 16. Fatos e Mitos: as categorias impotentes para encerrar uma mulher concreta

Simone de Beauvoir



16. Fatos e Mitos


Primeira Parte
Destino

CAPITULO III
O PONTO DE VISTA DO MATERIALISMO HISTÓRICO




 : 
as categorias impotentes para encerrar uma mulher concreta




É claro, por exemplo, que a própria ideia de posse singular só tem sentido possível a partir da condição original do existente. Para que apareça é preciso que haja, primeiramente, no sujeito uma tendência a se afirmar na sua singularidade radical, uma afirmação de sua existência autônoma e separada. Compreende-se que essa pretensão tenha permanecido subjetiva, interior, sem verdade, enquanto o indivíduo não possuía os meios práticos de satisfazê-la objetivamente: sem ferramenta adequada, não percebia, a princípio, seu poder sobre o mundo, sentia-se perdido dentro da Natureza e da coletividade, passivo, ameaçado, joguete de forças obscuras; somente identificando-se com todo o clã é que ousava pensar-se: o totem, o mana, a terra eram realidades coletivas. O que a descoberta do bronze permitiu ao homem foi, mediante a prova de um trabalho duro e produtivo, descobrir-se como criador; dominando a Natureza, não mais a teme e, em face das resistências vencidas, tem a audácia de se encarar como atividade autônoma, de se realizar na sua singularidade (1). Mas essa realização nunca teria ocorrido se o homem não a tivesse originalmente desejado; a lição do trabalho não se inscreveu num sujeito passivo: o sujeito forjou-se a si próprio e se conquistou, forjando seus instrumentos e conquistando 


(1) Gaston Buchelard em La terre et les rêveries de la volonté realiza estudo sugestivo do trabalho do ferreiro. Mostra como, pelo malho e a bigorna, o homem afirma-se e separa-se. "O instante do ferreiro é um instante concomitantemente isolado e ampliado; promove o trabalhador ao domínio do tempo pela violência de um instante", pág. 142, e mais adiante: "O ser forjando aceita o desafio do universo erguido contra ele".


a terra. Por outro lado, a afirmação do sujeito não basta para explicar a propriedade: no desafio, na luta, no duelo singular, cada consciência pode tentar alcançar a soberania. Para que o desafio tenha assumido a forma do potlatch, isto é, de uma rivalidade econômica, para que a partir daí o chefe, em primeiro lugar, e os membros do clã, em seguida, tenham reivindicado bens particulares, é preciso que se encontre no homem outra tendência original. Já dissemos, no capítulo precedente, que o existente só se apreende alienando-se; ele se procura através do mundo sob uma forma exterior e que faz sua. No totem, no mana, no território que ocupa é sua existência alienada que o clã encontra; quando o indivíduo se separa da comunidade, ele reclama uma encarnação singular: o mana individualiza-se no chefe e, em seguida, em cada indivíduo e, ao mesmo tempo, cada um tenta apropriar-se de um pedaço de terra, de instrumentos de trabalho, de colheitas. Nessas riquezas que são suas, é ele próprio que o homem reencontra porque nelas se perdeu; compreende-se, então, que possa atribuir-lhes uma importância tão fundamental quanto à sua própria vida. Então o interesse do homem pela sua propriedade torna-se uma relação inteligível. Mas vê-se bem que não é possível explicá-la unicamente pela ferramenta: é preciso captar toda a atitude do homem armado com a ferramenta, atitude que implica uma infra-estrutura ontológica.

De igual modo é impossível deduzir a opressão da mulher da propriedade privada. Ainda aqui a insuficiência do ponto de vista de Engels é manifesta. Ele compreendeu muito bem que a fraqueza muscular da mulher só se tornou uma inferioridade concreta na sua relação com a ferramenta de bronze e de ferro, mas não viu que os limites de sua capacidade de trabalho não constituíam em si mesmos uma desvantagem concreta senão dentro de dada perspectiva. É porque o homem é transcendência e ambição que projeta novas exigências através de toda nova ferramenta. Quando inventou os instrumentos de bronze não se contentou mais com explorar os jardins; quis arrotear e cultivar vastos campos; não foi do bronze em si que jorrou essa vontade. A incapacidade da mulher acarretou-lhe a ruína porque o homem apreendeu-a através de um projeto de enriquecimento e expansão. E esse projeto não basta ainda para explicar por que ela foi oprimida: a divisão do trabalho por sexo poderia ter sido uma associação amigável. Se a relação original do homem com seus semelhantes fosse exclusivamente uma relação de amizade, não se explicaria nenhum tipo de escravização: esse fenômeno é conseqüência do imperialismo da consciência humana que procura realizar objetivamente sua soberania. Se não houvesse nela a categoria original do Outro, e uma pretensão original ao domínio sobre o Outro, a descoberta da ferramenta de bronze não poderia ter acarretado a opressão da mulher. Engels não explica tampouco o caráter singular dessa opressão. Tentou reduzir a oposição dos sexos a um conflito de classes: fê-lo, aliás, sem grande convicção; a tese não é sustentável. É verdade que a divisão do trabalho por sexo e a opressão que dela resulta evocam, em certos pontos, a divisão por classes, mas não seria possível confundi-las. Não há na cisão entre as classes nenhuma base biológica. No trabalho, o escravo toma consciência de si próprio contra o senhor, o proletariado sempre sentiu sua condição na revolta, voltando dessa maneira ao essencial, constituindo uma ameaça para seus exploradores; e o que ele visa é o desaparecimento como classe. Dissemos, na introdução, quanto a situação da mulher é diferente, em particular por causa da comunidade de vida e interesses que a torna solidária do homem, e por causa da cumplicidade que ele encontra nela. Nenhum desejo de devolução a habita, nem ela poderia suprimir-se enquanto sexo: ela pede somente que certas consequências da especificação sexual sejam abolidas. O que é mais grave ainda é que não se poderia sem má-fé considerar a mulher unicamente uma trabalhadora; tanto quanto sua capacidade produtora, sua função de reprodutora é importante na economia social como na vida individual; há épocas em que ela é mais útil fazendo filhos do que empurrando a charrua. Engels escamoteou o problema; limitou-se a declarar que a comunidade socialista abolirá a família; é uma solução assaz abstrata; sabe-se como a U.R.S.S. teve de mudar frequente e radicalmente sua política familial segundo se equilibravam diferentemente as necessidades imediatas da produção e da repopulação; de resto, suprimir a família não é necessariamente libertar a mulher: o exemplo de Esparta e o do regime nazista provam que, embora diretamente ligada ao Estado, ela pode ser oprimida pelos machos. 

Uma ética verdadeiramente socialista, que procure a justiça sem suprimir a liberdade, que imponha encargos aos indivíduos mas sem abolir a individualidade, ver-se-á muito embaraçada com os problemas que põe a condição da mulher. É impossível assimilar muito simplesmente a gestação a um trabalho ou a um serviço, como o serviço militar. Viola-se mais profundamente a vida de uma mulher, dela exigindo-se filhos, do que regulamentando as ocupações dos cidadãos: nenhum Estado ousa jamais instituir o coito obrigatório. No ato sexual, na maternidade, a mulher não empenha somente tempo e forças mas ainda valores essenciais. O materialismo racionalista pretende em vão menoscabar esse caráter dramático da sexualidade: não se pode regulamentar o instinto sexual; não é certo que não carregue em si uma recusa à sua satisfação, dizia Freud. O certo é que ele não se deixa integrar no social porque há no erotismo uma revolta do instante contra o tempo, do individual contra o universal. Pretendendo canalizá-lo e explorá-lo, arrisca-se a matá-lo porque não se pode dispor da espontaneidade viva como se dispõe da matéria inerte; e não se pode tampouco forçá-la como se força uma liberdade. Não seria possível obrigar diretamente uma mulher a parir: tudo o que se pode fazer é encerrá-la dentro de situações em que a maternidade é a única saída; a lei ou os costumes impõem-lhe o casamento, proíbem as medidas anticoncepcionais, o aborto e o divórcio. São exatamente essas velhas coações do patriarcado que a U.R.S.S. ressuscitou; reavivou as teorias paternalistas do casamento; e com isso foi levada a pedir novamente à mulher que se torne objeto erótico: um discurso recente convidava as cidadãs soviéticas a cuidarem dos vestidos, a usarem maquilagem, a se mostrarem faceiras para reter seus maridos e incentivar-lhes o desejo. É impossível, vê-se por esse exemplo, encarar a mulher unicamente como força produtora; ela é para o homem uma parceira sexual, uma reprodutora, um objeto erótico, um Outro através do qual ele se busca a si próprio.

Os regimes totalitários ou autoritários podem, de comum acordo, proibir a psicanálise e declarar que para os cidadãos lealmente integrados na coletividade os dramas individuais não existem: o erotismo é uma experiência em que a generalidade é sempre empolgada por uma individualidade. E para um socialismo democrático em que as classes seriam abolidas mas não os indivíduos, a questão do destino individual conservaria toda a sua importância: a diferenciação sexual igualmente. A relação sexual que une a mulher ao homem não é a mesma que ele mantém com ela; o laço que a prende ao filho é irredutível. Ela não foi criada unicamente pela ferramenta de bronze: a máquina não basta para a abolir. Reivindicar para ela todos os direitos, todas as possibilidades do ser humano em geral não significa que se deva deixar de enxergar sua situação singular. E para conhecê-la é preciso ir além do materialismo histórico que só vê no homem e na mulher entidades econômicas.

Assim recusamos pela mesma razão o monismo sexual de Freud e o monismo econômico de Engel. Um psicanalista interpretará todas as reivindicações sociais da mulher como um fenômeno de "protesto viril". Ao contrário, para o marxista, sua sexualidade não faz senão exprimir por desvios mais ou menos complexos sua situação econômica; mas as categorias "clitoridiana" ou "vaginal", tal qual as categorias "burguesa" ou "proletária", são igualmente impotentes para encerrar uma mulher concreta. Por baixo dos dramas individuais como da história econômica da humanidade, há uma infra-estrutura existencial que permite, somente ela, compreender em sua unidade essa forma singular que é uma vida. O valor do freudismo provém do fato de o existente ser um corpo. A maneira pela qual se sente como corpo diante de outros corpos traduz concretamente sua situação existencial. Do mesmo modo, o que é verdadeiro na tese marxista é que as pretensões ontológicas do existente assumem uma forma concreta segundo as possibilidades materiais que se lhe oferecem, e em particular as que lhes proporcionam as técnicas. Não integradas, porém, na totalidade da realidade humana, a sexualidade, a técnica não poderiam nada explicar. Eis por que em Freud as proibições impostas pelo superego e os impulsos do ego se apresentam como fatos contingentes. E na exposição de Engels sobre a história da família os acontecimentos mais importantes parecem surgir inopinadamente segundo os caprichos de um misterioso acaso. Para descobrir a mulher não recusaremos certas contribuições da biologia, da psicanálise, do materialismo histórico, mas consideraremos que o corpo, a vida sexual, as técnicas só existem concretamente para o homem na medida em que os apreende dentro da perspectiva global de sua existência. O valor da força muscular, do falo, da ferramenta só se poderia definir num mundo de valores: é comandado pelo projeto fundamental do existente transcendendo-se para o ser.




