sábado, 24 de dezembro de 2011

Sêzar, eu quero um homem!

Fantasias obscenas...


baitasar



Acordei involuntariamente do sonho: uma quimera que não me entusiasma com o retardamento da realidade. Empurro com a barriga o que preciso fazer, deixo para depois, e depois, e depois...
Eu acho que foi um sonho, talvez tenha sido um sonho
— Sêzar, como está difícil encontrar um homem!
Na boca de quem precisa, um grito de socorro tem mais valia
— E eu?
Pergunto à jovem e bela senhora, caminhando de lá para cá e de volta para lá, um cigarro entre os dedos esfumaçando o ar, sufocando a vida que ainda me resta, ela para sua marcha sem destino e me olha
— Não vale!
— Por quê?
— Somos amigos há tantos anos e nunca pintou nenhum clima.
Não lembro onde exatamente essa conversa ficou: entre fantasmas não vividos ou entre os personagens fantásticos do mundo frágil dos devaneios. Quem sabe ela queria que lhe sussurrasse alguns turpilóquios ao pé do ouvido e a levasse para o quarto.
No quarto há uma cama, sobre a cama um homem e sobre o homem um menino com medo
— Voltando aos homens... Você acha que estão em extinção?
— Completamente...
Ela está desiludida ou perdeu as esperanças, ou ficou cansada dos joguinhos de charme e simpatia: sedução com poesia
— E eu?
— Já disse: tu não conta.
Encolhido na escuridão respirava boca abaixo. Ofegante. Suado. Com o peito procurava o ar que não podia ver. Rezava por um milagre, às vezes, eles acontecem... Nem sempre ou quase nunca
— Fica duro, pelo amor de Deus!
— Eu não disse? Tu não conta!
O homem engolido pelo menino e pela aragem gasosa, o ar livre: comprimido no peito. Acreditava que dormindo a flacidez lhe passava despercebida e depois ele viria em atropelos: enorme, viril, engolido até desaparecer e reaparecer... Estaria demonstrado todo na sua excitação por ela (ou tesão do amor: bem durinho)
— Não esquenta, isso é assim mesmo...
— É?
— A primeira vez pode ser um defeito mecânico, mas daí pra frente é bom pedir ajuda...
— E você?
— O que tenho eu?
— Pode me ajudar?
— Isso aqui é apenas um sonho, não dá pra ajudar de verdade assim...
— Assim como?
— Sem fantasias obscenas...
Acho que o ácido da casca da laranja é o gosto que fica quando o inerte está desobedecido da vontade. A cabeça mole bate e se desfigura. Não penetra. Os nervos na flor da pele. Duas vidas na mesma carne. Uma desistida da cobiça. Inerte. Revoltada. Desconfiada. O homem fugindo daquele garoto não sabe quando parar. Não quer crescer. Bate com a cabeça até desfalecer exausto. Esse é o problema de fugir sem um plano, sem um rumo. Escapar por escapar
— Mas eu tenho fantasias vergonhosas...
Os braços estavam retesados. Músculos duros para serem exibidos, engolidos pelo espelho... na saliência da pança: um tanquinho arredondado
— O ar entra a barriga sobe, o ar sai e a barriga desce.
— Isso, adoro brincar de médico!
— Sêzar!
— O que foi?
— Cansei.
Naquela cama tem um homem, sobre o homem tem um menino e sobre o menino um rio teimoso. Suas águas escuras represas se debatiam até que as margens cansavam. E só quando as águas do rio transbordavam da represa corriam por artérias e veias até o mar, cumprindo o seu destino de transportar vida aos oceanos. Lá das nascentes
— Quero contar minhas fantasias...
— Alucinações?
— Fechei os olhos e imaginei a dançarina esfregando seus pelos em meu rosto, as coxas tremendo...
— Pode parar!
— O que foi?
— Eu sabia que essa culpa acabaria no meu colo!
— Culpa?
Analisava com atenção e minúcia as leis da natureza em seu corpo. Examinava a testa, as bochechas magras, o pescoço, os ombros, as curvas do quadril
— Coxas roliças, celulite, rugas. Eu estou feia.
— Então, a gente acende a lâmpada...
— Não!
— Quer ser outra fêmea?
Coloco o creme na escova e massageio os dentes bem do jeitinho que mamãe ensinava todas as manhãs, Com os dentes de cima você move a escova para baixo e com os de baixo você move para cima
— Várias vezes...
— O quê?
— Os dentes... Várias vezes, para cada um deles.
Os dentes são para sempre, Algum dia, meu filho, você vai me agradecer
— Obrigada, mamãe...
— Agora, chega... Que história é essa de mamãe?
— Eu quero acordar.
— Sêzar, eu quero um homem!
Fica o perfume, a voz, é estranho isso das palavras, a espera sem esperança, ou talvez com muita esperança. Diálogos intermináveis falando às estrelas, mas as palavras ensaiadas com as estrelas ficam guardadas e outras saem: o peito inchando. Esvaziar todas as palavras não ditas, todos os carinhos, esperando que o tempo passe, sempre no mesmo lugar. Acho que a morte deve ser isto, nunca sair do lugar e estar sempre no começo, esperando o que não virá. A morte acaba com a dialética, acaba com a esperança, acaba com a mudança
— Está difícil de encontrar...
Os que existem já estão acomodados nas prateleiras
— Meu amor! Vamos sair e comprar um carro!
— Será que resolve...
— Claro, meu amorzinho, mais dia menos dia você consegue.
— Será?
— Até lá, a gente enrijece o carro novo.
— Querida, eu prefiro uma televisão, dessas bem fininhas...
Ano novo, carro novo, vida velha... tantas ressurreições
— Afinal, meu amor, pra que serve o dinheiro?

Nenhum comentário:

Postar um comentário