quinta-feira, 24 de agosto de 2023

D. Quixote - Cervantes Vol 1 - 1ª Parte L3 Capitulo XXV: Que trata das estranhas coisas que em Serra Morena sucederam

D. Quixote de la Mancha

Miguel de Cervantes

Vol 1

O Engenhoso Fidalgo 
D. Quixote de la Mancha 
Miguel de Cervantes


PRIMEIRA PARTE

LIVRO TERCEIRO

CAPÍTULO XXV

Que trata das estranhas coisas que em Serra Morena sucederam ao valente cavaleiro da Mancha, e da imitação que fez da penitência de Beltenebrós.


Despediu-se D. Quixote do cabreiro, e, tornando a montar em Rocinante, mandou a Sancho o acompanhasse, o que ele fez a pé, de muito má vontade.
A pouco e pouco iam já entrando mais pelo áspero da montanha; e Sancho ia morto por palrar com o amo, mas desejava que principiasse ele a conversação, para não contravir ao preceito recebido; porém, cansado já de tão aturado silêncio, disse:

 — Senhor D. Quixote, deite-me Vossa Mercê a sua bênção, e dê-me licença de me tornar já para minha casa, para minha mulher e meus filhos, com quem ao menos poderei falar à vontade, e departir tudo o que eu quiser, porque isso de querer Vossa Mercê que eu ande em sua companhia por estas solidões de dia e de noite sem lhe falar, em me apetecendo, é o mesmo que enterrar-me em vida. Se ao menos a sorte permitisse que os animais falassem hoje em dia, como no tempo de Guisote, fora meio mal, porque então me entreteria com o meu jumento, se ainda o tivera, quanto me desse na vontade, e com isso disfarçaria a minha desgraça. Em verdade que é desabrida coisa, e mal se pode levar à paciência andar buscando aventuras toda a vida, e não achar senão coices, manteações, pedradas e murros; e ainda por cima um ponto na boca, sem se ousar dizer o que um homem tem no coração, como se fora mudo!...

— Bem te percebo, Sancho — respondeu D. Quixote — estás morrendo por que eu te levante o interdito que te pus na língua; dá-o por levantado, e dize o que quiseres, com a condição de que não há-de durar a licença senão enquanto andarmos por estas serras.

— Seja assim — disse Sancho — fale eu agora, que depois Deus sabe o que será.

E começando imediatamente a gozar do salvo-conduto, disse:

— Que lhe aproveita a Vossa Mercê pôr-se tanto em campo pela tal Rainha Magimasa, ou como se chama? ou que lhe importava que o abade dormisse com ela ou não? Se Vossa Mercê deixara passar isso, que não era da sua alçada, estou certo de que o louco iria seguindo a sua história, e ter-se-iam dispensado a pedrada e os pontapés, e ainda por cima mais de meia dúzia de amolgadelas nas minhas costas. 

— À fé, Sancho — respondeu D. Quixote — que se tu souberas, como eu sei, quão honrada e principal senhora é a Rainha Madasima, havias de dizer que muito sofrido fui eu, que não esborrachei a boca donde tamanhas blasfêmias saíram. Onde se viu jamais impropério tamanho como é dizer, e até pensar, que uma Rainha viva mal encaminhada com um cirurgião? A verdade do caso é que o tal mestre Elisabat, de quem o doido falou, foi varão prudentíssimo, e de ótimo conselho, e serviu de aio e médico à Rainha; mas pensar que fosse ela amiga sua, é disparate merecedor do maior castigo; e, para veres como o Cardênio não sabia o que disse, hás-de te recordar de que no momento em que o disse já estava desvairado.

— Isso também eu digo — atalhou Sancho — e portanto das palavras de um louco ninguém devia fazer caso, porque, se a boa fortuna o não ajudara a Vossa Mercê e lhe deixasse ir o calhau à cabeça como lhe foi ao peito, ficávamos frescos, por termos tomado no ar a palha pela tal minha senhora que Deus confunda; nem o próprio Cardênio por louco se livrara.

— Contra ajuizados e contra loucos — disse D. Quixote — está obrigado qualquer cavaleiro andante a acudir pela honra das mulheres, quem quer que elas sejam, quanto mais pelas Rainhas de tão alta jerarquia e veneração, como foi a Rainha Madasima, a quem eu tributo especial afeição, por suas boas prendas, porque, além de ter sido formosa, foi também mui prudente e mui sofrida em suas adversidades, que as teve em grande número; e os conselhos e companhia do mestre Elisabat de muito proveito lhe foram, para poder levar os seus trabalhos com prudência e sofrimento, e foi disso que o vulgo ignorante mal intencionado tomou ocasião para dizer e imaginar ser ela sua manceba; e mentem, repito, e outras duzentas vezes mentirão todos os que tal pensarem e proferirem. 

