Hannah Arendt
Parte I
ANTISSEMITISMO
Este é um século extraordinário, que começa com a Revolução e termina com o Caso Dreyfus. Talvez ele venha a ser conhecido como o século da escória.
Roger Martin du Gard
Os primeiros governos a necessitarem de renda regular e de finanças seguras foram as
monarquias absolutistas, sob as quais o Estado-nação viria a nascer. Antes, príncipes e reis
feudais também necessitavam de dinheiro, e até mesmo de crédito, mas apenas para fins
específicos e operações temporárias; mesmo no século XVI, quando os Fugger puseram seu
próprio crédito à disposição do Estado, ainda não cogitavam de estabelecer crédito estatal
especial. Inicialmente, os monarcas absolutos cuidavam de suas necessidades financeiras em
parte pelo velho método de guerra e pilhagem, e em parte pelo sistema de monopólio de
impostos, o que solapava o poder, pois arruinava as fortunas da nobreza, sem aplacar a
hostilidade da população.
Durante muito tempo, as monarquias absolutistas procuraram na sociedade um grupo do qual
pudessem depender com a mesma segurança que a nobreza dava à monarquia feudal. Na França,
desde o século XV desenvolvia-se incessante luta entre as corporações e a monarquia, esta
querendo integrar aquelas no sistema do Estado. A mais interessante dessas experiências foi,
sem dúvida, o surgimento do mercantilismo e as tentativas do Estado absolutista para impor o
monopólio absoluto ao comércio e à indústria nacionais. O consequente desastre do Estado
absolutista e a sua bancarrota provocada pela resistência da burguesia em ascensão são
suficientemente conhecidos.[5]
Antes dos éditos de emancipação, cada casa principesca, cada monarca da Europa, já possuía
seu judeu-da-corte para administrar as finanças. Durante os séculos XVII e XVIII, esses judeus
da-corte eram sempre indivíduos isolados, que mantinham, decerto, conexões intereuropeias e
dispunham de fontes de crédito intereuropeias mas não constituíam entidade financeira
internacional.[6] Os judeus individualmente e as primeiras ricas pequenas comunidades judaicas dispunham então de poder tão elevado que se permitiam abordar com maior franqueza
não só as discussões sobre seus privilégios mas também sobre o direito de obtê-los, enquanto as
autoridades se referiam de maneira muito cuidadosa à importância dos serviços que os judeus
prestavam ao Estado.[7] Não há sombra de dúvida quanto à conexão entre os serviços prestados e
privilégios concedidos. Na França, na Baviera, na Áustria e na Prússia os judeus privilegiados
recebiam títulos de nobreza, de modo que ultrapassavam o status de meros homens ricos.
Sobrepujadas as dificuldades enfrentadas pelos Rothschild em conseguir o título de nobreza
(aprovado pelo governo austríaco em 1817), findava cabalmente uma época.
Em fins do século XVIII já era evidente nos vários países que nenhuma das camadas ou classes
estava desejosa ou tinha capacidade de tornar-se classe governante, isto é, de identificar-se com
o governo como a nobreza o havia feito no decorrer dos séculos.[8] O fato de a monarquia não ter
conseguido encontrar uma classe que substituísse a aristocracia dentro da sociedade levou ao
rápido desenvolvimento do Estado-nação e à presunção de que esse sistema estivesse acima de
todas as classes, completamente independente da sociedade com sua pluralidade de interesses
particulares que a perfaziam — enfim, o verdadeiro e único representante da nação como um
todo. Esse sistema resultou, por outro lado, no aprofundamento da brecha entre o Estado e a
sociedade, na qual repousava a estrutura política da nação. Sem essa brecha, não seria
necessário nem possível incluir os judeus na história europeia em termos de igualdade.
