quinta-feira, 25 de dezembro de 2025

Moby Dick: 45 - A Declaração Juramentada

Moby Dick

Herman Melville

45 -  A Declaração Juramentada
      
     Em tanto quanto possa haver de ficção neste livro; e, de fato, indiretamente tocando numa ou noutra característica muito interessante e curiosa dos hábitos do cachalote, o capítulo anterior é, em sua primeira parte, um dos mais importantes que se poderão encontrar neste volume; mas seu assunto principal requer que sejam alcançados maiores e mais profundos desenvolvimentos, de modo que seja adequadamente compreendido, e mais ainda dissipe a incredulidade que uma profunda ignorância de todo o tema possa induzir em algumas mentes no que concerne à veracidade natural dos principais pontos deste caso.
     Não me preocupo em desempenhar esta parte de minha tarefa metodicamente; mas ficarei satisfeito se produzir a impressão desejada pelas citações em separado dos itens, por mim conhecidos na prática ou por fonte segura de baleeiro; com tais referências, presumo – a conclusão almejada decorrerá naturalmente.
     Primeiro: soube pessoalmente de três casos nos quais a baleia, depois de ter sido atingida por um arpão, conseguiu fugir; e, após um intervalo de tempo (em um dos casos, depois de três anos), ela foi novamente atacada pela mesma pessoa, e assassinada; quando os dois ferros foram retirados de seu corpo, ambos apareciam marcados pelo mesmo monograma. Nesse caso em que três anos separavam o arremesso dos dois arpões; e creio que deve ter sido mais tempo; o homem que os atirou, viajando durante esse período num navio mercante rumo à África, desceu à terra, juntou-se a uma expedição de exploração e avançou muito pelo interior, onde viajou por um período de quase dois anos, muitas vezes ameaçado por serpentes, selvagens, tigres, vapores venenosos e todos os outros perigos que acometem a travessia no coração de regiões desconhecidas. Enquanto isso, a baleia atingida por ele também deve ter feito suas viagens; sem dúvida, havia circunavegado o globo três vezes, roçando com suas nadadeiras toda a costa da África; mas sem propósito. Tal homem e sua baleia tiveram mais um encontro, e um venceu o outro. Digo que soube pessoalmente de três casos semelhantes a esse; ou seja, em dois deles, vi as baleias sendo abatidas; e, no segundo ataque, vi os dois ferros, com as respectivas marcas neles gravadas, sendo posteriormente retirados do peixe morto. Nesse caso que durou três anos, aconteceu de eu estar no bote ambas as vezes, na primeira e na última; e de, na última vez, reconhecer distintamente um tipo peculiar de mancha, enorme, embaixo do olho da baleia, que eu observara três anos antes. Digo três anos, mas tenho quase certeza de que foram mais. Aqui estão três casos, dos quais tenho pessoalmente, então, o conhecimento da verdade; mas ouvi muitos outros de pessoas de cuja veracidade não há bases sólidas para a dúvida.
     Segundo: é bem sabido na Pesca do Cachalote, apesar da ignorância do mundo em terra firme sobre isso, que há vários exemplos históricos e memoráveis de uma determinada baleia no oceano ter sido, em ocasiões espaçadas no tempo e no espaço, reconhecida pelas pessoas. Por que tal baleia ficou assim marcada não foi apenas ou originalmente devido às peculiaridades de seu corpo, distintas das demais; pois, por mais peculiar a esse respeito que uma baleia possa de algum modo ser, logo se põe fim a suas peculiaridades matando-a e fervendo-a até que se obtenha um óleo de valor muito peculiar. Não, o motivo foi este: que a partir das experiências fatais da pesca se difundiu a terrível fama da periculosidade de tal baleia, como se fez com Rinaldo Rinaldini, a tal ponto que muitos pescadores se contentavam em somente cumprimentá-la tocando o gorro de seus impermeáveis quando percebiam estar navegando ao seu lado, sem buscar o cultivo de uma relação mais íntima. Como os pobres-diabos em terra firme que, encontrando por acaso um homem poderoso e irascível, o saúdam na rua com gestos distantes e moderados, temendo, se ultrapassados os limites da intimidade, receber um sumário sopapo pela presunção.
     Mas não apenas cada uma dessas famosas baleias desfrutou de grande notoriedade individual – não, pode-se falar num reconhecimento oceânico; e não apenas foram famosas em vida e agora são imortais nas histórias dos castelos de proa depois de mortas, como também gozaram de todos os direitos, privilégios e distinções de um nome; tiveram tanto renome quanto Cambises ou César. Não é verdade, ó, Tom do Timor!, famoso Leviatã, sulcado como um iceberg, que por tanto tempo espreitaste os estreitos orientais desse nome, muito visto a jorrar pelas verdes costas de Ombay? Não é verdade, ó, Jack da Nova Zelândia!, tu que foste o terror dos navios que arrastavam seus rastros pelas rotas próximas a Tattoo! Não é verdade, ó, Morquan!, Rei do Japão, cujo altíssimo jato diziam assumir por vezes a semelhança de uma cruz de neve contra o céu? Não é verdade, ó, Dom Miguel! Cachalote chileno, marcado como velha tartaruga por místicos hieróglifos no dorso? Em prosa pura e simples, eis quatro baleias tão conhecidas pelos estudantes da História dos Cetáceos quanto Mario e Sila pelos eruditos clássicos.
     Mas isso não é tudo. Jack da Nova Zelândia e Dom Miguel, depois de muitas vezes gerar grande destruição em meio a botes de diferentes navios, foram enfim acossados, sistematicamente caçados, perseguidos e mortos por corajosos capitães de navios baleeiros, que levantaram âncora tendo esse expresso objetivo em vista, tal como, encaminhando-se para os bosques de Narragansett, o Capitão Butler de outrora decidira capturar o famoso selvagem assassino Annawon, o principal guerreiro de Felipe, o Rei Índio.
