sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Edgar Allan Poe - Contos: Colóquio entre Monos e Una

Edgar Allan Poe - Contos



Colóquio entre Monos e Una
Título original: The Colloquy of Monos and Una
Publicado em 1841





Una — Ressuscitado?

Monos — Sim, bela e adorada Una, ressuscitado. Tal era a palavra sobre cujo sentido místico meditei tanto tempo, desprezando as explicações da padralhada, até que a morte veio, ela própria, trazer-me a chave do enigma.

Una — A Morte!

Monos — Como as tuas palavras fazem eco das minhas, doce Una! Os teus passos vacilam e brilha-te nos olhos um alvoroço anormal! Vê-se que estás ainda perturbada, oprimida pela novidade majestosa da Vida Eterna! Sim, era da Morte que eu falava. Mas como esta palavra parece estranha agora, esta palavra que, noutro tempo comunicava a tristeza a todos os corações e desluzia todos os prazeres!

Una — Ah! a Morte, o espectro terrível que se sentava a todas as mesas! Quantas vezes eu e tu, Monos, nos perdemos em conjeturas a seu respeito! Como ela se erguia, autoridade suprema e misteriosa, ante a ventura humana, dizendo: Daqui não se passa! Lembras-te, meu Monos, como, ao princípio, o amor nos fazia felizes e como nos lisonjeávamos, em vão, de ver progredir com ele a nossa ventura! Ai! esse amor progrediu, mas com ele progredia, nos nossos corações, o terror da hora fatal que devia separar-nos para sempre! E assim, com o tempo, o amor tornou-se-nos um suplício; o ódio ter-nos-ia sido uma misericórdia!

Monos — Não te lembres mais dessas penas, querida Una; minha agora, minha para sempre!

Una — Meu amigo, não é na lembrança das mágoas passadas que consiste a alegria do presente? Deixa-me falar muito tempo, muito tempo ainda das penas que já não existem. Conta-me os incidentes da tua viagem através da Sombra e do negro Vale. Tenho imenso desejo de os conhecer!

Monos — Jamais a radiante Una pedirá em vão seja o que for ao seu Monos! Contar-te-ei tudo minuciosamente; mas, diz-me, em que ponto devo começar a narrativa misteriosa?

Una — Em que ponto?

Monos — Sim, em que ponto?

Una — Compreendo, Monos. A morte revelou-nos a ambos a tendência do homem a definir o indefinível. Não direi pois: começa no ponto em que a vida para, mas sim: começa nesse momento de tristeza infinda, em que, a febre tendo desaparecido, caíste num torpor sem respiração nem movimento; quando os meus dedos trémulos de amor cerravam as tuas pálpebras lívidas.

Monos — Deixa-me dizer-te primeiro, minha Una, duas palavras acerca da condição geral do homem nessa época. Deves lembrar-te que um ou dois sábios de entre os nossos antepassados (sábios verdadeiros, bem que a opinião do mundo não os considerasse assim) tinham ousado duvidar da propriedade da palavra Progresso, aplicada à marcha da nossa civilização. Durante os cinco ou seis últimos séculos, que precederam a nossa morte, aparecia sempre, de vez em quando, uma ou outra inteligência vigorosa, lutando corajosamente por estes princípios cuja evidência ilumina agora a nossa razão emancipada, enfim, dos prejuízos terrestres; princípios, que deveriam ter ensinado à raça humana a deixar-se guiar pelas leis naturais sem querer submete-las à sua crítica. De tempos a tempos apresentavam-se pois alguns espíritos soberanos para os quais todos os progressos nas ciências práticas não eram senão um resumo na ordem da verdadeira utilidade. Às vezes, o espírito poético (que nós sabemos agora a mais sublime de todas as faculdades; visto que as verdades mais importantes só podiam ser-nos reveladas por essa analogia, cuja eloquência, irresistível para a imaginação, não tinha poder algum sobre a razão enferma e solitária) às vezes, digo, o espírito poético passou além da filosofia cega, inferindo da parábola mística da árvore da ciência e do seu fruto proibido, gerador de morte, uma advertência clara, a saber: que a ciência não convinha ao homem, durante a menoridade da sua alma. E esses homens, os poetas, que viviam e morriam desprezados pelos utilitários, pedantes rudes que usurpavam um título do qual só os desprezados eram dignos, os poetas referiram os seus devaneios e as suas justas saudades a esses dias primitivos em que os desejos do homem eram tão simples como penetrantes os seus gozos, em que a palavra alegria era desconhecida, tão profunda e invariável era a felicidade humana! Dias santos, augustos e abençoados quando os rios azulados corriam a transbordar das colinas invioladas, prolongando-se ao longe nas florestas primitivas, odoríferas e virgens!

