sábado, 27 de agosto de 2011

VIII (1ª) - No se puede hacer la revolucion sin las mujeres

Enganação nos bagos do assustado
Os topetes e as espigas de milho

baitasar


Naquela Montaña de mestiços invisíveis, la chola leporina era vista como um sinal de bondade dos deuses com todas as outras mujeres de Piedras Altas, Blanca foi escolhida para lembrar nossa própria perfeição. Assim, a memória habitual de abandonos e desistências seria derrotada pelas marcas a esa mujer, fariam las cholas sorrirem apesar da dor; amar apesar do cansaço; cantar apesar das fomes; dançar apesar dos silêncios; acreditar apesar das mentiras e das promessas nunca prometidas.
Blanca é uma mulher sagrada. E ali, entre os mestiços da Montaña, o sagrado era o lindo e o homem que a tocou: um beija-flor perfumado com o cheiro da laranjeira, do pessegueiro, amoreira, abacateiro; um cuitelo de vôos nervosos, mergulhos atrevidos, aqui e ali, acima e abaixo, parado no ar, no topo, enfiado até a raiz; suspenso no gozo que nos salva e permite morrer para ressuscitar nas virilhas complacentes do desejo. As mãos do colibri passaram a guardar na memória as umidades do sagrado, o buço retinha o gosto bom de estar vivo enquanto ela vive. Gemia de contentamento ao entrar pelo convite dos olhos, se derramava em súplicas de beijos e línguas. É isso, os beijos e as línguas só deveriam existir para acalmar a alma, sem tempo para tremores vulgares. Falatórios desnecessários. O beija-flor, a sua alma e os desejos
(Blanca, minha querida, os beijos avisam as carnes aquecidas, tua e minha: a língua se aproxima em lambidas perdidas entre as virilhas. Adora as rachaduras úmidas, fendas maliciosas, róseas perfumadas.)
Os vôos do beija-flor não arredavam dos olores da leporina. As mãos do colibri não soltavam das entranhas da chola sagrada. O homem pequeno pairava no ar para tomar o suco doce e graúdo que se arreganhava. As canelas tremiam e a cara se enfiava mais, adornada por gemidos e promessas
(come até acabar)
Não preciso lembrar que no meio daquela escuridão e penumbra, tocos de velas e chamas amareladas, cheiros de cera e suor, silêncios, sussurros e zumbidos, meu rosto queimava de curiosidade e medo, e vergonha. Os pés coçavam pelos embuás, mas não movia uma unha para caçá-los, que se divertissem comigo. Creio que Blanca, nos seus dias de menina, também olhava papá y su madre, papá y mi madre. Parecia-me ouvir rumores da sua boca
(Aprendes, mi hermana... aprendes.)
Não existe maldição, não existem bruxas no coração apaixonado, apenas a solidão que ama ainda mais que ontem, e por toda vida, sempre um pouquinho a mais. Até cansar e desmaiar de exaustão. A Montaña esperava resignada, sabia que o mundo não é o bastante para o gozo: ele se termina e ela está lá, olhando por cima do ombro, com uma das mãos repousadas sobre as nádegas amolecidas, nádegas adormecidas, por instantes: mortas! para aqueles dois corpos caídos.
Minha irmã não se queria sagrada, apenas se desvelou: a caverna degenerada do seu homem, arreganhada até o fundo pela espada que se juntava às suas dores. Quis o homem pequenino por seus atrevimentos de beija-flor, foi escolhido e feito amante por ela, um homem separado da manada e da Montaña. Distante como la chola leporina, sobressaltado como ela mesma, atrevido, ignorante de qualquer aberração, doce, diferente
(Adoro namorar tuas carnes, assim: enfiado, suave, abusado)
O meio-homem por baixo da minha irmã, deitado de costas, a barriga subindo e descendo indecente, até que desaparecia dentro da Blanca: o sumiço lhe arrancava gemidos, mas não eram os gemidos assustados dos cachorros, nem os gemidos perdidos das galinhas, podia jurar que eram os zumbidos das cigarras, atrevidas cantorias da desocupação. Sabemos domesticar abelhas, convivemos com baratas e ratos; esmagamos as formigas com solas cascudas, mas continuamos assustados com o canto das cigarras e os estalos dos grilos. Não entendemos as cigarras e a sua vontade de cantar para sempre.
