Ensaio 37
baitasar
Meu fio neto, as lembrança é a mirage da avó, tão e não tão por perto, vão e volta, como a escravidão que tá pra acabá, mais não acaba
— Mas avó, a escravidão dos negros já acabou. Os negros são livres!
Quem falô pro moleque que só existe a escravidão da cô com corrente nos cabrito preto? Ocê tem olho pra enxergá? Tem ouvido pra escutá? Nunca escutô da escravidão da cô com as corrente do coração? Tem as coisa que acontece, tem as outra coisa que tão nos livro, escondida nas letra, o neinho precisa aprendê as duas coisa. Os branco diz que só acredita no que tá escrito. Todo mundo sabe que não é tão assim, mais é o que eles diz. Não tem jeito da avó contá as história se não fô contá a vida dos preto, foi o que a avó viveu, é o que a avó vive, não tem jeito de ocê aprendê dos livro se não colocá atenção na serventia dos livro, precisa pô os olho nas miudeza, usá da imaginação e desacreditá, escutá na hora de escutá, mais falá na hora de falá, se não falá vai tê outro que vai falá das coisa boa e das coisa ruim do jeito que quisé
— A avó parece mais triste que alegre, se a avó deixá vou chamar os tiuzin...
Larga mão de sê medroso, não vai, não. Os tiuzin não tem o que fazê, a avó tá virando mirage... e nem tô tão desanimada
— A avó embranqueceu os cabelos e desenrugou, tá cada pouquinho mais bonita que foi.
É o amo do neinho pela avó, é o apego do neinho que não se esquece de sê fio neto da avó preta. Ocê precisa aprendê que é os não preto que tem precisão de tê vergonha do esquecimento. Não fica escondido dos não preto nem dos preto envergonhado, essas pessoa tem lugá pra ocê ficá escravizado se não lutá, mais carece de fazê apuração do seu lugá de aparecimento liberto dos acabrunhado e dos safado
— Já tentei, mas acho que não funcionou...
— Conta pra avó...
Dia destes, escutei da boca do tiuzin Manoel que nunca ia se enfiar dentro daquelas calças alargadas e apertadas nos tornozelos
— Fumaça, ocê nunca vai vê esse seu tio dentro de pano com esse feitio.
Quis saber do tiuzin a razão daquela decisão tão decidida
— Na escola não contam o que fizeram com os preto?
Respondi que não lembrava de nenhuma história que pudesse fazê a brabeza do tiuzin ficar tão braba, além da escravidão que se conta nos livros tinha mais história escondida
— Prometeram liberdade e não cumpriram, depois acharam um jeito de rebaixá o bocado dos preto nas tropas.
Perguntei o que o tiuzin sabia, e se sabia, tinha compromisso de contar
— Então, escuta com os ouvido da atenção e as chuva do coração: pra rebaixá o bocado dos preto alistados nas tropas, um bocadinho antes da emboscada dos monarquistas, deixaram os preto desarmados. Foi um massacre nos preto. Preto que sobrô foi acorrentado. Depois foi só assiná a rendição que não é rendição. Juram que não foi assim, que foi um descuido e demasia de zelo com as arma. Nunca mais peguei em porongo.
Fiz a pergunta que todo mundo que conhece o assunto deveria querer fazer, se ele sabia quem deu a ordem do desarmamento dos negros
— Um general famoso... é só perguntá pra quem escreve as história
Retruquei que pode ter sido azar dos negros. Ganhei um olhar que doeu mais que se o tiuzin tivesse me dado uma bofetada bem dada, merecida
— Ocê acredite no que quisé, mas não diz pro seu tio onde devo enfiá minha suposição. Vai vê, o meu sobrinho acredita que os preto não tem virtude, por isso, acabaram por sê escravo. Prometeram a liberdade, mas nunca deixaram de tê preto escravo, vai vê a liberdade era pros outros preto, os preto que são menos preto, os preto monarquista. Estratégia pra enervá o outro lado. Os preto era homem pra enfrentá os balaço, morrê do lado dos branco, é bicho que se acorrenta depois que passa o perigo.
Assumi compromisso com o tiuzin de escarafunchar as histórias. Só tinha confiança em uma pessoa, pra clarear alguns esclarecimentos, a minha professora da geografia, se alguém pudesse ter algum conhecimento sobre o acontecido... seria ela. Passei aquela noite de escuridão sem conseguir ter o sono acalmado, precisava da explicativa da geografia: por que os negros foram desarmados na guerra, antes da luta.
Quando amanheceu fui pra escola, decidido de fazer a pergunta sobre a promessa não cumprida de liberdade para os negros e a tocaia nos negros desarmados. Tava com a ansiedade pulando na garganta, nem tomei o café da avó. As pernas da geografia continuavam lindas, o sorriso, as mãos, o perfume, o primeiro amor de verdade de um homem é a sua professora.