— Eu cá não o profiro nem o penso — respondeu Sancho — os outros lá se avenham; e se maus caldos mexerem, tais os bebam. Se foram amancebados ou não, contas são essas que já dariam a Deus; venho da minha vida; não sei mais nada. Que me importam vidas alheias? Quem compra e mente na bolsa o sente; quanto mais, que nu vim ao mundo, e nu me vejo; nem perco nem ganho. E também que o fossem, quê me faz isso a mim? muitas vezes são mais as vozes que as nozes; mas quem pode ter mão em línguas de praguentos, se nem Cristo se livrou delas? 

— Valha-me Deus! — disse D. Quixote — Que de tolices vais enfiando, Sancho! que tem que ver o nosso caso com os adágios que estás arreatando? Por vida tua, homem, que te cales; daqui em diante ocupa-te em esporear o teu asno, quando o tiveres, e não te metas no que te não importa, e entende, com todos os teus cinco sentidos, que tudo quanto eu fiz, faço, ou houver de fazer, é muito posto em razão e mui conforme às regras de cavalaria, que as sei eu melhor que todos os cavaleiros do mundo.

— Ora, senhor meu — respondeu Sancho — é porventura boa regra de cavalaria andarmos nós outros perdidos por estas montanhas, sem caminho nem carreira, à cata de um maníaco, o qual, depois de achado, talvez lhe dê na tonta acabar o que já principiou, não do seu conto, senão da cabeça de Vossa Mercê e das minhas costelas, desfazendo-as inteiramente?

— Torno-te a dizer que te cales, Sancho — disse D. Quixote — porque deves saber que não é só o desejo de atinar com o doido que me traz por estas partes, como o que eu tenho de perfazer nelas uma façanha, com que hei-de ganhar perpétua fama, em todo o mundo conhecido; e tal será, que hei-de com ela pôr o non plus ultra a tudo quanto pode tornar perfeito e famoso um andante cavaleiro. 

— E essa tal façanha será de grande perigo? — perguntou Sancho Pança. 

— Não — respondeu o da Triste Figura — ainda que de tal maneira poderia correr o dado, que nos saísse azar em lugar de sorte; tudo depende da tua diligência.

— Da minha diligência? — replicou Sancho.

— Sim — disse D. Quixote — porque, se voltares depressa donde te quero agora enviar, depressa acabará a minha pena, e terá princípio a minha glorificacão; e como não há razão que te dilate por mais tempo suspenso, à espera do fim a que se encaminham as minhas razões, quero, Sancho, que saibas que o famoso Amadis de Gaula foi um dos mais perfeitos cavaleiros andantes. Não disse bem foi um; foi o único, o primeiro, o mais cabal, e o senhor de todos quantos em seu tempo no mundo houve. Não venha cá D. Belianis, ou outro qualquer, dizer que se lhe igualou, fosse no que fosse; porque se enganam; juro em boa verdade. E é assim, sem dúvida nenhuma; e quando não, que me respondam: se quando qualquer pintor quer sair famoso em sua arte, não procura imitar os originais dos melhores pintores de que há notícia? Esta mesma regra se observa em todos os mais ofícios ou exercícios de monta com que se adornam as repúblicas. Assim o há-de fazer, e faz, quem aspira a alcançar nomeada de prudente e sofrido, imitando a Ulisses, em cuja pessoa e trabalhos nos pinta Homero um retrato vivo de prudência e sofrimento, como também nos mostrou Virgílio na pessoa de Enéias o valor de um filho piedoso e a sagacidade de um valente e entendido capitão, não pintando-os ou descrevendo-os como eles foram, mas sim como deviam ser, para deixar exemplos de suas virtudes aos homens da posteridade. Deste mesmo modo Amadis foi o norte, o luzeiro, e o sol dos valentes e namorados cavaleiros, a quem devemos imitar, todos os que debaixo da bandeira do amor e da cavalaria militamos. Sendo pois isto assim, como é, acho eu, Sancho amigo, que o cavaleiro andante, que melhor o imitar, mais perto estará de alcançar a perfeição da cavalaria. Uma das coisas em que este cavaleiro melhor mostrou a sua prudência, valor, valentia, sofrimento, firmeza e amor, foi quando se retirou, desprezado pela senhora Oriana, a fazer penitência na Penha Pobre, trocando o seu nome pelo de Beltenebrós, nome por certo significativo e próprio para a vida que ele voluntariamente havia escolhido. Ora mais fácil me é a mim imitá-lo nisto, que no fender gigantes, descabeçar serpentes, matar dragões, desbaratar exércitos, fracassar armadas e desfazer encantamentos; e, como estes lugares são tão azados para semelhantes efeitos, não se deve perder a boa ocasião, que ao presente com tanta comodidade me oferece suas guedelhas. 

— Mas enfim — disse Sancho — que é o que Vossa Mercê pretende fazer em tão remotas brenhas? 

