XXV (2ª) - No se puede hacer la revolución sin las mujeres
por isso
nascemos crianças, para alegrar os adultos tristes
baitasar
A viagem de retorno sem la Vieja foi triste, sem graça, outro
esbanjamento de desperdício do nosso mundo para o mundo dos espíritos. Já me
explico, minha querida: el mundo de los
espíritus puede esperar, no está lejos de aquí. Allí, mi Vieja es sólo una más.
Senti muito sua ausência.
En la vuelta de la Piedra Caraca
a barqueira não usou das suas habilidades, as águas estavam quietas, quase
paradas, pareciam acomodadas, satisfeitas, voltaram ao seu curso natural
— Preta, acorda! — tentava descer do barco escorado nas areias — O que
foi? — perguntei antes de abrir os olhos e enfiar os meus pés tristes, naquele
chão de grãos finos e macios — Acorda, Preta! — mas os pés já tomavam as formas
achatadas, apertados pelo meu peso contra o assoalho de madeira do quarto sem
cor de lembrança — O que faço aqui? — para me erguer precisava esmagar o
assoalho com meu peso de maneira obstinada. O chão não precisa ser muito
resistente para suportar meus passos andantes — De onde eu vim?
Quando abri meus olhos de verdade, olhava para Anadyr — A velha se foi. —
Eu sei. — Como tu sabe? — olhava para aquela menina com um ou mais anos a mais,
me sentia tão mais velha, tão mais exigente, como poderia lhe dizer que la Vieja
veio dizer-me que partia para que outros pudessem ficar — Un intercambio justo, niña Preta — foi quando percebi meus olhos
inchados, ainda chorava, descobria que caminhamos pela vida chorando partidas e
fingindo esquecimento, até que partimos. Não via nenhum sentido nesta vida de
tantas despedidas. Como se a cada sumiço eu estivesse preparando minha vez, com
esperança que fosse uma boa hora. Sacudi minha cabeça e foi como um arrepio
percorrendo meu corpo, um choque de luz e escuridão. Poderia fazer tudo o que
quisesse, mas o amor pela vida não iria não me impedia à morte. Estremeci
novamente meu corpo, não queria pensar nessa hora que haveria de chegar — Niña Preta, chega destes medos tristes,
vá alegrar-se com as crianças e reza por mim. — por isso nascemos crianças,
para alegrar os adultos tristes. Bem que poderíamos nascer velhos e morrer
crianças, explicar a vida resmungando e receber a morte chorando, reentrando em
seu útero para sempre.
Esfreguei meus olhos, queria alertá-los de novo para a sintonia da vida,
uma aventura com caminhos perigosos, travessias difíceis, obstáculos
ameaçadores, esfreguei novamente os olhos e sorri, estava pensando bobagens,
não sabia da vida mais que ninguém. E hoje, sei menos, foi preciso me aventurar
todos esses anos para descobrir que fazemos algumas coisas que dependem de nós
mesmas, mas outras, a maioria, não controlamos.
Não adianta, precisamos planejar inventando invencionices. Cada dia é um
primeiro dia, uma rotina sem partituras, como tocar de ouvido: con cautela al principio, luego se utiliza sin
cuidado. Tudo é uma imprudência deliciosa, o roteiro fica pronto depois da
criação.
Ah... se aquela menina que fui soubesse o que sei hoje, ainda bem que não
sabia, precisava cometer as tolices necessárias à vida, imprescindíveis à
memória de ter vivido — Vamos, Preta. — saímos do meu quarto, seguia Anadyr
como uma boneca de pano, desconjuntada e amassada. Meus passos não eram passos,
eram saltos, piruetas da marionete levada pelos fios visíveis que se prendiam
às mãos invisíveis, a luta entre o visível e as forças que não controlamos.
Precisei desta vida para me descobrir neste mundo de cá, a gente vive e
não sabe se é feliz. Depois do lado de lá é preciso confiar.
A curandeira havia feito sua última cura, as vontades de la Vieja
se cumpriram. E ali, naquela noite, até o amanhecer, conversamos sobre o
encantamento mágico que espantou os espíritos adoecidos. De um jeito que não
sei, la Vieja tinha um relacionamento com Deus — Niña Preta, não vou por conta de vontade própria — Então, fica. —
Não tenho mais escolhas, apenas não chore.
Quis chorar, escorrer do meu corpo a dor que se rasgava e me grudava,
como o suor gruda os tecidos finos em nossa carne, como a gordura que acompanha
os descuidados e se gruda por dentro, aumentando dobras e saliências. Os olhos
secavam, não conseguia me salvar pelas águas dos olhos.
Dobrei meus joelhos até sentar-me sobre os calcanhares. Coloquei no chão
uma pequena tigela com as ervas de preferência de la Vieja — Tantas
maneiras de partir e você fez doce o seu desaparecimento — as folhas e os
galhos secos queimavam solenemente, eu rezava por minha solidão quase
permanente.
Tinha os olhos fechados e tentava acompanhar o rastro daquela nuvem
delgada que partia da tigela e se elevava até desaparecer, dançando entre os
invisíveis amores da minha vida — Niña
Preta, não existem motivos para chorar. — Eu sei.
Abri meus olhos e sorri meu primeiro riso — Bonan vojaĝon! adiaŭ! ĝis
revido! — ela sorriu de volta e me repetiu — Boa viagem! adeus! até à vista!
Eu aprendia, ela me aprendia.
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