Quando falharam todas as tentativas de aliar-se a uma das classes principais da sociedade,
restou ao Estado impor-se como poderosa empresa comercial. O crescimento dos negócios
estatais foi causado pelo conflito entre o Estado e as forças financeiramente poderosas da
burguesia, que preferiu dedicar-se ao investimento privado, evitando a intervenção do Estado e
recusando-se a participar de maneira ativa no que lhe parecia ser empresa "improdutiva". Foram
assim os judeus a única parte da população disposta a financiar os primórdios do Estado e a
ligar seu destino ao desenvolvimento estatal. Com o seu crédito e suas ligações internacionais, estavam em excelente posição para ajudar o Estado
nação a afirmar-se entre os maiores empregadores e empresas da época.[9]
Acentuados privilégios e mudanças decisivas na condição da vida dos judeus constituíam o
preço pela prestação de tais serviços e, ao mesmo tempo, a recompensa por grandes riscos.
Quando os Münzjuden — judeus financistas __de Frederico da Prússia ou os judeus-da-corte do
imperador austríaco receberam, sob forma de "privilégios gerais" e "patentes", o mesmo status
que, meio século mais tarde, todos os judeus da Prússia receberiam com o nome de
emancipação e igualdade de direitos; quando, no fim do século XVIII, no ápice de sua fortuna,
os judeus de Berlim conseguiram impedir o influxo dos judeus das províncias orientais — ex-polonesas — do império germânico, porque não desejavam dividir a sua "igualdade" com os
correligionários mais pobres e menos cultos, os quais não reconheciam como iguais; quando, ao
tempo da Assembleia Nacional Francesa, os judeus de Bordeaux e de Avignon protestaram
violentamente contra a concessão de igualdade, por parte do governo francês, aos judeus das
províncias orientais — Alsácia principalmente —, ficou claro que os judeus não pensavam em
termos de direitos iguais, mas, sim, de privilégios e liberdades especiais. E realmente não nos
surpreende que os judeus privilegiados, intimamente ligados aos negócios de governos e bem
conscientes da natureza e condição de seu status, relutassem em aceitar a outorga para todos os
judeus dessa liberdade, que eles conseguiram em troca por seus serviços, e a qual, portanto,
vista sob esse aspecto, não podia, segundo eles, tornar-se um direito a ser compartilhado por
todos.[10]
Só no fim do século XIX o imperialismo em evolução levou as classes proprietárias à mudança
da opinião inicial sobre a suposta improdutividade dos negócios estatais. A expansão
imperialista, juntamente com o gradativo aperfeiçoamento dos instrumentos de violência
monopolizados de modo absoluto pelo Estado, tornou interessantes os negócios comerciais com
o Estado como parceiro. Isso significou, naturalmente, que os judeus, gradual mas
automaticamente, perderam sua posição exclusiva e singular.
Mas a boa sorte dos judeus e a sua saída da obscuridade para a importância política teriam sido
mais breves, se eles se houvessem restringido a meras funções comerciais dentro do Estado
nação em crescimento. Em meados do século XIX, alguns Estados adquiriram suficiente crédito
para dispensar o financiamento e a garantia dos judeus para seus empréstimos.[11] Ademais, a
crescente consciência por parte dos cidadãos de que seus destinos particulares se tornavam cada
vez mais dependentes dos destinos do país fez com que eles se dispusessem a conceder ao
governo mais crédito necessário. A própria igualdade era simbolizada pelo fato de qualquer um
poder comprar papéis do governo — ações, apólices, bônus etc. —, já considerados a mais
segura modalidade de investir capital, na medida em que o Estado, totalmente soberano para
travar guerras e dispor da vida dos súditos, tornou-se a única entidade que podia realmente
proteger as propriedades dos cidadãos. A partir de meados do século XIX, os judeus
mantiveram posição de destaque porque ainda desempenhavam papel importante, intimamente
ligado à participação nos destinos do Estado. Sem território e sem governo próprios, os judeus
constituíam elemento intereuropeu; e o Estado-nação necessariamente conservava-lhes essa
condição, porque dela dependiam os serviços financeiros prestados por judeus. Mas, mesmo
após o desaparecimento da sua utilidade econômica, a condição intereuropeia dos judeus
continuava sendo de suma importância para o Estado, principalmente em tempo de conflitos e
guerras entre as nações.