Contudo essas nobres exceções ao absurdo em geral só serviam de o avigorar pela oposição. Ai! os piores de todos os nossos dias maus eram chegados. O Grande impulso (tal era a linguagem da época), perturbação mórbida, moral e física, caminhava sempre! A arte... as artes, quero dizer, foram elevadas à dignidade suprema e, uma vez instaladas sobre o trono, subjugaram a inteligência que as havia elevado. O homem, que não podia deixar de reconhecer a majestade da natureza, cantou nesciamente vitória pelas suas conquistas progressivas sobre os elementos da mesma natureza. Mas enquanto ele se pavoneava, fingindo-se Deus, acometia-o-uma imbecilidade infantil! Como se poderia ter previsto desde a origem da doença, infetaram-no logo uma quantidade de sistemas e de abstrações; embaraçaram-no as generalidades.

Entre outras ideias bizarras, predominava a da igualdade universal. E à face de Deus e da analogia (em despeito dos brados das leis da gradação, que tão intimamente penetram todos os objetos do céu e da terra), fizeram-se esforços insensatos para estabelecer uma democracia universal. Este mal era a consequência necessária do primeiro: a ciência. O homem não podia, ao mesmo tempo, submeter-se e saber.

Entretanto, edificaram-se um sem número de cidades enormes e famosas. As folhas verdes torceram-se sob o hálito ardente dos fornos. O formoso rosto da natureza parecia desfigurado pelos estragos de alguma doença repugnante. O sentimento do forçado e do investigar demasiado teria devido deter-nos naquele ponto. Mas parece que pervertendo o gosto, ou antes esquecendo-nos de o cultivar nas escolas, tínhamos concluído loucamente a própria destruição. Porque, na verdade, em semelhante crise só o gosto (esta faculdade que sendo o intermédio entre a pura inteligência e o senso moral não pode nunca ser desprezada impunemente) haveria então tido o poder de nos fazer voltar ao belo, à natureza e à vida! Mas, ai!, puro espírito contemplativo e majestosa intuição de Platão! Ai! Mousiké compreensiva que ele considerava, com justiça, como educação suficiente para a alma! Ai! onde estáveis? Era exatamente quando havíeis desaparecido no esquecimento e no desprezo universais que o mundo vos chamava com desespero.

Pascal, um filósofo a quem ambos amávamos, cara Una, disse (com que verdade!) que todo o raciocínio se reduz a ceder ao sentimento. Assim, se a época o tivesse permitido, talvez que o sentimento do natural tivesse retomado o seu antigo ascendente sobre a selvagem razão matemática das escolas. Mas não podia ser. A decrepitude do mundo aproximava-se prematuramente, trazida pelas orgias da ciência. É o que a massa da humanidade não via ou o que fingia não ver, vivendo com sofreguidão, posto que sem felicidade.

Quanto a mim, a história da terra havia-me ensinado a esperar a ruína mais completa como prémio inevitável da mais alta civilização. A comparação da China, simples e robusta, com a Síria arquiteta, o Egito astrólogo e a Núbia ainda mais subtil, mãe turbulenta de todas as artes, tinha-me dado a presciência do nosso destino. Os anais desses países haviam-me mostrado um reflexo do futuro. As especialidades industriais destes três últimos reinos eram doenças locais da terra, e a ruína de cada uma foi a aplicação do remédio local; mas para o mundo infetado em globo não havia regeneração possível senão na morte. Ora o homem não podendo, como raça, ser destruído conclui que lhe era preciso renascer.

E era então, bela e querida Una, que os nossos espíritos divagavam quotidianamente pelo país dos sonhos. Era então que discorríamos à hora do crepúsculo sobre os dias futuros, quando a epiderme da terra cicatrizada, tendo sofrido esta purificação (a única coisa que podia fazer desaparecer as suas abominações retangulares), tornaria a ostentar as verduras, as colinas e as águas risonhas do paraíso e voltaria a ser uma habitação apropriada ao homem; ao homem purificado pela morte; ao homem cuja inteligência enobrecida não acharia mais um veneno na ciência; ao homem resgatado, regenerado, beatificado, desde então imortal, contudo revestido ainda da matéria!

Una — Lembro-me perfeitamente dessas conversações, querido Monos, mas a época do fogo destruidor não estava tão próxima como imaginávamos e como a corrupção de que falas nos dava certamente razão de acreditar. Os homens viveram e morreram individualmente. Tu mesmo, vencido pela doença, desceste ao túmulo, onde a tua constante Una não tardou a seguir-te. E bem que os nossos sentidos adormecidos não tenham sido torturados pela impaciência, nem tenham sequer percebido a longa duração do século que se passou depois e cuja revolução final nos restituiu um ao outro, contudo, caro Monos, passou-se ainda um século!