— Não te disse já, Sancho — respondeu D. Quixote — que pretendo imitar a Amadis desempenhando-me aqui do papel de desesperado, de sandeu e de furioso, para imitar juntamente ao valoroso D. Roldão, quando topou numa fonte os sinais de ter Angélica, a bela, cometido vileza com Medoro, e de consternado se tornou louco, arrancou as árvores, enturvou as águas das claras fontes, matou pastores, destruiu gados, abrasou choças, derribou casas, arrastou éguas e fez outras cem mil insolências dignas de eterno renome e escritura? E posto que eu não penso imitar a Roldão, Orlando, ou Rotolando (que todos estes três nomes tinha ele) parte por parte em todas as loucuras que fez, disse e pensou, imitá-lo-ei o melhor que puder nas que me parecerem mais essenciais, e talvez também que me contentasse com imitar só a Amadis, que, sem fazer loucuras prejudiciais, senão só de choros e sentimentos, alcançou tanta fama como os que maior a conseguiram.

— A mim me parece — disse Sancho — que os cavaleiros, que isso fizeram, seriam primeiro provocados, e alguma causa teriam para cometerem esses destemperos e penitências; porém Vossa Mercê que razão tem para enlouquecer? que dama o desprezou? ou que sinais achou para suspeitar que a Senhora Dulcinéia del Toboso fizesse algumas tolices com mouro ou com cristão?

— Aí bate o ponto — respondeu D. Quixote — aí é que está o fino do meu caso; ensandecer um cavaleiro andante com causa não é para admirar nem agradecer: o merecimento está em destemperar sem motivo, e dar a entender à minha dama que se em seco faço tanto, em molhado o que não faria? quanto mais, que razão não me falta com a larga ausência que tenho feito da sempre senhora minha Dulcinéia del Toboso. Bem ouviste dizer àquele pastor que sabes, o Ambrósio: “Quem está ausente, não há mal que não tenha e que não tema.” Portanto, Sancho amigo, não gastes tempo em me aconselhar que deixe tão rara, tão feliz e tão nunca vista imitação. Louco sou, e louco hei-de ser até que me tornes com a resposta de uma carta que por ti quero enviar à minha senhora Dulcinéia; e se ela vier tal, como lho merece a minha lealdade, acabar-se-ão a minha sandice e a minha penitência; e se for ao contrário, confirmar-me-ei louco deveras, e assim não sentirei nada. Portanto, de qualquer maneira que ela responda, sairei do trabalhoso passo em que me houveres deixado, gozando ajuizado do bem que me trouxeres, ou, se me trouxeres mal, deixando por louco de o sentir. Mas dize-me cá, Sancho, trazes bem guardado o elmo de Mambrino? que eu bem vi que o levantaste do chão quando aquele desagradecido o quis espedaçar, mas não pôde, prova clara da fineza da sua têmpera.

A isto respondeu Sancho: 

— Vive Deus, senhor cavaleiro da Triste Figura! coisas diz Vossa Mercê, que eu não posso levar à paciência; e por elas chego a imaginar que tudo o que me tem dito de cavalarias, de alcançar reinos e impérios, de dar ilhas e fazer outras mercês e grandezas, como é de uso de cavaleiros andantes, deve ser tudo coisas de vento e mentira, e tudo pastranha, ou patranha, ou como melhor se chama. Quem ouvir a Vossa Mercê dizer que uma bacia de barbeiro é o elmo de Mambrino, sem sair de semelhante despropósito por mais de quatro dias, que há-de cuidar senão que a pessoa que tal diz e afirma tem o miolo furado? A bacia cá a levo eu no costal toda amolgada; e levo-a para a arranjar em minha casa e fazer com ela a barba, se Deus me fizer tanta mercê, que me torne ainda a ver com a minha mulher e filhos. 

— Olha, Sancho, pelo mesmo que tu me juraste há pouco te rejuro eu — disse D. Quixote — que tens o mais curto entendimento que nunca teve, nem tem, escudeiro do mundo. Pois é possível que, andando comigo há tanto tempo, ainda não tenhas reconhecido que todas as coisas dos cavaleiros andantes parecem quimeras, tolices e desatinos, e são ao contrário realidades? E donde vem este desconcerto? vem de andar sempre entre nós outros uma caterva de encantadores, que todas as nossas coisas invertem, e as transformam, segundo o seu gosto e a vontade que têm de nos favorecer ou destruir-nos. Ora aí está como isso, que a ti te parece bacia de barbeiro, é para mim elmo de Mambrino, e a outro se figurará outra coisa; e foi rara providência do sábio, que me favorece, fazer que pareça bacia o que real e verdadeiramente é elmo de Mambrino; e a causa vem a ser: porque, sendo ele traste de tanto apreço, todo o mundo, se o conhecesse, me perseguiria para mo tirar; como porém entendem que não passa de bacia de barbeiro, não fazem caso de se matar por ele, como bem o mostrou por sua parte o que diligenciou quebrá-lo, e o deixou no chão em vez de o levar; conhecera-o ele, e veríamos se o deixava assim! Guarda-o, guarda-o, amigo, que por enquanto não me faz míngua, antes estou para largar todas estas armas, e ficar nu como quando nasci, se é que me não der na vontade imitar mais a Roldão do que a Amadis, no tocante à penitência.