Enquanto a necessidade dos serviços dos judeus aos Estados-nações surgira de modo lento e
lógico, evoluindo a partir do contexto geral da história da Europa, a ascensão dos judeus à
posição de destaque político e econômico foi súbita e inesperada, tanto para eles próprios como
para os seus vizinhos. No fim da Idade Média, o emprestador de dinheiro judeu perdeu a sua
antiga importância, e já no começo do século XVI os judeus começaram a ser expulsos de
cidades e centros comerciais para lugarejos e vilas do interior, trocando assim a uniforme
proteção das autoridades centrais por uma posição insegura, concedida desigualmente por
pequenos nobres locais.[12] O momento crítico surgiu no século XVII quando, durante a Guerra
dos Trinta Anos, esses judeus, insignificantes e dispersos emprestadores de dinheiro, podiam
garantir, com o auxílio de judeus mercadores, provisões para os exércitos mercenários dos
chefes guerreiros situados em terras ocupadas e estranhas. Como essas guerras eram
semifeudais e mais ou menos particulares dos príncipes, sem envolver quaisquer interesses de outras classes, o que os judeus ganhavam em status era muito limitado e
quase imperceptível. Mas o número de judeus-da-corte aumentava, porque cada casa feudal
precisava do seu financista particular.
Esses judeus-da-corte eram servos de um grupo social apenas: serviam tão-só a pequenos
senhores feudais, que, como membros da nobreza, não aspiravam a representar qualquer
autoridade centralizada. As propriedades que administravam, o dinheiro que emprestavam e as
provisões que compravam constituíam problemas particulares do senhor, de modo que essas
atividades não podiam envolver os judeus em questões políticas. Portanto, odiados ou
favorecidos, os judeus tampouco podiam transformar-se em questão política de alguma
importância.
Quando, contudo, mudou o status do senhor feudal, quando ele se tornou príncipe ou rei,
alterou-se também a função do judeu-da-corte. Os judeus, como elementos estranhos,
desinteressados pelas mudanças, mal percebiam a gradativa melhora de sua posição. No que
lhes tocava, continuavam a administrar negócios privados, e sua lealdade continuava a ser
questão pessoal, que nada tinha a ver com considerações políticas. A lealdade significava
honestidade: não obrigava a tomar partido nos conflitos ou a permanecer fiel por motivos
políticos. Comprar provisões, vestir e alimentar um exército, emprestar dinheiro para o
recrutamento de mercenários refletia apenas o interesse pelo bem-estar de um sócio comercial,
fosse ele quem fosse.
O tipo de relação entre os judeus e a aristocracia impediu que o grupo judeu se ligasse a outra
camada da sociedade. Depois que desapareceu, no começo do século XIX, nunca foi
substituído. Como seu vestígio, entre os judeus permaneceu a inclinação por títulos
aristocráticos (especialmente na Áustria e na França) e, no tocante aos não-judeus, uma espécie
de antissemitismo liberal, que colocava judeus e nobreza no mesmo nível, por alegar que ambos
se aliavam financeiramente contra a burguesia em ascensão. Esses argumentos, correntes na
Prússia e na França, eram plausíveis antes da emancipação geral dos judeus, pois os privilégios
dos judeus-da-corte realmente se assemelhavam aos direitos e às liberdades da nobreza; os
judeus demonstravam o mesmo medo da aristocracia de perder os seus privilégios, e usavam os
mesmos argumentos contra a igualdade de todos. A plausibilidade tornou-se ainda maior
quando, no século XVIII, à maioria dos judeus privilegiados foram outorgados títulos menores
de nobreza e, no começo do século XIX, quando os judeus ricos, tendo perdido seus laços com
as comunidades judaicas, buscaram status social seguindo o modelo da aristocracia. Mas tudo
isso era inconsequente, primeiro, porque já era óbvio que a nobreza estava em declínio,
enquanto os judeus, ao contrário, subiam continuamente em sua posição social; e, segundo,
porque a própria aristocracia, especialmente na Prússia, veio a ser a primeira classe a esboçar
uma ideologia baseada no antissemitismo.
