XXIII (2ª) - No se puede hacer la revolución sin las mujeres
é bom ter
sonhos em quantidade possível
baitasar
— Não pode ir junto, niña Preta! — respondi que não me importava
com a volta se não podia ajudar la Vieja — Eu sei que posso valer de alguma
coisa. — Niña, as velhas têm precisão
da solidão, mais vezes que as jovens com seus apegos e o humor amoroso podem tolerar.
— estava em pé no barco, olhava direto em seus olhos — Criancice, mi Vieja, sinto que essa sua missão secreta
é arriscada e em missão arriscada é preciso ter confiança no socorro. — as
velhas quando ficam velhas, e não se escondem da própria partida, sofrem pelos
desejos da sua criança, correm riscos inúteis, sedutoras não dispensam cuidados
nem gentilezas, humildes confiam naqueles que as cercam, prestam atenção
silenciosa para compreender e se deixam apagar — Niña Preta, não existe só
o hoje, o agora, você precisa sobreviver hoje para os sonhos de amanhã. — Não tenho
parecença com sonhos. — ela me lançou um sorriso com uma maliciosa ternura que
jamais esqueci, pareceu estender a mão sobre minha cabeça, como se estivesse
benzendo pelo espaço de toda minha vida, sabendo e perdoando o que estava por
vir — É quase isso, não precisamos viver esperando pelos sonhos, mas é bom tê-los
em uma quantidade possível. — fiz o sinal da cruz, assim — En el nombre del Papá, Hijo y el
Espíritu Santo. — ela pode ver que eu também estava protegida.
A barqueira esperava com os remos suspensos acima das águas, o barco
subia e descia tão mansamente quanto era a sonolência da velha mulher, não
parecia nervosa ou alarmada, mas tinha uma missão para cumprir que não iria
descumprir — Senhora, não podemos ficar paradas — a voz naquela mulher tinha a
dignidade de todas as mulheres, carregava em si a própria vida, não era beleza,
não era sabedoria, nem tampouco revelava alguma oração, apenas sustentava o
próprio mistério da pausa para pensar, a imortalidade acessível à razão. É
preciso pensar e sentir. La Vieja olhou reto em meus olhos, avaliava
o tamanho da minha vontade, e fez um pequeno sinal com a ponta do nariz para a
velha barqueira. Os remos mergulharam nas águas e começamos nossa viagem para la Piedra
Caraca.
Aquela pequena travessia começou em silêncio. La Vieja parecia guardar
seus pensamentos para o futuro, para as águas, para as estrelas, para os
espíritos en la Piedra, eu não sabia o
que aconteceria, mas não iria me esconder outra vez. A dor da saudade fica
insuportável quando sabemos do tempo que já não temos. Saber antes não diminui
a dor. Não queria mais ficar esperando a traição do destino, enfeitada como uma
pobre coitada. Chorando queixas adoentadas e desnecessárias. A balda das
egoístas. Eu começava a caminhar meus passos sobre a dura realidade da vida, as
amigas fazem promessas enganadoras para salvar a si mesmas, ora somos generosas,
ora somos egoístas, e parece que conquistamos orgulho em nós mesmas. É duro
lutar contra a soberba da generosidade e as sobras do egoísmo. Parecem farpas
invencíveis e sintéticas, colocadas convenientemente no coração humano como
virtudes — O que é esse palavreado todo, niña
Preta? — respondi que eram bobagens —
Não tenha ilusões com o mundo, aprenda a ver as coisas como elas são... — E
como elas são? — perguntei tão rápido quanto a intuição me permitiu, sem
pensar. Ela pareceu pensar duas três quatro vezes antes de responder, já vi
homens e mulheres fazerem isso parecer um truque para ganhar tempo,
experimentar a paciência dos outros, nos mais velhos parece um cansaço com a
ignorância dos moços, eu acho que é apenas para dar maior importância ao que
vai ser dito — As coisas deste mundo são deste mundo, as coisas do outro mundo
são do outro mundo — respondi que não entendia da utilidade de manter um mundo
lá e outro cá, se ela mesma usava as coisas de lá para ajudar cá — O que ajuda
pode atrapalhar se não foi bem sabido e autorizado. — E a senhora está no meio.
— Tentei ajudar as pessoas a viverem melhorar — fez sinal para me aproximar,
não conseguia sair do meu lugar de assento, tenho covardia de barcos e rios, e
mar, e qualquer água que me chegue aos joelhos — Não consigo, tenho medo. — la bruja ergueu a mão em concha até a
boca, conversou com a própria mão, enquanto o barco era jogado com as ondas em
pequenos mergulhos e subidas, abriu a mão e com um pequeno sopro fez sua voz
sussurrar — Mantenha sempre flores dentro de casa, embelezam e deixam todos
mais calmos, elas possuem a energia vinda da terra. — perguntei sobre as flores
que acalmam — La niña Preta vai descobrir
o que lhe faz melhor.
