sábado, 25 de fevereiro de 2012

La indígena de la Montaña


XVI (2ª) - No se puede hacer la revolución sin las mujeres
baitasar
(¡Cierre la puerta!) — gritou a mulher do patrão — No me gusta tu olor de la mañana – nem eu, pensei deitada em minha esteira. E perguntava-me como ela podia dormir con el patrón y su sudor de vaca con olor y mierda. Talvez, os segredos de las mujeres desenganadas por romance são os laços de sangue, ou talvez, elas façam o que precisam para garantir seus filhos e a si mesmas na folha de pagamento. Pronto. As medidas de uma hija nem sempre são as medidas de la tierra, quase nunca são as medidas dos avós, são as medidas da ilusão com outros jeitos de mentir, uma cilada sem freios ou desfechos, incansável, disimulada. Para dona Lara nunca houve outra realidade possível de mulher. Uma fidelidade religiosa de esperança e desesperança, um jogo de silêncios e insinuações, aparências e mortes, um tempo sem tempo. Assim ela é mostrada como exemplo, um bilhete premiado da loteria.
O galo tornava a convidar de maneira obscena para a vida fora da cama; espalhava a vitória diária do sol contra as forças da noite. As claridades da manhã devoravam as estrelas resmungonas: todo tiene su tiempo para elegir ser. Assim como Dona Lara, na escuridão do quarto, na maioria das vezes, não escolheu ser devorada pelo patrón, em outras escuridões quis devorar como las perras adultas
(Obrigado, por me deixar comer.) (Faça como quiser.) (Gosto assim...) (Assim como?) (Assim...)
Escolher ser e não parecer, em outras vezes, parecer e não ser, mas bastava o galo retornar o seu anúncio do dia e Dona Lara mostrava sua irritação com as tarefas da dona-de-casa
(Alguém poderia fazer esse bicho calar o bico?) (Não posso, mi mamá!) – isso foi mais um descuido de Dom Juan, com os pêlos arrepiados como espinhos de cactos, entre lamentos suspiros estalos. Eu cerrava com força meus olhos, apertava para ter certeza que estavam fechados
(Não pode ou não quer?) - resmungava Dona Lara
Ela virava para o lado e se enfiava abaixo do travesseiro. Agarrava a almofada de penas com todas as suas forças, jurava pra si mesma que não estava escutando coisa nenhuma de nada. E toda manhã anunciava
(Não me acordem o guri.)
Aquelas suas ordens siempre chegavam com atraso. O choro do menino, o canto do galo, os estalos do marido, uma só voz, um único grito, meio trágico, meio divertido, destrambelhado, como lhe cuspissem as mãos para disolver o sono da cara de vinagre, desunir lo que estaba unido de cualquier modo toda la mañana. Resmungava que não era justo, havia parido os efetivos de trabajo no reparte do leite, mas não lhe davam o justo merecimento.
Por sorte da senhora e meu destino de estar pronta para servir, o meu sono dormia siempre con un ojo abierto, meu corpo quase adormecido ficava estendido sobre a esteira aos pés da cama do casal: la cama del niño pequeño y la indígena de la Montaña vigiavam o sono do menino Leopoldino, nascido com o lábio fendido como o da lebre, por susto da mãe com La Leporina.
Quando a Senhora me deu missão de vigilância do menino leporino, por toda vivienda, fiquei preocupada com as extravagâncias e os instintos vis del patrón. Afinal, o quarto do casal é um território de constrangimentos e mistérios. Dona Lara pareceu adivinhar minha apreensão com o comportamento del patrón, disse que Dom Juan deveria se contentar en acostarse, agarrarse un buen pedo y adormecerse, durante quarenta dias e quarenta noites. Explicou que esse era seu tiempo de recolhimento das fomes libidinosas do patrón, tiempo em que não lhe era permitido enfiar as mãos de macho, e outras coisas mais, debaixo das saias.
Como se el patrón fosse impedido das suas vontades: cuando el quería, no era tema a tratar, el quería y listo.
Na primeira noite de fazer vigilância, o leporino acordou e nada fez o choro do guri se acalmar. Apresentei-me rápida para arraigar en mis manos el niño. O patrãozinho chorava com desespero, não tinha temores ou remorsos, sentia a fome pelo calor do colo, o aconchego da quietude protetora do regaço. Embalei el niño para acalmar suas lamentações e a senhora dormir un poco más
(¡Dios mio! Carajo…) – el patrón pedia que alguém fizesse alguma coisa com o guri marcado.
Deitei o menino na minha esteira de vigilância e ofereci ao leporino mis pechos pequeños para acalmá-lo; el niño se aquietou e não desatou da boca meus bicos quase sacados de sí.
Foi a primeira vez que meus peitos pequenos foram agarrados pela boca e mamados. Algo de vital aconteceu quando o patrãozinho dormiu pelos meus bicos, decidi que não queria filhos, queria acalmar a fome do Juanito. Essa foi a única das minhas vontades de oferecer-me que não realizei, incompleta para siempre. Sepultada embaixo de la Montaña del maíz. Não tive filhos e aquele niño das minhas lembranças nunca colocou sua boca em mis pechos. Os planos nem siempre se cumprem, nem siempre se bastam, quase sempre permanecem como planos. Fiquei enfeitiçada e resolvida quando atendi meu primeiro cliente: el leporino. Dizem que o primeiro não se esquece, pois para mim o Juanito poderia ser o primeiro para quem quis me dar. Ele não quis ou não sabia dizer que me queria, o resultado foi o mesmo: no me he olvidado.
Depois da bruxaria que me fez uma perra, atendi tantos clientes que nem mesmo lembro se os repeti, nem lembro as mentiras e as invencionices com os homens em minha cama. Houveram clientes que precisavam da luz, outros da escuridão, cada um com suas manias: aprendi de tudo, esquecer e manter o fogo acesso, selvagem, um animal das proezas da escuridão. É quando minha alma dorme.
Ainda sou um negócio ilegítimo, por isso uma afronta imoral, mas são os homens que nos trazem as doenças e a culpa também é nossa. Existem muitas lendas ou verdades sobre as minhas histórias de lascívia. Fui rainha no bordel, me oferecia em cenas obcenas, mas com brutalidade só em duas vezes: fui violada¿Ir a la policía? — eu sou a prostituta... queria ser cortejada e conquistada, talvez não quisessem perder tempo conquistando uma mulher
As manhãs começavam pela rotina de oferecer meus peitos aos pequeno leporino, depois de acalmado el niño lloroso estaba en mi esteira, chupava conformado seu dedo pulgar, viajava no mundo dos espíritos influenciando o humor do dia com seu temperamento.  
Dona Lara detestava sair do sono tão cedo ou abandonar a cama antes de estar preparada, acostumada. No seu gosto o dia poderia começar depois das dez horas da manhã e terminar às nove horas da noite, não era uma mulher noturna. Até as brincadeiras de bagaço com Dom Juan preferia fazer el la siesta.
Ser la sierva da tarde era bem mais chique, melhor que se apresentar cansada como a piranha da noite, aquela senhora que encena aos berros enquanto o homem se distrae em troca de migalhas. Na tarde, os barulhos do ar se disfarçavam e misturavam com os desmoronamentos da devassidão
(E o amor é quase o mesmo) – si quejó a mi entre dientes. Murmurei para o menino grudado en mis pechos que a mãe dele retrucava de barriga cheia, satisfeita con el patrón de la casa, aconselhei el niñoSigue siendo pequeño, lejos de los dolores y molétias adultos.
Uma das filhas da senhora entrou pelo quarto adentro procurando uma escova de cabelos, já seguida de outra querendo uso do cuarto de baño
(Usem o banheiro de vocês!) (Está embruxado.) (¿El cuarto de baño?) (Iso miesmo.) (É verdade, mamá... é um nojo!) – não tem importância a idade, niños y hombres son puercos, sucios y groseros
(Mamá, a minha escova.) (Não acho meus rabicós.) (Não estão aqui, Angélyca.) (Achei!) (O quê, minha filha?) (A escova.) (E os meus rabicós?) (¡Dios mío! Não se tem sossego nesta casa!) – a Senhora enfiava su cabeza dentro do travesseiro, junto com as plumas.
Uma das jovens saiu escovando os cabelos, enquanto outra enrolava os fios negros e longos em voltas e nós.
Dom Juan deu uma escovadela nos dentes e fez gargarejos de limpeza da garganta. Aumentava o barulho do gargarejo e ventava o seu mau cheiro, novamente. Fingia com a garganta o que saia pelas pernas
(O sapo quer parar de se espremer?) (Mi mamá, preciso de cuecas limpas.) (Mãe! O meu tênis...) (Já vou... já vou...) (Mãe, o Chiado não acorda.) (Dom Juan, esse é pra você.) – rolou para o lado até cair da cama, não tinha outro jeito para sair da cama de matrimonio, siempre caia de quatro.