Os judeus eram fornecedores em tempo de guerra, mas, embora servos do rei, jamais
participavam dos conflitos; nem se esperava que o fizessem. Quando os conflitos cresceram e se
tornaram guerras nacionais, eles continuaram mantendo a característica de grupo internacional, cuja importância e utilidade decorriam
precisamente do fato de nunca se terem ligado a qualquer causa nacional. Não sendo mais
banqueiros estatais nem fornecedores em tempo de guerra (a última guerra financiada por um
judeu foi a guerra austro-prussiana de 1866, quando Bleichroeder ajudou Bismarck, depois que
o parlamento da Prússia negou a este último os créditos necessários), os judeus tornaram-se
consultores financeiros e assistentes em tratados de paz e, de modo menos organizado e mais
indefinido, mensageiros e intermediários na transmissão de notícias. Os últimos tratados de paz
elaborados sem assistência judaica foram os do Congresso de Viena, entre a França e as demais
potências da Europa. O papel de Bleichroeder nas negociações de paz entre a Alemanha e a
França em 1871 foi mais significativo do que seu auxílio na guerra, e ele prestou serviços ainda
mais importantes no fim da década de 1870, quando, através1 de suas ligações com os
Rothschild, proporcionou a Bismarck um meio de comunicação indireta com Benjamin
Disraeli.[13] Os tratados de paz após a Primeira Guerra Mundial foram os últimos nos quais os
judeus desempenharam papel proeminente como consultores. O último judeu que deveu sua
ascensão no cenário nacional à sua conexão judaica internacional foi Walter Rathenau, ministro do Exterior da República de Weimar. Como disse um de seus colegas após o seu assassinato por
nacionalistas antissemitas, Rathenau pagou com a vida o fato de ter transferido aos ministros da
nova república, completamente desconhecidos no âmbito internacional, seu prestígio no mundo
internacional das finanças e o apoio dos judeus em todo o mundo.[14]
É óbvio que os governos antissemitas não usassem os judeus para os negócios de guerra e paz.
Mas a eliminação dos judeus do cenário internacional tinha um significado mais amplo e mais
profundo do que o antissemitismo propriamente dito. Os judeus eram valiosos na guerra na
medida em que, usados como elemento não-nacional, asseguravam as possibilidades de paz; isto
é, enquanto o objetivo dos beligerantes nas guerras de competição era a paz de acomodação e o
restabelecimento do modus vivendi. Mas, quando as guerras tornaram-se ideológicas, visando a
completa aniquilação do inimigo, os judeus deixaram de ser úteis. Já isso levaria à destruição de
sua existência coletiva, embora seja necessário frisar que seu desaparecimento do cenário
político, e até mesmo a extinção da vida grupai específica, não conduzia necessariamente ao
extermínio físico dos judeus. Contudo, é verdadeiro apenas parcialmente o argumento de que os
judeus alemães se teriam tornado nazistas, se isso lhes fosse permitido, com a mesma facilidade com que o fizeram seus concidadãos "arianos", como, aliás, os
judeus italianos se alistavam no partido fascista da Itália antes que o fascismo italiano introduzisse a
legislação racial. Essa asserção é verdadeira apenas com relação à psicologia dos judeus tomados
individualmente, psicologia que não diferia muito da então reinante ao redor, mas é patentemente falsa no
sentido histórico. O nazismo, mesmo sem pregar o antissemitismo, teria levado o golpe de misericórdia na
existência do povo judeu na Europa, e seria suicídio para os judeus como povo apoiá-lo, mesmo que não
o fosse necessariamente para indivíduos de origem judaica.
A primeira contradição que marcou o destino dos judeus da Europa durante os últimos séculos é aquela
entre a igualdade e o privilégio — isto é, entre a igualdade concedida sob a forma de privilégio e o
privilégio como meio para alcançar a igualdade. A esta, é preciso acrescentar uma segunda contradição:
os judeus, o único povo não-nacional da Europa, foram mais ameaçados que quaisquer outros pelo
colapso do sistema de Estados nacionais. A situação é menos paradoxal do que pode parecer à primeira
vista. Os representantes da nação, fossem jacobinos de Robespierre a Clemenceau ou representantes dos
governos reacionários da Europa central desde Metternich até Bismarck, tinham algo em comum: todos
estavam sinceramente preocupados com o "equilíbrio do poder" na Europa. Buscavam, naturalmente,
mudar esse equilíbrio em favor de seus respectivos países, mas jamais sonhariam com o monopólio do
poder que levasse à aniquilação dos seus competidores. Os judeus não apenas podiam ser usados no
interesse desse precário equilíbrio, mas se tornaram até uma espécie de símbolo dos interesses comuns
das nações europeias.