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O SEGUNDO SEXO
SIMONE DE BEAUVOIR

Entendendo o eterno feminino como um homólogo da alma negra, epítetos que representam o desejo da casta dominadora de manter em "seu lugar", isto é, no lugar de vassalagem que escolheu para eles, mulher e negro, Simone de Beauvoir, despojada de qualquer preconceito, elaborou um dos mais lúcidos e interessantes estudos sobre a condição feminina. Para ela a opressão se expressa nos elogios às virtudes do bom negro, de alma inconsciente, infantil e alegre, do negro resignado, como na louvação da mulher realmente mulher, isto é, frívola, pueril, irresponsável, submetida ao homem.

Todavia, não esquece Simone de Beauvoir que a mulher é escrava de sua própria situação: não tem passado, não tem história, nem religião própria. Um negro fanático pode desejar uma humanidade inteiramente negra, destruindo o resto com uma explosão atômica. Mas a mulher mesmo em sonho não pode exterminar os homens. O laço que a une a seus opressores não é comparável a nenhum outro. A divisão dos sexos é, com efeito, um dado biológico e não um momento da história humana.

Assim, à luz da moral existencialista, da luta pela liberdade individual, Simone de Beauvoir, em O Segundo Sexo, agora em 4.a edição no Brasil, considera os meios de um ser humano se realizar dentro da condição feminina. Revela os caminhos que lhe são abertos, a independência, a superação das circunstâncias que restringem a sua liberdade.


4.a EDIÇÃO - 1970
Tradução
SÉRGIO MILLIET
Capa
FERNANDO LEMOS
DIFUSÃO EUROPÉIA DO LIVRO
Título do original:
LE DEUXIÊME SEXE
LES FAITS ET LES MYTHES
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Segundo Sexo é um livro escrito por Simone de Beauvoir, publicado em 1949 e uma das obras mais celebradas e importantes para o movimento feminista. O pensamento de Beauvoir analisa a situação da mulher na sociedade.

No Brasil, foi publicado em dois volumes. “Fatos e mitos” é o volume 1, e faz uma reflexão sobre mitos e fatos que condicionam a situação da mulher na sociedade. “A experiência vivida” é o volume 2, e analisa a condição feminina nas esferas sexual, psicológica, social e política.


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Leia também:

O Segundo Sexo - 12. Fatos e Mitos: a mulher é uma fêmea na medida em que se sente fêmea


O Segundo Sexo - 13. Fatos e Mitos: quando a observação descobre tantas anomalias quantos casos normais


O Segundo Sexo - 14. Fatos e Mitos: o próprio Freud admite que o prestígio do pênis explica-se pela soberania do pai


O Segundo Sexo - 15. Fatos e Mitos: A humanidade não é uma espécie animal: é uma realidade histórica


O Segundo Sexo - 17. Fatos e Mitos: Temos aqui a chave de todo o mistério


O Segundo Sexo - 1 Fatos e Mitos: que é uma mulher?



segunda-feira, 27 de novembro de 2017

O Brasil Nação - v1: § 43 – O moderador, pessoal e absoluto - Manoel Bomfim

Manoel Bomfim



O Brasil nação volume 1





PRIMEIRA PARTE
SEQUÊNCIAS HISTÓRICAS



capítulo 5
o acervo do império





§ 43 – O moderador, pessoal e absoluto




Teria sido gratuita a eiva de absoluto e pessoal, com que se marcou o reinado do último imperador? A unanimidade da acusação, a relativa ufania com que Pedro II a recebia, os fatos alegados, e os efeitos reconhecidos, demonstram cabalmente a realidade dela. Sim: desde que nunca se praticaram os princípios democráticos na organização dos poderes da nação; desde que, sem verdade de eleições, fazia-se, no entanto, todo o jogo parlamentarista, para toda a vida do Estado como se a vontade da nação se houvera pronunciado, é que uma vontade exterior à legalidade, e superior, no regime, veio suprir a democracia ausente. Tanto vale dizer: não teria havido a aparência de governo representativo se não fosse o poder pessoal do imperante. Efeito e necessidade da política normalizada no Brasil, desde 1824, o poder pessoal é contemporâneo dessa normalização, anterior, por conseguinte ao reinado de Pedro II. Todavia, na carência total do regime, dada a manifesta miséria da política, os governantes, desde que não estivessem no mando, voltavam-se para o decantado poder pessoal – a mostrar a realidade dele, e a dar-lhe a responsabilidade da mesma miséria política. A alegação não vale mais do que os mesmos políticos, mas tem o mérito de completar a prova da existência do poder pessoal. 

Falem, liberais e conservadores. 

Sousa Carvalho, por exemplo, não tem má vontade para com o imperador, e reconhece que o uso do poder pessoal foi, antes, um corretivo à miséria da política: “Se o imperador não revezasse os partidos na nomeação dos ministros de Estado, provavelmente seria eterna a dominação do partido que ele conservasse no poder... Não sei em que se fundam os que atribuem à coroa o estado degradante da nossa política...” Mas, com isto, atesta a existência da vontade do trono no curso da política:


No Brasil, o partido que está de cima sustenta o absolutismo pela fácil dominação que lhe proporciona... O governo exercita verdadeiro absolutismo... a invencível onipotência, o despotismo ignóbil sob o qual vegetamos... o vergonhoso absolutismo do governo, a nação dividida em dois partidos pessoais... Ditoso país... em que o governo absoluto pode ser requestado e servido à competência por liberais e conservadores!... o nosso liberalismo pessoal... tão estupendo e ridículo, que assombraria a consciência do gênero humano e faria o mundo inteiro dar gargalhadas.
 

Ao mesmo tempo, Sousa Carvalho atesta que: “... com todos os partidos, o governo é tudo, e em vez da câmara fazer o ministério, é este que faz a câmara... as urnas eleitorais nunca retirariam um partido do poder.”165  Reconhece que tal não é devido somente à tendência exorbitante do imperador; mas, bacharel, em face de costumes políticos, ele pretende que tudo resulta da simples forma legal – leis más. Ora, todos sabemos que leis não criam costumes, antes derivam deles. E esse foi o nosso caso: um parlamentarismo por fora da constituição, degradação da política, abjurações e transigências, produzindo a infame legislação reatora de 1839-49... Para a prova definitiva de que a forma legal não garante pureza na prática, nem liberdade de regime, aí temos a célebre e libérrima constituição republicana cobrindo práticas mais antiliberais e mais desbragadas que as do Império. Aliás, Sousa Carvalho mesmo não está bem certo da causa, e, finalmente, só faz questão da realidade verificada:


Sejam quais forem as verdadeiras causas, é certo que vivemos sob o mais perfeito absolutismo. Este estado é intolerável, faz vergonha de ser brasileiro. A voz popular costuma atribuir ao chefe supremo os erros e males da comunidade. O absolutismo do governo vai disputando com a duração do reinado... Se os ministérios têm interesse passageiro em manter o absolutismo, a coroa tem interesse permanente em sustentá-lo...


165 Op. cit., págs. 6, 29, 47, 48, 50, 53, 66, 72. 


O conservador José de Alencar é mais formal contra o poder pessoal, porque se sente vítima dele. Começa apontando –


a ostentação de absolutismo, pois que só nos governos absolutos é que o impulso de vida pública vem do alto... Há um luxo, um aparato, uma ostentação de absolutismo que abate o cidadão brasileiro. Neste país, não é a opinião que domina, mas a vitaliciedade. A coroa... eis a imagem da monarquia constitucional do Brasil... O país está absolutamente cativo do absolutismo e da preponderância do governo pessoal... O ministério reduzido a um corpo movido pela cabeça aparente, com a coroa como cérebro... O organizador do ministério não é quem de fato o organiza, mas um poder superior... o dono desta terra... o único poder deste Império, aquele que o estrangeiro chama – o dono esta terra...


Para que não pareça vazia a acusação, o grande cearense volta-se para o governo da véspera, o de Pimenta Bueno (São Vicente), político sem outro prestígio além do favor imperial:


... nulidade que cerca o trono... Homens sem escrúpulos, baldos de pensamento, decorados com as rubricas de quaisquer opiniões em voga, e assim escalam o poder, e nele se mantém. É esse um dos meios que o poder pessoal frequentemente emprega... não se carece mudar de gabinete para mudar de programa... Tem o poder pessoal para seu uso uma provisão de paradoxos. Possuído intus et in cute do espírito do governo pessoal, o Sr. Visconde de São Vicente organizou a instituição da presidência do Conselho pelo molde imperial...


Artista, Alencar dá pitoresco às formas do poder pessoal:


São Vicente – órgão parlamentar da coroa, iniciador dos projetos organizáveis à majestade... São Vicente encarnação do governo pessoal. Antes, os ministérios serviam de instrumento à vontade superior; neste, o poder irresponsável se infundiu e incorporou... Que melhor ambrosia se pode oferecer a Júpiter do que a queda de um homem superior?... Os políticos são utensílios do governo pessoal...

Num certo momento, afirmou Sousa Carvalho: “O absolutismo do governo vai disputando com a duração deste reinado...” para fazer crer que, de início, não era assim. No entanto, subimos pelo tempo, e encontramos a constante verificação de – absolutismo em manifestação pessoal. Melo Morais: “A nação votada inconstitucionalmente à inexperiência, ao pedantismo e aos desatinos do poder executivo, o único poder da nação...” Ora, bem sabemos que o executivo consubstanciara-se num ministério, instrumento da coroa. Para Tavares Bastos, a existência do poder pessoal nem merece discussão: “... Os políticos volvem e revolvem a eterna questão do governo pessoal... brinquedo, distração aconselhada pelo governo, para poder, às caladas, arranjar os seus projetos inconstitucionais e vergonhosos...” Compreensão e crítica muito justas: o poder pessoal, realidade que era, não só aproveitava aos políticos como distribuição de domínio, como lhes dava a desculpa – dos constantes atentados à liberdade e da insuficiência do governo para o bem. Landulfo Medrado, mais para trás, 1860, clama por um lado: “Declara-se tudo corrompido, exceto o poder neutro (a coroa); insinua-se a necessidade e excelência do governo pessoal...” ao passo que, por outro lado, nota: “As acusações passavam por cima da cabeça dos ministros e iam ferir o poder inviolável... fazia-se sentir de mais a vontade irresponsável...” E pergunta: “... têm a simplicidade de duvidar que de fato existe o governo pessoal?.. Estão satisfeitos com os frutos que o país há recolhido do governo pessoal?...” De todo modo, o grande liberal baiano fala como de coisa incontestável, esse poder pessoal, que até aparecia a muitos – qual remédio contra a corrupção geral. 

Havia mesmo uma formal propaganda – para sua ostensiva legalização:


... perdidas todas as reputações, estragado todo prestígio pessoal: sopravam ambições, invejas, ódio, irritações, vinganças, misérias... contavam que a solução do problema seria... a que parecia mais simples, fácil e, talvez, natural e necessária: só um indivíduo, só um poder escapara a essa vasta e funda desmoralização; a nação, portanto, descrida dos outros seus delegados, descrida de si mesma, abdicaria a sua soberania nas mãos do único que se não maculara...


