segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Dostoiévski - O Idiota: Primeira Parte (11.) - O príncipe saiu da sala

O Idiota



Fiódor Dostoiévski


Tradução portuguesa por José Geraldo Vieira


Primeira Parte


11.


O príncipe saiu da sala de visitas e se encerrou no seu quarto. Kólia correu imediatamente para tentar acalmá-lo. O pobre garoto não se dispunha a deixá-lo.

- O senhor fez bem de ter vindo embora. Agora aquilo lá vai piorar. E todos os dias é isto, aqui em casa.

Tudo só por causa de Nastássia Filíppovna.

- Há tantas fontes de tribulação em sua família, Kólia! - observou o príncipe.

- Há, sim. Não se pode negar. E é tudo culpa nossa. Mas quer saber de uma coisa? Tenho um amigo que ainda é mais desgraçado. O senhor gostaria de conhecê-lo?

- Muitíssimo. É um camarada seu?

- Sim, quase como um camarada. Depois lhe contarei... Mas como Nastássia Filíppovna é linda, não acha? Nunca a tinha visto antes, apesar de ter feito todo o possível. Fiquei deslumbrado. Se Gánia estivesse apaixonado por ela, eu lhe perdoaria tudo. Mas por que está ele contando com dinheiro? Isso é que é horrível.

- Realmente, não aprecio muito o seu irmão.

- Já percebi. Mas, como foi que o senhor pôde, depois... mas, quer saber? Não tolero certas ideias. Um espinoteado qualquer, um doido, um tratante, em um acesso de loucura dá uma bofetada em um homem e este se desonra por toda a vida, não pode resgatar o insulto a não ser com sangue, a menos que o outro se ajoelhe e lhe peça perdão. Na minha opinião isso é absurdo e é tirania. O drama de Lérmontov, O Baile de Máscaras, é baseado nisso e o acho estúpido. Ou, explicando-me melhor, não o acho natural. É verdade que ele o escreveu na meninice.

- Gostei muito de sua irmã.

- Viu? Escarrou na cara de Gánia! Ela tem cabelo nas ventas. Se o senhor não brigou com ele, estou certo de que não foi por falta de coragem. Mas aí vem ela. É falar-se no diabo e ele logo... Eu sabia que ela viria. Tem muitos defeitos, mas que é generosa, é.

Mal entrou, Vária implicou com o irmão:

- Você não tem nada que fazer aqui. E, antes de mais nada, vá ver seu pai. Ele o estava incomodando, príncipe?

- Absolutamente. Muito pelo contrário.


- Desta vez, mana, perdeste! Por que implicas comigo? Quanto a papai, pensei que fosse sair com Rogójin. Está arrependido agora, com certeza. Ainda assim acho bom ir procurá-lo - acrescentou, saindo.

- Graças a Deus consegui tirar mamãe de lá e a obriguei a deitar-se. Acabou o barulho. Gánia está envergonhado e muito deprimido. Pudera! Que lição!... Vim para lhe agradecer, de novo, príncipe, e para lhe perguntar se já conhecia Nastássia Filíppovna, antes!

- Não conhecia, não.

- Então que foi que fez o senhor dizer, diante dela, que ela “não era assim”? E parece que o senhor acertou. Também acho que não seja. Mas não a compreendo. É evidente que teve o propósito de insultar-nos. Isso ficou mais do que claro. Eu sei que muita coisa que me falavam dela é falso. Mas, se realmente veio para nos convidar, por que se portou assim para com a mamãe? Ptítsin, que a conhece bem, me declarou que dificilmente a consideraria capaz de fazer o que nos fez hoje. E Rogójin, então? Como é que uma pessoa que se respeita pode agir desse modo na casa dos outros? Como mamãe ficou aborrecida com o que lhe aconteceu!

- Não se incomodem com isso. - e o príncipe ajudou as palavras com um gesto.

- E não é que ela acabou obedecendo ao senhor?

- De que modo?

- O senhor lhe perguntou se não sentia vergonha e imediatamente ela mudou. Pode ficar certo que tem influência sobre ela príncipe. - e Vária sorriu levemente.

