sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Ensaio sobre o entendimento humano: Seção VIII(1.b)

Ensaio sobre o entendimento humano

David Hume

Seção VIII

DA LIBERDADE E DA NECESSIDADE[1]
PRIMEIRA PARTE
 
continuando...

     O filósofo, se é coerente, deve estender o mesmo raciocínio às ações e volições dos seres inteligentes, visando assim mostrar que as decisões humanas mais irregulares e inesperadas se explicam com frequência quando se conhecem todas as circunstâncias do caráter e da situação humanas. Uma pessoa com disposições amáveis pode responder de maneiras impertinentes, mas porque ela está com dor de dentes ou ainda não jantou. Um homem de modos grosseiros pode revelar vivacidade incomum ao seu comportamento porque recebeu de repente uma grande fortuna. Mesmo considerando-se que um ato, como às vezes ocorre, não pode ser explicado por quem o praticou ou pelos circundantes, reconhecemos que, em geral, os caracteres humanos são até certo ponto inconstantes e irregulares. De certo modo, é este o caráter constante da natureza humana, embora se aplicando mais particularmente às pessoas destituídas de regras estáveis em sua conduta, mas que atuam numa sequência contínua de capricho e de inconstância. Apesar destas aparentes irregularidades, os princípios e motivos internos devem atuar de modo uniforme, da mesma maneira que se supõe que os ventos, a chuva, as nuvens e as outras variações do tempo são governados por princípios estáveis, embora a sagacidade e a investigação humana não os possam facilmente desvendar.
     Desta maneira, parece que não apenas a conjunção entre os motivos e os atos voluntários é tão regular e uniforme (de modo análogo à relação de causa e efeito em qualquer aspecto da natureza), mas, também, que esta conjunção regular tem sido reconhecida universalmente e jamais tem sido tema de debate, quer pela filosofia quer na vida diária. Ora, como derivam da experiência passada todas as experiências sobre o futuro e como concluímos que os objetos que sempre encontramos conjuntados sempre estarão conjuntados, pode, pois, parecer supérfluo provar que esta experimentada uniformidade das ações humanas é a fonte de onde tiramos inferências que a elas se referem.[6] Mas, a fim de mostrar maior número de aspectos dos argumentos, insistiremos também, embora sumariamente, neste último tópico.  
     Em todas as sociedades, pode-se verificar que a mútua dependência entre os homens é tão grande que raramente uma ação humana é inteiramente completa em si mesma ou se realiza sem alguma referência às ações dos demais, constituindo assim no requisito necessário para que possa responder por completo à intenção de quem a realiza. O artesão paupérrimo, que trabalha sozinho, espera pelo menos a proteção do magistrado assegurando lhe o gozo do fruto de seu trabalho. Também espera que, quando leva suas mercadorias ao mercado e as oferece a um preço razoável, encontrará compradores e terá poder graças ao dinheiro que obteve para comprar dos outros as mercadorias que são necessárias para a sua subsistência. A medida que os homens estendem suas relações e tornam mais complexas suas comunicações com outros homens, sempre compreendem em seus planos de vida uma maior variedade de atos voluntários que esperam, por motivos justos, que colaborem com sua própria ação. Em todas estas conclusões tiram suas regras da experiência passada, do mesmo modo que em seus raciocínios sobre objetos externos; acreditam firmemente que tanto os homens como os elementos devem continuar em suas operações tal como foram sempre encontrados. Um fabricante conta ao mesmo tempo com o trabalho de seus empregados para a execução de qualquer obra como com a maquinaria empregada e ficaria igualmente surpreso se se decepcionasse em suas expectativas. Numa palavra, a inferência e o raciocínio experimental referentes aos atos de outrem incorporam-se tanto na vida humana, que nenhum homem, enquanto está desperto, deixa de utilizá-los por um momento sequer. Não temos razão, portanto, para afirmar que toda a humanidade sempre tem concordado com a doutrina da necessidade tal como a definição e a explicação dadas mais acima?