Uma tal propaganda indica o termo de uma evolução: o poder pessoal, de tão patente sobre a nação abandonada, tratava de legalizar-se: era o tipo bem definitivo e consagrado, por isso mesmo que a respectiva evolução começara numa forma por demais adiantada. A primeira referência à exorbitação da coroa já patenteia uma completa deformação do regime para os liberais de 1842. O·absolutismo do poder supremo só se explicava como coação – dos conservadores, feitos com a camarilha, sobre o ânimo do imperial adolescente. Os resultados da luta travada por eles para livrar o trono, demonstrou que – coros e camarilha fundiam-se numa só expressão. Depois, porque, em 1846, são os conservadores os feridos pelo poder pessoal, em toda a força, desandam, os mesmos conservadores, em acusações formais, como se lê no célebre panfleto de Justiniano Rocha, ou Vasconcelos, ou Hermeto. E nunca mais cessam tais acusações, até a Grande Aranha, de Rui Barbosa, reinando na excelsa corte de El-Rei café... Um Itaboraí, antes justifica, do que acusa: “O imperador reina, governa e administra.” Como bom escravocrata, Rodrigues Torres reservava para si o papel de feitor, do supremo mandão. Euzébio de Queiroz, esse que só foi ministro uma vez, tanto lhe doeu o freio do governo pessoal, dizia: “Nesta terra não se pode ser ministro...” Noutros termos: “Com o imperador, não é possível a um homem, dono de si, ser ministro.” Pelo mesmo tempo, o jornal de Francisco Otaviano abria as cortinas: “O movimento (político) parte de cima; quem governa é a coroa.” E Silveira Lobo completava o julgamento: “Hoje só os servis e os néscios desconhecem a existência do poder pessoal...” 

Finalmente, nem havia quem quisesse, ou pudesse passar por néscio – com o negar a realidade da onipotência política de Pedro II. Desde que um partido estava na oposição fustigava as imperiais faces com a acusação. Mas só o fazia por matreirice, para forçar a vez na distribuição do poder. No mais, de um lado e do outro, todos aceitavam a condição subalterna em que os deixava o trono; ninguém resistia à ostensiva usurpação de poderes, por parte do monarca, porque ninguém se podia dizer legítimo representante da nação: “No Brasil não há eleições... O governo é que faz a câmara, em vez de ser feito por ela...” Em tais condições, como poderiam esses espúrios representantes da nação ter segurança de atitudes e independência de caráter para enfrentar o trono absorvente? Eram todos utensílios do governo pessoal; disse José de Alencar, que, aliás, também o foi. Bem considerado, teria sido Pedro II o menos responsável pela inflação ilegal dos seus poderes majestáticos; criança, foram buscá-lo, tumultuariamente – para que a sua pessoinha mudasse a situação política, contra a vontade expressa da nação, representada na câmara dos deputados; antes, já Araújo Lima havia afastado um ministério, por um verdadeiro golpe de governo pessoal; depois, de 1841 em diante, não houve chefe político que não aceitasse o poder – que lhe fosse dado por simples arbítrio do governo pessoal, e, assim como aproveitavam o poder, reclamavam a dissolução da câmara. Ora, quem concordava com o mais, que era esse fácil jogo de parlamentarismo, concordava com o menos: que o imperador interviesse em todos os negócios da Nação, para impor as suas decisões: “A vontade irrevogável (do imperador) não encontra obstáculos... Depois de trinta anos, o monarca não achou ainda quem lhe mostrasse os perigos do governo pessoal...” Sem temperamento de déspota, honesto e circunspecto, Pedro II teria voltado atrás da sua arbitrariedade política, se os chefes tivessem resistido a ela, como deviam, se eles concorressem para dar verdade ao regime representativo e fossem, de fato, legítimos detentores do poder em face do trono. Não houvesse políticos brasileiros – ministros – para fazer a guerra ao Paraguai, e o imperador teria recalcado as suas antipatias, teria recolhido o seu capricho, porque o sentimento unânime da nação era contra esse crime. E foram os famosos liberais! Um deles, Saraiva, no seu curtíssimo liberalismo, concebeu uma nova organização eleitoral – a eleição direta, com censo alto; apresentou a ideia a Pedro II, que discordou: Saraiva insistiu (como se aquilo merecesse insistência) e o imperador acabou cedendo – vencido, não convencido, teria ele dito ao chefe liberal. E vencido se confessaria, sempre, qualquer que fosse o motivo em causa, se os políticos tivessem cumprido o seu dever, pois é bem de ver que Pedro II não era um ânimo a criar por si, por puro motivo pessoal, uma crise revolucionária, qual seria a de proclamar-se ostensivamente superior à nação. Os políticos nada fizeram como resistência, nada fizeram no sentido de corrigir os vícios manifestos, e depurar o regime: podiam esperar que o próprio representante do trono viesse fazê-lo?... 

Em princípios de 1843, quando Pedro II era simples instrumento da camarilha, e não podia ser um poder pessoal, Feijó teve, então, a intuição da degradação a que estava reduzido o Brasil pela miséria da sua política: “... Se eu pudesse daria o exemplo de resistir às ordens ilegais, sem o que será sempre nominal a nossa liberdade... Uma nação que vê submissa a violação das suas instituições é indigna de ser livre. Já é escrava, e se não tem senhor, terá o primeiro que o quiser ser...” O primeiro foi Pedro II, não que o quisesse, mas porque o destino o colocou em face de quem não era digno de ser livre... Não foi porque o quisesse nem foi o personalismo do seu reinado quem corrompeu e aviltou a política brasileira. Efeitos tão sinistramente profundos, miséria tão desenvolvida, vão além da ação de um indivíduo, demônio ou herói que ele seja. Lembremo-nos, ainda, de que naqueles dias – de fastígio pessoal de Pedro II, essa carência de legalidade era comum a todos os neoibéricos: não havia nação, do México à Argentina, que não estivesse sob governo pessoal, apesar das constituições livres que possuíam. Muitos desses povos já se redimiram, ao passo que, para o Brasil, o governo pessoal tomou a forma abjeta – do mandonismo na ceva. O fato se explica, justamente, pela miséria da alma dos dirigentes.






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"Morreu no Rio aos 64 anos, em 1932, deixando-nos como legado frases, que infelizmente, ainda ecoam como válidas: 'Somos uma nação ineducada, conduzida por um Estado pervertido. Ineducada, a nação se anula; representada por um Estado pervertido, a nação se degrada'. As lições que nos são ministradas em O Brasil nação ainda se fazem eternas. Torcemos para que um dia caduquem. E que o novo Brasil sonhado por Bomfim se torne realidade."

Cecília Costa Junqueira



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O Brasil nação: vol. I / Manoel Bomfim. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro, 2013. 332 p.; 21 cm. – (Coleção biblioteca básica brasileira; 35).


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Download Acesse:

http://www.fundar.org.br/bbb/index.php/project/o-brasil-nacao-vol-i-manoel-bonfim/


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O Brasil Nação - v1: § 39 – A choldra dos partidos – sobre a nação abandonada - Manoel Bomfim 


O Brasil Nação - v1: § 40 – Já é corrupção... - Manoel Bomfim 


O Brasil Nação - v1: § 41 – O exclusivo da honestidade - Manoel Bomfim 


O Brasil Nação - v1: § 42 – Pedro II - Manoel Bomfim


O Brasil Nação - v1: § 44 – Involução e reação - Manoel Bomfim


O Brasil nação - v1: Prefácio - Manoel Bomfim



Rayuela - Julio Cortázar: Capítulo 56

Capítulo 56


    De dónde le vendría la costumbre de andar siempre con piolines en los bolsillos, de juntar hilos de colores y meterlos entre las páginas de los libros, de fabricar toda clase de figuras con esas cosas y goma tragacantos. Mientras arrollaba un piolín negro al picaporte, Oliveira se preguntó si la fragilidad de los hilos no le daba algo así como una perversa satisfacción, y convino en que maybe peut-être y quién te dice. Lo único seguro era que los piolines y los hilos lo alegraban, que nada le parecía más aleccionante que armar por ejemplo un gigantesco dodecaedro transparente, tarea de muchas horas y mucha complicación, para después acercarle un fósforo y ver cómo una llamita de nada iba y venía mientras Gekrepten se-re-tor-cía-las-manos y decía que era una vergüenza quemar algo tan bonito. Difícil explicarle que cuanto más frágil y perecedero el armazón, más libertad para hacerlo y deshacerlo. Los hilos le parecían a Oliveira el único material justificable para sus inventos, y sólo de cuando en cuando, si lo encontraba en la calle, se animaba a usar un pedazo de alambre o algún fleje. Le gustaba que todo lo que hacía estuviera lo más lleno posible de espacio libre, y que el aire entrara y saliera, y sobre todo que saliera; cosas parecidas le ocurrían con los libros, las mujeres y las obligaciones, y no pretendía que Gekrepten o el cardenal primado entendieran esas fiestas.

    Lo de arrollar un piolín negro al picaporte empezó casi un par de horas después, porque entre tanto Oliveira hizo diversas cosas en su pieza y fuera de ella. La idea de las palanganas era clásica y no se sintió en absoluto orgulloso de acatarla, pero en la oscuridad una palangana de agua en el suelo configura una serie de valores defensivos bastante sutiles: sorpresa, tal vez terror, en todo caso la cólera ciega que sigue a la noción de haber metido un zapato de Fanacal o de Tonsa en el agua, y la media por si fuera poco, y que todo eso chorree agua mientras el pie completamente perturbado se agita en la media, y la media en el zapato, como una rata ahogándose o uno de esos pobres tipos que los sultanes celosos tiraban al Bósforo dentro de una bolsa cosida (con piolín, naturalmente: todo acababa por encontrarse, era bastante divertido que la palangana con agua y los piolines se encontraran al final del razonamiento y no al principio, pero aquí Horacio se permitía conjeturar que el orden de los razonamientos no tenía a) que seguir el tiempo físico, el antes y el después, y b) que a lo mejor el razonamiento se había cumplido inconscientemente para llevarlo de la noción de piolín a la de la palangana acuosa). En definitiva, apenas lo analizaba un poco caía en graves sospechas de determinismo; lo mejor era continuar parapetándose sin hacer demasiado caso a las razones o a las preferencias. De todas maneras, ¿qué venía primero, el piolín o la palangana? Como ejecución, la palangana, pero el piolín había sido decidido antes. No valía la pena seguir preocupándose cuando estaba en juego la vida; la obtención de las palanganas era mucho más importante, y la primera media hora consistió en una cautelosa exploración que volvió con cinco palanganas de tamaño mediano, tres escupideras y una lata vacía de dulce de batata, todo ello agrupado bajo el rubro general de palangana. El 18, que estaba despierto, se empeñó en hacerle compañía y Oliveira acabó por aceptar, decidido a echarlo apenas las operaciones defensivas alcanzaran cierta envergadura. Para la parte de los hilos el 18 resultó muy útil, porque apenas lo informó sucintamente de las necesidades estratégicas, entornó sus ojos verdes de una hermosura maligna y dijo que la 6 tenía cajones llenos de hilos de colores. El único problema era que la 6 estaba en la planta baja, en el ala de Remorino, y si Remorino se despertaba se iba a armar una de la gran flauta. El 18 sostenía además que la 6 estaba loca, lo que complicaba la incursión en su aposento. Entornando sus ojos verdes de una hermosura maligna, le propuso a Oliveira que montara guardia en el pasillo mientras él se descalzaba y procedía a incautarse de los hilos, pero a Oliveira le pareció que era ir demasiado lejos y optó por asumir personalmente la responsabilidad de meterse en la pieza de la 6 a esa hora de la noche. Era bastante divertido pensar en responsabilidad mientras se invadía el dormitorio de una muchacha que roncaba boca arriba, expuesta a los peores contratiempos; con los bolsillos y las manos llenos de ovillos de piolín y de hilos de colores, Oliveira se quedó mirándola un momento, pero después se encogió de hombros como para que el mono de la responsabilidad le pesara menos. Al 18, que lo esperaba en su pieza contemplando las palanganas amontonadas sobre la cama, le pareció que Oliveira no había juntado piolines en cantidad suficiente. Entornando sus ojos verdes de una hermosura maligna, sostuvo que para completar eficazmente los preparativos de defensa se necesitaba una buena cantidad de rulemanes y una Heftpistole. La idea de los rulemanes le pareció buena a Oliveira, aunque no tenía una noción precisa de lo que pudieran ser, pero desechó de plano la Heftpistole. El 18 abrió sus ojos verdes de una hermosura maligna y dijo que la Heftpistole no era lo que el doctor se imaginaba (decía "doctor" con el tono necesario para que cualquiera se diese cuenta de que lo hacia por jorobar) pero que en vista de su negativa iba a tratar de conseguir solamente los rulemanes. Oliveira lo dejó irse, esperanzado en que no volviera porque tenía ganas de estar solo. A las dos se iba a levantar Remorino para relevarlo y había que pensar alguna cosa. Si Remorino no lo encontraba en el pasillo iba a venir a buscarlo a su pieza y eso no convenía, a menos de hacer la primera prueba de las defensas a su costa. Rechazó la idea porque las defensas estaban concebidas en previsión de un determinado ataque, y Remorino iba a entrar desde un punto de vista por completo diferente. Ahora sentía cada vez más miedo (y cuando sentía el miedo miraba su reloj pulsera, y el miedo subía con la hora); se puso a fumar, estudiando las posibilidades defensivas de la pieza, y a las dos menos diez fue en persona a despertar a Remorino. Le transmitió un parte que era una joya, con sutiles alteraciones de las hojas de temperatura, la hora de los calmantes y las manifestaciones sindromáticas y eupépticas de los pensionistas del primer piso, de tal manera que Remorino tendría que pasarse casi todo el tiempo ocupado con ellos, mientras los del segundo piso, según el mismo parte, dormían plácidamente y lo único que necesitaban era que nadie los fuese a escorchar en el curso de la noche. Remorino se interesó por saber (sin muchas ganas) si esos cuidados y esos descuidos procedían de la alta autoridad del doctor Ovejero, a lo que Oliveira respondió hipócritamente con el adverbio monosilábico de afirmación adecuado a la circunstancia. Tras de lo cual se separaron amistosamente y Remorino subió bostezando un piso mientras Oliveira subía temblando dos. Pero de ninguna manera iba a aceptar la ayuda de una Heftpistole, y gracias a que consentía en los rulemanes.