Nisto a porta se abriu e, para grande surpresa de ambos, Gánia entrou. Não titubeou nem mesmo à vista da irmã. Ficou parado um pouco, à entrada, depois caminhou resolutamente para o príncipe.

- Príncipe, comportei-me como um sujeito à-toa. Perdoe-m,e meu caro camarada. - falava com sentimento, não encobrindo uma expressão de mágoa que havia no seu rosto.

O príncipe olhou-o espantado e não respondeu.

- Vamos, perdoe-me - insistiu Gánia, com humildade. E se deixar, estou pronto a beijar a sua mão.

O príncipe comoveu-se e, embora não dissesse nada, abraçou Gánia. Beijaram-se, com sinceridade.

- Eu não tinha a menor ideia, a menor ideia de que o senhor pudesse ser assim - disse o príncipe, retomando o fôlego. -Julgava-o incapaz disso.

- De confessar o meu erro? E dizer-se que esta manhã o tomei por um idiota! O senhor percebe o que os outros não veem. Explicando, ou não explicando, o senhor compreende tudo...

- Aqui está uma outra pessoa a quem o senhor também devia pedir perdão - e o príncipe apontou para Vária.

- Não adianta, príncipe. São todos meus inimigos. Já fiz várias tentativas. Não há nenhum perdão sincero vindo da parte de certa gente - rematou impetuosamente Gánia, dando as costas para Vária, que inesperadamente disse alto:

- Sim, eu te perdoo.

- E serás capaz de ir comigo esta noite à casa de Nastassia Filíppovna?

- Se exiges, vou. Mas cabe a ti próprio julgar se não é fora de propósito eu ir lá, esta noite.

- Ela não é como aqui pensam. Viste que ela hoje aqui cada vez se mostrou mais enigmática. Só usou de artifícios. - e Gánia riu de um modo vicioso.

- Eu sei perfeitamente que ela não é assim e que tudo não passa de maneirismo. Mas que pretende ela? Além disso, pensa bem, Gánia, afinal ela te toma por quem? Lá o ter beijado a mão de mamãe, não representa nada, pode ter sido uma impostura. Tu sabes que ela continuou rindo de ti, na mesma! Isso não vale setenta e cinco mil rublos, realmente não vale, tu bem sabes, mano! E é porque sei que ainda és capaz de sentimentos nobres que te falo assim. Para com isso. Acautela-te. Isso não pode acabar bem.

Estava tão excitada que, mal acabou de falar, saiu quase a correr do quarto.

- Elas todas são assim! - e Gánia sorriu. - E supõem que não conheço a vida. Ora, conheço muito mais do que elas. - e tendo dito estas palavras se sentou no sofá, dando mostras de querer prolongar a visita.

- Se sabe as coisas tão bem, por que é que escolheu um tal tormento?- aventurou-se o príncipe a comentar. - O senhor sabe que tal situação não vale setenta e cinco mil rublos.

- Não é a isso que estou me referindo - redarguiu Gánia. - Mas diga, já que falou neste assunto, o que pensa o senhor? Quero saber a sua opinião. Uma tal miséria vale ou não vale setenta e cinco mil rublos?

- Acho que não vale.

- Eu sabia que o senhor ia responder assim! E um tal casamento é vergonhoso?

- Vergonhosíssimo.

- Bem, deixe-me dizer que me vou casar com ela. Coisa, aliás, sobre a qual já não há dúvida. Cheguei a hesitar e bastante, mas agora resolvi ceder. Não fale! Eu sei o que é que o senhor quer dizer.

- Eu não ia dizer o que o senhor pensa. Surpreende-me muito a sua imensa confiança.

- Sobre quê? Qual confiança?

- Ora! A respeito do seguinte: que Nastássia Filíppovna está certa que se casará com o senhor e que isso é caso resolvido. E a seguir que, se ela se casar com o senhor, os setenta e cinco rublos entrarão para o seu bolso. Mas naturalmente que em tudo isso há muita coisa que eu ignoro.

Gánia chegou-se mais para perto do príncipe.

- É evidente que o senhor não sabe quase nada. Mas por que então me sujeitaria eu a tais cadeias?

- Penso que no mais das vezes muita gente se casa por causa do dinheiro, que aliás fica com a esposa.