Com esta conversação chegaram ao pé de um alto monte, que entre outros que o rodeavam se erguia solitário, como se fora ali uma esguia rocha talhada por mão.
Corria-lhe pela falda um manso arroio, e por todas as partes à volta se lhe alastrava um prado tão verde e viçoso, que era alegria dos olhos. Havia por ali muitas árvores montesinas e algumas plantas e flores que tornavam o lugar sobremodo aprazível.
Foi este o sítio que para a sua penitência elegeu o Cavaleiro da Triste Figura. Apenas o avistou, rompeu em altas exclamações, dizendo como fora de si:

— Este é o lugar, ó céus! que eu escolho para chorar a desventura em que vós mesmos me haveis posto. Este é o sítio em que o tributo dos meus olhos há-de aumentar as águas daquele arroio, e meus contínuos e profundos suspiros estremecerão sem descanso as folhas destas árvores selváticas, em testemunho da pena que o meu coração perseguido padece. Ó vós outros, quem quer que sejais, rústicos deuses, que nesta desconversável paragem habitais, ouvi as queixas de tão desditoso amante, a quem uma longa ausência e uns fantasiados zelos hão trazido a lamentar-se nestas asperezas, e a queixar-se da dura condição daquela ingrata e bela, fim e remate de toda a humana formosura! Ó vós outras, Napéias e Dríades, que usais habitar no mais cerrado dos montes, assim os ligeiros e lascivos Sátiros de quem sois amadas, posto que em vão, não perturbem jamais o vosso doce sossego; ajudai-me a deplorar a minha desventura, ou pelo menos não vos canseis de ma ouvir! Ó Dulcinéia del Toboso, dia da minha noite, glória da minha pena, norte dos meus caminhos, estrela da minha ventura (assim o céu ta depare favorável em tudo que lhe pedires!) considera, te peço, o lugar e o estado a que a tua ausência me conduziu, e correspondas propícia ao que deves à minha fé! Ó solitárias árvores, que de hoje em diante ficareis acompanhando a minha solidão, dai mostras com o movimento das vossas ramarias de que vos não anoja a minha presença! Ó tu, escudeiro meu, agradável companheiro em meus sucessos prósperos e adversos, toma bem na memória o que vou fazer à tua vista, para que pontualmente o repitas à causadora única de tudo isto! 

Dizendo assim, apeou-se do Rocinante, tirou-lhe de repente o freio e as silhas, e, dando-lhe uma palmada nas ancas, lhe disse:

— Liberdade te dá o que sem ela fica, ó cavalo tão estimado por tuas obras, quão mísero por teu fado! vai-te por onde quiseres, que na frente levas escrito que não te igualou em ligeireza o Hipógrifo de Astolfo, nem o famigerado Frontino, que tão caro saiu a Bradamante.

Vendo aquilo Sancho, disse: 

— Bem haja quem nos tirou agora o trabalho de desalbardar o ruço, que à fé que não faltariam palmadinhas que dar-lhe, nem coisas que dizer em seu louvor. Se ele aqui estivera, não havia de eu consentir que ninguém o desalbardasse, nem para tal havia razão, pois com ele não tinham que ver as inquirições de enamorado nem de desesperado, pois nem uma nem outra coisa estava seu amo, que era eu quando Deus queria. Agora, senhor Cavaleiro da Triste Figura, se a minha partida e a loucura de Vossa Mercê são coisas deveras assentadas, bom será tornar-se a aparelhar o Rocinante para me suprir a falta do ruço, porque assim se encurtará a demora da minha ida e tornada, que a pé não sei quando voltarei, porque eu por mim sou fraco andarilho.

— Como quiseres, Sancho — disse D. Quixote — não me parece mal a tua lembrança; daqui a três dias partirás, pois quero que neste meio tempo vejas o que por ela faço e digo, para lho repetires como testemunha. 

— Que mais tenho eu que ver do que já vi? — disse Sancho.

— Sim; bem inteirado estás — disse D. Quixote. — Agora só me falta rasgar o fato, espalhar por aí as armas e dar cabriolas e cabeçadas por estas penhas, com outras coisas deste jaez que te hão-de admirar.

— Pelo amor de Deus — disse Sancho — olhe Vossa Mercê como dá essas cabeçadas, que em tal penha poderia acertar, e em tal parte, que logo à primeira se acabasse toda esta máquina de penitência; seria eu de parecer que, visto Vossa Mercê entender serem as cabeçadas necessárias para o caso, e não se pode fazer sem elas esta obra, se contentasse, por ser tudo isto fingido, e coisa de arremedilho e comédia, se contentasse, digo, com dar as cabeçadas na água, ou em alguma outra coisa fofa, por exemplo em algodão; o mais deixe-o por minha conta, que eu direi à minha senhora que Vossa Mercê as dava na quina de um penhasco mais agudo que um diamante.

