sexta-feira, 16 de maio de 2014

a roupa de terra das gentes

Morte e Vida Severina


Não basta ser artista, intelectual ou estudado, se não entender os sofrimentos do povo e a sua roupa de terra.


Chegou o dia
     
                                      a poesia

saiu dos livros
                               e a música
emudeceu no violão,

o coração?
                                 esqueceu-se

                              severina e joão

em qual esquina eu morri
e matei
                                     e deixei

de me importar?
                             
                           desaprendi de querer                        
ver a terra querida
e dividida
                                               entre as gentes
se fartando do pão
e da doçura do mel

fecundado na terra
do corpo
                 do pano enrolado
                                            da   severina
São os tempos
                              sem olhos para ver
as feridas
o chão





...
Essa cova em que estás,
com palmos medida,
é a cota menor
que tiraste em vida.
É de bom tamanho,
nem largo nem fundo,
é a parte que te cabe
deste latifúndio.
Não é cova grande,
é cova medida,
é a terra que querias
ver dividida.
É uma cova grande
para teu pouco defunto,
mas estarás mais ancho
que estavas no mundo.
É uma cova grande
para teu defunto parco,
porém mais que no mundo
te sentirás largo.
É uma cova grande
para tua carne pouca,
mas a terra dada
não se abre a boca.

Viverás, e para sempre,
na terra que aqui aforas:
e terás enfim tua roça.
Aí ficarás para sempre,
livre do sol e da chuva,
criando tuas saúvas.
Agora trabalharás
só para ti, não a meias,
como antes em terra alheia.
Trabalharás uma terra
da qual, além de senhor,
serás homem de eito e trator.
Trabalhando nessa terra,
tu sozinho tudo empreitas:
serás semente, adubo, colheita.
Trabalharás numa terra
que também te abriga e te veste:
embora com o brim do Nordeste.
Será de terra tua derradeira camisa:
te veste, como nunca em vida.
Será de terra e tua melhor camisa:
te veste e ninguém cobiça.
Terás de terra
completo agora o teu fato:
e pela primeira vez, sapato.
Como és homem,
a terra te dará chapéu:
fosses mulher, xale ou véu.
Tua roupa melhor
será de terra e não de fazenda:
não se rasga nem se remenda.
Tua roupa melhor
e te ficará bem cingida:
como roupa feita à medida.



"Morte e Vida Severina" de João Cabral de Melo Neto






O Cio da Terra

Debulhar o trigo
Recolher cada bago do trigo
Forjar no trigo o milagre do pão
E se fartar de pão

Decepar a cana
Recolher a garapa da cana
Roubar da cana a doçura do mel
Se lambuzar de mel

Afagar a terra
Conhecer os desejos da terra
Cio da terra, a propícia estação
E fecundar o chão

Composição: Chico Buarque / Milton Nascimento



Pedro Páramo




Livro áudio

Pedro Páramo - Juan Rulfo 1/4



Pedro Páramo - Juan Rulfo 2/4




Pedro Páramo - Juan Rulfo 3/4



Pedro Páramo - Juan Rulfo 4/4




Nenhum comentário:

Postar um comentário