Contos e Lendas de Amor - Brasil
As lágrimas de Potira
Muito antes de os brancos atingirem os sertões de Goiás, em busca
de pedras preciosas, existiam por aquelas partes do Brasil muitas tribos
indígenas, vivendo em paz ou em guerra e segundo suas crenças e hábitos.
Numa dessas tribos, que por muito tempo manteve harmonia com seus
vizinhos, viviam Potira, menina contemplada por Tupã com a formosura das
flores, e Itagibá, jovem forte e valente.
Era costume na tribo as mulheres se casarem cedo e os homens,
assim que se tornassem guerreiros. Quando Potira chegou à idade do casamento,
Itagibá atingiu sua condição de guerreiro. Não havia como negar que se amavam e
que tinham escolhido um ao outro. Embora outros jovens quisessem o amor da
indiazinha, nenhum ainda possuía a condição para as bodas, de modo que não
houve disputa, e Potira e Itagibá se uniram com muita festa.
Corria o tempo tranquilamente, sem que nada perturbasse a vida do
apaixonado casal. Os curtos períodos de separação, quando Itagibá saía com os
demais para caçar, tornavam os dois ainda mais unidos. Era admirável a alegria
do reencontro.
Um dia, no entanto, o território da tribo foi invadido por
vizinhos cobiçosos, devido à abundante caça que ali havia, e Itagibá teve que
partir com os outros homens para a guerra.
Potira ficou contemplando as canoas que desciam rio abaixo,
levando sua gente em armas, sem saber exatamente o que sentia, além da tristeza
de se separar de seu amado por um tempo não previsto. Não chorou como as
mulheres mais velhas, talvez porque nunca houvesse visto ou vivido o que sucede
numa guerra.
Mas todas as tardes ia sentar-se à beira do rio, numa espera
paciente e calma. Alheia aos afazeres de suas irmãs e à algazarra constante das
crianças, ficava atenta, querendo ouvir o som de um remo batendo na água e ver
uma canoa despontar na curva do rio, trazendo de volta seu amado. Somente
retornava à taba quando o Sol se punha e depois de olhar uma última vez,
tentando distinguir no entardecer o perfil de Itagibá.
Foram muitas tardes iguais, com a dor da saudade aumentando pouco
a pouco. Até que o canto da araponga ressoou na floresta, desta vez não para
anunciar a chuva mas para prenunciar que Itagibá não voltaria, pois tinha
morrido na batalha.
E pela primeira vez Potira chorou. Sem dizer palavra, como não
haveria de fazer nunca mais, ficou à beira do rio para o resto de sua vida,
soluçando tristemente. E as lágrimas que desciam pelo seu rosto sem cessar
foram-se tornando sólidas e brilhantes no ar, antes de submergir na água e
bater no cascalho do fundo.
Dizem que Tupã, condoído com tanto sofrimento, transformou suas
lágrimas em diamantes, para perpetuar a lembrança daquele amor.
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Contos e Lendas
de Amor
Co-edição Latino-americana. Editora Ática. 1986. São
Paulo
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