domingo, 14 de outubro de 2018

Música e Literatura: Pablo Milanés, Joan y Mercedes

Gracías a la Vida



O CORO

"Desgraça! Desgraça! estamos sós - a Peste e nós. A última porta fechou-se! Não estamos ouvindo mais nada. O mar, de agora em diante, está por demais longínquo. Agora, estamos dentro da dor e teremos de rodar em torno desta cidade, sem árvores e sem águas, fechada por altas portas lisas, coroada por multidões ululantes... não merecemos esta prisão! Nossos corações não eram inocentes, mas nós amávamos o mundo e seus verões - e isto nos deveria ter salvo!... Mas por uma vez ainda, pela última vez, antes que nossas bocas se fechem sob a mordaça do terror, gritaremos no deserto!"

Albert Camus, Estado de Sítio, 1948.









A PESTE

"Eu reino. É um fato. É, portanto, um direito. Mas um direito que não se discute, ao qual deveis adaptar-vos. Aliás, não vos iludais: se reino, é a minha maneira e até seria mais certo dizer que funciono... Não possuo cetro e tomei o aspecto de um suboficial. É a maneira que encontrei para vos atormentar, pois é bom que sejais atormentados: tendes tudo por aprender... O estado de sítio está proclamado.

Está proibido, como estão proibidos a ridícula angústia da felicidade, o rosto estúpido dos apaixonados, a contemplação egoísta das paisagens e a criminosa ironia. Em lugar de tudo isso, trago a organização. Isso vos incomodará um pouco, no início, mas acabareis por compreender que uma boa organização vale muito mais do que um mau patético...

Vossas macaquices tiveram seu momento. Agora, trata-se de serdes sérios! Suponho que já me compreendestes. A partir de hoje, ides aprender a morrer em ordem. Até aqui tendes morrido à espanhola, um pouco ao acaso: porque fez frio, após ter feito calor; porque vossas mulas tropeçavam; porque a linha do Pirineus era azul; porque, na primavera, o rio Guadalquivir atrai os solitários, ou porque existem imbecis desenfreados, que matam por lucro, ou pela honra - quando é muito mais distinto matar pelos prazeres da lógica. Sim: morreis mal. Um morto aqui, um morto lá, este em sua cama, aquele na arena. Pura libertinagem. Felizmente, porém, essa desordem vai ser administrada. Uma só espécie de morte, para todos - e de acordo com a bela ordem de uma lista. Tereis vossa fichas, não morrereis mais por capricho... Fareis parte da estatística e ireis, por fim, servir para alguma coisa. Ia me esquecendo de dizer que, está claro, morrereis, mas sereis incinerados, em seguida, ou mesmo antes: é mais limpo e faz parte do plano: a Espanha em primeiro lugar!

Ficar em fila, para morrer bem, eis o principal! A esse preço, tereis meus favores..."


Albert Camus, Estado de Sítio, 1948.










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