As cantorias e estalos do anão e da leporina pareciam dizer que a vida é esse barulhamento de entrar e sair um do outro. Então, vi os cabelos do Juzé entrando na terra, como se estivessem enraizando o meio-homem na mãe de todas as mães. Até que ele se derramou para dentro daquele útero do chão
(Eu vi.) (¿Lo que vio, mi amor?) (Onde o touro esteve pode ainda estar.)
O aviso foi disparado
(O anão viu o touro.) (Onde?) (Não sei, mas ele viu.)
Antes de o galo cantar e Blanca seguir con papá para espremer as leiteiras, decidiram que o serviço precisava de ligeireza. Descoberto o esconderijo do animal o plano era simples: entrar no campo, amarrar o bicho e trazer para acobertar as leiteiras.
Na noite seguinte, no instante em que o sol retirou suas pegadas da Montaña, a lua escureceu para deixar que o brilho das estrelas flutuasse sobre seus largos cabelos e repicasse em cada pedrinha do caminho, desenhando outra via láctea leitosa de terras e pedras, uma trilha imaginária de rabiscos.
E lá se foram Juzé, Jaquín e José. O meio-homem preto ia à frente, caminhava em silêncio na estrada do pensamento, ideava a trilha com esperança para as leiteiras das Piedras Altas. O negrume daquela noite só deixava passar para as vistas a brancura da camisa, o anão era invisível, sem cabeça, sem braços, sem pernas, apenas uma camisa branca flutuava na escuridão. Aquela madrugada seria um esconderijo perfeito. O anão no circo: os olhares curiosos, os risos de afronta, os insultos, as bocas retorcidas, o cheiro da pipoca, do suor, estrumes, as risadas
(Psiu...)
Os dois maiores se entreolharam e pararam, estreitaram o olhar e alargaram os ouvidos, mas nada podia ser visto ou escutado. O pequeno ergue o queixo: farejava pelas ventanas de la nariz
(É aqui.)
Foi quando um negrinho todo marcado de apanhar apareceu com um toco de vela e abriu o caminho entre a escuridão e as trevas
(O xucro está lá no meio do campo.)
Os três seguiram no encalço do negrinho.
Os invasores mais o toco da vela e o negrinho, naquela escuridão não se viam, entraram no cercado e foram às cercanias do animal. O bicho era exagerado: de longe metia medo; de perto, aumentava a covardia.
O anão deu um passo mais à frente e arriscou uma olhadela nas virilhas do touro, queria certeza que o resultado valia o risco da missão. Primeiro, examinou com os olhos, depois, para se assegurar que as vistas não estavam se enganando, segurou as partes do bicho nas mãos.
Virou-se pensativo para sua comitiva de captura e sussurrou apreensivo
(Se o bicho não for delicado, tenho medo por Plantera.) (Tenho medo por nós, não vamos obrigar esse imbecil a nada, nem mesmo vai nos seguir.) (Calma, para tudo tem um jeito.)
Juzé enfiou uma das mãos por dentro da sua camisa branca, pegou três pequenas sacolas de pano
(Dom Carmelo disse que podíamos voltar com as mãos abanando... confiando apenas na sorte.) (O que tem dentro destes saquinhos de pano?) (O mistério da vida.) (Fala tudo de vez, homem-pequeno.)
Jaquín e José estavam ansiosos, a jornada de levar e trazer o touro, não podia com qualquer desperdício de tempo
(Esses panos carregam os cheiros das leiteiras.)
Juzé explicou: papá passou os panos entre as virilhas traseiras das leiteiras e recomendou que usassem os panos quando o touro estivesse no alcance do cheiro
(Preparem o laço.) (Começamos com qual das leiteiras?)
Primeiro a Plantera, depois a Pastora. O bicho não se abalou, não pareceu interessado, nem disposto a arredar-se daquele canto de conforto. O mistério se mostrou quando o cheiro da Tormenta balançou el toro. O animal saiu a passo, seguindo o pano branco que se mostrava na escuridão. Apenas, o lenço e a camisa branca do anão flutuavam naquele negrume.
Passaram o laço no pescoço do pretendente e saíram do cercado. Caminhavam sobre seus passos até Piedras Altas. Voltavam sobre as próprias pegadas.
Juzé levava sobre os ombros, um tempo pouco de cada lado, uma haste desbastada de árvore. No final da vara, ia pendurada a bandeira com os cheiros da Tormenta. A flâmula branca das tréguas balançava pendurada sobre o ombro invisível, esparramando os cheiros do cio da Tormenta: promessas de ficar arrebatada, como uma fenda profunda de la tierra, um abismo em que poucos mergulham pelo prazer dos mistérios escondidos, um manto de lava dos seus subterrâneos.