- Não, conosco não será assim... Neste caso há pontos a considerar... - murmurou Gánia, com ar meditativo. - Quanto a resposta dela, hoje, não há dúvida - acrescentou apressadamente. - Em que se baseia o senhor para julgar que ela me dará o contra?

- A esse respeito não sei senão o que vi, e o que acabou de dizer Varvára Ardaliónovna.

- Ah! Foi bobagem dela. Elas não sabem mais o que dizer. Nastássia Filíppovna estava rindo de Rogójin. - dou-lhe a minha palavra. Eu vi. Tenho a certeza. Eu estive aturdido, mas agora compreendi. E quanto ao modo dela se comportar perante mamãe, papai e Vária?

- E perante o senhor, também.

- Talvez. Foi uma maneira muito feminina de se cobrar de velhas contas. Ela é pavorosamente irritável, presunçosa e egoísta. Como qualquer escriturário que acabou de ser vítima de injustiça no seu serviço. Quis demonstrar pessoalmente todo o seu desprezo por todos e... por mim. Eis a verdade, não nego... E ainda assim quer se casar comigo. O senhor não sabia a que falsos papéis pode levar a vaidade humana. Repare só e verá que ela me considera um sem-vergonha porque a aceitei, a ela, amante de outro homem, e a aceito abertamente só por causa de dinheiro! E desconhece que qualquer outro homem a aceitaria de um modo ainda mais desavergonhado do que o meu, acenando-lhe com ideias liberais e progressistas, fingindo acobertá-la sob problemas femininos. E ela entraria direitinho nessa armadilha como um fio em uma agulha. Convenceria ele a tola vaidosa (e seria fácil) que se casasse com ela, apenas devido ao seu “nobre coração” e “desventura”, embora fosse, como no meu caso, por causa de dinheiro, tal e qual. Não me absolvem porque não finjo envergonhar-me. E é o que eu devia fazer. Mas, ela, que faz ela? Não dá no mesmo? Então que direito tem de desprezar e de armar jogos assim, comigo? Porque eu me mostro altivo e me vendo caro? Está bem, veremos!

- O senhor a amou até que isso tivesse acontecido?

- No começo a amei. Basta! Há mulheres que só servem para.. amantes. Não digo que tivesse sido minha amante. Se ela sempre se comportar direito, o mesmo farei eu. Mas sei que é uma insubordinada. Já prevejo tudo: largo-a logo e levo o dinheiro comigo. Não quero que se riam de mim. Acima de tudo, tenho horror do ridículo.

- Eu, por mim, considero Nastássia Filíppovna muito sagaz, observou o príncipe prudentemente.

- Por que procuraria ela a armadilha sabendo de antemão que miséria isso significaria para ela? O senhor bem vê que ela se poderia casar com qualquer outro. E é que me surpreende. Ora, é que há outras razões. O senhor não sabe de tudo, príncipe. É que... De mais a mais, está persuadida de que a amo até à loucura, garanto-lhe. E ainda por cima tenho fortes suspeitas de que também me ama à sua maneira, conforme o ditado que o senhor conhece: “Castigo quem amo”. Considerar-me-á toda a vida como um patife (e talvez seja isso o que ela deseje) e ainda assim me amará à sua maneira. Ela está se preparando para isso, o seu caráter é assim. É uma autêntica mulher russa, digo-lhe eu. Mas, tenho uma pequenina surpresa guardada para ela. Aquela cena de ainda agora com Vária foi ocasional, mas me serviu; viu como estou apegado a ela e ficou convencida de que estou pronto a romper com todas as amarras por sua causa. Não sou tão parvo, pode o senhor ficar certo. E já que nisso estamos, o senhor não vai inferir do que aqui lhe digo que sou tagarela, não é mesmo? Talvez, de fato, eu esteja errado em confiar no senhor, caro príncipe. Mas o senhor é o primeiro homem honrado com quem cruzei no meu caminho. Zangou-se por causa do que aconteceu ainda agora? Não? Esta é a primeira vez, de há dois anos a esta parte, creia, que eu falo de coração. Aqui há gente terrivelmente pouco honesta, e Ptítsin, por exemplo, é o mais honesto de todos. Acho que o senhor está rindo, não? Os canalhas admiram as pessoas honestas... O senhor ignorava isso? E por conseguinte, eu... mas em que sou eu um canalha, diga-me com toda a sua consciência!? Por que é que todos fazem coro com ela, chamando-me de canalha? E quer saber de uma coisa? Acabei seguindo o exemplo deles e dela e também me chamo um canalha! Isso é que é uma canalhice, realmente, uma canalhice!...