     Não sei onde posso encontrar melhor lugar do que aqui para mencionar uma ou duas coisas, que me parecem importantes, no intuito de estabelecer, de forma impressa, sob todos os aspectos, a razoabilidade de toda a história da Baleia Branca, e especialmente da catástrofe. Pois este é um daqueles casos desalentadores, em que a verdade precisa de tanto reforço quanto o erro. Tão ignorante é a maioria dos homens de terra firme no que diz respeito a algumas das mais simples e palpáveis maravilhas do mundo que, sem a menção de alguns fatos simples, históricos ou não, sobre a pescaria, poderiam desprezar Moby Dick como uma fábula monstruosa, ou ainda pior e mais detestável, como hedionda e insuportável alegoria.
     Primeiro: ainda que a maioria dos homens tenha uma idéia vaga dos perigos mais comuns da grande pescaria, contudo eles não têm nada como uma concepção firme e real desses perigos, nem da freqüência com que são recorrentes. Talvez uma das razões seja que nem mesmo um entre cinqüenta desses desastres e mortes por acidentes na pescaria chega a ser registrado publicamente pelo país, nem o mais transitório e imediatamente esquecido registro. Você acha que aquele pobre coitado, neste momento talvez preso à corda da baleia além da costa da Nova Guiné, que está sendo arrastado para o fundo do mar pelo Leviatã que mergulha – você acha que o nome do pobre coitado vai aparecer no obituário do jornal que você vai ler amanhã de manhã no café? Não: porque o correio é muito irregular entre aqui e a Nova Guiné. De fato, você já ouviu falar de notícias regulares diretas ou indiretas vindas da Nova Guiné? Ainda assim, digo a você que numa determinada viagem que fiz ao Pacífico, entre muitos outros nós entramos em contato com trinta navios, e cada um deles relatou uma morte causada por baleia, alguns até mais de uma, e três perderam a tripulação de um bote. Pelo amor de Deus, economize lamparinas e velas! Nenhum galão é queimado sem que ao menos uma gota de sangue humano tenha sido derramada.
     Segundo: pessoas em terra firme têm mesmo ideias indefinidas de que a baleia é uma criatura enorme de enorme força; mas percebi que, sempre que conto um caso específico dessa dupla enormidade, sou apontado significativamente por minha facécia; e então juro por minha alma que não tinha mais intenção de ser facecioso do que Moisés quando escreveu a história das pragas do Egito.
     Mas felizmente a questão específica que procuro aqui esclarecer pode ser confirmada por testemunhos inteiramente alheios ao meu. A questão é a seguinte: o Cachalote é em alguns casos forte, inteligente e criteriosamente maléfico o suficiente para, com premeditação inequívoca, arrebentar, destruir completamente e afundar um navio grande; e, acima de tudo, o Cachalote já fez isso.
     Primeiro: no ano de 1820, o navio Essex, do Capitão Pollard, de Nantucket, cruzava o oceano Pacífico. Certo dia a tripulação avistou alguns jatos, desceu os botes e começou a perseguir um bando de cachalotes. Em pouco tempo, várias baleias estavam feridas; quando, de repente, uma baleia muito grande que escapara dos botes deixou o bando e irrompeu diretamente contra o navio. Arremessando a cabeça sobre o casco, arrebentou-o de tal forma que em menos de “dez minutos” o navio foi liquidado e afundou. Nem uma tábua do navio jamais se viu desde então. Após duríssimas privações, parte da tripulação alcançou a costa em seus botes. Voltando enfim para casa, o Capitão Pollard uma vez mais zarpou para o Pacífico no comando de outro navio, mas os deuses naufragaram-no de novo contra rochedos submersos e ondas de rebentação; pela segunda vez seu navio foi totalmente arruinado, e, sem demora abjurando o mar, nunca mais nele se arriscou desde então. Até hoje o Capitão Pollard reside em Nantucket. Conheci Owen Chace, que era o primeiro imediato do Essex na época da tragédia; li a sua narrativa simples e fiel; conversei com seu filho; e tudo isso a poucas milhas do cenário da catástrofe.{a}
     Segundo: o navio União, também de Nantucket, estava no ano de 1807 totalmente perdido na costa dos Açores por semelhante ocorrência, mas nunca me aconteceu encontrar as autênticas particularidades dessa catástrofe, embora dos baleeiros tenha ouvido alusões casuais a ela.
     Terceiro: há coisa de dezoito ou vinte anos, o Comodoro J. –, então comandante de uma corveta de guerra norte-americana de primeira classe, jantava com um grupo de capitães baleeiros a bordo de um navio de Nantucket, no porto de Oahu, nas ilhas Sandwich. Quando a conversa passou às baleias, agradou ao Comodoro mostrar-se cético quanto à força monumental que lhes era atribuída pelos senhores profissionais presentes. Negou peremptoriamente, por exemplo, que uma baleia pudesse danificar sua sólida corveta causando um rombo que vazasse sequer um dedal de água. Muito bem; mas havia mais pela frente. Algumas semanas depois, o Comodoro içou velas com sua indevassável embarcação rumo a Valparaíso. Mas foi retido no caminho por um imponente cachalote, que lhe pediu alguns momentos para um assunto confidencial. O assunto consistiu em desferir uma pancada tão forte na embarcação do Comodoro, que, com todas as bombas funcionando, foi direto para o porto mais próximo virar a quilha e consertá-la. Não sou supersticioso, mas considero a conversa do Comodoro com a baleia providencial. Saulo de Tarso não se converteu de sua incredulidade por susto semelhante? Eu sempre digo, o cachalote não tolera disparates.
     Vou referir-me agora às Viagens de Langsdorff, por causa de uma circunstância menor, de interesse particular para o escritor deste livro. Langsdorff, como se sabe, fazia parte da famosa Expedição de Descobrimento do Almirante Russo Kruzenstern, no começo deste século. O Capitão Langsdorff assim começa o seu capítulo dezessete:

