terça-feira, 26 de maio de 2020

Cruz e Sousa - Poesias Completas: Outros Sonetos XLIV - Lágrimas

Cruz e Sousa

Obra Completa
Volume 1
POESIA



O Livro Derradeiro
Primeiros Escritos

Cambiantes
Outros Sonetos Campesinas
Dispersas
Julieta dos Santos




OUTROS SONETOS 







LÁGRIMAS


Lágrimas tu! mulher encantadora!
Não te bastara então essa pobreza,
Era mister pagar à natureza
O tributo da dor esmagadora?

Era preciso à luta vencedora
Dar um quinhão de sangue de pureza
Cristalizado em lágrimas, na acesa
Voragem de uma vida aterradora?

Sim, todos nós andamos por calvários,
Deixando as almas, castos relicários,
Entre as brumas chorosas do desgosto.

Chora! e que eu beba, humílimo de rastros,
As lágrimas que choras, como uns astros,
Como estrelas no céu desse teu rosto.


                      1888






FILOSOFANDO


Ontem à tarde, alguns trabalhadores,
Habitantes de além, de serra a serra,
Cavando e revolvendo a dura terra,
Do sol entre os prismáticos fulgores,

Estavam – cada qual tinha os ardores
Da febre de lutar, à luz que encerra
Toda a nobreza do trabalho – e que erra
Só na cabeça dos conspiradores.

E dos obscuros revolucionários
Do bem fecundo e cultural das leivas
Que são da vida os maternais sacrários.

E pareceu-me que do chão estuante
Vem porejar um bálsamo de seivas
Geradoras de um mundo mais pensante.







AOS POBRES


– Minha mãe, minha mãe, quanta grandeza
Nesses palácios, quanta majestade;
Como essa gente há de viver, como há de
Ser grande sempre na feliz riqueza.

Nem uma lágrima sequer – e à mesa
Dentre as baixelas, dentre a imensidade
Da prata e do ouro – a azul felicidade
Dos bons manjares de ótima surpresa.

Nem um instante os olhos rasos d’água,
Nem a ligeira oscilação da mágoa,
Na vida farta de prazer, sonora.

– Como o teu louco pensamento expandes!
Filho, a ventura não é só dos grandes;
O mar também é grande e quanto chora!












Cruz e Sousa foi vítima de preconceito?
Literatus Preview#02





Lethycia Dias:

"Muitos escritores que hoje são reconhecidos, viveram muito mal. Lima Barreto é mais um exemplo. Discriminado por ser negro, pobre e boêmio... Por escrever sobre as pessoas simples, como donas de casa, bêbados, "vagabundos". Existem tantos exemplos de escritores que passaram por dificuldades em vida!"



"Desse tipo de erro ninguém reclama nos livros didáticos"



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De fato, a inteligência, criatividade e ousadia de Cruz e Sousa eram tão vigorosos que, mesmo vítima do preconceito racial e da sempiterna dificuldade em aceitar o novo, ainda assim o desterrense, filho de escravos alforriados, João da Cruz e Sousa, “Cisne Negro” para uns, “Dante Negro” para outros, soube superar todos os obstáculos que o destino lhe reservou, tornando-se o maior poeta simbolista brasileiro, um dos três grandes do mundo, no mesmo pódio onde figuram Stephan Mallarmé e Stefan George. A sociedade recém-liberta da escravidão não conseguia assimilar um negro erudito, multilíngue e, se não bastasse, com manias de dândi. Nem mesmo a chamada intelligentzia estava preparada para sua modernidade e desapego aos cânones da época. Sua postura independente e corajosa era vista como orgulhosa e arrogante. Por ser negro e por ser poeta foi um maldito entre malditos, um Baudelaire ao quadrado. Depois de morrer como indigente, num lugarejo chamado Estação do Sítio, em Barbacena (para onde fora, às pressas, tentar curar-se de tuberculose), seu
corpo foi levado para o Rio de Janeiro graças à intervenção do abolicionista José do Patrocínio, que cuidou para que tivesse um enterro cristão, no cemitério São João Batista.


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Organização e Estudo
Lauro Junkes
Presidente da Academia Catarinense de Letras


© Copyright 2008
Avenida Gráfica e Editora Ltda.

Projeto Gráfico, Editoração e Capa
ESPAÇO CRIAÇÃO ARQUITETURA DESIGN E COMPUTAÇÃO GRÁFICA LTDA.
www.espacoecriacao.com.br
Fone/Fax: (48) 3028.7799

Revisão Linguístico-Ortográfica
PROFª Drª TEREZINHA KUHN JUNKES
PROF. Dr. LAURO JUNKES

Impressão e Acabamento
Avenida Gráfica e Editora Ltda.

Formato
14 x 21cm




FICHA CATALOGRÁFICA

Catalogação na fonte por M. Margarete Elbert - CRB14/167



S725o      Sousa, Cruz e, 1861-1898

                        Obra completa : poesia / João da Cruz e Sousa ; organização
                  e estudo por Lauro Junkes. – Jaraguá do Sul : Avenida ; 2008.
                         v. 1 (612 p.)

                         Edição comemorativa dos 110 anos de falecimento e do
                  traslado dos restos mortais de Cruz e Sousa para Santa Catarina.

                            1. Sousa, Cruz e, 1861-1898. 2. Poesia catarinense. I.
                  Junkes, Lauro. II. Titulo.

                                                                                      CDU: 869.0(816.4)-1



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