- Eu nunca o consideraria propriamente um canalha! - disse o príncipe. - Ainda agora pensei no senhor como em um frasco, e imediatamente depois o senhor se reabilitou, causando-me júbilo à alma. Foi uma lição, para eu não julgar sem experiência. Agora concluo que o senhor não pode ser considerado sem moral e nem mesmo, realmente, um homem depravado Na minha opinião. O senhor não é mais que um homem como tantos outros de qualidades sem interesse real, ou melhor, sem qualidades quaisquer. E, além disso, tendo fraqueza de mais e originalidade de menos.

Gánia sorriu sarcasticamente, mas não respondeu nada, vendo que a sua opinião tinha sido mal aceita, o príncipe se embaraçou e também ficou calado. Pouco depois Gánia lhe perguntou:

- Meu pai lhe pediu dinheiro?

- Não.

- Se lhe pedir, não dê. Outrora foi um homem decente. Lembro-me. Frequentava só gente direita. E com que rapidez fraqueja essa gente decente quando a velhice chega! Basta uma circunstancia mínima, e não fica mais nada dessa gente, tudo se vai em um relâmpago! Outrora ele não pregava mentiras deste tipo, posso lhe garantir. Outrora apenas foi um pouquinho entusiasmado, e veja em que deu! Naturalmente a bebida está no fundo de tudo isso. E quer saber de uma coisa? Tem uma amásia! E agora está ficando pior do que um simples mentiroso. Não entendo mais a capacidade de sofrimento de minha mãe. Ele lhe falou no cerco de Kars? E como o seu cavalo baio trotador começou a falar? Pois olhe que ele não se limita somente a tais despautérios!...

E repentinamente Gánia desferiu uma gargalhada. - Por que é que está me olhando assim? - perguntou ao príncipe, interrompendo-se de repente.
 
- Estou surpreendido com a sua gargalhada tão franca. Ainda bem que pode rir como uma criança. O senhor entrou aqui para fazer as pazes comigo; disse, até: “Se consentir, beijarei a sua mão”, tal como uma criança o teria feito. Ainda é, pois, capaz de tais palavras e de tais impulsos. E depois o senhor começa uma enorme lengalenga a respeito desse negro caso e desses setenta e cinco mil rublos. Devo dizer-lhe quanto tudo isso me parece absurdo e incrível.

- E o que deduz disso?

- Não estará agindo impensadamente? Não deveria examinar-se antes? Varvára Ardaliónovna tem razão, decerto!

