sábado, 20 de janeiro de 2024

The Raven: O Corvo

The Raven: O Corvo

A História de Amor de Edgar Allan Poe
1915
LEGENDADO


A HISTÓRIA DE AMOR DE EDGAR ALLAN POE, 1915, Estados Unidos, preto e branco, mudo, 59 minutos. LEGENDADO 
Direção e roteiro: Charles J. Brabin. 
Com Henry B. Walthall, Warda Howard, Ernest Maupain, Eleanor Thompson, Marion Skinner, Harry Dunkinson.
A biografia do escritor americano Edgar Allan Poe, enfatizando os amores e momentos mais trágicos de sua vida, culminando com a composição de “O Corvo”, seu poema mais famoso.
Cinebiografia romanceada do escritor Edgar Allan Poe (1809-1849), mistura fato e ficção, tendo como base a celebrada peça em quatro atos escrita em 1903 pelo ator George Hazelton, em sua primeira investida como dramaturgo. A obra posteriormente foi adaptada em romance pelo próprio autor, em 1909, e levada ao cinema em 1915 pela companhia Essanay. 
Três anos antes o curta-metragem “The Raven”, produzido pela Eclair, adaptou o famoso poema de Poe.





"O Corvo" é um poema narrativo do escritor norte-americano Edgar Allan Poe. Publicado pela primeira vez em janeiro de 1845, é conhecido principalmente por sua musicalidade, linguagem estilizada e atmosfera sobrenatural. O poema trata da visita misteriosa de um corvo falante a um homem, frequentemente identificado como estudante, que lamenta a perda de sua amada, Lenore, e progressivamente enlouquece.



Tradução de Machado de Assis

Em certo dia, á hora, á hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, cahindo de somno e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agora morta,
Ia pensando, quando ouvi á porta
Do meu quarto um soar devagarinho,
E disse estas palavras taes:
«É alguem que me bate á porta de mansinho;
«Ha de ser isso e nada mais.»


Ah! bem me lembro! bem me lembro!
Era no glacial Dezembro;
Cada braza do lar sobre o chão reflectia
A sua ultima agonia.

Eu, ancioso pelo sol, buscava
Saccar d’aquelles livros que estudava
Repouso (em vão!) á dôr esmagadora
D’estas saudades immortaes
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora,
E que ninguem chamará mais.

E o rumor triste, vago, brando
Das cortinas ia acordando
Dentro em meu coração um rumor não sabido
Nunca por elle padecido.
Emfim, por applacal-o aqui no peito,
Levantei-me de prompto, e: «Com effeito,
(Disse) é visita amiga e retardada
«Que bate a estas horas taes.
«É visita que pede á minha porta entrada:
«Ha de ser isso e nada mais.»

Minh’alma então sentiu-se forte;
Não mais vacillo e d’esta sorte
Fallo: «Imploro de vós, — ou senhor ou senhora,
«Me desculpeis tanta demora.
«Mas como eu, precisado de descanço,
«Já cochilava, e tão de manso e manso
«Batestes, não fui logo, prestemente,
«Certificar-me que ahi estaes.»
Disse; a porta escancaro, acho a noite somente,
Sómente a noite, e nada mais.

Com longo olhar escruto a sombra,
Que me amedronta, que me assombra,


E sonho o que nenhum mortal ha já sonhado,
Mas o silencio amplo e calado,
Calado fica; a quietação quieta;
Só tu, palavra unica e dilecta,
Lenora, tu, como um suspiro escasso,
Da minha triste boca saes;
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
Foi isso apenas, nada mais.

Entro co’ a alma incendiada.
Logo depois outra pancada
Sôa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ella:
«Seguramente, ha na janella
«Alguma cousa que sussura. Abramo
«Eia, fôra o temor, eia, vejamos
«A explicação do caso mysterioso
«D’essas duas pancadas taes.
«Devolvamos a paz ao coração medroso,
«Obra do vento e nada mais.»

Abro a janella, e de repente,
Vejo tumultuosamente
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
Não despendeu em cortezias
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
De um lord ou de uma lady. E prompto e recto
Movendo no ar as suas negras alas,
Acima vôa dos portaes,
Trepa, no alto da porta, em um busto de Pallas;
Trepado fica, e nada mais.

Diante da ave feia e escura,
Naquella rigida postura,
Com o gesto severo, — o triste pensamento
Sorriu-me alli por um momento,
E eu disse: «Ó tu que das nocturnas plagas
«Vens, embora a cabeça nua tragas,
«Sem topete, não és ave medrosa,
«Dize as teus nomes senhoriaes;
«Como te chamas tu na grande noite umbrosa?»
E o corvo disse; «Nunca mais.»