— Agradeço-te a boa intenção, amigo Sancho — respondeu D. Ouixote — mas quero que saibas que tudo isto que eu faço não são comédias, mas realidades mui reais, porque o mais fora contravir às ordens de cavalaria, que nos proíbem toda a casta de mentira, sob pena de relapsos; o fazer uma coisa por outra o mesmo é que mentir; portanto as minhas cabeçadas hão-de ser verdadeiras, firmes, e a valer, sem nada de sofístico nem de fantástico; e necessário será que me deixes alguns fios para me curar, já que a desgraça quis que nos faltasse o bálsamo, que não foi pequena perda.

— Pior foi a do asno — respondeu Sancho — pois com ele se foram os fios e tudo mais que trazia. Peço-lhe a Vossa Mercê que nunca mais se torne a lembrar daquela maldita bebida, que só de ouvir falar nela se me revolve a alma, quanto mais o estômago. Mais lhe rogo que faça de conta que são já passados os três dias que me aprazou para eu ver as suas loucuras; já as dou por vistas, revistas e passadas em julgado, e hei-de contar delas maravilhas à minha senhora. Escreva a carta e despacheme logo, pois estou com grande ânsia de vir breve tirá-lo desse purgatório em que o deixo.
 
— Purgatório o chamas tu, Sancho? — disse D. Quixote — inferno lhe puderas tu chamar mais apropriadamente, ou coisa ainda pior, se a há.

— No inferno nulla es retentio, segundo tenho ouvido dizer — replicou Sancho.

— Não entendo o que vens a dizer com a tua retentio — disse D. Quixote. 

Retentio é — respondeu Sancho — que quem está no inferno nunca mais de lá sai, nem pode; em Vossa Mercê poderá ser às avessas, ou mau caminheiro serei eu, a não levar esporas com que esperte o Rocinante. Ponha-me eu a meu salvo em Toboso, e na presença da minha senhora Dulcinéia, que eu lhe direi tais coisas das necedades e loucuras (que tanto monta uma coisa como outra), que Vossa Mercê tem feito e fica fazendo, que a porei mais macia que uma luva, ainda que a ache mais dura que um sobreiro. Com a sua resposta, que há-de ser doce como um mel, voltarei por ares e ventos que nem bruxo, e o tirarei a Vossa Mercê deste purgatório, que, se não é inferno, bem o parece, visto haver esperança de saída, a qual, como já disse, não a têm os que estão no inferno; tenho que vossa Mercê não dirá agora o contrário.

— É verdade — disse o da Triste Figura — mas como faremos para escrever a carta?

— A carta e mais a cédula dos três burrinhos — acrescentou Sancho. 

— Tudo será mencionado — disse o cavaleiro. — Que bom não seria se, à falta de papel, a pudéramos escrever, como os antigos o faziam, em folhas de árvores, ou numas tabelas enceradas! mas tão dificultoso seria achar-se agora isso, como papel. Mas em bem me lembra: onde se pode otimamente escrever a carta é no livrinho de memórias que foi de Cardênio, e tu terás cuidado de a mandar copiar para papel, com boa letra, no primeiro lugar que encontres onde haja mestre de meninos de escola; ou, quando não, qualquer sacristão ta copiará; lá de escrivão, Deus nos livre, esses amigos fazem letra de processo, que nem Satanás a decifra

— E como há-de ser a assinatura? — disse Sancho. 

— As cartas de Amadis nunca foram assinadas — respondeu D. Quixote.

— Embora — replicou Sancho; — mas a ordem para os três burricos por força que há-de ser assinada e, se essa assinatura se copia, dirão que é falsa e ficaremos sem burrinhos.

— Essa ordem no mesmo livrinho a assinarei, que, em minha sobrinha a vendo, nenhum reparo porá em a cumprir; e pelo que respeita à carta de amores, porás, em vez de assinatura: Vosso até à morte, o Cavaleiro da Triste Figura. E o ir a coisa escrita por mão de outrem pouco importa, porque, se bem me lembra, a Dulcinéia não sabe escrever nem ler, nem em toda a sua vida viu nunca letra nem carta minha, porque os meus amores e os dela têm sido sempre platônicos, sem se atreverem a mais que a um olhar honesto; e ainda isso tão de longe em longe, que me atreverei a jurar-te com verdade que em doze anos (que tantos há que eu lhe quero mais que à luz destes olhos que a terra há-de comer) não a tenho visto quatro vezes; e até poderá ser que destas quatro vezes nem uma só ela em tal reparasse; tamanho é o recato e encerro com que seu pai Lourenço Corchuelo, e sua mãe Aldonça Nogales a criaram.

— Tenha lá mão — disse Sancho — pois a filha de Lourenço Corchuelo é que é a senhora Dulcinéia del Toboso, chamada por outro nome Aldonça Lourenço?

— Essa é — disse D. Quixote — é essa a que merece ser senhora de todo o universo.