    Tuvo todavía un rato de paz, porque el 18 no llegaba y había que ir llenando las palanganas y las escupideras, disponiéndolas en una primera línea de defensa algo más atrás de la primera barrera de hilos (todavía teórica pero ya perfectamente planeada) y ensayando las posibilidades de avance, la eventual caída de la primera línea y la eficacia de la segunda. Entre dos palanganas, Oliveira llenó el lavatorio de agua fría y metió la cara y las manos, se empapó el cuello y el pelo. Fumaba todo el tiempo pero no llegaba ni a la mitad del cigarrillo y ya se iba a la ventana a tirar el pucho y encender otro. Los puchos caían sobre la rayuela y Oliveira calculaba para que cada ojo brillante ardiera un momento sobre diferentes casillas; era divertido. A esa hora le ocurría llenarse de pensamientos ajenos, dona nobis pacem, que el bacán que te acamala tenga pesos duraderos, cosas así, y también de golpe le caían jirones de una materia mental, algo entre noción y sentimiento, por ejemplo que parapetarse era la última de las torpezas, que la sola cosa insensata y por lo tanto experimentable y quizá eficaz hubiera sido atacar en vez de defenderse, asediar en vez de estar ahí temblando y fumando y esperando que el 18 volviera con los rulemanes; pero duraba poco, casi como los cigarrillos, y las manos le temblaban y él sabía que no le quedaba más que eso, y de golpe otro recuerdo que era como una esperanza, una frase donde alguien decía que las horas del sueño y la vigilia no se habían fundido todavía en la unidad, y a eso seguía una risa que él escuchaba como si no fuera suya, y una mueca que en la que se demostraba cumplidamente que esa unidad estaba demasiado lejos y que nada del sueño le valdría en la vigilia o viceversa. Atacar a Traveler como la mejor defensa era una posibilidad, pero significaba invadir lo que él sentía cada vez más como una masa negra, un territorio donde la gente estaba durmiendo y nadie esperaba en absoluto ser atacado a esa hora de la noche y por causas inexistentes en términos de masa negra. Pero mientras lo sentía así, a Oliveira le desagradaba haberlo formulado en términos de masa negra, el sentimiento era como una masa negra pero por culpa de él y no del territorio donde dormía Traveler; por eso era mejor no usar palabras tan negativas como masa negra, y llamarlo territorio a secas , ya que uno acababa siempre llamando de alguna manera a sus sentimientos. Vale decir que frente a su pieza empezaba el territorio, y atacar el territorio era desaconsejable puesto que los motivos del ataque dejaban de tener inteligibilidad o posibilidad de ser intuidos por parte del territorio. En cambio si él se parapetaba en su pieza y Traveler acudía a atacarlo, nadie podría sostener que Traveler ignoraba lo que estaba haciendo, y el atacado por su parte estaba perfectamente al tanto y tomaba sus medidas, precauciones y rulemanes, sea lo q ue fueran estos últimos.

    Entre tanto se podía estar en la ventana fumando, estudiando la disposición de las palanganas acuosas y los hilos, y pensando en la unidad tan puesta a prueba por el conflicto del territorio versus la pieza. A Oliveira le iba a doler siempre no poder hacerse ni siquiera una noción de esa unidad que otras veces llamaban centro, y que a falta de contorno más preciso se reducía a imágenes como la de un grito negro, un kibbutz del deseo (tan lejano ya, ese kibbutz de madrugada y vino tinto) y hasta una vida digna de ese nombre porque (lo sintió mientras tiraba el cigarrillo sobre la casilla cinco) había sido lo bastante infeliz como para poder imaginar la posibilidad de una vida digna al término de diversas indignidades minuciosamente llevadas a cabo. Nada de todo eso podía pensarse, pero en cambio se dejaba sentir en términos de contracción de estómago, territorio, respiración profunda o espasmódica, sudor en la palma de las manos, encendimiento de un cigarrillo, tirón de las tripas, sed, gritos silenciosos que reventaban como masas negras en la garganta (siempre había alguna masa negra en ese juego), ganas de dormir, miedo de dormir, ansiedad, la imagen de una paloma que había sido blanca, trapos de colores en el fondo de lo que podía haber sido un pasaje, Sirio en lo alto de una carpa, y basta, che, basta por favor; pero era bueno haberse sentido profundamente ahí durante un tiempo inconmensurable, sin pensar nada, solamente siendo eso que estaba ahí con una tenaza prendida en el estómago. Eso contra el territorio, la vigilia contra el sueño. Pero decir: la vigilia contra el sueño era ya reingresar en la dialéctica, era corroborar una vez más que no había la más remota esperanza de unidad. Por eso la llegada del 18 con los rulemanes valía como un pretexto excelente para reanudar los preparativos de defensa, a las tres y veinte en punto más o menos.

    El 18 entornó sus ojos verdes de una hermosura maligna y desató una toalla donde traía los rulemanes. Dijo que había espiado a Remorino, y que Remorino tenía tanto trabajo con la 31, el 7 y la 45, que ni pensaría en subir al segundo piso. Lo más probable era que los enfermos se hubieran resistido indignados a las novedades terapéuticas que pretendía aplicarles Remorino, y el reparto de pastillas o inyecciones llevaría su buen rato. De todas maneras a Oliveira le pareció bien no perder más tiempo, y después de indicarle al 18 que dispusiera los rulemanes de la manera más conveniente, se pudo a ensayar la eficacia de las palanganas acuosas, para lo cual fue hasta el pasillo venciendo el miedo que le daba salir de la pieza y meterse en la luz violeta del pasillo, y volvió a entrar con los ojos cerrados, imaginándose Traveler y caminando con los pies un poco hacia afuera como Traveler. Al segundo paso (aunque lo sabía) metió el zapato izquierdo en una escupidera acuosa y al sacarlo de golpe mandó por el aire la escupidera que por suerte cayó sobre la cama y no hizo el menor ruido. El 18, que andaba debajo del escritorio sembrando los rulemanes, se levantó de un salto y entornando sus ojos verdes de una hermosura maligna aconsejó un amontonamiento de rulemanes entre las dos líneas de palanganas, a fin de completar la sorpresa del agua fría con la posibilidad de un resbalón de la madona. Oliveira no dijo nada pero lo dejó hacer, y cuando hubo colocado nuevamente la escupidera acuosa en su sitio, se puso a arrollar un piolín negro en el picaporte. Este piolín lo estiró hasta el escritorio y lo ató al respaldo de la silla; colocando la silla sobre dos patas, apoyada de canto en el borde del escritorio, bastaba querer abrir la puerta para que cayera al suelo. El 18 salió al pasillo para ensayar, y Oliveira sostuvo la silla para evitar el ruido. Empezaba a molestarle la presencia amistosa del 18, que de cuando en cuando entornaba sus ojos verdes de una hermosura maligna y quería contarle la historia de su ingreso en la clínica. Cierto que bastaba con ponerse un dedo delante de la boca para que se callara avergonzado y se quedara cinco minutos de espaldas contra la pared, pero lo mismo Oliveira le regaló un atado nuevo de cigarrillos y le dijo que se fuera a dormir sin hacerse ver por Remorino.

-Yo me quedo con usted, doctor -dijo el 18.

-No, andate. Yo me voy a defender lo más bien.

-Le hacía falta una Heftpistole, yo se lo dije. Pone ganchitos por todos lados, y es mejor para sujetar los piolines.

- Yo me voy a arreglar, viejo -dijo Oliveira-. Andate a dormir, lo mismo te agradezco.

-Bueno, doctor, entonces que le vaya bonito.

-Chau, dormí bien.

-Atenti a los rulemanes, mire que no fallan. Usted los deja como están y ya va a ver.

-De acuerdo

- Si a la final quiere la Heftpistole me avisa, el 16 tiene una.

-Gracias. Chau.

