sábado, 18 de agosto de 2012

O sinal da cruz e o pecado


Ensaio
baitasar
Sempre que passava na calçada da igreja, ou de qualquer cruz, fiz o sinal combinado: antes de partir de la Montaña; antes de deixar o penico de barro; antes de limpar as sujeiras sozinhas: Pai – Filho – Espírito – Amém.
Muitas vezes, quando precisei de mais alívio, rezava 1 Pai Nosso e 1 Ave Maria, mas quando a coisa era braba, depois do sinal em cruz, rezava 3 Pai Nosso e 3 Ave Maria, para desafogo e soltura dos desacordos de julgamento da lucidez.
Por via das dúvidas, quando passava por cruzamentos com despachos de oferendas, sempre evitei o centro da cruz; primeiro peço licença, faço o sinal em cruz, digo anúncio de saudação — Salve as bandas de lá! Salve as bandas de cá! — e cruzo pelos lados. Nunca pelo centro do cruzeiro.
Não sei se existe alguma razão para tanto respeito e quitação de dívida, feita ou por fazer, além do medo de perder a amorosidade dos espíritos antigos, de qualquer maneira, fiz e não desfiz de rezar, e cuidar no que piso, sempre ajuda sentir mão de auxílio.
Compreendo que existe alguma razão por trás das escolhas que fiz, além da vontade que quis satisfazer. Acho que sempre vão existir razões para um ou outro capricho, mas gosto de dizer que — Fiz o que fiz porque quis.
Ajudei muitas meninas. Perdidas. Solitárias. Vencidas. Amarguradas. Maltratadas. Sonharam de olhos abertos. Sonhos acordados. Algumas moravam na casa, outras chegavam para atender a freguesia. Fizeram o que fizeram porque ajudei.
Quando as meninas moravam na casa, ficava com cinquenta por cento, mas o melhor arranjo foi elas chegarem apenas para o trabalho, deixavam com a casa vinte e cinco por cento do que ganhavam.
Melhor para elas e melhor para a casa, trabalhar sozinha na rua precisa sorte e ser maluca, não basta ter coragem. Aqui, tinham proteção: cliente violento ia se entender com o Calçacurta.
Esse nunca me pediu dinheiro ou favor desmedido, só queria atendimento de primeira classe. Nunca deixou de gozar e se endurecer de vontade. A casa tinha orgulho da sua clientela — Na minha casa cliente gozava do prazer e não da piada.
Fui como as outras meninas, mas mais corajosa. Precisava ser como uma general: dura, exigente, intransigente, disciplinada, aceitei muito conselho do Calçacurta. O homem entendia do que fazia, mas adorava que se babava de apanhar uma boa surra das meninas. Não reclamava. Não dava um gemido, parecia querer mostrar como se apanha calado... com o bico fechado.
Entre as meninas sempre tinha uma mais chamada que as outras. São os fatos da vida e nos convencemos que não era nada de mais, é isso, para ganhar bem foi preciso aceitar muito, topar tudo, desde que pagassem bem. E fim de papo, sem mau gosto ou barbarismo.
Às vezes, quase não se fazia nada. Não tinha o que fazer apenas esperar. Nem adiantava ficar incomodada, era preciso paciência. Quase todas tinham oportunidade de popularidade e cheiro de dinheiro. Precisavam estar concentradas em ganhar dinheiro. Negociar bem e serem cuidadosas.
Despesas pequenas com médico e remédio pouco ficavam na conta das meninas, mas quando o serviço precisava de mais tempo que alguma visita de consultório, eu não punha preço ao general Calçacurta. A menina com abatimento de doença tinha atendimento em clínica privativa. Coisa boa. O homem mandava e não pedia.
Teve vez que ele convocou a casa fechada para o público — Preciso dar atendimento de atenção especial num gringo. — um graúdo das políticas estrangeiras. O cara pálida chegou por aqueles dias, e não precisou pedir outra vez. Fechamos. Dia para o balanço. A clientela chiava, mas não tinha o que fazer, além de esperar a abertura das portas.
O recém-chegado era senador político dos estrangeiros. Gordo. Língua presa. Desavergonhado. Não quis quarto, preferiu os acontecimentos por ali, na chegada. Ansioso. Trouxe junto a sua bebida. Desconfiado. Não bebi. Nunca bebia em serviço de guarda. Soldado no quartel precisa ficar alertado.
As meninas lhe tiraram a roupa. Pedi que a penumbra pudesse esconder a pouca vergonha daquele homem atirado pelo chão, rolando de vontade. Comeu e foi comido. Gritava coisas malucas de bêbado — A experiência anal é maravilhosa! — foi a primeira vez que a droga entrou na casa. Cheirava e bebia. Um dos seus convidados deu um trabalho danado na Facécia. A menina usou todos os truques no sujeito, mas nada lhe fez ficar pronto com o endurecimento. Fiquei com dó do gajo, tanto esforço, tanta energia, veio de tão longe, a Facécia pronta, querendo e o atrapalhado inutilizado. Gritava palavrões para o ferramental desajeitado, lambia a guria, e nada
—        Deputado... estou ficando esfoladinha...
—        Saliva de língua é antibiótico de muito recurso.
—        Então, que continue o uso. — foi o jeito de fazer o nobre deputado sentir utilidade de uso — Pode fazer uso dos dedos... — a Facécia sempre foi de muita classe.
Guria com firula não vingava na casa.

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