Ogum
Reginaldo Prandi
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Reginaldo Prandi
Ogum dá aos homens o segredo do ferro
Na Terra criada por Obatalá, em Ifé, os orixás e os seres humanos trabalhavam e viviam em igualdade.
Todos caçavam e plantavam usando frágeis instrumentos feitos de madeira, pedra ou metal mole.
Por isso o trabalho exigia grande esforço.
Com o aumento da população de Ifé, a comida andava escassa.
Era necessário plantar uma área maior.
Os orixás então se reuniram para decidir como fariam para remover as árvores do terreno e aumentar a área da lavoura.
Ossaim, o orixá da medicina, dispôs-se a ir primeiro e limpar o terreno.
Mas seu facão era de metal mole e ele não foi bem sucedido.
Do mesmo modo que Ossaim, todos os outros orixás tentaram, um por um, e fracassaram na tarefa de limpar o terreno para o plantio.
Ogum, que conhecia o segredo do ferro, não tinha dito nada até então.
Quando todos os outros orixás tinham fracassado, Ogum pegou seu facão, de ferro, foi até a mata e limpou o terreno.
Os orixás, admirados, perguntaram a Ogum de que material era feito tão resistente facão.
Ogum respondeu que era de ferro, um segredo recebido de Orunmilá.
Os orixás invejavam Ogum pelos benefícios que o ferro trazia, não só na agricultura, como à caça e até mesmo à guerra.
Por muito tempo os orixás importunaram Ogum para saber o segredo do ferro, mas ele mantinha o segredo só para si.
Os orixás decidiram então oferecer-lhe o reinado em troca de que ele lhes ensinasse tudo sobre aquele metal tão resistente.
Ogum aceitou a proposta.
Os humanos também vieram a Ogum pedir-lhe o conhecimento do ferro.
Mas, apesar de Ogum ter aceitado o comando dos orixás, antes de mais nada ele era um caçador.
Certa ocasião, saiu para caçar e passou muitos dias fora numa difícil temporada.
Quando voltou da mata, estava sujo e maltrapilho.
Os orixás não gostaram de ver seu líder naquele estado.
Eles o desprezaram e decidiram destituí-lo do reinado.
Ogum se decepcionou com os orixás, pois, quando precisaram dele para o segredo da forja, eles o fizeram rei e agora diziam que não era digno de governá-los.
Então Ogum banhou-se, vestiu-se com folhas de palmeira desfiadas, pegou suas armas e partiu.
Num lugar distante chamado Irê, construiu uma casa embaixo da árvore de acocô e lá permaneceu.
Os humanos que receberam de Ogum o segredo do ferro não o esqueceram.
Todo mês de dezembro, celebram a festa de Iudê-Ogum.
Caçadores, guerreiros, ferreiros e muitos outros fazem sacrifícios em memória de Ogum.
Ogum é o senhor do ferro para sempre.
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Reginaldo Prandi, paulista de Potirendaba e professor titular de sociologia da Universidade de São Paulo, é autor de três dezenas de livros. Pela editora Hucitec publicou Os candomblés de São Paulo, pela Edusp, Um sopro do Espírito, e pela Cosac Naify, Os príncipes do destino. Dele, a Companhia das Letras publicou também Segredos guardados: orixás na alma brasileira; Morte nos búzios; Ifá, o Adivinho; Xangô, o Trovão; Oxumarê, o Arco-Íris; Contos e lendas afro-brasileiros: a criação do mundo; Minha querida assombração; Jogo de escolhas e Feliz Aniversário.
Prandi, Reginaldo. Mitologia dos Orixás / Reginaldo Prandi; ilustrações de Pedro Rafael. - São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
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