    A las tres y media Oliveira terminó de colocar los hilos. El 18 se había llevado las palabras, o por lo menos eso de mirarse uno a otro de cuando en cuando o alcanzarse un cigarrillo. Casi en la oscuridad, porque había envuelto la lámpara del escritorio con un pulóver verde que se iba chamuscando poco a poco, era raro hacerse la araña yendo de un lado al otro con los hilos, de la cama a la puerta, del lavatorio al ropero, tendiendo cada vez cinco o seis hilos y retrocediendo con mucho cuidado para no pisar los rulemanes. Al final iba a quedar acorralado entre la ventana, un lado del escritorio (colocado en la ochava de la pared, a la derecha) y la cama (pegada a la pared de la izquierda). Entre la puerta y la última línea se tendían sucesivamente los hilos anunciadores (del picaporte a la silla inclinada, del picaporte al cenicero del vermut Martini puesto en el borde del lavatorio, y del picaporte a un cajón del ropero, lleno de libros y papeles, sostenido apenas por el borde), las palanganas acuosas en forma de dos líneas defensivas irregulares, pero orientadas en general de la pared a la izquierda a la de la derecha, o sea desde el lavatorio al ropero la primera línea, y de los pies de la cama a las patas del escritorio la segunda línea. Quedaba apenas un metro libre entre la última serie de palanganas acuosas, sobre la cual se tendían múltiples hilos, y la pared donde se abría la ventana sobre el patio (dos pisos más abajo). Sentándose en el borde del escritorio, Oliveira encendió otro cigarrillo y se puso a mirar por la ventana; en un momento dado se sacó la camisa y la metió debajo del escritorio. Ahora ya no podía beber aunque sintiera sed. Se quedó así, en camiseta, fumando y mirando el patio, pero con la atención fija en la puerta aunque de cuando en cuando se distraía en el momento de tirar el pucho sobre la rayuela. Tan mal no se estaba aunque el borde del escritorio era duro y el olor a quemado del pulóver le daba asco. Terminó por apagar la lámpara y poco a poco vio dibujarse una raya violeta al pie de la puerta, es decir que al llegar Traveler sus zapatillas de goma cortarían en dos sitios la raya violeta, señal involuntaria de que iba a iniciarse el ataque. Cuando Traveler abriera la puerta pasarían varias cosas y podrían pasar muchas otras. Las primeras eran mecánicas y fatales, dentro de la estúpida obediencia del efecto a la causa, de la silla al piolín, del picaporte a la mano, de la mano a la voluntad, de la voluntad a... Y por ahí se pasaba a las otras cosas que podrían ocurrir o no, según que el golpe de la silla en el suelo, la rotura en cinco o seis pedazos del cenicero Martini, y la caída del cajón del ropero, repercutieran de una manera o de otra en Traveler y hasta en el mismo Oliveira porque ahora, mientras encendía otro cigarrillo con el pucho del anterior y tiraba el pucho de manera que cayese en la novena casilla, y lo veía caer en la octava y saltar a la séptima, pucho de mierda, ahora era tal vez el momento de preguntarse qué iba a hacer cuando se abriera la puerta y medio dormitorio se fuera al quinto carajo y se oyera la sorda exclamación de Traveler, si era una exclamación y si era sorda. En el fondo había sido un estúpido al rechazar la Heftpistole, porque aparte de la lámpara que no pesaba nada, y de la silla, en el rincón de la ventana no había absolutamente el menor arsenal defensivo, y con la lámpara y la silla no iría demasiado lejos si Traveler conseguía quebrar las dos líneas de palanganas acuosas y se salvaba de patinar en los rulemanes. Pero no lo conseguiría, toda la estrategia estaba en eso; las armas de la defensa no podían ser de la misma naturaleza que las armas de la ofensiva. Los hilos, por ejemplo, a Traveler le iban a producir una impresión terrible cuando avanzara en la oscuridad y sintiera crecer como una sutil resistencia contra su cara, en los brazos y en las piernas, y le naciera ese asco insuperable del hombre que se enreda en una tela de araña. Suponiendo que en dos saltos arrancara todos los hilos, suponiendo que no metiera un zapato en una palangana acuosa y que no patinara en un rulemán, llegaría finalmente al sector de la ventana y a pesar de la oscuridad reconocería la silueta inmóvil en el borde del escritorio. Era remotamente probable que llegara hasta ahí, pero si llegaba, no cabía duda de que a Oliveira le iba a ser por completo inútil una Heftpistole, no tanto por el hecho de que el 18 había hablado de unos ganchitos, sino porque no iba a haber un encuentro como quizá se lo imaginara Traveler sino una cosa totalmente distinta, algo que él era incapaz de imaginarse pero que sabía con tanta certeza como si lo estuviera viendo o viviendo, un resbalar de la masa negra que venía de fuera contra eso que él sabía sin saber, un desencuentro incalculable entre la masa negra Traveler y eso ahí en el escritorio fumando. Algo como la vigilia contra el sueño (las horas del sueño y la vigilia, había dicho alguien un día, no se habían fundido todavía en la unidad), pero decir vigilia contra sueño era admitir hasta el final que no existía esperanza alguna de unidad. En cambio podía suceder que la llegada de Traveler fuera como un punto extremo desde el cual intentar una vez más el salto de lo uno en lo otro y a la vez de lo otro en lo uno, pero precisamente ese salto sería lo contrario de un choque, Oliveira estaba seguro de que el territorio Traveler no podía llegar hasta él aunque le cayera encima, lo golpeara, le arrancase la camisa a tirones, le escupiera en los ojos y en la boca, le retorciera los brazos y lo tirara por la ventana. Si una Heftpistole era por completo ineficaz contra el territorio, puesto que según el 18 venía a ser una abrochadora o algo por el estilo, ¿qué valor podía tener un cuchillo Traveler o un puñetazo Traveler, pobres Heftpistole inadecuadas para salvar la insalvable distancia de un cuerpo a cuerpo en el que un cuerpo empezaría por negar al otro, o el otro al uno? Si de hecho Traveler podía matarlo (y por algo tenía él la boca seca y las palmas de las manos le sudaban abominablemente), todo lo movía a negar esa posibilidad en un plano en que su ocurrencia de hecho no tuviera confirmación más que para el asesino. Pero mejor todavía era sentir que el asesino no era un asesino, que el territorio ni siquiera era un territorio, adelgazar y minimizar y subestimar el territorio para que de tanta zarzuela y tanto cenicero rompiéndose en el piso no quedara más que ruido y consecuencias despreciables. Si se afirmaba (luchando contra el miedo) en ese total extrañamiento con relación al territorio, la defensa era entonces el mejor de los ataques, la peor puñalada nacería del cabo y no de la hoja. Pero qué se ganaba con metáforas a esa hora de la noche cuando lo único sensatamente insensato era dejar que los ojos vigilaran la línea violácea a los pies de la puerta, esa raya termométrica del territorio.

    A las cuatro menos diez Oliveira se enderezó, moviendo los hombros para desentumecerse, y fue a sentarse en el antepecho de la ventana. Le hacía gracia pensar que si hubiera tenido la suerte de volverse loco esa noche, la liquidación del territorio Traveler hubiera sido absoluta. Solución en nada de acuerdo con su soberbia y su intención de resistir a cualquier forma de entrega. De todas maneras, imaginarse a Ferraguto inscribiéndolo en el registro de pacientes, poniéndole un número en la puerta y un ojo mágico para espiarlo de noche... Y Talita preparándole sellos en la farmacia, pasando por el patio con mucho cuidado para no pisar la rayuela. Sin hablar de Manú, el pobre, terriblemente desconsolado de su torpeza y su absurda tentativa. Dando la espalda al patio, hamacándose peligrosamente en el antepecho de la ventana, Oliveira sintió que el miedo empezaba a irse, y que eso era malo. No sacaba los ojos de la raya de luz, pero a cada respiración le entraba un contento por fin sin palabras, sin nada que ver con el territorio, y la alegría era precisamente eso, sentir cómo iba cediendo el territorio. No importaba hasta cuándo, con cada inspiración el aire caliente del mundo se reconciliaba con él como ya había ocurrido una que otra vez en su vida. Ni siquiera le hacía falta fumar, por unos minutos había hecho la paz consigo mismo y eso equivalía a abolir el territorio, a vencer sin batalla y a querer dormirse por fin en el despertar, en ese filo donde la vigilia y el sueño mezclaban las primeras aguas y descubrían que no había aguas diferentes; pero eso era malo, naturalmente, naturalmente todo eso tenía que verse interrumpido por la brusca interposición de dos sectores negros a media distancia de la raya de luz violácea, y un arañar prolijito en la puerta. "Vos te la buscaste", pensó Oliveira resbalando hasta pegarse al escritorio. "La verdad es que si hubiera seguido un momento más así me caigo de cabeza en la rayuela. Entrá de una vez, Manú, total no existís o no existo yo, o somos tan imbéciles que creemos en esto y nos vamos a matar, hermano, esta vez es la vencida, no hay tu tía."

-Entrá nomás- repitió en voz alta, pero la puerta no se abrió. Seguían arañando suave, a lo mejor era pura coincidencia que abajo hubiera alguien al lado de la fuente, una mujer de espaldas, con el pelo largo y los brazos caídos, absorta en la contemplación del chorrito de agua. A esa hora y con esa oscuridad lo mismo hubiera podido ser la Maga que Talita o cualquiera de las locas, hasta Pola si uno se ponía a pensarlo. Nada le impedía mirar a la mujer de espaldas puesto que si Traveler se decidía a entrar las defensas funcionarían automáticamente y habría tiempo de sobra para dejar de mirar el patio y hacerle frente. De todas maneras era bastante raro que Traveler siguiera arañando la puerta como para cerciorarse de si él estaba durmiendo (no podía ser Pola, porque Pola tenía el cuello más corto y las caderas más definidas), a menos que también por su parte hubiera puesto en pie un sistema especial de ataque (podían ser la Maga o Talita, se parecían tanto y mucho más de noche y desde un segundo piso) destinado a-sacarlo-de-sus-casillas (por lo menos de la una hasta la ocho, no llegaría jamás al Cielo, no entraría jamás en su kibbutz) "Qué esperás, Manú", pensó Oliveira. "De qué nos sirve todo esto." Era Talita, por supuesto, que ahora miraba hacia arriba y se quedaba de nuevo inmóvil cuando él sacó el brazo desnudo por la ventana y lo movió cansadamente de un lado a otro.

-Acercate, Maga -dijo Oliveira-. Desde aquí sos tan parecida que se te puede cambiar el nombre.

-Cerrá esa ventana, Horacio -pidió Talita.

-Imposible, hace un calor tremendo y tu marido está ahí arañando la puerta que da miedo. Es lo que llaman un conjunto de circunstancias enojosas. Pero no te preocupés, agarrá una piedrita y ensayá de nuevo, quién te dice que es una...

    El cajón, el cenicero y la silla se estrellaron al mismo tiempo en el suelo. Agachándose un poco, Oliveira miró enceguecido el rectángulo violeta que reemplazaba la puerta, la mancha negra moviéndose, oyó la maldición de Traveler. El ruido debía haber despertado a medio mundo.

-Mirá que sos infeliz -dijo Traveler, inmóvil en la puerta-, ¿Pero vos querés que el Dire nos raje a todos?

-Me está sermoneando -le informó Oliveira a Talita-. Siempre fue como un padre para mí.

-Cerrá la ventana, por favor -dijo Talita.

-No hay nada más necesario que una ventana abierta -dijo Oliveira-. Oílo a tu maridoo, se nota que metió un pie en el agua. Seguro que tiene la cara llena de piolines, no sabe qué hacer.

-La puta que te parió -decía Traveler manoteando en la oscuridad y sacándose piolines por todas partes-. Encendé la luz, carajo.

-Todavía no se fue al suelo -informó Oliveira-. Me esttán fallando los rulemanes.

-¡No te asomés así! -gritó Talita, levantando los brazos. De espaldas a la ventana, con la cabeza ladeada para verla y hablarle, Oliveira se inclinaba cada vez más hacia atrás. La Cuca Ferraguto salía corriendo al patio, y sólo en ese momento Oliveira se dio cuenta de que ya no era de noche, la bata de la Cuca tenía el mismo color de las piedras del patio, de las paredes de la farmacia. Consintiéndose un reconocimiento del frente de guerra, miró hacia la oscuridad y se percató de que a pesar de sus dificultades ofensivas, Traveler había optado por cerrar la puerta. Oyó, entre maldiciones, el ruido de la falleba.