Não foi, portanto, mero acidente que as derrotas dos povos da Europa foram antecedidas pela catástrofe
do povo judeu. Era fácil iniciar a dissolução do precário equilíbrio de forças na Europa a partir da
eliminação dos judeus, embora fosse difícil compreender que essa eliminação transcendia o nacionalismo
inusitadamente cruel ou a inoportuna restauração de "velhos preconceitos". Quando veio a hecatombe, o
destino do povo judeu passou a ser considerado um "caso especial", cuja história seguia leis excepcionais
e cuja sorte, portanto, por depender de "determinismo" histórico, não era relevante. Mas a esse colapso da
solidariedade europeia correspondeu o colapso da solidariedade interjudaica em toda a Europa. Quando
começou a perseguição aos judeus alemães, os judeus dos outros países desse continente descobriram que
os judeus da Alemanha constituíam uma exceção, cujo destino não se assemelhava ao seu. Do mesmo
modo, o colapso da comunidade judaica alemã foi precedido pela fragmentação em numerosas facções,
cada qual acreditando que seus direitos humanos seriam protegidos por privilégios especiais — o
privilégio de ter sido veterano da Primeira Grande Guerra, ou filho de veterano, ou filho do soldado morto
em combate pela pátria. Cada grupo julgava constituir uma exceção. A aniquilação física dos indivíduos
de origem judaica parece então estar sendo precedida pela destruição moral do grupo e pela
autodissolução comunitária, como se o povo judeu devesse sua existência exclusivamente aos outros
povos e ao ódio que deles emanava.
continua página 32...
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Parte I Antissemitismo (2. Os Judeus. O Estado-Nação e o nascimento do antissemitismo: 2.1[b])
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[5] Contudo, dificilmente pode ser superestimada a influência das experiências mercantilistas em acontecimentos futuros. A França
foi o único país onde o sistema mercantilista foi seriamente experimentado e resultou no precoce florescimento de manufaturas que
deviam sua existência à intervenção do Estado — e o país jamais se recuperou disso. Na era da livre iniciativa, sua burguesia evitava
investimentos não garantidos em indústria, enquanto que sua burocracia, também produto do sistema mercantilista, sobreviveu ao
colapso. Embora a burocracia tenha perdido todas as suas funções produtivas, é, ainda hoje, característica do país, dificultando mais
que a burguesia a sua recuperação.
[6] Esse havia sido o caso na Inglaterra desde o banqueiro marrano da rainha Elizabeth e os financistas judeus dos exércitos de
Cromwell, até que um dos doze corretores judeus admitidos na Bolsa de Londres foi apontado como agenciador de um quarto de
todos os empréstimos governamentais de seu tempo (ver Saio W. Baron, A social and religious history of the Jews, 1937, vol. II:
Jews and capitalism); na Áustria, onde em 44 anos (1695-1739) os judeus creditaram ao governo mais de 35 milhões de florins, e
onde a morte de Samuel Oppenheimer em 1703 resultou numa grave crise financeira tanto para o Estado como para o imperador; na
Baviera, onde em 1808 quase 80% de todos os empréstimos governamentais eram endossados e negociados por judeus [ver M.
Grunwald, Samuel Oppenheimer und sein Kreis (S. O. e seu círculo), 1913]; na França, onde as condições mercantis eram
especialmente favoráveis aos judeus, a ponto de Colbert já ter louvado sua grande utilidade para o Estado (Baron, op. cit., loc. cit.),
e onde, em meados do século XVIII, o judeu alemão Liefman Calmer recebeu um baronato de um rei agradecido, que apreciava
serviço e lealdade a "Nosso Estado e Nossa pessoa" (Robert Anchel, no ensaio "Un baron juif français au18éme siècle, Liefman Calmet", publicado em Souvenir et Science, (1930, pp. 52-5); e também na Prússia, onde os Münzjuden
(judeus cunhadores de moedas) de Frederico II tinham títulos de nobreza e onde, no fim do século XVIII, quatrocentas famílias
judias constituíam um dos grupos mais ricos de Berlim. [Uma das melhores descrições de Berlim e do papel dos judeus em sua
sociedade no limiar do século XVIII pode ser encontrada em Wilhelm Dilthey, Das Leben Schleier-machers [A vida de S.], 1870,
pp. 182 ss.].