A luz de la Vieja iluminava o
barco, até que a escuridão de fora para dentro ficou assustadora e nos engoliu,
as águas salgadas ficaram nervosas e o barco se lançou para o alto e depois
mergulhou. Procurei la Vieja e não via além do palmo no nariz,
gritei — Vieja! — ninguém respondeu —
repeti repeti repeti — Vieja!. Numa
das vezes em que o barco foi de nariz para o alto, pareci estar en la
Montaña, observando entre a lua e as
estrelas, vi o espírito alegre, simples e santo del Papá ordenando com
seu brilho os subterrâneos do dia sem sol — Cuidado com as ideias de muita bondade
e belas. — a voz dele parecia que jamais se assustava — Por que, mi Papá? — Elas podem não ser de
verdade. — vigiei la Vieja por uma estrela, queria olhar para
saber se a estrela zombava de mim.
Era a estrela que me zoava, dançando para cima e para baixo, ligando e desligando.
Pela primeira vez, sentia medo da morte que se anunciava e duvidei
daquele impulso que me empurrou para o barco. Aquela covardia de fugir de la Montaña
e abandonar minha irmã Blanca cobrava a minha dívida com a coragem: actuar sin pensar. O desconforto
suportável da ausência veio depois da saudade acomodada, então comecei com o
gosto e encantamento impetuoso pelo irrefletido. Os planos do futuro não
pareciam querer a minha vida com alegrias, ele se mostrava rancoroso e egoísta.
Decidi que iniciava minha própria rebelião. Um talento que ali, naquele barco,
estava aprendendo: obedecer al instinto
de ilegal y obsceno, desilusionada
con la felicidad de tener a un hombre y sus hijos, queria muitos homens e
muito dinheiro — Mi Vieja, entende? —
O que, niña Preta? — Não é bom ter medo demais. — o olhar despreocupado lhe
saiu — Nem confiança em demasia, niña
Preta.
O barco se lançava com as ondas acima e abaixo, as palavras ficavam penduradas
no redemoinho dos ventos, rodeando abraçando apertando — Vieja, assim a vida fica mais feia. — A dor é inevitável... —
mergulhamos e as palavras ficaram lá em cima. Sentia enjoo com tantos balanços.
O céu de estrelas desaparecia, la Vieja e a barqueira sumiam, a frente só
existia um imenso e escuro rochedo, me sentia abandonada num pesadelo que iria
me perseguir por muito tempo — ¡Vieja! — ¿Qué te molesta, niña Preta? — Onde tu
estás? — Aqui, na frente do barco. — Estou com medo! — Já vamos chegar. — me
parecia uma tarefa do acaso descer do barco tão maltratado pelo vento e com as
águas tão agitadas, parecia uma tarefa do desastre.
Não entendia a demora daquela velha barqueira em fazer a travessia a la Piedra
Caraca, lembrando melhor, ela tinha o
jeito de mulher cansada de muitas travessias. Olhando da praia, durante a
superfície do dia, o distanciamento das areias com aquela pedra era um começo bem
perto do fim. Distância curta, viagem curta. Algumas remadas seriam suficientes
para levar o barco em segurança até aquelas pedras. Talvez a velha remadora
estivesse fraca ou perdida do rumo — Vieja,
estamos no caminho certo? — Estamos aproveitando o melhor caminho. — una bruja precisa saber o melhor caminho
em meio àquela escuridão num mar enfurecido, senão deixa de ser una bruja.
Senti medo de seguir em frente, afinal, eu estava perdida, mas tinha ao
meu lado a disposição para enfrentar de jeito impulsivo tantas forças e, de
alguma maneira, acreditava que seguiria em frente, não seria o meu fim. Uma
superfície nevoenta suave com um vapor intenso me trouxe uma sensação
prazenteira, invadiu o barco, acomodou as águas salgadas — Receberam alguma
ordem de calmaria? — eu mais perguntava do que acreditava — O que foi, niña Preta?
— la bruja mais perguntava do que
respondia — As águas se aquietaram... — O melhor caminho. — a barqueira
continuava onde sempre esteve, em pé, com os remos na água, controlando e olhando
a frente. Conduzindo atenta e cantarolando
(Meu Jesus crucificado,
Filho da Virgem Maria,
nos guardai por esta noite
e amanhã por todo dia.)
Hoje, tão longe daquela travessia, sei que o fim se aproxima e de alguma
maneira seguirei em frente. Não tenho desespero, nem bruxaria, nem medo, talvez
seja um jeito de confortar o desamparo do meu corpo. O gozo e a jovialidade
cederam lugar à beleza — Vá e não volte nunca mais, saudade que tenho dentro de
mim.
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