-Así me gusta, che -dijo Oliveira-. Solitos en el ring como dos hombres.

-Me cago en tu alma -dijo Traveler enfurecido-. Tengo una zapatilla hecha sopa, y es lo que más asco me da en el mundo. Por lo menos encendé la luz, no se ve nada.

-La sorpresa de Cancha Rayada fue algo por el estilo -dijo Oliveira-. Comprenderás quue no voy a sacrificar las ventajas de mi posición. Gracias que te contesto, porque ni eso debería. Yo también he ido al Tiro Federal, hermano.

    Oyó respirar pesadamente a Traveler. Afuera se golpeaban puertas, la voz de Ferraguto se mezclaba con otras preguntas y respuestas. La silueta de Traveler se volvía cada vez más visible; todo sacaba número y se ponía en su lugar, cinco palanganas, tres escupideras, decenas de rulemanes. Ya casi podían mirarse en esa luz que era como la paloma entre las manos de loco.

-En fin -dijo Traveler levantando la silla caída y sentándose sin ganas-. Si me pudieras explicar un poco este quilombo.

-Va a ser más bien difícil, che. Hablar, vos sabés...

-Vos para hablar te buscás unos momentos que son para no creerlo -dijo Traveler rabioso-. Cuando no estamos a caballo en dos tablones con cuarenta y cinco a la sombra, me agarrás con un pie en el agua y esos piolines asquerosos.

-Pero siempre en posiciones simétricas -dijo Oliveira-. Como dos mellizos que juegan en un sube y baja, o simplemente como cualquiera delante del espejo. ¿No te llama la atención, doppelgänger?

    Sin contestar Traveler sacó un cigarrillo del bolsillo del piyama y lo encendió, mientras Oliveira sacaba otro y lo encendía casi al mismo tiempo. Se miraron y se pusieron a reír.

-Estás completamente chiflado -dijo Traveler-. Esta vez no hay vuelta que darle. Mirá que imaginarte que yo...

-Dejá la palabra imaginación en paz -dijo Oliveira-. Limitate a observar que tomé mis precauciones, pero que vos viniste. No otro. Vos. A las cuatro de la mañana.

-Talita me dijo, y me pareció... ¿Pero vos realmente creés...?

-A lo mejor en el fondo es necesario, Manú. Vos pensás que te levantaste para venir a calmarme, a darme seguridades. Si yo hubiese estado durmiendo habrías entrado sin inconveniente, como cualquiera que se acerca al espejo sin dificultades, claro, se acerca tranquilamente al espejo con la brocha en la mano, y ponele que en vez de la brocha fuera eso que tenés ahí en el piyama...

-Lo llevo siempre, che -dijo Traveler indignado-. ¿O te creés que estamos en un jardín de infantes, aquí? Si vos andás desarmado es porque sos un inconsciente.

-En fin -dijo Oliveira, sentándose otra vez en el borde de la ventana y saludando con la mano a Talita y a la Cuca-, lo que yo creo de todo esto importa muy poco al lado de lo que tiene que ser, nos guste o no nos guste. Hace tanto que somos el mismo perro dando vueltas y vueltas para morderse la cola. No es que nos odiemos, al contrario. Hay otras cosas que nos usan para jugar, el peón blanco y el peón morocho, algo por el estilo. Digamos dos maneras, necesitadas de que la una quede abolida en la otra y viceversa.

-Yo no te odio -dijo Traveler-. Solamente que me has acorralado a un punto en que ya no sé que hacer.

-Mutatis mutandis , vos me esperaste en el puerto con algo que se parecía a un armisticio, una bandera blanca, una triste incitación al olvido. Yo tampoco te odio, hermano, pero te denuncio, y eso es lo que vos llamás acorralar.

-Yo estoy vivo -dijo Traveler mirándolo en los ojos-. Estar vivo parece siempre el precio de algo. Y vos no querés pagar nada. Nunca lo quisiste. Una especie de cátaro existencial, un puro. O César o nada, esa clase de tajos radicales. ¿Te creés que no te admiro a mi manera? ¿Te creés que no admiro que no te hayas suicidado? El verdadero doppelgänger sos vos, porque estás como descarnado, sos una voluntad en forma de veleta, ahí arriba. Quiero esto, quiero aquello, quiero el norte y el sur y todo al mismo tiempo, quiero a la Maga, quiero a Talita, y entonces el señor se va a visitar la morgue y le planta un beso a la mujer de su mejor amigo. Todo porque se le mezclan las realidades y los recuerdos de una manera sumamente no-euclidiana.

    Oliveira se encogió de hombros pero miró a Traveler para hacerle sentir que no era un gesto de desprecio. Cómo transmitirle algo de eso que en el territorio de enfrente llamaban un beso, un beso a Talita, un beso de él a la Maga o a Pola, ese otro juego de espejos como el juego de volver la cabeza hacia la ventana y mirar a la Maga parada ahí al borde de la rayuela mientras la Cuca y Remorino y Ferraguto, amontonados cerca de la puerta estaban como esperando que Traveler saliera a la ventana y les anunciara que todo iba bien, y que un sello de embutal o a lo mejor un chalequito de fuerza por unas horas, hasta que el muchacho reaccionara de su viaraza. Los golpes en la puerta tampoco contribuían a facilitar la comprensión. Si por lo menos Manú fuera capaz de sentir que nada de lo que estaba pensando tenía sentido del lado de la ventana, que sólo valía del lado de las palanganas y los rulemanes, y si el que golpeaba la puerta con los dos puños se quedara quieto un solo minuto, tal vez entonces... Pero no se podía hacer otra cosa que mirar a la Maga tan hermosa al borde de la rayuela, y desear que impulsara el tejo de una casilla a otra, de la tierra al Cielo.

-...sumamente no-euclidiana.

- Te esperé todo este tiempo -dijo Oliveira cansado-. Comprenderás que no me iba a dejar achurar así nomás. Cada uno sabe lo que tiene que hacer, Manú. Si querés una explicación de lo que pasó allá abajo... solamente que no tendrá nada que ver, y eso vos lo sabés. Lo sabés, doppelgänger, lo sabés. Qué te importa a vos lo del beso, y a ella tampoco le importa nada. La cosa es entre ustedes al fin y al cabo.

-¡Abran! ¡Abran en seguida!

-Se la toman en serio -dijo Traveler, levantándose-. ¿Les abrimos? Debe ser Ovejero.

-Por mí...

-Te va a querer dar una inyección, seguro que Talita alborotó el loquero.

-Las mujeres son la muerte -dijo Oliveira-. Ahí donde la ves, lo más modosita al lado de la rayuela... Mejor no les abrás, Manú, estamos tan bien así.

    Traveler fue hasta la puerta y acercó la boca a la cerradura. Manga de cretinos, por qué no se dejaban de joder con esos gritos de película de miedo. Tanto él como Oliveira estaban perfectamente y ya abrirían cuando fuera el momento. Harían mejor en preparar café para todo el mundo, en esa clínica no se podía vivir.

    Era bastante audible que Ferraguto no estaba nada convencido, pero la voz de Ovejero se le superpuso como un sabio ronroneo persistente, y al final dejaron la puerta en paz. Por el momento la única señal de inquietud era la gente en el patio y las luces del tercer piso que se encendían y apagaban continuamente, alegre costumbre del 43. Al rato no más Ovejero y Ferraguto reaparecieron en el patio, y desde ahí miraron a Oliveira sentado en la ventana, que los saludó excusándose por estar en camiseta. El 18 se había acercado a Ovejero y le estaba explicando algo de la Heftpistole, y Ovejero parecía muy interesado y miraba a Oliveira con atención profesional, como si ya no fuera su mejor contrincante de póker, cosa que a Oliveira le hizo bastante gracia. Se habían abierto casi todas las ventanas del primer piso, y varios enfermos participaban con suma vivacidad en todo lo que estaba sucediendo, que no era gran cosa. La Maga había levantado su brazo derecho para atraer la atención de Oliveira, como si eso fuera necesario, y le estaba pidiendo que llamara a Traveler a la ventana. Oliveira le explicó de la manera más clara que eso era imposible porque la zona de la ventana correspondía exclusivamente a su defensa, pero que tal vez se pudiera pactar una tregua. Agregó que el gesto de llamarlo levantando el brazo lo hacía pensar en actrices del pasado y sobre todo en cantantes de ópera como Emmy Destynn, Melba, Marjorie Lawrence, Muzio, Bori, y por qué no Theda Bara y Nita Naldi, le iba soltando nombres con enorme gusto y Talita bajaba el brazo y después lo volvía a subir suplicando, Eleonora Duse, naturalmente, Vilma Banky, exactamente Garbo, pero claro, y una foto de Sarah Bernhardt que de chico tenía pegada en un cuaderno, y la Karsavina, la Boronova, las mujeres, esos gestos eternos, esa perpetuación del destino aunque en ese caso no fuera posible acceder al amable pedido.

    Ferraguto y la Cuca vociferaban manifestaciones más bien contradictorias cuando Ovejero, que con su cara de dormido lo escuchaba todo, les hizo seña de que se callaran para que Talita pudiera entenderse con Oliveira. Operación que no sirvió de nada porque Oliveira, después de escuchar por séptima vez el pedido de la Maga, les dio la espalda y lo vieron (aunque no podían oírlo) dialogar con el invisible Traveler.

-Fijate que pretenden que vos te asomes.

-Mirá, en todo caso dejame nada más que un segundo. Puedo pasar por debajo de los piolines.

-Macana, che -dijo Oliveira-. Es la última línea de defensa, si la quebrás quedamos en resuelto infighting.

-Está bien -dijo Traveler sentándose en la silla-. Seguí amontonando palabras inútiles.

-No son inútiles -dijo Oliveira-. Si querés venir aquí no tenés necesidad de pedirme permiso. Creo que está claro.

-¿Me jurás que no te vas a tirar?

Oliveira se quedó mirándolo como si Traveler fuera un panda gigante.

-Por fin -dijo-. Se destapó la olla. Ahí abajo la Maga está pensando lo mismo. Y yo que creía que a pesar de todo me conocían un poco.

-No es la Maga -dijo Traveler-. Sabés perfectamente que no es la Maga.

-No es la Maga -dijo Oliveira-. Sé perfectamente que no es la Maga. Y vos sos el abanderado, el heraldo de la rendición, de la vuelta a casa y al orden. Me empezás a dar pena viejo.

-Olvidate de mí -dijo Traveler, amargo-. Lo que quiero es que me des tu palabra de que no vas a hacer esa idiotez.

-Fijate que si me tiro -dijo Oliveira-, voy a caer justo en el Cielo.

-Pasate de este lado, Horacio, y dejame hablar con Ovejero. Yo puedo arreglar las cosas, mañana nadie se va a acordar de esto.

-Lo aprendió en el manual de psiquiatría -dijo Oliveira, casi admirado-. Es un allumno de gran retentiva.

-Escuchá -dijo Traveler-. Si no me dejás asomarme a la ventana voy a tener que abrirles la puerta y va a ser peor.

-Me da igual, una cosa es que entren y otra es que lleguen hasta aquí.

-Querés decir que si tratan de agarrarte vos te vas a tirar.

-Puede ser que de tu lado signifique eso.