Vendo que o passaro entendia
A pergunta que lhe eu fazia,
Fico attonito, embora a resposta que dera
Difficilmente lh’a entendera.
Na verdade, jamais homem ha visto
Cousa na terra semelhante a isto:
Uma ave negra, friamente posta
N’um busto, acima dos portaes,
Ouvir uma pergunta e dizer em resposta
Que este é seu nome: «Nunca mais.»

No emtanto, o corvo solitario
Não teve outro vocabulario,
Como se essa palavra escassa que alli disse
Toda a sua alma resumisse.
Nenhuma outra proferiu, nenhuma,
Não chegou a mexer uma só pluma,
Até que eu murmurei: «Perdi outr’ora
Tantos amigos tão leaes!

«Perdeirei tambem este em regressando a aurora.»
E o corvo disse: «Nunca mais!»

Estremeço. A resposta ouvida
É tão exacta! é tão cabida!
«Certamente, digo eu, essa é toda a sciencia
«Que elle trouxe da convivéncia
«De algum mestre infeliz e acabrunhado
«Que o implacavel destino ha castigado
«Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
«Que dos seus cantos usuaes
«Só lhe ficou, na amarga e ultima cantiga,
«Esse estribilho: «Nunca mais.»

Segunda vez, nesse momento,
Sorriu-me o triste pensamento;
Vou sentar-me defronte ao corvo magro e rudo;
E mergulhando no velludo
Da poltrona que eu mesmo alli trouxera
Achar procuro a lugubre chimera,
A alma, o sentido, o pavido segredo
Daquellas syllabas fataes,
Entender o que quiz dizer a ave do medo
Grasnando a phrase: — Nunca mais.

Assim posto, devaneando,
Meditando, conjecturando,
Não lhe fallava mais; mas, se lhe não fallava,
Sentia o olhar que me abrazava.
Conjecturando fui, tranquillo, a gosto,
Com a cabeça no macio encosto

Onde os raios da lampada cahiam
Onde as tranças angelicaes
De outra cabeça outr’ora alli se desparziam,
E agora não se esparzem mais.

Suppuz então que o ar, mais denso,
Todo se enchia de um incenso,
Obra de seraphins que, pelo chão roçando
Do quarto, estavam meneando
Um ligeiro thuribulo invisivel;
E eu exclamei então: «Um Deus sensivel
«Manda repouso á dor que te devora
«D’estas saudades immortaes.
«Eia, esquece, eia, olvida essa extincta Lenora.»
E o corvo disse: «Nunca mais.»

«Propheta, ou o que quer que sejas!
«Ave ou demonio que negrejas!
«Propheta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
«Onde reside o mal eterno,
«Ou simplesmente naufrago escapado
«Venhas do temporal que te ha lançado
«N’esta casa onde o Horror, o Horror profundo
«Tem os seus lares triumphaes,
«Dize-me: existe acaso um balsamo no mundo?»
E o corvo disse: «Nunca mais.»

«Propheta, ou o que quer que sejas!
«Ave ou demonio que negrejas!
«Propheta sempre, escuta, attende, escuta, attende!
«Por esse céu que alem se estende,

«Pelo Deus que ambos adoramos, falla,
«Dize a esta alma se é dado inda escutal-a
«No Eden celeste a virgem que ella chora
«Nestes retiros sepulchraes,
«Essa que ora nos ceus anjos chamam Lenora!»
E o corvo disse: «Nunca mais.»

«Ave ou demonio que negrejas!
«Propheta, ou o que quer que sejas!
«Cessa, ai, cessa! clamei, levantando-me, cessa!
«Regressa ao temporal, regressa
«Á tua noite, deixa-me commigo.
«Vae-te, não fique no meu casto abrigo
«Pluma que lembre essa mentira tua.
«Tira-me ao peito essas fataes
«Garras que abrindo vão a minha dor já crua.»
E o corvo disse: «Nunca mais.»

E o corvo ahi fica; eil-o trepado
No branco marmore lavrado
Da antiga Pallas; eil-o immutavel, ferrenho.
Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
Um demonio sonhando. A luz cahida
Do lampeão sobre a ave aborrecida
No chão espraia a triste sombra; e fóra
D’aquellas linhas funeraes
Que fluctuam no chão, a minha alma que chora
Não sai mais, nunca, nunca mais!



215 anos de aniversário do nascimento do mestre Edgar Allan Poe

Nenhum comentário:

Postar um comentário