domingo, 24 de março de 2019

histórias de avoinha: a dô dotro pode sê esquecida?

mulheres descalças



a dô dotro pode sê esquecida?
ensaio 127Bi – 2ª edição 1ª reimpressão




baitasar




A praça continua cheia daquela gente, a pianística comentô sem alarde de tamanho, como se fala prum vazio qualqué, só pra enchê sem urgência o silêncio, é um costume natural fugí pra relva macia do desilêncio vão qui devora os pensamento como os lírio enfeita os túmulo escondido na memória, tava vencida pelo cansaço pra se descobrí vestida com o véu da hipocrisia, num queria mostrá pra ela mesma a natureza dos hábito atrelado: reclamá de barriga cheia e fingí qui a dô dotro num pode sê sentida e esquecida

o painho encorajado pelo arrependimento e uma pequena tristeza respondeu ausente dele mesmo, nem tanto do tanto qui podia, mais apareceu seu estúpido desapreço pela vida qui ele julga vulgá, desinteressante e inferiô, Hoje, nesta praça, que já foi frequentada por gente de bem, só tem assombração de vagabundo e o pior da negrada. Abusam da nossa paciência. Pura perda de tempo ensinar à pobreza e pra essa negrada... modos de gente.

um arrepiu fugindo da praça junto com um suspiro de aguardamento fez estremecê os vidro da janela no mezanino, lamento de gente qui se escraviza pela ordem e pelo progresso, sem sabê uquié ordem nem entendê uquié progresso, gente qui grita em nome dos dono de tudo, lá do poço sem fundo da escravidão 

Veja, papai! Dois fidalgo conversando no meio do alvoroço todo, aposto que o assunto é o negrinho, parô de súbito e oiô pru painho, só pode ser, venha ver. Não podem ter outro motivo. Venha, tudo está parado na volta dos dois, até aquele baita criolo que acompanha de perto o acorrentado parou.

a praça pode num sê – é muntu possível qui num é – o centro da villa, mais tava no centro daquela sala pianística, as razão num era pra todos do mesmo feitio, mais se o centro das pessoa é a arrumação e o crescimento do avanço sem qualqué medida da vida qui tem na sua volta, a praça era só um circo em qui as pessoa ri e chora do palhaço, torce pru equilibrista caí e chora depois qui ele cai e reza pra ele num morrê

depois de suspirá o siô augusto chamô pela fia

Minha filha, por favor. Saia da janela... não vamos recomeçar. Essa praça não é o centro da vida em nossa Villa, muito menos, em nossa casa.

desta veiz, o painho pode tá certo, mais pelas razão de hôme branco qui julga e determina uqui é ou num é importante, a bondade é feita pela vontade dos hôme qui é branco, inté as muié aprendeu sê uquié pelo julgamento dos mesmo hôme, quem se recusa aprendê sê defunto-vivo vira defunto-morto 

Dá uma pena... e podia tê ficado nisso, uma dó qui podia serví tanto lá fora como lá dentro da casa pianística

a praça pode num sê o centro das terra da villa ou da terra-mundo, mesmo com a desconfiança de uns pra desdizê e a crença dotros pra confirmá uma coisa ou otra, mais é um lugá qui pode se oferecê como o meió dos mundo pra retocá a ignorância desalmada qui fecha as vista grossa prus mal-intencionado das justiça injusta

as lei num é pensada pra sê uma só

as justiça da villa é muntu mais qui uma ou duas, tem o justiçamento dos pretu, feito com as lei ou sem as lei; otro justiçamento qui tem muntu uso é pras vadia, feito pra conservá o lugá das família no alto das terra da villa; otro prus miserando pobre e triste é feito pra tê tudo no seu lugá de costume; delas, resulta a justiça sem o tapa-ôio qui conserva as regalia dos dono de tudo

as lei é pensada pra fazê tudo sê como é

é preciso entendê qui a villa num nasceu das lei, elas foi imaginada, considerada, aleijada, ajeitada e criada pela ordenança dos dono da villa, qui disse como queria o feitio da vida entre o medo e a hipocrisia, o desânimo e a ignorância, tudo escondido no silêncio duvidoso da ceguêra qui vê, mais num sabe uqui vê pruqui num qué vê