     Os filósofos não têm jamais mantido, a este respeito, opinião diferente daquela da plebe. Porque, sem mencionar que quase todas as ações de sua existência supõem esta opinião, há apenas alguns setores do saber especulativo aos quais ela não é essencial. O que seria da história se não tivéssemos confiança na veracidade do historiador, de acordo com a experiência que temos adquirido dos homens? Como a política poderia ser uma ciência, se as leis e as formas de governo não tivessem influência uniforme sobre a sociedade? Onde estaria o fundamento da moral, se cada caráter particular não tivesse um determinado poder de produzir sentimentos particulares e se estes sentimentos não influenciassem nossas ações de maneira constante? E quais poderiam ser nossas pretensões quando aplicamos nossa crítica[7] a um poeta ou a um autor elegante, se não pudéssemos decidir se a conduta e os sentimentos de seus personagens são ou não são naturais, em tais caracteres e em tais circunstâncias? Parece quase impossível, portanto, que nos ponhamos a fazer ciência ou atuar de alguma maneira, sem reconhecer a doutrina da necessidade, e esta inferência que vai dos motivos aos atos voluntários, dos caracteres às condutas.
     E, certamente, quando consideramos quão exatamente se entrelaçam a evidência natural e a evidência moral, formando uma única corrente de argumentos, não teremos escrúpulos em admitir que ambas são da mesma natureza e que derivam dos mesmos princípios. Um prisioneiro desprovido de dinheiro e influência descobre a impossibilidade de sua fuga, quer considerando a obstinação do carcereiro, quer verificando as paredes e grades que o cercam; e, em todos os seus esforços para conseguir libertar-se, opta antes trabalhar sobre a pedra e o ferro dos últimos do que sobre a natureza inflexível dos primeiros. O mesmo prisioneiro, ao ser conduzido para o cadafalso, prevê sua morte com tanta certeza devido à constância e fidelidade dos guardas como à operação do machado ou da roda. Seu espírito percorre uma certa série de ideias: a negativa dos soldados em consentirem em sua fuga, a ação do carrasco, a separação de sua cabeça de seu corpo, a sangria, movimentos convulsivos e a morte. Há aqui um encadeamento complexo de causas naturais e de atos voluntários, mas o espírito não sente nenhuma diferença ao passar de um elo a outro. Não se sente também menos seguro do evento futuro, como se este estivesse ligado aos objetos presentes à memória e aos sentidos por uma série de causas, aglutinadas entre si pelo que nos agrada denominar de necessidade física. A experiência da mesma uma o tem o mesmo efeito sobre o espírito, quer os objetos unidos sejam motivos, volição e ações, quer sejam uma figura e um movimento. Podemos mudar o nome das coisas, porém sua natureza e sua ação sobre o entendimento não mudam jamais.
     Se um homem, que sei que é honesto e rico e com o qual mantenho íntima amizade, vem à minha casa onde estou rodeado por meus criados, estou bem seguro que não me apunhalará antes de sair a fim de roubar meu tinteiro de prata e deste evento suspeito tanto como de que venha abaixo a casa, que é nova e solidamente construída e alicerçada. Mas ele poderia ser acometido de uma súbita e desconhecida loucura. E do mesmo modo pode ocorrer um repentino terremoto que sacuda minha casa e a faça cair sobre minha cabeça. Substituirei, pois, a hipótese. Direi que tenho certeza que ele não colocará sua mão no fogo deixando-a nele até que se consuma. Este evento, posso prevê-lo com a mesma segurança, penso eu, como prevejo que, se ele se jogar pela janela e não encontrar nenhum obstáculo, não permanecerá um momento sequer suspenso no ar. Não existe nenhuma forma de loucura desconhecida que possa conferir a menor possibilidade ao primeiro evento, tão contrário a todos os princípios conhecidos da natureza humana. Um homem que ao meio-dia deixa sua bolsa cheia de ouro na calçada de Charing Cross pode esperar que ela voará como uma pena ou que uma hora depois estará intacta. Mais da metade dos raciocínios humanos contém inferências de natureza semelhante, acompanhadas de um maior ou menor grau de certeza proporcional à nossa experiência da conduta habitual dos homens em tais situações particulares.[8]
     Tenho frequentemente considerado qual poderia ser a razão pela qual toda a humanidade, embora tenha sempre e sem hesitação reconhecido a doutrina da necessidade em toda sua ação prática e em todos os seus raciocínios[9], manifesta-se, contudo, relutante em reconhecê-la em palavras, tendo antes mostrado, em toda época, uma tendência a professar opinião contrária. O fato, penso eu, pode ser explicado da seguinte maneira. Se examinamos as ações dos corpos e a produção dos efeitos a partir de suas causas, veremos que nenhuma de nossas faculdades pode levar-nos mais longe no conhecimento desta relação que a simples constatação de uma conjunção constante entre objetos particulares, e de uma tendência do espírito em passar, por uma transição costumeira, do aparecimento de um para a crença no outro. Mas, embora esta conclusão acerca da ignorância humana seja o resultado do mais cuidadoso exame sobre o assunto, os homens ainda mantém uma forte tendência em acreditar que penetraremos mais profundamente nos poderes da natureza e que perceberemos qualquer coisa semelhante a uma conexão necessária entre a causa e o efeito. Quando dirigem de novo suas reflexões para as operações de seus próprios espíritos e não sentem tal conexão entre o motivo e a ação, são então levados a supor que há uma diferença entre os efeitos resultantes da força material e aqueles que nascem do pensamento e da inteligência. Mas desde que estamos convencidos de que nada sabemos a mais sobre toda espécie de causalidade do que unicamente a conjunção constante de objetos e a consequente inferência do espírito de um a outro, e admitindo-se que toda gente concorda que estas duas circunstâncias intervêm nos atos voluntários, podemos mais facilmente reconhecer que a mesma necessidade é comum a todas as causas. E embora este raciocínio possa contradizer os sistemas de muitos filósofos, atribuindo a necessidade às determinações da vontade, veremos, depois de refletir, que eles discordam somente em palavras e não em seu sentimento real. A necessidade, no sentido que a entendemos aqui, nunca tem sido rejeitada, nem pode ser rejeitada, penso eu, por um filósofo. Pode-se apenas pretender, talvez, que o espírito deve perceber, nas operações materiais, uma conexão adicional entre a causa e o efeito; e que esta conexão não intervém nas ações voluntárias dos seres inteligentes. Ora, se isto ocorre assim ou não, somente a investigação pode revelar; é, portanto, dever destes filósofos de justificarem sua afirmativa, definindo ou descrevendo esta necessidade e no-la mostrando nas operações das causas materiais.
     Parece, certamente, que se começa pelo lado errado sobre a questão da liberdade e da necessidade quando nela se penetra examinando as faculdades da alma, a influência do entendimento e as operações da vontade. Dever-se-ia, primeiramente, discutir um problema mais simples, a saber, as ações do corpo e da matéria bruta, e verificar se pode formar alguma ideia da causalidade e da necessidade, além de uma conjunção constante de objetos e a subsequente inferência do espírito de um para o outro. Se estas circunstâncias formam, com efeito, toda a necessidade que concebemos na matéria, e se estas circunstâncias intervêm também, por reconhecimento universal, nas operações do espírito, a discussão está terminada; pelo menos, deve-se reconhecer que ela é, de agora em diante, puramente verbal. Mas, contanto que suponhamos temerariamente que temos uma ideia adicional da necessidade e da causalidade nas operações dos objetos externos, ao mesmo tempo que nada a mais podemos encontrar nas ações voluntárias do espírito, não há possibilidade de conduzir a questão para uma solução determinada enquanto procedemos sobre uma hipótese tão crônica. O único método adequado para esclarecer-nos consiste em subir mais alto e, examinando a estreiteza do campo da ciência que se aplica às causas materiais, convencer-nos de que tudo que apreendemos delas se restringe à conjunção constante e à inferência acima mencionadas. Podemos, talvez, notar que é com relutância que somos induzidos a fixar limites tão estreitos ao entendimento humano; mas a seguir não encontraremos obstáculos ao aplicar esta doutrina aos atos da vontade. Pois, como é evidente que estas. ações estão em conjunção regular com os motivos, as circunstâncias e os caracteres, e como sempre tiramos inferências de uns aos outros, somos obrigados a reconhecer em palavras aquela necessidade que já temos reconhecido em todas as deliberações de nossa vida e em todos os passos de nossa conduta e de nossas ações.[10]
     Mas para realizar nosso projeto de reconciliação relativo à questão da liberdade e da necessidade — a mais controvertida questão da metafísica, a mais litigiosa das ciências — não precisamos de muitas palavras para provar que todos os homens sempre têm concordado a respeito da doutrina da liberdade, assim como com a da necessidade, e que toda discussão a este respeito também tem sido, até agora, puramente verbal. Pois o que se entende por liberdade quando se aplica a palavra às ações voluntárias? Não podemos certamente dizer que estes atos têm tão pouca conexão com os motivos, as inclinações e as circunstâncias, que um não deriva do outro com um certo grau de uniformidade e que um não proporciona nenhuma inferência pela qual podemos concluir a existência do outro. Pois estes são fatos patentes e reconhecidos. Por liberdade, então, podemos apenas entender um poder de agir ou de não agir segundo as determinações da vontade;[11] isto é, se escolhermos permanecer em repouso, podemos; mas, se escolhermos mover-nos, também podemos. Ora, reconhece-se universalmente que esta liberdade incondicional encontra-se em todo homem que não esteja prisioneiro ou acorrentado. Logo, aqui não há assunto para discussão.
     Acerca de qualquer definição que possamos dar de liberdade, devemos cuidadosamente observar duas circunstâncias indispensáveis: primeira, a definição deve estar de acordo com a evidência do fato; segunda, a definição deve concordar com ela mesma. Se observarmos estas circunstâncias e se tornarmos nossa definição inteligível, estou persuadido de que todos os homens terão uma só opinião a respeito deste assunto.
     Admite-se universalmente que nada existe sem uma causa de sua existência e que a palavra ‘acaso”, se examinada com cuidado, é puramente negativa e não designa nenhuma força real que exista em qualquer lugar na natureza. Mas se se pretende que algumas causas são necessárias enquanto outras não o são, vemos então a vantagem das definições. Se alguém definisse uma causa, sem compreender, como elemento da definição, a conexão necessária com o seu efeito, e se mostrasse distintamente a origem da ideia expressa pela definição, desistiria prontamente de toda controvérsia. Mas, se se aceita a explicação anterior do assunto, isto deve ser absolutamente impraticável. Se os objetos não tivessem entre si uma conjunção regular, nunca formaríamos qualquer noção de causa e de efeito; esta conjunção regular produz a inferência no entendimento, que é a única conexão da qual podemos ter alguma compreensão. Quem pretender definir a causa, excluindo estas circunstâncias, será obrigado a empregar termos ininteligíveis ou dar sinônimos do termo que se tenta esforçar por definir.[12] Se se admite a definição acima citada, a liberdade, oposta à necessidade e não à restrição, é a mesma coisa que o acaso e a respeito do qual toda a gente está de acordo que não existe.

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[6] Nas edições de K a M lê-se: "a forma de todas as inferências que formamos a seu respeito.
[7] Hume se refere talvez ao que se entende atualmente por estética. [N. do T.]
[8] Este parágrafo foi inserido apenas na última edição revista por Hume e publicada em 1777 (edição O). [N. do T.]
[9] Dos argumentos atados por Hume, depreendemos uma proposição, segundo Flew, geral e fundamental. Trata-se de aceitar como evidente que o método experimental, o único em verdade válido nas questões de fato e de existência real, deve basear-se em regularidades, ou uniformidades, discerníveis rios fatos naturais, e quer aplicado aos homens, quer a outros objetos quaisquer, devem resultar inferências bem-sucedidas. Por este motivo, Hume procurou mostrar que não apenas na esfera humana, como em outros objetos quaisquer, há suficiente regularidade para originar a inferência causal (Flew, ob. cit., pp. 146-7). [N. do T.]
[10] O predomínio da doutrina da liberdade pode ser explicado por outra causa, ou seja, uma falsa sensação ou aparente experiência de liberdade ou indiferença que temos ou que podemos ter em muitos de nossos atos. A necessidade de uma ação da matéria ou do espírito não é, propriamente falando, uma qualidade no agente, mas em qualquer ser pensante e inteligente que pode considerar a ação, e ela consiste principalmente nas determinações de seus pensamentos para inferir a existência desta ação a partir de alguns objetos precedentes. De modo que a liberdade, quando oposta à necessidade, não é senão a ausência desta determinação e a presença de certo abandono ou indiferença que sentimos ao passar ou não passar da ideia de um objeto à de outro que o sucede. Podemos, assim, observar que, mesmo ao refletir sobre os atos humanos, raramente sentimos esse abandono ou indiferença, mas somos geralmente capazes de inferi-los de seus motivos e das disposições de quem os realiza; sem dúvida, ao realizar estes mesmos atos, notamos frequentemente algo parecido a isto. E, como é fácil confundir todos os objetos semelhantes, isto tem sido usado como prova demonstrativa e mesmo intuitiva da liberdade humana. Sentimos que nossos atos estão sujeitos à nossa vontade na maioria dos casos e imaginamos que sentimos a vontade como não subordinada a nenhuma coisa porque, quando por afirmação contrária somos provocados a tratar de fazê-lo, sentimos que ela se move facilmente em todas as direções e produz uma imagem de si mesma (ou uma veleidade, como tem sido denominada nas escolas), embora sem decidir para que lado ela se dirige. Esta imagem ou débil movimento nesse momento poderia (estamos persuadidos disto) haver chegado a ser a própria coisa, porque, se isto fosse negado, veríamos, numa segunda tentativa, que agora pode chegar a sê-lo. Não consideramos que o fantástico desejo de mostrar a liberdade é aqui o motivo de nossas ações. Parece certo que, qualquer que seja a maneira pela qual sentimos em nós a liberdade, um espectador pode geralmente inferir nossos atos de nossos motivos e do nosso caráter, e mesmo quando não pode conclui geralmente que poderia se conhecesse perfeitamente todas as circunstâncias de nossa situação e temperamento e as fontes mais secretas de nossa disposição. Esta é, portanto, a verdadeira essência da necessidade, segundo a doutrina anterior (Hume).
[11] O homem como “agente” deve considerar-se inteiramente livre para realizar, ou não, qualquer ação. Na condição de ‘espectador”, que observa e reflete tanto sobre suas ações como as de outrem, o homem conclui que elas importam em tal uniformidade que é levado a enquadrá-las como efeitos necessários de causas conhecidas. É com vistas à última caracterização que Hume tem a intenção de conciliar as doutrinas da “liberdade e da necessidade”. Reafirma, assim, que a definição de “causa” implica a “conexão necessária” com seu efeito, como elemento essencial, ou ainda, segundo o Tratado, a “necessidade constitui um aspecto essencial da causalidade” (II, ii, III, p. 407). A partir desta formulação, infere que se “se admite a definição de causa acima citada, a liberdade, oposta à necessidade e não à restrição, é a mesma coisa que o acaso e a respeito do qual toda a gente está de acordo que não existe”. Excluindo o fator “acaso” da doutrina da liberdade, Hume está prescrevendo as mesmas regras da necessidade causal para elucidar a liberdade humana. Instaura, desta maneira, a liberdade no seio da necessidade e pressupõe que apenas assim os atos humanos devem ser julgados sob o prisma da responsabilidade moral. [N. do T.]
[12] Assim, se uma causa fosse definida como o que produz algo, é fácil observar que produzir é sinônimo de causar. Do mesmo modo, se se definisse uma causa como aquilo por meio do qual algo existe, esta definição está sujeita à mesma objeção. O que se entende pelos termos por meio da qual? Se se houvesse dito que a causa é aquilo depois do qual algo existe constantemente, teríamos entendido os termos. Porque isto é, em verdade, tudo o que sabemos acerca do assunto. E esta constância constitui a verdadeira essência da necessidade, já que não temos outra ideia dela (Hume).

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