Monos — Diz antes um ponto no vago infinito. A minha morte realizou-se incontestavelmente durante a decrepitude da terra. Fatigado de mágoas provenientes da desordem e da decadência geral, sucumbi à febre cruel que me atacou. Depois de poucos dias de sofrimento e de muitos dias cheios de delírios, de sonhos e de êxtases fui, como dizes, acometido por uma letargia, sem respiração nem movimento, e as pessoas que me rodeavam disseram que era a morte. As palavras são coisas vagas; o meu espírito não me privava do sentimento, era pouco mais ou menos a extrema quietação de uma pessoa que, tendo dormido muito tempo profundamente, imóvel, prostrada sob a calmaria do solstício ardente, começa a voltar lenta e furtivamente a si sem atentar no movimento exterior.

Não respirava. O pulso estava imóvel. O coração havia cessado de bater. A volição não tinha desaparecido, mas era ineficaz. Os meus sentidos gozavam de uma atividade insólita, posto que exercendo-a de um modo irregular e usurpando reciprocamente as suas funções ao acaso. O sabor e o olfato misturavam-se numa confusão inextricável, não formando já senão um sentido anormal e intenso. A água de rosas com que me humedeceste ternamente os lábios no momento supremo dulcificava-me o espírito com ideias de flores, flores fantásticas, infinitamente mais belas do que flor alguma da terra antiga semelhantes às que vemos hoje florescer em torno de nós. As pálpebras, transparentes e exangues, não opunham o mínimo obstáculo à visão. Como a vontade estava suspensa, os globos não podiam mover-se nas órbitas, mas todos os objetos situados ao alcance do hemisfério visual eram percebidos mais ou menos distintamente; os raios que caíam sobre a retina externa ou no canto do olho, produzindo um efeito mais vivo do que os que batiam na superfície interna ou a atacavam de frente. Contudo, no primeiro caso esse efeito era tão anormal que me parecia mais um som; som doce ou discordante, conforme os objetos que se apresentavam ao meu lado; eram luminosos ou sombrios; arredondados ou angulosos. Ao mesmo tempo o ouvido, posto que sobre-excitado, não tinha nada de irregular na sua ação, apreciando os sons reais com uma precisão não menos hiperbólica que a sua sensibilidade. O tato, esse, sofrera uma mudança mais notável. As suas impressões vinham lentamente, mas conservavam-se e produziam sempre um prazer físico dos mais pronunciados.

Assim, a pressão dulcíssima dos teus dedos sobre as minhas pálpebras não foi, ao princípio, percebida senão pelo órgão da visão; mas por fim, e longo tempo depois de os teres retirado, embriagou-me com um prazer sensual inapreciável. Digo: um prazer sensual. Todas as minhas perceções eram puramente sensuais. Quanto aos materiais fornecidos pelos sentidos ao cérebro passivo, a inteligência morta, incapaz de os trabalhar, não lhes dava forma alguma. Havia em todas aquelas sensações um pouco de dor, muita voluptuosidade, mas nem a sombra de um prazer ou de um desgosto moral. Os teus soluços impetuosos flutuavam-me no ouvido com todas as suas cadências doridas, apreciados em todas as variações dos seus tons melancólicos, mas eram notas musicais e nada mais, não trazendo à razão extinta a mínima noção das dores que os causavam, ao passo que a copiosa e incessante chuva de lágrimas que caía sobre o meu rosto penetrava-me simplesmente de êxtase. E, na verdade, era realmente a Morte, de quem todos os assistentes falavam respeitosamente e em voz baixa; e tu, minha doce Una, com voz convulsiva, entrecortada de soluços e de gritos!

Três ou quatro figuras sombrias que passavam e repassavam de um para o outro lado com ar azafamado vestiram-me para o túmulo. Quando estas figuras atravessavam a linha direta da minha visão afetavam-me como formas; mas quando passavam ao meu lado, as suas imagens traduziam-se-me no cérebro por gritos, gemidos e outras expressões lúgubres, de terror, de repugnância ou de sofrimento. Só as ondulações do teu vestido branco, em qualquer direção que te agitasses, vibravam sempre musicalmente em redor de mim.