-Por favor -dijo Traveler, dando un paso adelante-. ¿No te das cuenta de que es una pesadilla? Van a creer que estás loco de veras, van a creer que realmente yo quería matarte.

    Oliveira se echó un poco más hacia fuera, y Traveler se detuvo a la altura de la segunda línea de palanganas acuosas. Aunque había hecho volar dos rulemanes de una patada, no siguió avanzando. Entre los alaridos de la Cuca y Talita, Oliveira se enderezó lentamente y les hizo una seña tranquilizadora. Como vencido, Traveler arrimó un poco la silla y se sentó. Volvían a golpear la puerta, menos fuerte que antes.

-No te rompás más la cabeza -dijo Oliveira-. ¿Por qué le buscás explicaciones, viejo? La única diferencia real entre vos y yo en este momento es que yo estoy solo. Por eso lo mejor es que bajes a reunirte con los tuyos, y seguimos hablando por la ventana como bueno amigos. A eso de las ocho me pienso mandar mudar, Gekrepten quedó en esperarme con tortas fritas y mate.

-No estás solo, Horacio. Quisieras estar solo por pura vanidad, por hacerte el Maldoror porteño. ¿Hablabas de un doppelgänger, no? Ya ves que alguien te sigue, que alguien es como vos aunque esté del otro lado de tus condenados piolines.

-Es una lástima -dijo Oliveira- que te hagas una idea tan pacata de la vanidad. Ahí está el asunto, hacerte una idea de cualquier cosa, cueste lo que cueste. ¿No sos capaz de intuir un solo segundo que esto puede no ser así?

-Ponele que lo piense. Lo mismo estás hamacándote al lado de la ventana abierta.

-Si realmente sospecharas que esto puede no ser así, si realmente llegaras al corazón del alcaucil... Nadie te pide que niegues lo que estás viendo, pero si solamente fueras capaz de empujar un poquito, comprendés, con la punta del dedo...

-Si fuera tan fácil -dijo Traveler-, si no hubiera más que colgar piolines idiotas... No digo que no hayas dado tu empujón, pero mirá los resultados.

-¿Qué tienen de malo, che? Por lo menos estamos con la ventana abierta y respiramos este amanecer fabuloso, sentí el fresco que sube a esta hora. Y abajo todo el mundo se pasea por el patio, es extraordinario, están haciendo ejercicio sin saberlo. La Cuca, fijate un poco, y el Dire, esa especie de marmota pegajosa. Y tu mujer que es la haraganería misma. Por tu parte no me vas a negar que nunca estuviste tan despierto como ahora. Y cuando digo despierto me entendés, ¿verdad?

-Me pregunto si no será al revés, viejo.

-Oh, esas son las soluciones fáciles, cuentos fantásticos para antologías. Si fueras capaz de ver la cosa por el otro lado a lo mejor ya no te querrías mover de ahí. Si te salieras del territorio, digamos de la casilla una a la dos, o de la dos a la tres... Es tan difícil, doppelgänger, yo me he pasado toda la noche tirando puchos y sin embocar más que la casilla ocho. Todos quisiéramos el reino milenario, una especie de Arcadia donde a lo mejor se sería mucho más desdichado que aquí, porque no se trata de felicidad, doppelgänger, pero donde no habría más ese inmundo juego de sustituciones que nos ocupa cincuenta o sesenta años, y donde nos daríamos de verdad la mano en vez de repetir el gesto del miedo y querer saber si el otro lleva un cuchillo escondido entre los dedos. Hablando de sustituciones, nada me extrañaría que vos y yo fuéramos el mismo, uno de cada lado. Como decís que soy un vanidoso, parece que me he elegido el lado más favorable, pero quién sabe, Manú. Una sola cosa sé y es que de tu lado ya no puedo estar, todo se me rompe entre las manos, hago cada barbaridad que es para volverse loco suponiendo que fuera tan fácil. Pero vos que estás en armonía con el territorio no querés entender este ir y venir, doy un empujón y me pasa algo, entonces cinco mil años de genes echados a peder me tiran para atrás y recaigo en el territorio, chapaleo dos semanas, dos años, quince años... Un día meto un dedo en la costumbre y es increíble cómo el dedo se hunde en la costumbre y asoma por el otro lado, parece que voy a llegar por fin a la última casilla y de golpe una mujer se ahoga, ponele, o me da un ataque, un ataque de piedad al divino botón, porque eso de la piedad... ¿Te hablé de las sustituciones, no? Qué inmundicia, Manú. Consulta a Dostoievski para eso de las sustituciones. En fin, cinco mil años me tiran otra vez para atrás y hay que volver a empezar. Por eso siento que sos mi doppelgänger, porque todo el tiempo estoy yendo y viniendo de tu territorio al mío, si es que llego al mío, y en esos pasajes lastimosos me parece que vos sos mi forma que se queda ahí mirándome con lástima, sos los cinco mil años de hombre amontonados en un metro setenta, mirando a ese payaso que quiere salirse de su casilla. He dicho.

-Déjense de joder -les gritó Traveler a los que golpeaban otra vez la puerta-. Che, en este loquero no se puede hablar tranquilo.

-Sos grande, hermano -dijo Oliveira conmovido.

-De todas maneras -dijo Traveler acercando un poco la silla- no me vas a negar que esta vez se te está yendo la mano. Las transustanciaciones y otras yerbas están muy bien pero tu chiste nos va a costar el empleo a todos, y yo lo siento sobre todo por Talita. Vos podrás hablar todo lo que quieras de la Maga, pero a mi mujer le doy de comer yo.

-Tenés mucha razón -dijo Oliveira-. Uno se olvida de que está empleado y esas cosas. ¿Querés que le hable a Ferraguto? Ahí está al lado de la fuente. Disculpame, Manú, yo no quisiera que la Maga y vos...

-¿Ahora es a propósito que le llamás la Maga? No mientas, Horacio.

-Yo sé que es Talita, pero hace un rato era la Maga. Es las dos, como nosotros.

-Eso se llama locura -dijo Traveler.

-Todo se llama de alguna manera, vos elegís y dale que va. Si me permitís voy a atender un poco a los de afuera, porque están que no dan más.

-Me voy -dijo Traveler, levantándose.

-Es mejor -dijo Oliveira-. Es mucho mejor que te vayas y desde aquí yo hablo con vos y con los otros. Es mucho mejor que te vayas y que no dobles las rodillas como lo estás haciendo, porque yo te voy a explicar exactamente lo que va a suceder, vos que adorás las explicaciones como todo hijo de los cinco mil años. Apenas me saltés encima llevado por tu amistad y tu diagnóstico, yo me voy a hacer a un lado, porque no sé si te acordás de cuando practicaba judo con los muchachos de la calle Anchorena, y el resultado es que vas a seguir viaje por esta ventana y te vas a hacer moco en la casilla cuatro, y eso si tenés suerte porque lo más probable es que no pases de la dos.

Traveler lo miraba, y Oliveira vio que se le llenaban los ojos de lágrimas. Le hizo un gesto como si le acariciara el pelo desde lejos.

Traveler esperó todavía un segundo, y después fue a la puerta y la abrió. Apenas quiso entrar Remorino (detrás se veía a otros dos enfermeros) lo agarró por los hombros y lo echó atrás.

-Déjenlo tranquilo -mandó-. Va a estar bien dentro de un rato. Hay que dejarlo solo, qué tanto joder.

    Prescindiendo del diálogo rápidamente ascendido a tetrálogo, exálogo y dodecálogo, Oliveira cerró los ojos y pensó que todo estaba tan bien así, que realmente Traveler era su hermano.Oyó el golpe de la puerta al cerrarse, las voces que se alejaban. La puerta se volvió a abrir coincidiendo con sus párpados que trabajosamente se levantaban.

-Metele la falleba -dijo Traveler-. No les tengo mucha confianza.

-Gracias -dijo Oliveira-. Bajá al patio, Talita está muy afligida.

    Pasó por debajo de los pocos piolines sobrevivientes y corrió la falleba. Antes de volverse a la ventana metió la cara en el agua del lavatorio y bebió como un animal, tragando y lamiendo y resoplando. Abajo se oían las órdenes de Remorino que mandaba a los enfermos a sus cuartos. Cuando volvió a asomarse, fresco y tranquilo, vio que Traveler estaba al lado de Talita y que le había pasado el brazo por la cintura. Después de lo que acababa de hacer Traveler, todo era como un maravilloso sentimiento de conciliación y no se podía violar esa armonía insensata pero vívida y presente, ya no se la podía falsear, en el fondo Traveler era lo que él hubiera debido ser con un poco menos de maldita imaginación, era el hombre del territorio, el incurable error de la especie descaminada, pero cuánta hermosura en el error y en los cinco mil años de territorio falso y precario, cuánta hermosura en esos ojos que se habían llenado de lágrimas y en esa voz que le había aconsejado: "Metele la falleba, no les tengo mucha confianza", cuánto amor en ese brazo que apretaba la cintura de una mujer. "A lo mejor", pensó Oliveira mientras respondía a los gestos amistosos del doctor Ovejero y de Ferraguto (un poco menos amistoso), "la única manera posible de escapar del territorio era metiéndose en él hasta las cachas". Sabía que apenas insinuara eso (una vez más, eso) iba a entrever la imagen de un hombre llevando del brazo a una vieja por unas calles lluviosas y heladas. "Andá a saber", se dijo. "Andá a saber si no me habré quedado al borde, y a lo mejor había un pasaje. Manú lo hubiera encontrado, seguro, pero lo idiota es que Manú no lo buscará nunca y yo, en cambio..."

-Che Oliveira, ¿por qué no baja a tomar café? -proponía Ferraguto con visible desagrado de Ovejero-. Ya ganó la apuesta, ¿no le parece? Mírela a la Cuca, está más inquieta...

-No se aflija, señora -dijo Oliveira-. Usted, con su experiencia del circo, no se me va a achicar por pavadas.

-Ay, Oliveira, usted y Traveler son terribles -dijo la Cuca-. ¿Por qué no hace como dice mi esposo? Justamente yo pensaba que tomáramos café todos juntos.

-Si, che, vaya bajando -dijo Ovejero como casualmente-. Me gustaría consultarle un par de cosas sobre unos libros en francés.

-De aquí se oye muy bien -dijo Oliveira-.

-Está bien, viejo -dijo Ovejero-. Usted baje cuando quiera, nosotros nos vamos a desayunar.

-Con medialunas fresquitas -dijo la Cuca-. ¿Vamos a preparar café, Talita?

-No sea idiota -dijo Talita, y en el silencio extraordinario que siguió a su admonición, el encuentro de las miradas de Traveler y Oliveira fue como si dos pájaros chocaran en pleno vuelo y cayeran enredados en la casilla nueve, o por lo menos así lo disfrutaron los interesados. A todo esto la Cuca y Ferraguto respiraban agitadamente, y al final la Cuca abrió la boca para chillar: "¿Pero qué significa esa insolencia?", mientras Ferraguto sacaba pecho y miraba de arriba abajo a Traveler que a su vez miraba a su mujer con una mezcla de admiración y censura, hasta que Ovejero encontró la salida científica apropiada y dijo secamente: "Histeria matinensis yugolata, entremos que le voy a dar unos comprimidos", a tiempo que el 18, violando las órdenes de Remorino, salía al patio para anunciar que la 31 estaba descompuesta y que llamaban por teléfono de Mar del Plata. Su expulsión violenta a cargo de Remorino ayudó a que los administradores y Ovejero evacuaran el patio sin excesiva pérdida de prestigio.