Levantava já enrolada num roupão todo felpudo caminhava pela vivienda. Tinha um pequeno estremecimento de friúra. Saia pelos quartos resmungando
(¡Dios mio! No hay nobleza, entre el cielo y la tierra.) - resmungava enquanto percorria os cantos e frestas, catava os perdidos e não achados pela preguiça de procurar de uns e desatenção de outras.
Ela até conseguia entender que os meninos não achavam nada, homem é assim mesmo, descuidado de atenção, mas sus niñas estavam sempre desencontradas dos lugares das suas coisas. Isso não era normal. Las niñas têm por natureza cuidar dos quefazeres do lar. Lembra que lhe bastava o olhar de su madre para desempenhar as suas tarefas de niña dona-de-casa. Desde pequeña ensaiou ser a dona-de-casa de su propio hogar, de su propia casa
(Serão péssimas esposas.) – apenas repetia o que aprendeu desde muito pequeña El mínimo que un marido espera que su esposa está en casa organizada, a mesa recheada com temperos e cheiros, as crianças de banho tomado e a cama arrumada com o linho branco da pureza.
Meus ensinamentos foram outros. Gostava de pensar que minha irmã estava amando seu homem, em algum lugar, com a mesma vontade que ele a tomava em seus braços, con codicia, desesperación y promesas
(Onde está o saco das meias?) (Não sei, Dom Juan.) — o homem desaparece resmungando assovios no cuarto de baño para ressurgir com espuma branca na boca, no queixo e nos pêlos espetados do peito. A escova se mantinha firme nos dentes em movimentos de vai e vem, parecia mascar borrachas. Não tinha mais jeito, essa bondade natural e ingênua me trazia desconforto. Olhava o marido da Dona Lara, ele era o seu quebra-galho, apenas isso. Não sentia pena de mi patrona, acreditava ter sido feita para garantir uma boa família, a carne que originava tudo e tinha entalhada na testa: hogareña.
Ela virava sua cabeça na direção dos quartos. Os filhos brotavam nas portas do corredor comunitário
(Pai... estamos atrasados.)
Aliás, no andar de cima da vivienda, tinham dois espaços de uso geral da família: a casa de banho do casal e o corredor, uma passagem longa e estreita que comunicava os quartos, pequenas fortalezas de camuflagem dos filhos
(Dom Juan, não esquece de levar o acolchoado da Angélyca até a lavanderia.) (Aquela lavanderia da Boa Saúde?) (Acho que se mudou para a Boa Esperança.) (Até logo, mãe.) (Até a vista, queridos.) (Esperem por mim!) (Até logo, Aryani.) (Beijinho, mãe...) (Até logo, queridos.)
Dom Juan e as crianças saiam. Entravam na perua.
Uma furgoneta estranha, sem janelas, apenas o vidro do pára-brisa e das laterais do motorista permitiam uma visão embaçada do que acontecia lá dentro. Pensei que seria apropriada para transporte de pequenas cargas ou bagagens. Uma porta dupla do mesmo lado do carona era a saída e a entrada dos passageiros. Depois que a família entrava e as portas se fechavam não se ouvia nada. Nem mesmo se percebia que a carga não era o reparte de leite, mas os filhos de Dom Juan.
O homem levava um saco com as cobertas da filha. Partiam para seus destinos.
Anadyr e Calçado já estavam no tambo espremendo tetas e repartindo o leite.
Dona Lara olhava na sua volta para reconhecer que o seu destino já a havia encontrado, desde antes, lá na barriga da sua mãe. O sonho de ir morar na terra dos gringos morreu quando se deixou convencer de abrir as pernas para o homem gorila. Repetia que os formigamentos na virilha lhe eram impossíveis de resistir
(Menina, se permitir as mãos com dedos atrevidos entre as pernas... estás perdida.) (Entendi, mamá.) – não, essas meninas nunca entenderam.
Deixou cair o roupão e um pequeno arrepio lhe percorreu o corpo.
Eu ficava ali, parada. Olhando sem nada ver.
Ouviu os resmungos do menino, choramingo de fome. A senhora veio até o quarto e o agarrou no colo para oferecer a teta. Ficou ali, pelo tempo da fome do filho, ela sabia que a alegria vinha das tripas e a loucura das virilhas.
Todo a su tiempo.

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