“No dia treze de maio, nosso navio estava pronto para zarpar, e no dia seguinte encontrávamo-nos em mar aberto, a caminho de Okhotsk. O tempo estava muito límpido e belo, mas tão intoleravelmente frio que fomos obrigados a usar casacos de pele. Durante alguns dias tivemos muito pouco vento; apenas no décimo nono dia começou a soprar um forte vento noroeste. Uma baleia de grandeza descomunal, seu corpo era maior do que o próprio navio, estava quase na superfície da água, mas não havia sido avistada por ninguém a bordo até o momento em que o navio, que estava a toda vela, se viu praticamente em cima dela, de tal modo que era impossível evitar a colisão. Estávamos, dessarte, em perigo iminente, e então aquela criatura gigantesca, arqueando o dorso, levantou o navio pelo menos três pés fora da água. Os mastros se inclinaram, e as velas caíram umas sobre as outras, enquanto nós que estávamos embaixo corremos ao mesmo tempo para o convés, achando que tínhamos batido num rochedo; mas, em vez disso, vimos o monstro grave e solenemente se afastando. O Capitão D’Wolf concentrou-se imediatamente nas bombas para ver se o navio havia sido ou não danificado pelo choque, mas descobrimos muito felizmente que escapara inteiramente sem estragos.”

     Ora, o Capitão D’Wolf, aqui referido como comandante do dito navio, é da Nova Inglaterra, e depois de uma longa vida de aventuras incomuns como capitão do mar hoje vive no vilarejo de Dorchester, perto de Boston. Tenho a honra de ser seu sobrinho. Fiz-lhe em particular perguntas sobre esse episódio de Langsdorff. Ele confirmou cada palavra. No entanto, o navio não era grande: uma embarcação Russa, construída na costa da Sibéria e adquirida por meu tio depois de ter posto em troca a que o trouxera da pátria.
     Naquele livro de ponta a ponta viril e de antiquadas aventuras, tão repleto também de maravilhas verdadeiras – a viagem de Lionel Wafer, um dos velhos companheiros de Dampier –, encontrei uma história tão parecida com a que foi citada de Langsdorff que não posso deixar de inseri-la aqui, como exemplo comprobatório, se tal fosse necessário.
     Lionel, ao que parece, estava a caminho de “John Ferdinando”, como se chama a moderna Juan Fernandes. “Em nosso caminho para lá”, diz ele, “cerca das quatro da manhã, quando estávamos a cerca de cento e cinquenta léguas das águas norte-americanas, nosso navio levou um choque terrível, que deixou nossos homens tão consternados que mal sabiam onde estavam ou o que pensar; mas todos começaram a se preparar para morrer. E, de fato, o choque foi tão repentino e tão violento, que tínhamos certeza de que o navio havia atingido um rochedo; mas, quando o susto diminuiu um pouco, lançamos a sonda e medimos, mas não achamos o fundo. (…) A brusquidão do choque fez saltar os canhões de suas carretas, e vários homens foram sacudidos para fora de suas redes. O Capitão Davis, que estava deitado com a cabeça apoiada em sua arma, foi lançado para fora de sua cabine!” Lionel então continua atribuindo o choque a um terremoto e parece sustentar sua hipótese afirmando que um enorme terremoto, mais ou menos naquela época, de fato fizera grande estrago em terras Espanholas. Mas eu não me surpreenderia se, na escuridão daquela hora da madrugada, o choque tivesse sido causado por uma baleia submersa, que viesse verticalmente a abalroar o casco por debaixo.
     Poderia prosseguir com vários outros exemplos, que fiquei sabendo de um ou de outro modo, da enorme força e maldade do cachalote. Mais de uma vez deu-se a saber que o cachalote não apenas perseguiu os botes baleeiros que o atacaram, forçando-os de volta ao navio, mas também o próprio navio, resistindo por muito tempo a todos os arpões que lhe eram atirados do convés. O navio inglês Pusie Hall pode contar uma história a esse respeito; quanto à sua força, deixe que eu lhe diga que há casos em que os cabos presos a um cachalote em fuga, na calmaria, transferiram sua tensão para o navio e lá ficaram firmes; a baleia arrastando o enorme casco pelas águas como um cavalo puxa uma carruagem. Também é muito comum observar que, se ao cachalote, depois de atingido, for dado um tempo de recuperação, ele então age não com uma raiva cega, mas com planos obstinados e resolutos de destruição de seus perseguidores; e não deixa de ser uma indicação eloquente de seu caráter o fato de, sendo atacado, ele frequentemente abrir a boca e se manter nessa posição assustadora por vários minutos consecutivos. Mas ficarei satisfeito com uma última e mais conclusiva ilustração; uma notável e significativa ilustração, pela qual você não deixará de perceber que o acontecimento mais maravilhoso deste livro não é apenas comprovado pelos fatos corriqueiros dos dias de hoje, mas que essas maravilhas (como todas as maravilhas) são meras repetições atravessando os tempos; assim, pela milionésima vez, dizemos amém a Salomão – em verdade, não há nada de novo sob o sol.
     No sexto século cristão viveu Procópio, um magistrado cristão de Constantinopla, no tempo em que Justiniano era imperador e Belisário general. Como se sabe, ele escreveu a história de seu tempo, um trabalho sob todos os aspectos de valor inestimável. Pelas maiores autoridades, sempre foi considerado um historiador dos mais confiáveis, nunca exagerado, exceto por um ou outro detalhe, que não dizem respeito ao assunto ora apresentado.
     Pois, em sua história, Procópio menciona que, durante o período de sua prefeitura em Constantinopla, um grande monstro marinho foi capturado na vizinha Propôntida, ou Mar de Mármara, após ter destruído navios naquelas águas por um período de mais de cinquenta anos. Um fato assim estabelecido na história não pode ser facilmente contestado. Também não haveria razão para tal. De que espécie exatamente era esse monstro marinho, não foi mencionado. Mas por destruir navios, e também por outras razões, deve ter sido uma baleia; e sinto-me fortemente inclinado a pensar em um cachalote. E vou lhe dizer por quê. Durante muito tempo imaginei que o cachalote fosse desconhecido no Mediterrâneo e nas águas profundas a ele ligadas. Mesmo hoje tenho certeza de que aquelas águas não são, e talvez nunca possam ser, pela presente constituição das coisas, lugar adequado para o retiro habitual e gregário do cachalote. Mas ulteriores investigações recentemente provaram que nos tempos modernos houve casos isolados da presença do cachalote no Mediterrâneo. Fui informado, de fonte segura, de que na costa Berbere um certo Comandante Davies da marinha Britânica encontrou o esqueleto de um cachalote. Ora, como um navio de guerra atravessa facilmente os Dardanelos, assim também um cachalote poderia passar pela mesma rota do Mediterrâneo à Propôntida.
     Na Propôntida, até onde sei, não se encontra o brit, alimento da baleia franca. Mas tenho todos os motivos para acreditar que o alimento do cachalote – a lula ou a siba – se esconde no fundo daquele mar, porque criaturas grandes, ainda que não as maiores, foram encontradas em sua superfície. Se você somar corretamente essas afirmações, e pensar um pouco, verá claramente que, de acordo com o raciocínio humano, o monstro marinho de Procópio, que por meio século afundou os navios do Imperador Romano, com toda a probabilidade deve ter sido um cachalote.

