Ensaio 07
baitasar
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baitasar
Adelaide sempre foi desde que nasceu coisa nenhuma,
nas conferências com o seu analista psicólogo, espírita, além-túmulo,
subconsciente, inconsciente, místico, histérico, confessou que ainda na barriga
da mãe tinha decidido: se aqui nesta província só existem vermelhos e azuis,
maragatos e chimangos, brancos e pretos, cavalos e vacas, não seria nem isso,
nem aquilo, muito antes pelo contrário, serão todos ou ninguém.
Brincava de mocinho e bandido com os meninos, mas
não era o mocinho ou o bandido, gostava de ser o juiz para ordenar o enforcamento
— Quantas vezes me senti menino.
Brincava de médica com as meninas, mas não era a
doutora ou a paciente, gostava de ser a enfermeira para ajudar a salvar vidas.
Até o dia que a Inês, uma garotinha de 6 anos, estava mais doente que
brincando, vomitou em seus pés, nesse dia desistiu de salvar vidas — Quantas
vezes me senti menina.
Então, dormiu e passaram a experimentar bonecas,
carrinhos, tambores, cornetas, soldadinhos de chumbo – perdeu um exército
inteiro do pai – saladinhas, sopinhas, o que interessava era o divertimento do
seu menino e da sua menina. Adelaide ficou em risco exposta no dia em que seu
irmão, mais velho por um ano – nas conferências de aparições telepáticas confessou
que gostaria de ter nascido um ano antes do irmão, Isso teria feito muita
diferença. – intrometeu-se nas brincadeiras. O chato do irmão é real e azul, ela
decidiu que também teria uma cor da paixão: vermelha. Aceitou o jogo daquelas forças supremas. Seria um espinho
atravessado no pé daquele guri chato e abelhudo. A felicidade dos colorados
frustrava o contentamento do irmão — Adoro! — enquanto o irmão rezava pela
infelicidade dos colorados, ela também torcia fervorosamente pela desdita dos
gremistas, não queria o pai triste, mas não tinha como suportar o irmão com
seus gritos de felicidade — Odeio!
Por essa e outras mais razões, a camiseta azul,
presente do Sèzar, está estendida em sua cama. Está sufocada por esta realidade
que não é real porque só existe nas aparências — Se eu pudesse mudaria o nome
do Brasil para Inter! — respondeu quando à professora do 2º ano perguntou o que
ela gostaria de mudar no mundo.
E, no entanto, ali estava com a camisa azul, É bem
bonita, sempre lembra que o pai foi gremista, mas aquele ano antes do irmão fez
muita diferença.
Olha para o relógio, já quase lhe chega a hora
marcada, coisas de nada. Desveste suas roupas e vai para o banho, gosta de
caminhar nua. Gozava com sinceridade aquele passeio sem importância até o
chuveiro. Sem suas roupas sente-se real, não se distrai com as aparências.
O perfume das águas aliviam suas tensões.
Está pronta, mas falta a camiseta azul. Pensa no pai
melancólico com sua escolha pelo colorado, sorriu para ele e vestiu a camiseta
gremista. Não se viu no espelho.
O Sèzar estava parado à porta, as mãos nos bolsos da
calça, os olhos sorrindo, a boca se abrindo com sua alma — Está pronta?
Ela está pronta.
Os colorados não se lembraram de abraçar os
Eucaliptos – ou não quiseram, apenas venderam as memórias – faltou acarinhar o velho
estádio colorado, agora não é mais possível mudarem as aparências.
Saem para abraçar o estádio Olímpico, um abraço de
despedida e reencontro com as histórias memórias, um último abraço no velho
pai.
Ele está lá.
— Eu
fui!
Gremistas ou colorados, todos são alguma coisa que
não existe, como um sono morto, quase um desassossego.
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