o fato estabelecido é qui a justiça das lei nunca existiu de verdade – e uquié verdade? – pra diminuí a fartura da vida dos dono de tudo, um justiçamento premeditado, refletido e pouco repetitivo inté pode sê usado pelos dono de tudo, esporádico e muntu pensadamente, é verdade – já descalçô a verdade? –, contra os afeiçoado e aliado, caso a cisma da traição exija o uso das represália pra mantê a firmeza do jogo, eles é qui tem e sempre teve a decisão das decisão: os dono de tudo manda e quem tem juízo obedece

é preciso entendê qui quem faz, acomoda, ajusta e julga com as lei da villa tá metido inté a raiz dos cabelo no serviço de obedecê os dono de tudo

Chuiquinha, chega! Saia da janela!

a muriquinha pianística voltô as vista pra mãinha e seu grito histérico, tava pasma de escutá ela falando grosso na frente do painho, logo ela, a rainha silenciosa da casa, sempre conformada, obediente e paciente com as vontade do marido

Mãezinha...

a mais véia tava o retrato dum trapo de pano rouco e triste qui foi colocado no sol pra secá e voltá tê uso, um uso cada veiz menos fidalgo e majestoso, no modo de vê do siô augusto 

ela num se surpreende mais quando tropeça, cai e levanta sozinha sem a ajuda do marido, ele óia e num se oferece; ela num precisa mais adivinhá sua verdadêra dimensão nem imaginá coisa diferente, Levanta, mulher. Caindo de madura? 

se lamenta e num se lamenta, sabe qui a casca da carne é a aparência qui a villa qué vê duqui ela tem pra mostrá, num basta tê as unha dos pé e das mão limpa e lapidada, a raiz num muda a cô da flô

Obedeça seu pai, já!

a voz da mãinha tava pinicando e embostando os alicerce da sua silenciosa vontade, foi quando o brilho alaranjado da rua encontrô a silenciosa sinhá e tingiu com a aura da sua luz inocente a cúmplice invisível dadô qui ela carrega, a culpa de durumí só dulado do marido, sem ninguém pra se pendurá no pescoço, uma muié inferiô qui subiu obrigada na cama do seu siô pra nunca mais descê  uqui a villa fazia enquanto o dono da casa lhe subia sem querê sabê se ela queria, sem puruguntá se podia subí

a villa nunca se incomodô de respondê enquanto ela se incomodava de fazê uqui era preciso fazê: ele gemê em silêncio, agarrada com unha e dente no travessêro

Mãezinha... o sol ainda está macio e carinhoso, a pianística comentô sem alarde de tamanho, falava prum vazio qualqué, queria enchê com urgência o desilêncio, fugí pra relva macia do colo da mãinha, mais em vão, a solidão devora os pensamento e engole as palavra como os lírio enfeita os túmulo escondido na memória

a mais véia qui tava sentada, e assim ficô, num ergueu nem a quêxada pra oiá lá pra fora, sabia de tanto vê no silêncio da sua solidão qui a vista do panorama da noite escura é a repetição das otra escuridão descampada na bêrada do rio, É só escurecer e todas essas belezas viram verdadeiras taperas, como um nariz sujo que não respira nem cheira, mas está lá e não sabe o porquê existe.

E não esqueça, Chiquinha, a muriquinha virô-se na direção do painho, isso era uma novidade pra pianística, os dois se combinando com as palavra sem suspeitá qui as palavra dos dois, cada veiz mais, quase nada valia pra muriquinha qui num sorria nem se acomodava, a escuridão dá cobertura para essa negrada vil, como só eles sabem usar. Ainda bem que acabam mortos por algum motivo.

chiquinha experimentava o cansaço e a insuficiência pra sê mais qui a agulha do paiêro, naquele jogo de mandá e obedecê, gato e rato, prugunta e resposta sem resposta

Coitadinho...




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