O dia baixava, e à medida que a luz se esvaecia acometia-me uma inquietação vaga (uma ansiedade semelhante à de um homem que dorme ao som de ruídos tristes e reais; sons de sinos longínquos, solenes e periódicos, acompanhando-lhe algum sonho melancólico). A noite veio, e com as suas sombras, uma desolação profunda que me oprimia todo com um peso enorme, palpável! Havia também um som lúgubre, assaz semelhante ao eco longínquo da ressaca, mas mais moderado, que começara ao crepúsculo e aumentara com as trevas. De repente, iluminaram o aposento e, no mesmo instante, interrompeu-se o tal eco prolongado, transformando-se em explosões frequentes, desiguais, com o mesmo som, mas menos lúgubres e menos distintos. A opressão esmagadora diminuiu em grande parte. Senti brotar da chama de cada lâmpada (eram muitas) um canto de uma monotonia melodiosa. E quando, aproximando-te do leito em que eu jazia, vieste graciosamente sentar-te ao meu lado, exalando o perfume desses lábios deliciosos e pousando-os sobre a minha fronte, ergueu-se-me no peito uma perturbação trémula, confusa, semelhante às sensações puramente físicas, produzidas pelas circunstâncias; alguma coisa análoga à própria sensibilidade; um sentimento que apreciava em parte o teu amor ardente e a tua dor e quase lhes correspondia. Mas esse sentimento não se implantava no coração paralisado; parecia mais uma sombra que uma realidade e esvaeceu-se rapidamente, primeiro com uma quietação extrema, depois com um prazer puramente material, como primitivamente.

E então, do naufrágio, do caos de todos os sentidos pareceu elevar-se em mim um sexto sentido absolutamente perfeito. A sua ação era um deleite esquisito, mas físico, sendo que a inteligência não se lhe associava de modo algum. O movimento no ser animal havia cessado completamente. Nenhuma fibra tremia, não vibrava um único nervo nem uma artéria palpitava. Mas parecia que no meu cérebro tinha nascido este não sei quê do qual palavra alguma pode dar uma concepção, mesmo confusa, a uma inteligência puramente humana. Deixa-me defini-lo assim: vibração do pêndulo mental. Era a personificação moral da ideia abstrata do Tempo. É pela igualação absoluta desse movimento, ou de algum outro análogo, que são regidos os ciclos dos globos celestes. Foi assim que medi as irregularidades do pêndulo do fogão e as dos relógios das pessoas presentes, cujos tique-taques me soavam harmoniosamente ao ouvido. Os seus desvios mais ligeiros (e esses desvios eram frequentes) afetavam-me exatamente como, entre os vivos, a violação da verdade abstrata afeta as faculdades morais. Posto que não houvesse, em todo o aposento, dois movimentos que marcassem os segundos exatamente, não me custava nada a reter imperturbavelmente no espírito o timbre de cada uma das suas diferenças relativas. E este sentimento da duração, vivo, perfeito, existindo propriamente, sem dependência de uma série qualquer de factos (modo de existência talvez incompreensível para o homem) essa ideia, esse sexto sentido, surgindo das minhas ruínas, era o primeiro passo sensível, decisivo, da alma intemporal para os umbrais da Eternidade.

Era meia noite. Tu continuavas sentada ao meu lado; os outros, depois de me haverem metido no caixão, tinham deixado o quarto da Morte. As vacilações das luzes traduziam-se em mim pelos trinados dos cantos monótonos. Mas, de repente, esses cantos diminuíram de clareza e de volume e por fim cessaram. Extinguiram-se os perfumes; desapareceram da visão todas as imagens. O meu peito foi aliviado da opressão das Trevas. Percorreu-me o corpo uma comoção surda, seguida do desaparecimento total da ideia do tato.

Tudo o que restava dos chamados sentidos do homem fundiu-se na simples consciência da entidade e no sentimento único e imutável do Tempo. A Destruição irremediável havia por fim aniquilado o corpo mortal.

E, portanto, a sensibilidade não havia desaparecido de todo, porque a consciência e o sentimento substituíam algumas das suas funções por meio de uma intuição letárgica. Eu percebia a mudança horrorosa que começava a operar-se na carne; contudo, assim como o homem, em sonhos, tem às vezes a consciência da presença corporal de alguém, assim também eu sentia vagamente a minha doce Una sentada junto de mim.

Do mesmo modo, quando chegaram as doze horas do outro dia, a minha quase inconsciência pôde ainda apreciar os movimentos que se seguiram. Tu desapareceste! Fecharam-me no caixão, colocaram-me no carro mortuário e conduziram-me ao túmulo. Depois meteram-me lá dentro, carregaram-me de terra e deixaram-me só com os vermes, no escuro e na podridão, entregue ao meu sono triste e solene!

