mulheres descalças
o siô ajeitado e as duas miúda
Ensaio 127Bzb – 2ª edição 1ª reimpressão
baitasar
inatie aye acenô da cabeça, tava sabendo das vontade daquele dono das corda trançada e amarrada feito um colá de morte e sofrimento no seu pescoço, Negrinha! Não se faça de surda. Escuta. Presta bem atenção, a voz agachô inté parecê um zumbido desalmado, duro, sem fim, vou desamarrar a corda do pescoço da negrinha, mas não esquece da sua mãezinha acorrentada. Vai me dar muito prazer fazer ela pagar por suas bobagens. Entendeu, negrinha?
inatie aye acenô otra veiz da cabeça, o corpo todo tremia, as palavra tava escondida, as mão continuava pendurada, uma em cada lado, os dedo piquinino num mexia, eles continuava apontando pra terra, nehum mexia, as água dusóio derramando, sem um gemido, aprendia perdê pedaço da vida, uma lasca toda veiz e cada veiz mais quanto mais a vida nela crescia
uspé descalço continuava empurrando o chão daquele lugá qui apreciava inerte tanto ódio e desprezo, fingimento qui diz num sabê, num vê nem escutá maldade, Muito bem, é só obedecer que não vai ter castigo. E não duvide, eu gosto disso tudo, curvô otra veiz, inté a miúda sentí umidade nas palavra ajeitada, uma a uma, como num jogo, queria amarrá o medo da morte nas vontade da vida, não esqueça, eu sou muito poderoso. Eu sou a autoridade que castiga os fujões, os atrevidos, os preguiçosos. Entendeu, negrinha? Eu escolho a negrinha que morre, a negrinha que vive...
continuô parada esperando sê desatada, sem a corda ficô mais amarrada duqui antes, num queria sê mais um fardo pra mais dô na mãinha, num podia se desatá, gritá ou fugí nem abandoná seu corpo defunto, precisava aprendê sê mais uma muié preta corajosa, queria vivê
ducéu se soltava uma ventania qui mais parecia gemido, as vista naquele lugá chorava tristeza, a animação ficava por conta daqueles grito com oferecimento e procura, compra e venda, E essa crioulinha quanto vai me custar?
num existi vendedô quando num tem compradô
o trabáio escravizadô oiô pru siô ajeitado qui se mostrô interessado, boa vestimenta, segurando pelas mão duas miúda cô do leite, descobriu só divê qui usiô tava querendo uma boneca de carne e osso preta pras duas miúda branca, Aham, pensô, é de pequenininha que se entorta o pepino e se ensina quem obedece e quem manda, sentiu pelo faro qui era negócio bão pra sê feito, Essa é Antônia, a idade presumida é dez anos, estatura a crescer, rosto comprido, os olhos pretos e os olhos grossos compensam o nariz achatado. Não tem moléstia. Não tem marca de nagô na cara, tem os pés pequenos e nenhum osso quebrado. Não tem nenhuma marca de castigo porque é obediente, já aprendeu o seu lugar de ficar. Não dá trabalho nem precisa de muito cuidado. Não se queixa nem sofre da vaidade de querer se mostrar mais do que é. Não tem imaginação nem as asas que fazem a vontade querer voar. Não levanta os olhos e não pega nada sem ser mandada. Eu tenho orgulho das atitudes dessa negrinha. É uma venda que me deixa triste e satisfeito. Triste porque vou perder a negrinha e satisfeito porque é uma venda que não vai me dar dor de cabeça com alguma reclamação ou insatisfação. É um bom negócio para as duas partes.
Tanto elogio só pode ser para subir o preço...
De maneira nenhuma, preço justo é preço justo. Mas é preciso ficar atento, o sinhô sabe como é, né? Negro é negro, em algum momento vai fazer alguma cagada... desculpe desculpe, esqueci as meninas e as boas maneiras... a crioulada sempre faz alguma coisa errada quando chega ou quando sai. É assim, e pronto. Mas acredito que a Antônia vai se esforçar. De qualquer maneira a tentação é a mão da desobediência, é preciso ter pulso firme.
parô as palavra, gostava de pará e depois avisá qui nuseu ensinamento prus pretu num tinha desatenção nem afrôxamento, mais agora precisava sabê do interesse daquele siô ajeitado e se aquela falação toda foi caso ditê adiantado, esperô pra sabê se a conversa num ia pará, E os dentes?
é isso, o siô ajeitado tinha mordido a isca, um pêxe grande na sua linha, o trabáio escravizadô soltô um suspiro desses traqui qui ninguém vê, a primêra parte tava cumprida, agora vinha a parte do preço, sabê vendê é sabê entendê o compradô
____________________
histórias de avoinha: Toque, minha filha.
histórias de avoinha: Onde está a gaiola do Venuto?
histórias de avoinha: Deus te abençoe, minha filha
histórias de avoinha: um corpo febrento e para sempre culpada
histórias de avoinha: a dança dos dedo
histórias de avoinha: os pé e as bota de garrão
histórias de avoinha: Oh!... prugunta pra todas criança
histórias de avoinha: um império invisível
histórias de avoinha: uma sombra sem corpo não cruza as pernas
histórias de avoinha: Bagaço hipócrita!
