domingo, 26 de abril de 2020

Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XLIII - A Volta

Cruz e Sousa

Obra Completa
Volume 1
POESIA



O Livro Derradeiro
Primeiros Escritos

Cambiantes
Outros Sonetos Campesinas
Dispersas
Julieta dos Santos




OUTROS SONETOS 







A VOLTA


Voltamos juntos pela mesma estrada
Tu em caminho rias doidamente;
E a tua fresca e musical risada
Era a canção mais doce e mais nitente.


Foi bem longe o passeio, a caminhada
Certo que havia de ficar ardente
A luz do teu olhar de pomba amada
Que voa pelo azul resplandecente.


Palpitava-te o seio alabastrino,
Arfava-te, de manso, como um hino
De puro amor, entre os rendados jolhos.


E embora a tua carne assim cansasse
Oh! podes rir! – Por mais que eu só te olhasse
Não se cansavam de te olhar meus olhos.






BALADA MATINAL


Cantam agora os pássaros nos ramos
Dos verdejantes, flébeis arvoredos...
E que adoráveis, íntimos segredos
Eles dirão, que nós não deciframos...


Coleiros, sabiás e gaturamos
Cantam felizes, joviais e ledos,
Na densa mata verde dos silvedos
Profundos como os sonhos que adoramos.


Vem tu agora, ó dríade dos campos,
Vem comigo colher os frutos lampos
Do casto amor com que a tu’alma abrasas,


Que enquanto assim os pássaros cantarem
E pela mata flórida voarem,
O meu amor te estenderá as asas.






RECORDAÇÃO


Foi por aqui, sob estes arvoredos,
Sob este doce e plácido horizonte,
Junto da clara e pequenina fonte,
Que murmura lá baixo os seus segredos...


Recordo bem todos os cantos ledos
Da passarada – e lembro-me da ponte
Por sobre a qual via-se além, de fronte,
O mar vinil batendo nos rochedos.


Sinto a impressão ainda da paisagem,
Do tom muito tocante da folhagem,
Das culturas rurais, do sítio agreste.


A luz do dia vinha então morrendo...
Foi por aqui que eu pude ficar crendo
O quanto pode o teu olhar celeste.


                   1887





_____________________



CULTNE CINEMA - Cruz e Souza
- Poeta do Desterro - filme



Drama biográfico sobre o poeta João da Cruz e Sousa, simbolista brasileiro. Descendente de escravos, Cruz e Sousa recebeu a melhor educação possível e decide mudar-se para o Rio de Janeiro em busca de reconhecimento para sua obra. O filme aborda, em segundo plano, a questão do racismo no Brasil.


Data de lançamento janeiro 2000 (1h 26min)
Gêneros: Drama, Biografia
Nacionalidade: Brasil
Direção, roteiro e produção: Sílvio Back
Elenco: Kadu Carneiro, Maria Ceiça, Danielle Ornelas, Lea Garcia e Guilherme Weber
Trilha sonora: Sílvia Beraldo
Diretor de fotografia: Antonio Luiz Mendes
Montador: Francis

______________________


Leia também:

__________________________



De fato, a inteligência, criatividade e ousadia de Cruz e Sousa eram tão vigorosos que, mesmo vítima do preconceito racial e da sempiterna dificuldade em aceitar o novo, ainda assim o desterrense, filho de escravos alforriados, João da Cruz e Sousa, “Cisne Negro” para uns, “Dante Negro” para outros, soube superar todos os obstáculos que o destino lhe reservou, tornando-se o maior poeta simbolista brasileiro, um dos três grandes do mundo, no mesmo pódio onde figuram Stephan Mallarmé e Stefan George. A sociedade recém-liberta da escravidão não conseguia assimilar um negro erudito, multilíngue e, se não bastasse, com manias de dândi. Nem mesmo a chamada intelligentzia estava preparada para sua modernidade e desapego aos cânones da época. Sua postura independente e corajosa era vista como orgulhosa e arrogante. Por ser negro e por ser poeta foi um maldito entre malditos, um Baudelaire ao quadrado. Depois de morrer como indigente, num lugarejo chamado Estação do Sítio, em Barbacena (para onde fora, às pressas, tentar curar-se de tuberculose), seu
corpo foi levado para o Rio de Janeiro graças à intervenção do abolicionista José do Patrocínio, que cuidou para que tivesse um enterro cristão, no cemitério São João Batista.


Nenhum comentário:

Postar um comentário