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{a} O que se segue são extratos da narrativa de Chace: “Todos os fatos pareceram afiançar-me na conclusão de que qualquer coisa menos o acaso teria conduzido suas ações; por duas vezes, fez várias investidas contra o navio, com um pequeno intervalo entre elas; ambas, segundo sua direção, sendo calculadas para nos causar maior dano, por terem sido dirigidas à proa e, portanto, combinando a velocidade dos dois objetos para o choque; para tal efeito, exatamente as manobras que fez foram as necessárias. Seu aspecto era o mais horrendo, e assim indicava ressentimento e fúria. Veio diretamente do bando em que havíamos acabado de entrar, e no qual feríramos três de seus companheiros, como que incendiado por um desejo de vingança pelo sofrimento deles”. E mais: “Em todo caso, todas as circunstâncias consideradas, tendo acontecido diante dos meus próprios olhos, produzindo, naquela hora, impressões de uma maldade decidida e calculada por parte da baleia (muitas dessas impressões não consigo mais recordar), induzem me à convicção de que estou certo em minha opinião.”
     Eis aqui suas reflexões algum tempo depois de ter deixado o navio, durante uma noite escura num bote aberto, quando quase desistia de encontrar uma praia hospitaleira: “O oceano escuro e as águas agitadas não eram nada; os temores de ser engolido por alguma terrível tempestade, ou atirado contra rochedos submersos, e todos os outros motivos comuns de assustadora contemplação, pareciam apenas merecer um instante do meu pensamento; o naufrágio sinistro e o aspecto horrendo e a vingança da baleia ocupavam totalmente as minhas reflexões, até que o dia raiou novamente.”
     Em outro lugar – p. 45 – fala do “ataque misterioso e mortal do animal”. [N. A.]
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Continua na página 197...
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Leia também:

Moby Dick: Etimologia, Excertos, Citações
Moby Dick: 1  - Miragens
Moby Dick: 45 - A Declaração Juramentada
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{a} Depois que isso foi escrito, a afirmação foi felizmente confirmada por uma circular oficial, emitida pelo Tenente Maury, do Observatório Nacional, de Washington, em 16 de abril de 1851. Segundo a circular, parece que justamente tal carta está em via de ser terminada; e trechos dela são apresentados na circular. “Esta carta divide o oceano em distritos de cinco graus de latitude por cinco graus de longitude; perpendicularmente, através de cada uma dessas regiões há doze colunas para cada um dos doze meses; e horizontalmente, através de cada região há três linhas; uma para mostrar o número dos dias que foram gastos por mês em cada região, e as outras duas para mostrar o número de dias durante os quais baleias, cachalotes ou francas foram vistos.” [N. A.]
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Moby Dick é um romance do escritor estadunidense Herman Melvillesobre um cachalote (grande animal marinho) de cor branca que foi perseguido, e mesmo ferido várias vezes por baleeiros, conseguiu se defender e destruí-los, nas aventuras narradas pelo marinheiro Ishmael junto com o Capitão Ahab e o primeiro imediato Starbuck a bordo do baleeiro Pequod. Originalmente foi publicado em três fascículos com o título "Moby-Dick, A Baleia" em Londres e em Nova York em 1851.
O livro foi revolucionário para a época, com descrições intrincadas e imaginativas do personagem-narrador, suas reflexões pessoais e grandes trechos de não-ficção, sobre variados assuntos, como baleias, métodos de caça a elas, arpões, a cor do animal, detalhes sobre as embarcações, funcionamentos e armazenamento de produtos extraídos das baleias.
O romance foi inspirado no naufrágio do navio Essex, comandado pelo capitão George Pollard, que perseguiu teimosamente uma baleia e ao tentar destruí-la, afundou. Outra fonte de inspiração foi o cachalote albino Mocha Dick, supostamente morta na década de 1830 ao largo da ilha chilena de Mocha, que se defendia dos navios que a perturbavam.
A obra foi inicialmente mal recebida pelos críticos, assim como pelo público por ser a visão unicamente destrutiva do ser humano contra os seres marinhos. O sabor da amarga aventura e o quanto o homem pode ser mortal por razões tolas como o instinto animal, sendo capaz de criar seus fantasmas justamente por sua pretensão e soberba, pode valer a leitura.


E você com o quê se identifica?

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