 — Bem a conheço — disse Sancho; — o que sei dizer é que atira tão longe uma barra como o mais alentado pastor daquele povo. Vive Deus, que é um raparigão de truz, direita e desempenada, e de cabelinho na venta, e que pode tirar as barbas de vergonha a qualquer cavaleiro andante ou por andar, que a tiver por sua dama. Filha da mãe! que rija dos nós! que vozeirão! O que posso dizer é que se pôs um dia no alto da torre da aldeia a bradar por uns moços da casa, que andavam longe numa courela do pai; e, ainda que estavam a mais de meia légua, ouviram-na como se a torre estivesse ali ao pé; e o melhor que tem é que não tem nada de nicas, porque é muito levantada, com todos caçoa e de tudo faz galhofa.

Agora é que eu digo, senhor Cavaleiro da Triste Figura, que não só pode e deve fazer Vossa Mercê desatinos por ela, senão que terá carradas de razão de se desesperar e até enforcar-se. Não há ninguém que em o sabendo não diga que fez muito bem, ainda que o leve o diabo. Tomara-me já em caminho só por vê-la, que a não vejo há já muitos dias, e deve a estas horas estar muito demudada, porque o andar sempre ao ar e ao sol estraga muito o carão das mulheres. 
Uma verdade lhe confesso eu, senhor D. Quixote, e é que tinha vivido até aqui numa grande ignorância, porque entendia, e era capaz de o jurar, que a senhora Dulcinéia devia ser alguma Princesa, de quem Vossa Mercê estava enamorado, ou alguma pessoa tão de costa acima, que merecesse os ricos presentes que Vossa Mercê lhe tem enviado, tais como o do biscainho, o dos forçados das galés e outros, que muitos devem ser, segundo a quantia das vitórias que Vossa Mercê terá ganhado e ganhar, no tempo em que eu não era ainda seu escudeiro.
Mas agora, considerando bem, que proveito dará à senhora Aldonça Lourenço (quero dizer, à senhora Dulcinéia del Toboso) o irem-se lançar de joelhos diante dela, os vencidos que Vossa Mercê lhe envia e há-de enviar? porque poderia suceder que, na ocasião deles chegarem lá, estivesse ela tasquinhando linho ou malhando na eira, e eles se envergonhassem de a ver, e ela se risse e aborrecesse do presente.

— Já te tenho dito, e por muitas vezes, Sancho, — disse D. Quixote — que és um grande falador; e, ainda que de bestunto ronceiro, muitas vezes frisas em sutil; contudo para te convencer de quão rombo és tu, e eu discreto, quero que me ouças um breve conto:

— Certa viúva formosa, moça, livre e rica, e ainda por cima desenfadada, se enamorou de um rapaz tosquiado, roliço e de boa presença. O irmão mais velho dela, descobrindo aquela inclinação, disse-lhe um dia a modo de advertência fraternal:

“Maravilhado estou, senhora, e com bastante razão, de que mulher tão principal, tão formosa e tão abastada como Vossa Mercê, se haja enamorado de um homem tão soez, tão baixo e tão idiota, como é Fulano, sendo esta casa frequentada por tantos padres-mestres, apresentados e teólogos, por onde Vossa Mercê poderia fazer melhor escolha, como em bandeja de peras, e dizer: Este serve-me; aquele não presta.”

Ao que ela respondeu com grande chiste e despejo:

“Vossa Mercê, senhor meu, está muito enganado e pensa muito à antiga, se cuida que elegi mal em Fulano, por lhe parecer idiota, porque para o que eu o quero tanta filosofia sabe como Aristóteles, e até mais.”

Assim, Sancho, para o que eu quero a Dulcinéia del Toboso, tanto vale ela como a mais alta Princesa do mundo. Olha que nem todos os poetas, que louvam damas debaixo de um nome que eles arbitrariamente lhes põem, as têm na realidade. Pensas tu que as Amarílis, as Fílis, as Sílvias, as Dianas, as Galatéias, e outras quejandas de que andam cheios os livros, os romances, as lojas de barbeiros, os teatros das comédias, foram realmente damas de carne e osso, e pertenceram àqueles que as celebram e celebraram? Decerto que não. As mais delas inventaram-nas eles para assunto dos seus versos, e para que os tenham por enamorados, e homens de valia para o serem. Segundo isso, baste-me também a mim pensar e crer que a boa de Aldonça Lourenço é formosa e honesta. Lá a sua linhagem importa pouco; não hão-de ir tirar-lhe as inquirições para dar-lhe algum hábito; para mim faço de conta que é a mais alta Princesa do mundo. Porque hás-de saber, Sancho, se o não sabes, que há duas coisas só, que mais que todas as outras incitam a amar: são a formosura e a boa fama; e ambas estas coisas são em Dulcinéia extremadas, porque em lindeza nenhuma a iguala, e em boa nomeada poucas lhe chegam; e, para acabar com isto, imagino eu que tudo que te digo é assim, sem um til de mais nem de menos; pinto-a na fantasia como a desejo assim nas graças como no respeito; nem Helena lhe deita água às mãos, nem Lucrécia, nem outra alguma das famigeradas mulheres das idades pretéritas, grega, bárbara ou latina; digam o que quiserem; se por isto me repreenderem os ignorantes, não me condenarão os justiceiros. 

