Bolo de Carne
baitasar
Dói em Maria ver o negão retornar do final diário sem nada, mais um dia estéril. Os ombros o denunciam. Recurvados. Desencantados. Dias de maus resultados.
Passa por ela sem ver ou querer ver.
Ela tem três filhos. Todos do Virgílio e da Memória. Devoradores. Comedores ávidos da geladeira esfomeada. Vazia. Estômagos de avestruz.
O frio vem conforme o cobertor, pena que a fome não é conformada com a medida do bolso vazio.
Para o bem da verdade, e a mentira não prevaleça, o neguinho do meio não tem por jeito comer carne. Falta de costume com o gosto. Ela precisa dar empurrões de mãe, por vezes, súplicas gritos insultos.
É quando Maria Memória perde o jeito de conversar com os olhos. Os caminhos que levam sangue à cabeça se dilatam, quase rasgam. A luta é desigual, sempre foi desequilibrada.
Ele fica mastigando embolando empurrando de um lado e outro na boca, qualquer pedaço de carne. Mastiga. Tritura. Aperta. Morde. Chora, mas não engole.
Outro pedaço e as histórias se repetem.
Mãe e filho querendo vencer resistir. A insistência estratégica. A resistência que empurra. E a bola de carne aumentando. Dançando. Não chega à garganta. Não desce pelo gargalo. Não tem gosto de carne.
Falta de costume.
O nervosismo tomando conta. A ansiedade crescendo. Tortura. Medo. O chinelo na mão.
Até que a exaustão se apodera de todos. O menino chora até as lágrimas e a mãe cresce nas ameaças, Come come come.
Ele vomita.
Nunca come.
Ela sempre limpa.
Mãe é mãe, Esquece, minha nêga, menos uma boca.
Enquanto a voz do Virgílio sobe nas paredes, ela lembra o coitado do Ogum, vizinho sem préstimo de emprego. A curvatura dos ombros fortes e largos. O silêncio. Escuta o pensamento lhe escapando da boca, Uns com tanto e outros sem nada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário