Ensaio 17
baitasar
O anão abriu os braços e deu alguns
passos na direção da voz misturada com a penumbra da casa, uma névoa escondida
do espírito do sol, fechada de fora para dentro, imaginou o anão pedindo por
ajuda, perdido naquela caverna de deuses, ninfas e pastores, Onde está o
presente, onde ficou o passado
— Hola, jefe ...
Estavam num túnel, uma luz atrofiada e
abatida chegava daquele fim de tudo e desenhava um corpo com voz sensual,
melodiosa, com cheiro moleque – uma luz no fim do túnel nem sempre é uma saída
– Sèzar parou de chorar, firmou às vistas, como se estivesse entrando numa sala
de cinema, às escuras, apertou os olhos, esfregou, mas, quem quer que fosse,
continuava escondida na cautela da indefinição do seu pequeno apartamento,
caminhando nua em sua direção, como se estivesse fluindo pelo ar daquele
mistério de luz e neutralidade, se desvendava passo a passo, pequenos, um pé à
frente do outro, por vez, os joelhos se tocam levemente, o pequeno vazio de luz
entre as coxas era um vestígio por onde começar com a língua e a saliva grossa
do desejo, as curvas do quadril, Sèzar sentia a voragem como um pé-de-vento dos
pelos na sua boca, reunidos do entalhe das virilhas que se juntam e se abrem, o
relento da noite, o pântano escorregadio, encharcado, o ventre, o cordão
umbilical, a cintura moldada pelas mãos finaliza as curvas daquele quarto e
sobem até os ombros, descem pelos braços longos, delicados, as mãos macias,
atrevidas, quase juntas a ele, ergue uma das mãos, displicente, até os cabelos
vaporosos, negros, desalinhados, como se estivessem ainda desacordados de uma
longa noite de amores, olhos enviesados para baixo, um comedido sorriso de
mistério e revelação, Sèzar endireita os olhos, vê os seios na Adelaide,
pequenas cuias morenas, os bicos apontados para ele, derramando em suas mãos —
Adelaide...
— Ah,
aí está você, amorzinho... — a luz daquele final de tudo desenhava uma mulher
com contornos generosos, passos sinuosos — ... venha conhecer o meu amigo...
Sèzar tinha parado de chorar, se aquilo
tudo fosse uma armadilha, Essa armadilha é muito gostosa, foda-se tudo mais, to
nessa.
Sacudiu a cabeça, tentava afastar os
maus presságios, estremeceu o corpo, avisava que estava pronto para o que vier
a ser tudo aquilo
— O
que foi meu amigo?
— Nada
não, nada. — não era a diamba dando rebote de carência, o rapaz não controlou a
língua, avançou o sinal da boa vizinhança, fez elogio de gostosura àquela
aparição inesperada de mulher, um milagre da beleza escondida do espírito do
sol, na névoa sinuosa da casa azulada
— Meu
amigo, essa é a Maiami...— sentia vontade que o anão parasse de se referir a
ele, de dizer: ‘Meu amigo, meu amigo...’, afinal, tinham acabado de se
conhecerem, não podiam e não deviam ser amigos, não tinham nada em comum, a
começar pelo tamanho de um e do outro, não tinham lembranças juntos, não
cresceram juntos – o anão ainda estava crescendo – não fazem academia juntos,
não sofreram juntos, não riram juntos, não guardam segredos de um ou de outro,
e além disso, acabou de conhecer a mulher do amigo, quer dizer, do amigo anão,
não é isso, Eu quero comer essa... tira isso do pensamento. Mulher de amigo é
como se fosse homem, amizade antes da beleza
— Oi,
eu sou o Sèzar. — cínico, a diamba não lhe roubou a boa educação, quase
conseguiu fazer um fingimento de indiferença, quando a tal Maiami, mulher do
seu novo quase amigo, rasgou com leveza o véu da penumbra usando só uma
coisinha.
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