histórias de avoinha: a vaga de marido
histórias de avoinha: a lua na escuridão
histórias de avoinha: chegô no piano
histórias de avoinha: o silêncio no brejo dos pensamento
histórias de avoinha: borboleta preta
histórias de avoinha: Obrigada, Açunta!
histórias de avoinha: ôum velório de vida
histórias de avoinha: Simão
o siô ajeitado e as duas miúda
Ensaio 127Bzb – 2ª edição 1ª reimpressão
baitasar
inatie aye acenô da cabeça, tava sabendo das vontade daquele dono das corda trançada e amarrada feito um colá de morte e sofrimento no seu pescoço, Negrinha! Não se faça de surda. Escuta. Presta bem atenção, a voz agachô inté parecê um zumbido desalmado, duro, sem fim, vou desamarrar a corda do pescoço da negrinha, mas não esquece da sua mãezinha acorrentada. Vai me dar muito prazer fazer ela pagar por suas bobagens. Entendeu, negrinha?
inatie aye acenô otra veiz da cabeça, o corpo todo tremia, as palavra tava escondida, as mão continuava pendurada, uma em cada lado, os dedo piquinino num mexia, eles continuava apontando pra terra, nehum mexia, as água dusóio derramando, sem um gemido, aprendia perdê pedaço da vida, uma lasca toda veiz e cada veiz mais quanto mais a vida nela crescia
uspé descalço continuava empurrando o chão daquele lugá qui apreciava inerte tanto ódio e desprezo, fingimento qui diz num sabê, num vê nem escutá maldade, Muito bem, é só obedecer que não vai ter castigo. E não duvide, eu gosto disso tudo, curvô otra veiz, inté a miúda sentí umidade nas palavra ajeitada, uma a uma, como num jogo, queria amarrá o medo da morte nas vontade da vida, não esqueça, eu sou muito poderoso. Eu sou a autoridade que castiga os fujões, os atrevidos, os preguiçosos. Entendeu, negrinha? Eu escolho a negrinha que morre, a negrinha que vive...
continuô parada esperando sê desatada, sem a corda ficô mais amarrada duqui antes, num queria sê mais um fardo pra mais dô na mãinha, num podia se desatá, gritá ou fugí nem abandoná seu corpo defunto, precisava aprendê sê mais uma muié preta corajosa, queria vivê
ducéu se soltava uma ventania qui mais parecia gemido, as vista naquele lugá chorava tristeza, a animação ficava por conta daqueles grito com oferecimento e procura, compra e venda, E essa crioulinha quanto vai me custar?
num existi vendedô quando num tem compradô
o trabáio escravizadô oiô pru siô ajeitado qui se mostrô interessado, boa vestimenta, segurando pelas mão duas miúda cô do leite, descobriu só divê qui usiô tava querendo uma boneca de carne e osso preta pras duas miúda branca, Aham, pensô, é de pequenininha que se entorta o pepino e se ensina quem obedece e quem manda, sentiu pelo faro qui era negócio bão pra sê feito, Essa é Antônia, a idade presumida é dez anos, estatura a crescer, rosto comprido, os olhos pretos e os olhos grossos compensam o nariz achatado. Não tem moléstia. Não tem marca de nagô na cara, tem os pés pequenos e nenhum osso quebrado. Não tem nenhuma marca de castigo porque é obediente, já aprendeu o seu lugar de ficar. Não dá trabalho nem precisa de muito cuidado. Não se queixa nem sofre da vaidade de querer se mostrar mais do que é. Não tem imaginação nem as asas que fazem a vontade querer voar. Não levanta os olhos e não pega nada sem ser mandada. Eu tenho orgulho das atitudes dessa negrinha. É uma venda que me deixa triste e satisfeito. Triste porque vou perder a negrinha e satisfeito porque é uma venda que não vai me dar dor de cabeça com alguma reclamação ou insatisfação. É um bom negócio para as duas partes.
Tanto elogio só pode ser para subir o preço...
De maneira nenhuma, preço justo é preço justo. Mas é preciso ficar atento, o sinhô sabe como é, né? Negro é negro, em algum momento vai fazer alguma cagada... desculpe desculpe, esqueci as meninas e as boas maneiras... a crioulada sempre faz alguma coisa errada quando chega ou quando sai. É assim, e pronto. Mas acredito que a Antônia vai se esforçar. De qualquer maneira a tentação é a mão da desobediência, é preciso ter pulso firme.
parô as palavra, gostava de pará e depois avisá qui nuseu ensinamento prus pretu num tinha desatenção nem afrôxamento, mais agora precisava sabê do interesse daquele siô ajeitado e se aquela falação toda foi caso ditê adiantado, esperô pra sabê se a conversa num ia pará, E os dentes?
é isso, o siô ajeitado tinha mordido a isca, um pêxe grande na sua linha, o trabáio escravizadô soltô um suspiro desses traqui qui ninguém vê, a primêra parte tava cumprida, agora vinha a parte do preço, sabê vendê é sabê entendê o compradô
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histórias de avoinha: Oh!... prugunta pra todas criança
histórias de avoinha: uma sombra sem corpo não cruza as pernas
histórias de avoinha: Bagaço hipócrita!
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histórias de avoinha: o silêncio no brejo dos pensamento
histórias de avoinha: borboleta preta
histórias de avoinha: ôum velório de vida
histórias de avoinha: Simão
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