— Confesso que em tudo tem Vossa Mercê razão — disse Sancho — e que eu sou um asno. O que eu não sei é por que hei-de falar em asno; não se deve lembrar baraço em casa de enforcado. Mas venha a carta, e adeus que me mudo.

Puxou D. Quixote pelo livro de lembranças, e, retirando-se para um canto, com muito sossego começou a escrever a carta.
Acabada ela, chamou a Sancho, e lhe disse que lha queria ler para ele a entregar à memória, para ficar esse remédio, caso no caminho a perdesse, porque da sua desdita tudo se podia recear.
A isto respondeu Sancho:

— Escreva-a Vossa Mercê duas ou três vezes aí no livro, e dê-mo, que eu o levarei bem guardado; porque pensar que eu possa tomar isso de cor é disparate, sou tão falto de memória, que às vezes me chega a esquecer como me chamo. Mas diga-a sempre, que estimo muito ouvi-la; há-de ser que nem de letra redonda. 

— Ora escuta: reza assim — disse D. Quixote. 

CARTA DE D. QUIXOTE A DULCINÉIA DEL TOBOSO

 “Soberana e alta senhora!

O ferido do gume da ausência, e o chagado nas teias do coração, dulcissima Dulcinéia del Toboso, te envia saudar, que a ele lhe falta.
Se a tua formosura me despreza, se o teu valor me não vale, e se os teus desdéns se apuram com a minha firmeza, não obstante ser eu muito sofrido, mal poderei com estes pesares, que, além de muito graves, já vão durando em demasia. 
O meu bom escudeiro Sancho te dará inteira relação, ó minha bela ingrata, amada inimiga minha, do modo como eu fico por teu respeito. Se te parecer acudir-me, teu sou; e, se não, faze o que mais te aprouver, pois com acabar a minha vida terei satisfeito à tua crueldade e ao meu desejo. 
Teu até à morte 

O Cavaleiro da Triste Figura.” 

— Por vida de meu pai — disse Sancho acabada a leitura da carta — que esta é a mais sublime coisa que nunca ouvi. Aí diz Vossa Mercê tudo quanto quer; e como encaixa bem para assinatura aquilo do Cavaleiro da Triste Figura! Digo a verdade que Vossa Mercê é o próprio diabo em carne e osso; não há nada que não saiba. 

— Tudo é necessário para o ofício que exerço — disse D. Quixote.

— Ora pois — disse Sancho — ponha Vossa Mercê agora nessa outra página adiante a ordem dos três burricos, e assine-se com muita clareza, para a conhecerem logo que a virem.

— Aí vai — disse D. Quixote. Depois de escrita releu-a, e dizia assim: 

“Por esta minha de burrinhos mandará Vossa Mercê, senhora sobrinha, dar a Sancho Pança, meu escudeiro, três dos cinco que deixei em casa, e que estão a cargo de Vossa Mercê, os quais três burrinhos os mande entregar e pagar por outros tantos aqui recebidos de contado, que com esta e com sua carta de pago serão bem dados.
Feita nas entranhas da Serra Morena aos vinte e dois de Agosto deste ano.”

— Está muito boa — disse Sancho — assine-a Vossa Mercê.

— Não é preciso assiná-la — disse D. Quixote — basta pôr-lhe a minha rubrica, que vale o mesmo que assinatura; e para três asnos, e trezentos que fossem, é quanto basta. 

— Fio-me em Vossa Mercê — respondeu Sancho; — deixai-me ir aparelhar Rocinante, e prepare-se para me deitar sua bênção, que eu abalo já sem ver as sandices que Vossa Mercê quer fazer; eu lhe lá direi que vi fazer tantas, que não havia mais que pedir para fartar. 

— Pelo menos quero, Sancho, porque assim é necessário — disse D. Quixote — que me vejas nu em pelo, e fazer uma dúzia ou duas de disparates; não me levarão nem meia hora; tendo-os tu presenciado pelos teus olhos, já podes jurar sem carrego de consciência todos os mais que te parecer acrescentar.
 
— Pelo amor de Deus, senhor meu — disse Sancho — não me obrigue a ver a Vossa Mercê nu em pelo; isso era para mim uma grande aflição, e até me fazia chorar sem querer, e tenho esta cabeça em tal estado, do pranto que à noite fiz pelo ruço, que não estou para novos choros. Se tem muito empenho em que eu lhe assista a algumas loucuras, faça-as vestido, e à pressa, e as primeiras que lhe lembrem. Quanto mais, que para mim nada disso era mister; o meu maior empenho é apressar jornada, e não demorar a volta, que há-de ser com as notícias que Vossa Mercê deseja e merece; e, quando não, prepare-se a senhora Dulcinéia, que, se não responde como deve, faço juramento de alma que lhe hei-de sacar do bucho resposta apropositada a poder de pontapés e bofetões. Pois como se há-de aturar que um cavaleiro andante, tão famoso como Vossa Mercê, se mude em doido sem que nem para que, por amor de uma... não me obrigue a dizer senhora; quando não, juro que desproposito, dê por onde der; bom sou eu para essas; ainda me não conhece; pois olhe que, se me conhecesse, veria que não sou para graças.