E ali, naquela prisão que tão poucos segredos tem a revelar, passaram-se os dias, as semanas, os meses, e a alma contava escrupulosamente cada segundo que corria e registava a sua fuga sem esforço e sem objeto.

Passou-se um ano. A consciência do ser tornara-se gradualmente mais confusa, dominada, em grande parte, pela da localidade. A ideia da identidade afogara-se na ideia do lugar. O pequeno espaço que confinava o que outrora havia sido corpo constituía agora o próprio corpo. Por fim, como acontecia às vezes sobre a terra ao homem profundamente adormecido, (o sono e o mundo do sono são as únicas imagens da morte) quando um raio de luz o fazia estremecer, deixando-o meio desperto, meio engolfado nos sonhos, assim surgiu para mim, nas profundezas da Sombra, a única luz que podia talvez fazer-me estremecer: a luz do Amor imortal! Levantaram a terra húmida que me encerrava na fria noite do túmulo e sobre os meus ossos descarnados desceu o caixão de Una! E depois tudo voltou ao Nada. Aquela luz nebulosa extinguiu-se. Aquele tremor impercetível desvaneceu-se outra vez na imobilidade. Decorreram lustros e lustros. A poeira voltou a ser poeira. Acabara-se o pasto dos vermes. O sentimento do ser havia por fim desaparecido inteiramente. Em seu lugar, em lugar de tudo o mais, reinavam, autocratas supremos e eternos, o Lugar e o Tempo. Para o que não era nada; para o que não tinha forma, nem pensar, nem sentimento; para o que estava sem alma e não possuía já um átomo de matéria; para aquele nada e para aquela imortalidade, o túmulo era ainda um habitáculo: as horas corrosivas uma sociedade.


continua na página 321...

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Edgar Allan Poe (nascido Edgar Poe; Boston, Massachusetts, Estados Unidos, 19 de Janeiro de 1809 — Baltimore, Maryland, Estados Unidos, 7 de Outubro de 1849) foi um autor, poeta, editor e crítico literário estadunidense, integrante do movimento romântico estadunidense. Conhecido por suas histórias que envolvem o mistério e o macabro, Poe foi um dos primeiros escritores americanos de contos e é geralmente considerado o inventor do gênero ficção policial, também recebendo crédito por sua contribuição ao emergente gênero de ficção científica. Ele foi o primeiro escritor americano conhecido por tentar ganhar a vida através da escrita por si só, resultando em uma vida e carreira financeiramente difíceis.
Ele nasceu como Edgar Poe, em Boston, Massachusetts; quando jovem, ficou órfão de mãe, que morreu pouco depois de seu pai abandonar a família. Poe foi acolhido por Francis Allan e o seu marido John Allan, de Richmond, Virginia, mas nunca foi formalmente adotado. Ele frequentou a Universidade da Virgínia por um semestre, passando a maior parte do tempo entre bebidas e mulheres. Nesse período, teve uma séria discussão com seu pai adotivo e fugiu de casa para se alistar nas forças armadas, onde serviu durante dois anos antes de ser dispensado. Depois de falhar como cadete em West Point, deixou a sua família adotiva. Sua carreira começou humildemente com a publicação de uma coleção anônima de poemas, Tamerlane and Other Poems (1827).
Poe mudou seu foco para a prosa e passou os próximos anos trabalhando para revistas e jornais, tornando-se conhecido por seu próprio estilo de crítica literária. Seu trabalho o obrigou a se mudar para diversas cidades, incluindo Baltimore, Filadélfia e Nova Iorque. Em Baltimore, casou-se com Virginia Clemm, sua prima de 13 anos de idade. Em 1845, Poe publicou seu poema The Raven, foi um sucesso instantâneo. Sua esposa morreu de tuberculose dois anos após a publicação. Ele começou a planejar a criação de seu próprio jornal, The Penn (posteriormente renomeado para The Stylus), porém, em 7 de outubro de 1849, aos 40 anos, morreu antes que pudesse ser produzido. A causa de sua morte é desconhecida e foi por diversas vezes atribuída ao álcool, congestão cerebral, cólera, drogas, doenças cardiovasculares, raiva, suicídio, tuberculose entre outros agentes.
Poe e suas obras influenciaram a literatura nos Estados Unidos e ao redor do mundo, bem como em campos especializados, tais como a cosmologia e a criptografia. Poe e seu trabalho aparecem ao longo da cultura popular na literatura, música, filmes e televisão. Várias de suas casas são dedicadas como museus atualmente.



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Edgar Allan Poe

CONTOS

Originalmente publicados entre 1831 e 1849


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