Olhava firme nas vistas dela, fazia a prática dos ensinamentos da avó, Quem olhá firme na direção das vista do outro, vai achá os esconderijo escondido ou dá prova do próprio mistério, a geografia respondeu que não sabia o que eu sabia, mas já adiantava em me dizer que não acreditava que o dito fosse fato acontecido, Têm acontecimentos do passado que até é bom ficarem do jeito que é contado, É bom pra quem, professora?
— Avó, essa foi minha primeira desilusão com o amor, nem tinha consumado a carne, nem perdia o interesse, ela é linda, mas, naquele agora, as mãos não me provocavam o compulsório, o descarrego da necessidade tinha que ficar pra depois, não tinha perdido a paixão, mas parecia que eu tinha levado uma surra.
O fio neto vai sabê que outras mirage vai chegá, é assim mesmo, a tapeação e a iluminura caminha uma do lado da outra, tem que colocá atenção nos interesse de quem conta, tudo tem lado, isso é bão. O que não é bão, é o neinho se metê pelo caminho da velhice antes de vivê a meninice, cada tempo tem seu tempo. As pessoa é diferente, isso é bão, ensina lição diferente, isso é bão, ocê só precisa tê ouvido no coração. Agora, alcança pra avó o copo com a água, aqui na mesinha, junto dessa luz amarelada
— Quê é isso, avó?
Os dente falso da avó... como se não subesse. A avó esqueceu no copo. Pega pra avó, não quero fazê a viagem com os mais velho... sem os dente. Não faz essa cara de nojo
— Como é que pega?
Com as mão. Já vi que o neinho tem enjoo com as coisa da velhice. Tá bem, alcança o copo. Isso. Deixa que a avó pega. Não fica triste, meu fio neto, vô gostá de ficá na vadiage quando passá no funil da separação do espírito dessa carcaça velha. E pare com essa cantoria que só serve pra enxarcá as vista, precisá firmá nas ideia dos sonho: o neinho vai virá doutô, o primeiro neinho da avó virado no que escolheu. Não quero sabê que o meu fio neto perdeu tempo de não sabê vivê
— Queria que a avó visse os festejos do diploma...
Quem diz que a avó não vai vê não faz compreensão dos espírito
— Queria vê a avó vendo...
Se o neinho acreditá de teimá, o tampão da imaginação vai deixá a avó aparecê. Vão dizê que aquilo que ocê vê, não vê, não credita nessa gente, não é como diz os branco, Não tem mais escravo, não tem mais escrava, é tudo igual; não credita, o seu puliça continua correndo atrás dos preto, é o pressentimento do seu puliça se prevení pra não tê necessidade de remediá, então corre atrás do preto antes do preto fazê, pode não tê feito, mais inda vai fazê. O neinho precisa prendê de mostrá o que é, o que qué, o que sente, não tem que ficá envergonhado, quem fingí que não vê o que vê tem o fingimento da obediência, tem os que finge que vê o que não vê, com esses o cuidado carece de sê redobrado. Ocê precisa se juntá com ocê pra modo de melhorá
— É mais fácil falar...
Claro que é mais fácil de falá que fazê, ocê tem que botá atenção em ocê. O olhá dos outro pode sê aleijado pelo desgosto, pelo orgulho, e tem gente que olha com meiguice demais, por isso, não olha pelo olhá dos outro, pra não virá arrogante, invejoso ou conformado. Não deixa ninguém dizê que sabe o que ocê tem na cabeça, o que ocê tem na cabeça só ocê sabe. Se o neinho credita que a avó perdeu importância, a avó vai dormí
— Cruz e credo, em nome do Pai, do Filho e do Espírito dos mais Velho, a avó tá ensinando até agora, teve uma vida livre.
Nem sempre, moleque, a avó também viveu mentira. Tô cansada. O neinho precisa deixá a avó partí
— Eu to com medo que a avó não volta.
Não precisa se metê medo. É só isso. To feliz que o neinho tá aqui, no acomodamento da avó
— Queria fazê à vida da avó vivê pra sempre.
Ocê não pode, ninguém pode, ocê só pode fazê a sua vida vivê enquanto não perde tempo de sabê vivê, não dá importância demais da conta pras coisa ruim, cuida do amô, deixa sempre o nó do laço afrouxado. Tudo sempre se acaba, nada é pra sempre. Bobage de querê pra sempre o que precisa terminá. Segura na mão da avó que precisa fechá as vista cansada
— Amo ocê, avó...
A avó sabe
______________
Leia também:
Ensaio 36 - Neinho, ocê faz a vida vivê
Ensaio 1B - Sempre chega: a vez de sentá pra conversá
______________
Leia também:
Ensaio 36 - Neinho, ocê faz a vida vivê
Ensaio 1B - Sempre chega: a vez de sentá pra conversá
Nenhum comentário:
Postar um comentário