— Sabes o que me está parecendo, Sancho? — disse D. Quixote — É que não estás mais assisado do que eu.

— Tão doido não estou — respondeu Sancho — mas mais enraivecido, sim. Mas, deixando-nos agora disto; que é o que Vossa Mercê há-de comer enquanto não volto? Há-de sair aos caminhos como Cardênio para rapinar aos pastores?

— Não te dê isso cuidado — respondeu D. Quixote — porque, ainda que eu tivesse para aí ucharias, não comera outra coisa senão as ervas e frutos que me oferecem este prado e estas árvores; nisso está a maior substância do meu caso: não comer e praticar outras inclemências.

— Sabe Vossa Mercê o que eu estou receando? — disse Sancho — é não atinar à volta com o sítio em que o deixo agora, segundo é sonegado. 

— Repara-lhe bem nos sinais, que eu procurarei não me apartar destes contornos — respondeu D. Quixote; — demais, tomarei cuidado de trepar por estes cabeços mais altos, para ver se te avisto quando voltares. Mas o melhor será, para te não perderes e para dares comigo, cortares algumas giestas das muitas que por aqui há, e as vás deitando de onde em onde até saíres a raso; assim já tens marcas para atinares comigo; é uma imitação do fio de Teseu no labirinto.

— Farei isso — respondeu Sancho. 

E, cortando algumas giestas, pediu a bênção ao amo e, sem muitas lágrimas de parte a parte, se despediu dele; e, montando no Rocinante, que D. Quixote muito lhe recomendou, dizendo-lhe que olhasse por ele como por si mesmo, se encaminhou para o plano, espalhando de distância em distância os ramos de giesta, segundo a advertência do amo. E assim se foi, se bem que até ao fim nunca D. Quixote deixou de o importunar para que lhe visse fazer ao menos duas loucuras.
Não tinha porém andado ainda cem passos, quando se voltou e disse: 

— Razão tinha Vossa Mercê em dizer que, para eu poder jurar, sem encargo de consciência, que o tinha visto fazer loucuras, seria bem ter-lhe presenciado ao menos uma, suposto que uma, e bem grande, já lhe eu vi, que foi esta de se me ficar por aí sozinho.

— Não te dizia eu? — disse D. Quixote — Espera, Sancho, que num credo as farei.

E, despindo com toda a pressa os calções, ficou em carnes, com poucas roupas menores, e logo, sem mais nem menos, deu duas cabriolas no ar, e dois tombos de cabeça a baixo, descobrindo coisas que, para não vê-las outra vez, voltou Sancho a rédea a Rocinante, e se deu por habilitadíssimo para poder jurar que o fidalgo ficava doido confirmado.
Deixemo-lo seguir o seu caminho, até à volta, que pouco tardou. 

continua página 152...

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D. Quixote - Cervantes Vol 1 - Prólogo
D. Quixote - Cervantes Vol 1 - Ao Livro de D. Quixote de la Mancha
D. Quixote - Cervantes Vol 1 - 1ª Parte L1 Capitulo I
D. Quixote - Cervantes Vol 1 - 1ª Parte L2 Capitulo IX
D. Quixote - Cervantes Vol 1 - 1ª Parte L3 Capitulo XXV
D. Quixote - Cervantes Vol 1 - 1ª Parte L3 Capitulo XXVI
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D. QUIXOTE 
VOL. I 
Cervantes 
D. Quixote de La Mancha — Primeira Parte 
(1605) 
Miguel de Cervantes [Saavedra] 
(1547-1616)
Tradução: 
Francisco Lopes de Azevedo Velho de Fonseca Barbosa Pinheiro Pereira e Sá Coelho (1809- 1876) Conde de Azevedo 
Antônio Feliciano de Castilho (1800-1875) 
Visconde de Castilho
Edição 
eBooksBrasil www.ebooksbrasil.com 
Versão para eBook 
eBooksBrasil.com 
Fonte Digital 
Digitalização da edição em papel de Clássicos Jackson, Vol. VIII Inclusões das partes faltantes confrontadas com a edição em espanhol da eBooksBrasil.com 
(1999, 2005)
Copyright 
Autor: 1605, 2005 Miguel de Cervantes 
Tradução Francisco Lopes de Azevedo Velho de Fonseca Barbosa Pinheiro Pereira e Sá Coelho 
António Feliciano de Castilho 
Capa: Honoré-Victorin Daumier (1808-1879) 
Retrato de Cervantes: Eduardo Balaca (1840-1914) 
Edição: 2005 eBooksBrasil.com

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