sábado, 28 de março de 2020

Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XLII - À PÁTRIA LIVRE

Cruz e Sousa

Obra Completa
Volume 1
POESIA



O Livro Derradeiro
Primeiros Escritos

Cambiantes
Outros Sonetos Campesinas
Dispersas
Julieta dos Santos




OUTROS SONETOS 







À PÁTRIA LIVRE


Nem mais escravos e nem mais senhores!
Jesus desceu as regiões celestes,
Fez das sagradas, perfumosas vestes
Um sudário de luz pra tantas dores.

A terra toda rebentou em flores!
E onde havia só cardos e ciprestes,
Onde eram tristes solidões agrestes
Brotou a vida cheia de esplendores.

Então Jesus que sempre em todo mundo
Quis ver o amor ser nobre e ser profundo,
Falou depois a escravas gerações:

– Homens! A natureza é apenas uma...
Se não existe distinção alguma
Por que não se hão de unir os corações?!


1888




O RIO


O rio em turbilhões ei-lo crescendo...
E no seu leito as largas forças vivas
Das profundas correntes impulsivas
Como o sangue na artéria vão fervendo.

No arrebatado cachoeirar tremendo
Florestas de hera, tinhorões, esquivas
Plantas e troncos de árvores altivas
Vão sobre o rio desaparecendo.

Tudo o rio consigo arroja e arrasta
E a natureza vegetal devasta
Nos explosivos borbotões das águas.

Tal os meus sonhos límpidos e amados
Rio abaixo também foram levados
Pela corrente indômita das mágoas.





JOIA


Humilde como Ester, eu não conheço
Ninguém, nem conheci pessoa alguma
Que fosse joia tal e de tal preço,
Mais casta e muito mais do que uma espuma.

Nem quero que haja igual – pois eu nem desço
A mais definições – porque isto, em suma,
A gente deve até, num manto espesso
De emoções encobrir, num véu de bruma.

E faz-me recordar um tipo exato
De estranha irradiação – sim, que eu, de fato
Lhe disse, de uma vez, que pareciam

Seus olhos musicais e nazarenos,
Duas brilhantes gotas dos serenos
Que desse azul dos páramos caíam.








POEMA ANTÍFONA






Literatura / Simbolismo
Resumão






Literatura | Simbolismo
e Poema de Antífona (Revisão)






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De fato, a inteligência, criatividade e ousadia de Cruz e Sousa eram tão vigorosos que, mesmo vítima do preconceito racial e da sempiterna dificuldade em aceitar o novo, ainda assim o desterrense, filho de escravos alforriados, João da Cruz e Sousa, “Cisne Negro” para uns, “Dante Negro” para outros, soube superar todos os obstáculos que o destino lhe reservou, tornando-se o maior poeta simbolista brasileiro, um dos três grandes do mundo, no mesmo pódio onde figuram Stephan Mallarmé e Stefan George. A sociedade recém-liberta da escravidão não conseguia assimilar um negro erudito, multilíngue e, se não bastasse, com manias de dândi. Nem mesmo a chamada intelligentzia estava preparada para sua modernidade e desapego aos cânones da época. Sua postura independente e corajosa era vista como orgulhosa e arrogante. Por ser negro e por ser poeta foi um maldito entre malditos, um Baudelaire ao quadrado. Depois de morrer como indigente, num lugarejo chamado Estação do Sítio, em Barbacena (para onde fora, às pressas, tentar curar-se de tuberculose), seu
corpo foi levado para o Rio de Janeiro graças à intervenção do abolicionista José do Patrocínio, que cuidou para que tivesse um enterro cristão, no cemitério São João Batista.




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