No fim de todas as desculpas, é apenas isto: me enteré de que los hombres tienen miedo de no sobrevivir tantos deseos; miedo de el beso robado con la fantasia de una perra, miedo, miedo... el toro es castrado, porque el patrón tiene miedo que va a comer a todas las vacas. Los misterios del amor necesita sabores y fragancias. As brincadeiras dos cheiros são os temperos que agradam às vistas e nos fazem ficar na ponta dos pés, mas precisam das mãos, das palavras, dos silêncios
(Blanca, adoro teus temperos.) (Los misterios del amor.) (As brincadeiras dos cheiros.) (Amores necesitan sabores y fragancias.) (E temperos que agradam às vistas.) — O que te passa Juzé? — os companheiros daquela viagem não entendiam os resmungos do anão no escuro. — Nada rapazes, apenas o pensamento me escapando pela boca.
O caminho na volta se usado com pressa é mais curto. Num instante, eles estavam no cercado das leiteiras. Quando o macho entrou na pousada as bichanas reagiram aos seus instintos, cada uma em seu quarto da hotelaria
As três já estavam amarradas pelo pescoço ao cercado da baia, os traseiros voltados para a porteira
(Juzé, de este modo más aburrido.) (Mas com esse touro o jeito é sem jeito, tudo às pressas.) (Qué lástima, coitadinhas.) (Você queria deixá-las mugindo e rolando pela grama do pasto? E o coronel? Sentado... vigiando o desempenho do xucro?)
O anão mantinha o brutamonte preso por las ventanas: os cheiros das gurias. O cafetão caricaturista, o touro, as fêmeas, uma a uma o macho cheirava e lambia, mas não aparentava vontade de trepar nos costados. O tempo da escuridão encurtava la paciencia de los hombres, o bichano seguia amarrado no pescoço
(O filho-da-puta do touro não se anima.) (Coitado de bicho.)
Macho de pau-de-carga mole é certeza de insubordinação. Ordens são ordens, precisavam ser cumpridas
(¿Y el amor, mi querido?) (Amor, amor... o touro só precisava endurecer as ideias e enfiar algumas delas nas leiteiras.)
Foi quando Dom Carmelo chegou para massagear o úbere das leiteiras. Pediu bacia com água morna. Molhava as mãos na água aquecida e esfregava as tetas, uma a uma. Depois se erguia e empurrava o próprio punho dentro da primeira, depois a outra, e a outra. Olhou para o anão e ordenou que o pequeno colocasse as mãos na água e esfregasse os bagos do desinteressado
(Mi amor, hermoso.) (Bem mostras que teu pai é Dom Carmelo.) (Apuesto que dio cierto.) ((Deu...) (Sus manos son magia, mi amor.)
O pequenino olhou para sua comitiva. José e Jaquín ergueram os ombros e pediram licença do serviço. O velho voltou a ordenar ao homenzinho uma esfregação de enganação nos bagos do assustado
(O que tinha que ser feito... será feito.)
O anão chamou Jaquín e José. Os dois colocaram o imprestável frente ao traseiro da Tormenta, enquanto Dom Carmelo alisava com água morna o úbere da leiteira-moça: depois arremessava o punho na fenda da leiteira; o anão mergulhava as mãos amornadas nos bagos do pretendente. Nada parecia adiantar.
Repetiram com a Pastora sem nenhum resultado prático.
Na vez da Plantera, o anão pareceu sentir nas mãos sinais de interesse do envergonhado. O interesse cresceu até que o exagerado soltou um berro imenso, ergueu as patas dianteiras e se acomodou nervoso nas ancas da leiteira. O anão foi jogado embaixo do revigorado. A missão estava se completando rápida, nervosa e intensa.
No instante que o touro se desvencilhou da Plantera, o anão gritou que Jaquín e José o colocassem na garupa da Pastora. O bicho reagiu bem e voltou a desabrochar
(¡Lo mismo con la Tormenta!)
Mas quando o xucro atirou as patas dianteiras sobre a garupa da leiteira e alongou tudo para se enfiar, aconteceu o imprevisto. A vaca empinou sobre as dianteiras e com as duas patas traseiras esmurrou o bufão endurecido.
O urro do animal acordou a Montaña.
O bicho se acovardou e deitou enroscado sobre os bagos

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