Manoel Bomfim
O Brasil Nação volume 2
SEGUNDA PARTE
TRADIÇÕES
À glória de
CASTRO ALVES
Potente e comovida voz de revolução
CASTRO ALVES
Potente e comovida voz de revolução
POR FIM...
(7)
Concretamente, que se pode esperar, na necessária e inevitável revolução brasileira?
O Brasil apresenta-se em condições históricas muito próprias, com uma situação de época e de local muito específica, sem identidade imediata com a dos grandes povos do Ocidente, onde as reivindicações reparadoras estão definidas, na intensa propaganda revolucionária dos últimos decênios. Toda a diferença que haja, porém, será para tornar mais justa, e relativamente mais fácil, a definitiva e integral renovação de que precisamos. Em todos os povos cultos, de longa evolução, por essa mesma evolução se delineou o sentido da revolução, definindo-se explicitamente o seu objeto. São os povos que, sob a política da burguesia capitalizadora, chegaram à plena expansão industrial, de que resultou distinguir- -se a nação nas duas classes típicas: a do trabalhador, proletário, votado à miséria, por isso mesmo que trabalha, assalariado, escravizado economicamente ao capital; e a dos desfrutadores, senhores do capital, e, com ele, dominadores, servidos pela récua dos parasitas, no apanágio das altas funções do Estado. Então, a revolução, francamente pronunciada, assistida de toda a justiça, é para a solução – social-comunista. A classe dos trabalhadores, já consciente do seu valor, organizando-se ativamente, e melhorando constantemente o seu preparo, reclama desafrontadamente a ascendência política, em relação com a significativa condição do trabalho, essencial na produção, e em face do qual o capital, acumulado como riqueza particular, não passa de espoliação. E dá a gestão política aos que realmente valem, como trabalho e produção, e que as reservas da mesma produção, a riqueza feita, tenha significação explicitamente social, gerida pela comunidade, para benefício dela. A batalha, rudemente travada por toda parte onde o proletariado tem consciência do seu valor e da justiça da sua causa, já não pode deixar dúvidas quanto ao desfecho. Não importa que, na perspectiva da derrota, com o desespero da morte, os dirigentes de algumas nações tenham levado a reação até a destemperada tirania fascista, ou a apavorada eliminação de liberdades políticas essenciais, como os torys destes dias – a renegarem a tradição política britânica do último século. Pouco importa: são oscilações de longa campanha, e que não desviarão o resultado final.
No Brasil, a situação, por mais retrógrada, torna-se mais simples e fácil, ao passo que nos grandes povos, solidamente organizados, a complexidade e solidez são dificuldades imediatas. Nações tradicionais, de grande riqueza, ou longa história, elas todas têm, nas respectivas classes dirigentes, uma parte muito importante e significativa da substância em que se formaram. Desta sorte, se essas classes representam a oposição constante à radical reforma social, também incorporam o que há de mais explícito no passado guerreiro, ou aristocrático, e na transformação industrial da pátria. Inglaterra, França, Holanda, Itália, Alemanha... existem sob governantes que se ligam a uma tradição nacional arrogante, porque é patente – conquistas, glórias guerreiras, e toda a organização política eficiente no passado. Enquanto isto, no nosso Brasil, os dirigentes correspondem, apenas, à misera insuficiência em que continuam, e que não poderia ser parte essencial da nação. Nestas condições, com a vida rudimentar e falha que fazemos, quando, não há grande riqueza acumulada, nem complicadas e extensas organizações de produção capitalizadora, fácil e pronta seria a renovação revolucionária, mesmo no sentido que a evolução e a experiência humana estão apontando. Sim: não nos fecham, para a essencial reparação, nem privilégios milenários, nem específico poder da classe dirigente, nem emaranhado feudalismo financeiro, realmente nosso, estendido na trama social como ostensivo domínio. Tudo que há são esboços, que, fatalmente, se estenderão se o campo lhes for indeterminadamente deixado. Como temos de sair da insignificância vil em que estamos, a saída é franca...
Nisso se resume a relativa facilidade do nosso caso. Quem nos levará, no entanto?... Aí começa a suprema dificuldade, na inadiável remissão da pátria brasileira. Todo o argumentado até aqui – Brasil na História, Brasil Nação, e que é a história de dois séculos, demonstra-nos que não se pode esperar que venha de cima a obra salvadora. A revolução tem de ser inicialmente contra a classe dirigente, fator constante nas nossas desgraças. Sem poder contar que o conduzam à forma política e social conveniente; não devendo adiar a solução, pois o mundo transbordaria sobre nós: é o próprio povo que, pelo seu pé, tem de sair, aproveitando a porta larga que a própria história lhe fez. Não basta, no entanto, apontar a solução final, nem ela se poderia fazer na fórmula simples enunciada: é um movimento para a grande maioria da nação, mas inspirado e derramado nos ânimos por uma minoria ativa, intelectual, esclarecida, absolutamente desinteressada, sinceramente exaltada, cordialmente revoltada contra a injustiça, sublime de abnegação, capaz de produzir, em intensidade de propulsão, o que lhe falta em desenvolvimento. É bem de ver que tal crise nada tem de comum e de solidariedade com as anteriores sedições e mazorcas, que, estupidamente ambiciosas, desprestigiaram o nome – revolução, e que só têm de digno os heroísmos perdidos, mais das vezes, o sacrifico de humildes, seduzidos ou arrastados pelos manejos dos mesmos ambiciosos, a assaltar o poder.
Nem mesmo se pense em simples ataque de destruição... “Só quem sabe construir, tem o direito de destruir...” (Gandry). Destruir será, apenas, o penoso e fácil negativo da obra, que nada há de mais banal: não se faz preciso aprender a destruir, nem é objeto de nota. Para nós, então, quando o passado, mesmo maléfico, é quase inválido, o destruir se fará como simples afastamento, e as forças ficam intactas para a verdadeira obra revolucionária – a nova construção. E toda a ideologia inspiradora se desenvolverá com vistas a essa construção: revolução ostensivamente organizadora, fecunda disposição de solidariedade, criadora de liberdades essenciais, como o exige a justiça. Sem subordinação a preconceitos de ordem, o programa de tal revolução dará para a verdadeira ordem, a que se retempera porque inclui princípios essenciais de vida.
continua pág 359...
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"Manoel Bomfim morreu no Rio aos 64 anos, em 1932, deixando-nos como legado frases, que infelizmente, ainda ecoam como válidas: 'Somos uma nação ineducada, conduzida por um Estado pervertido. Ineducada, a nação se anula; representada por um Estado pervertido, a nação se degrada'. As lições que nos são ministradas em O Brasil nação ainda se fazem eternas. Torcemos para que um dia caduquem. E que o novo Brasil sonhado por Bomfim se torne realidade."
Cecília Costa Junqueira
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Bomfim, Manoel, 1868-1932
O Brasil nação: vol. II / Manoel Bomfim. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Fundação Darcy Ribeiro, 2013. 392 p.; 21 cm. – (Coleção biblioteca básica brasileira; 31).
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