-Ay, ay, ay -dijo Oliveira, balanceándose en la ventana-, y yo que creía que las farmacéuticas eran tan educadas.

-¿Vos te das cuenta? -dijo Traveler-. Estuvo gloriosa.

-Se sacrificó por mí -dijo Oliveira-. La otra no se lo va a perdonar ni en el lecho de muerte.

-Para lo que me importa -dijo Talita-. "Con medialunas fresquitas", date cuenta un poco.

-¿Y Ovejero, entonces? -dijo Traveler-. ¡Libros en francés! Che, pero lo único que faltaba era que te quisieran tentar con una banana. Me asombra que no los hayas mandado al cuerno.

    Era así, la armonía duraba increíblemente, no había palabras para contestar a la bondad de esos dos ahí abajo, mirándolo y hablándole desde la rayuela, porque Talita estaba parada sin darse cuenta en la casilla tres, y Traveler tenía un pie metido en la seis, de manera que lo único que él podía hacer era mover un poco la mano derecha en un saludo tímido y quedarse mirando a la Maga, a Manú, diciéndose que al fin y al cabo algún encuentro había, aunque no pudiera durar más que ese instante terriblemente dulce en el que lo mejor sin lugar a dudas hubiera sido inclinarse apenas hacia fuera y dejarse ir, paf se acabó.



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terça-feira, 21 de novembro de 2017

Gente Pobre - 21. A desgraça é uma doença contagiosa - Dostoiévski

Fiódor Dostoiévski


21.




27 de julho


Meu querido Makar Alexeievitch:




A sua carta e os últimos acontecimentos inquietaram-me sobremaneira, tanto mais quanto é certo que, a princípio, não consegui compreender nada. Foi Fédora que me explicou do que se tratava. Porque se desespera tanto e se inquieta por tão pouca coisa, Makar Alexeievitch? As suas explicações só em parte me satisfizeram. Talvez eu não devesse insistir em aceitar aquele emprego tão vantajoso, lembrando-me do que a minha última experiência neste capitulo me proporcionou. 

Diz o senhor que o seu afeto por mim o levou a ocultar-me muitas coisas. Eu não ignorava os grandes sacrifícios que fazia por mim, apesar da sua insistente afirmação de que apenas gastava comigo o supérfluo, aquilo que, de outro modo, seria para pôr de lado. Mas agora que sei que o senhor não dispõe de quaisquer reservas de dinheiro; que foi só condoído pela minha triste situação que começou a gastar, em meu proveito, o seu ordenado, chegando mesmo a pedir adiantamentos; que durante a minha doença se sacrificou ao ponto de vender peças do seu vestuário… ao ter conhecimento de tudo isto, acho-me numa situação deveras crítica, sem saber como interpretar o sucedido, nem que pensar acerca dele. 

Ah, Makar Alexeievitch! O senhor, movido pela compaixão e pelo afeto de parente, devia ter-se limitado a auxiliar-me nas minhas mais prementes necessidades, nunca indo além das suas posses e não fazendo comigo essas despesas supérfluas que constituem um verdadeiro esbanjamento. Atraiçoou a nossa amizade, Makar Alexeievitch; abusou da minha confiança; e agora que me vejo obrigada a ouvir que o senhor gastou até ao último centavo nas ofertas de vestidos, doces e livros e em passeios e teatros que me proporcionou — pago bem caro tudo isso com as censuras que a consciência me dirige —, deploro amargamente a minha imperdoável despreocupação, pois aceitava tudo o que me oferecia sem querer saber da sua vida. Deste modo, tudo o que fez para me dar prazer, converteu-se num peso aniquilador, e o pesar que sinto enegrece a recordação do que noutros tempos foi agradável.

Já tinha notado que ultimamente dava mostras de certo abatimento; mas, embora eu própria, assaltada por pressentimentos, suspeitasse de qualquer coisa, não podia, de modo algum, prever a realidade. Nunca pensei que a sua cabeça regulasse tão mal, Makar Alexeievitch. Que dirão de si todos aqueles que o conhecem? Será possível que o senhor, a quem eu, como de resto toda a gente, estimava tanto pela sua honradez, simplicidade e dignidade, haja contraído um vício tão repugnante e em que, segundo parece, nunca caíra? Se soubesse o que pensei quando Fédora me contou que o haviam encontrado na rua embriagado e que a polícia se vira obrigada a acompanhá-lo a casa! Fiquei deveras surpreendida, se bem que já imaginasse qualquer coisa de extraordinário, em virtude de ter passado quatro dias sem aparecer. Já pensou, Makar Alexeievitch, no que dirão os seus superiores quando souberem do verdadeiro motivo da sua falta ao trabalho? Diz-se que toda a gente se ri à sua custa, que ninguém ignora as nossas relações e que os seus vizinhos me envolvem nos seus comentários trocistas! Não se preocupe com isso, Makar Alexeievitch, e por amor de Deus, tranquilize-se! 


Traz-me também bastante inquieta o incidente que teve com aquele oficial... Ainda não sei bem como as coisas se passaram, pois apenas surpreendi uns rumores acerca do caso. Peço-lhe que me explique no que aquilo veio a dar. 

Diz-me na sua carta que não me contou toda a verdade, com receio de perder o meu afeto; que durante a minha doença, desesperado, vendeu tudo para fazer face às despesas e evitar que me internassem no hospital; e que se viu mesmo obrigado a empenhar-se até mais não, o que lhe valeu ter todos os dias cenas desagradáveis com a patroa. Pois, devo dizer-lhe, o pior que fez foi ocultar-me essas coisas. Pretendia, com o seu silêncio, evitar-me o conhecimento das suas dificuldades, mas agora, pondo-me ao corrente de tudo, causa-me duplo sofrimento. Isto dá cabo de mim, Makar Alexeievitch. A desgraça é uma doença contagiosa, meu amigo! Os pobres e os desgraçados deviam viver longe uns dos outros, para que as suas misérias se não agravassem mutuamente. Reconheço que fui a causadora do seu infortúnio, e este facto aflige-me extraordinariamente e faz-me perder toda a coragem. 

Escreva-me, contando-me com franqueza tudo o que lhe aconteceu e como lhe foi possível deixar-se abater até tal ponto. Tranquilize-me, se puder. Não é por egoísmo que assim falo, mas pelo afeto e pela amizade que lhe tenho, sentimentos que nada será capaz de arrancar do meu coração. 

Adeus, Makar Alexeievitch. Espero com impaciência a sua resposta. Julgou-me mal, meu amigo. Ama-o sinceramente



Bárbara Dobroselof








28 de julho



Minha inestimável Bárbara Alexeievna:




Que lhe hei de dizer, agora que tudo acabou, que tudo, pouco a pouco, está a regressar à normalidade? Sim, agora posso ser sincero consigo. Diz a minha amiguinha que está inquieta com o que se pensa e se diz de mim. Apresso-me, por isso, a comunicar-lhe que na repartição me estimam ainda mais do que dantes. E depois de lhe contar todas as minhas calamidades e infortúnios, posso informá-la de que os meus superiores não tiveram ainda conhecimento de nada disso; continuam todos a ter de mim a mesma opinião favorável. A única coisa que receio são as mexeriquices. Cá em casa a patroa gritava; mas, como, graças aos dez rublos, já lhe paguei parte do meu débito, agora limita-se a rosnar baixinho. Quanto às restantes pessoas, também a coisa não piorou; contanto que não lhes peça dinheiro, todos mostram boa cara. Para terminar as minhas explicações, devo dizer-lhe, querida, que para mim a sua estima vale mais do que tudo o que há no mundo, e que o simples facto de a não ter perdido representa uma consolação no meio das minhas dificuldades presentes. Graças a Deus, o primeiro choque e os primeiros dissabores já lá vão; e a grande bondade da minha boa amiga permite-me acreditar que não fez de mim mau conceito e continua a ter-me na conta de um bom amigo, não me acusando de egoísmo pelo facto de tudo ter feito para a reter na nossa companhia. É que queria-lhe muito e não me sentia com coragem para me separar de si, meu anjo. Agarrei-me novamente, com todo o afinco, ao meu trabalho, esforçando-me por reparar o mal feito, com o cumprimento fiel dos meus deveres burocráticos. Evstafii não me disse nada quando ontem passei ao seu lado. 

Devo dizer-lhe que as minhas dívidas e o mau estado do meu fato me contrariam sobremaneira; mas tudo se há de arranjar e, entretanto, rogo-lhe que não se aflija com insignificâncias. 

Envia-me mais meio rublo, querida Bárbara, e esse meio rublo trespassou-me o coração. Aqui tem, pois, como as coisas são e ao que eu cheguei. Não sou eu, velho imbecil, que a ajudo a si, meu anjo, mas você, pobre órfã, que me auxilia a mim. Fédora é credora da minha gratidão por ter arranjado o dinheiro. Por mim, não sabia aonde recorrer, minha filha; mas tão depressa saiba de alguma possibilidade, lhe comunicarei o que houver. As mexeriquices e só as mexeriquices é que me inquietam! Adeus, meu amor. Beijo-lhe as mãos e peço-lhe encarecidamente que faça por se restabelecer. Por hoje não lhe escrevo mais, porque são horas de ir para o trabalho; quero, à força de zelo e de aplicação, reparar as minhas faltas e tranquilizar, pouco a pouco, a minha consciência. Deixo para logo à noite a descrição mais pormenorizada de tudo o que me tem sucedido, bem como o incidente com os oficiais. 

Seu respeitoso e sincero amigo,



Makar Dievuchkin








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Esse é o tipo de livro que modifica algo na gente. “Pobre gente” foi o primeiro romance de Dostoievski, começou a escrever em 1844 e terminou no ano seguinte. O personagem Makar Dévushkin, um auxiliar administrativo que leva trinta anos copiando documentos, mora numa pensão humilde, seu pequeno quarto fica ao lado da cozinha, é o que pode pagar com o seu salário também minúsculo. O frio e a frieza de uma sociedade que ignora os pobres. Crítica social contundente, comendo pelas beiradas narrativas. Segundo alguns historiadores, uma das obras que mandou o autor para a cadeia siberiana. Eram os 25 anos de um gênio então já se apurando na escrita, despertando assim, para sentir seu tempo e as humilhações da época, desesperos; um olhar sobre todas as coisas da sofrida gente. Triste narrativa pungente da condição humana em torno desses dois personagens, como vítimas de fatalidades da vida numa sociedade onde poucos conseguem realmente sair do ramerão, e onde muitos se movem numa crueldade austera entre si, forçada pelas inóspitas condições em que vivem. Makar e Varenka vivem um amor idílico ensombrado pelo que os circunda (Makar é muito mais velho que Varenka), agravando as suas próprias condições a um nível desesperador e quase doentio, mas sempre com alguma perspectiva de esperança fundadas em ilusões muitas das vezes patéticas, algo falsamente ingênuas, ilustrativas, no entanto, ao alcance do coração humano que tudo pode sonhar, sem se importar com as verdadeiras condições em que se encontra, principalmente nessas condições por assim dizer desprezíveis.



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Fiódor Dostoiévski

GENTE POBRE

Título original: Bednye Lyudi (1846)

Tradução anônima 2014 © Centaur Editions

centaur.editions@gmail.com


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