[7] No começo do século XVIII, os judeus austríacos conseguiram banir o Entdecktes Ju-dentum [O judaísmo desnudo], de
Eisemenger, de r703, e, no fim desse século, O mercador de Veneza de Shakespeare só podia ser representado em Berlim com um
pequeno prólogo em que se pediam desculpas ao público judeu.
[8] A única e irrelevante exceção é constituída pelos coletores de impostos, chamados fer-miers-généraux, da França, que alugavam
do Estado o direito de cobrar impostos, garantindo uma quantia fixa ao governo. Ganhavam da monarquia absoluta elevadas
fortunas, e dela dependiam diretamente, mas eram numericamente por demais insignificantes como grupo, e por demais efêmeros
como fenômeno, para exercerem influência econômica de per si.
[9] As necessidades que estreitavam os laços entre os governos estatais e os judeus podem ser avaliadas pela
ambivalência entre as ideias antijudaicas e a prática política do governo que as professava. Assim, Bismarck, em sua
juventude, fez alguns discursos antissemitas, mas veio a tornar-se, como chanceler do Reich, amigo íntimo de
Bleichroeder e fiel protetor dos judeus contra o movimento antissemita de Stoecker em Berlim. Guilherme II, embora,
como príncipe da Coroa e membro da antijudaica nobreza prussiana, tenha simpatizado com os movimentos antissemitas da década de 80, mudou suas convicções e abandonou seus protegidos antissemitas da noite para o dia,
quando subiu ao trono.
[10] Já no século XVIII, onde quer que grupos de judeus se tornassem suficientemente ricos para serem úteis ao
Estado, gozavam de privilégios coletivos e separavam-se, como grupo, de seus irmãos menos ricos e menos úteis,
ainda que fosse no mesmo país. Como os Schutzjuden (judeus protegidos) da Prússia, os judeus de Bordeaux e de
Bayonne na França gozavam de igualdade muito antes da Revolução Francesa, e foram até convidados a apresentar
suas queixas e proposições, juntamente com os outros grupos, na Convocation des Etats Généraux de 1787.
[11] Jean Capefigue (/fíííojre des grandes opérationsfinancières, vol. III: Emprunts bourses etc, 1855) pretende que,
durante a Monarquia de Julho, só os judeus, e especialmente a casa dos Rothschild, invalidaram a solidificação do
crédito e&tatal baseado no Banco da França. Diz ele que os acontecimentos de 1848 tornaram supérfluas as
atividades dos Rothschild. Raphael Strauss ("The Jews in the economic evolution of Central Europe", em Jewish
Social Studies, III, 1, 1941) observa também que, depois de 1830, "o crédito público já se tornava risco menor, de
modo que bancos cristãos começaram a entrar no negócio cada vez mais". Contra essas interpretações há o fato de
que prevaleciam excelentes relações entre os Rothschild e Napoleão III, embora não possa haver dúvida quanto à
tendência geral da época.
[12] Ver Priebatsch, op. cit.
[13] De acordo com um incidente, fielmente relatado por todos os seus biógrafos, Bismarck disse logo apôs a derrota
francesa de 1871: "Antes de mais nada, Bleichroeder tem de ir a Paris reunir-se com os seus colegas judeus e discutir o
assunto [os 5 bilhões de francos de reparação] com os banqueiros". (Ver Otto Joehlinger, flismarc/fc unddieJuden[B. e os
judeus], Berlim, 1921.)
[14] Ver o estudo de Walter Frank, "Walter Rathenau und die blonde Rasse" [W. R. e a raça loira],
em ForschungenzurJudenfrage [Pesquisas da questão judaica], vol. IV, 1940. Frank, a despeito de sua posição nazista, não
deixou de ser cuidadoso na escolha das fontes e métodos. Nesse artigo, ele cita os obituários de Rathenau no Israelitisches
Familienblatt (Hamburgo, 6 de julho de 1922). Die Zeit (junho de 1922) e Berliner Tageblatt (31 de maio de 1922).
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