- Ah! Lições de moral!? Que eu sou rapaz desmiolado, estou farto de saber - interveio Gánia, acaloradamente - E basta ver a conversa que acabo de ter com o senhor. Não é por motivos mercenários que vou fazer este casamento, príncipe - continuou espicaçado pela vaidade da mocidade que não o deixava calar-se - Certamente ainda não posso me orientar, porque sou fraco demais. em caráter e em espírito. A paixão me cega porque só tenho uma coisa em mira. O senhor pensará que, mal eu ponha a mão em setenta e cinco mil rublos, compro logo uma carruagem. Não. continuarei usando o meu paletó do ano retrasado e não prestarei atenção nos meus conhecidos que frequentam clubes. Há pouca gente perseverante, entre nós, embora não passemos de cavadores de dinheiro. Mas eu. eu serei perseverante. A grande coisa é fazer isso cabalmente; esse é que é o problema. Ptísin, aos dezessete anos, dormia na rua e vendia canivetes. Começou com um copeque e hoje tem sessenta mil rublos. Pergunte a ele o que passou para chegar a isso. Mas eu começarei para cá dos empecilhos e já con capital. Dentro de quinze anos, dirão: “Ali vai Ívolguin, o rei dos judeus!” Disse-me o senhor, ainda agora, que não tenho nada de original. Observe, caro príncipe, que nada ofende mais a um homem da nossa raça e da nossa época do que lhe dizerem que não é original, que não tem força de vontade nem talentos especiais e que não passa de um indivíduo comum. O senhor nem sequer me deu crédito para me considerar um canalha de primeira ordem, e o senhor sabe que eu estaria pronto para aniquilá-lo, só por causa disso. O senhor me ofendeu mais do que Epantchín, o qual, sem discussão, sem experimentar tentar-me, na simplicidade do seu coração, repare bem, acreditou que eu fosse capaz de vender a minha vida. Isso me exaspera há tempos e é por isso que eu quero dinheiro. Mas dêem- me o dinheiro e verão se me torno ou não um homem altamente original. O que há de baixo e de desprezível no dinheiro é que com ele se compra até mesmo talento, e assim será até o fim do mundo. Dirá o senhor que também isso não passa de infantilidade ou. talvez, de romantismo. Bem, para mim será melhor assim e hei de fazer o que desejo. - Seja como for perseverarei e não desistirei. Rira bien qui rira le dernier. O que levou Epantchín a insultar-me desse jeito? Despeito, não podia ser! Nunca! Então foi porque me achou um tipo sem a menor importância. Mas, então... Agora, chega, porém. É tempo de me ir. Kólia já meteu o nariz pela porta duas vezes; ele quer avisar que o jantar está pronto. Preciso sair. Procurarei o senhor, de vez em quando. O senhor se sentirá à vontade, conosco; considerá-lo-ão da família, em pouco. Então, estamos de bem, outra vez? Creio que o senhor e eu seremos amigos ou inimigos. E que acharia, príncipe, se eu lhe tivesse beijado a mão como me prontifiquei com sinceridade? Isso me tornaria seu inimigo depois?

- Estou certo que sim, mas não para sempre. Não aguentaria e haveria de o perdoar - respondeu o príncipe com uma risada, depois de ter pensado um pouco.

- Ah! Ah!... O senhor precisa ser vigiado com mais cuidado. Ora bolas! Também pôs a sua gotinha de veneno... E quem sabe o senhor, afinal, não é um inimigo? Por falar nisso ali! ali! ah! - ia me esquecendo de perguntar. Tenho razão em crer que o senhor também ficou arrebatado diante de Nastássia Filíppovna.

- Sim... Eu gosto dela.

- Ficou apaixonado?

- Não!

- Pois não é que o senhor está ficando vermelho e com ar infeliz? - Ora, não faz mal, não tem importância, não vou rir por causa disso. Mas, quer saber de uma coisa? Ela é uma mulher de vida virtuosa! Não acredita? - Pensa o senhor que ela está vivendo com esse tal Tótskii? Absolutamente. Há muito que isso acabou. - E reparou que ela é terrivelmente retraída e que até ficou embaraçada por alguns segundos, hoje? Foi, sim. É gente dessa marca que gosta de dominar os outros. Bem, adeus.

Gánia saiu bem-humorado e muito mais à vontade do que quando entrara. O príncipe ficou pensando mais de dez minutos sem se mover. Kólia meteu a cabeça pelo vão da porta, outra vez.

- Não quero jantar, Kólia. Almocei demais em casa dos Epantchín. Kólia entrou logo e entregou um bilhete ao príncipe. Estava dobrado em um envelope fechado e era do general. A cara de Kólia, ao entregá-lo, deixava ver claramente quanto isso o desgostava. O príncipe leu, levantou-se e pegou no chapéu.

- É a dois passos daqui. Nem isso - explicou Kólia, ainda confuso. Ele está sentado lá, diante de uma garrafa. Que jeito faz para arranjar bebida fiado, não entendo. Príncipe, meu caro príncipe, não diga à minha gente que eu lhe entreguei esse bilhete. Já jurei mais de mil vezes não levar nem trazer bilhetes destes, mas acabo ficando com pena. E deixe que lhe diga, não fique com cerimônia diante dele; passe-lhe qualquer bagatela que ele logo o deixa em paz.

- Já era minha intenção procurar seu pai, Kólia .. por causa de um negócio. Vamos.


continua página 113...

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